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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - GREVE! - LIVROS
A Barcelona Brasileira (13)

Clique na imagem para voltar ao índiceEntre 1879 e 1927, Santos foi o centro de um dos três principais movimentos de reforma social no Brasil, tornando-se conhecida como a Barcelona Brasileira, em razão da chegada de grande contingente de imigrantes ibéricos, fortemente politizados, participantes ativos da corrente do anarco-sindicalismo. Santos tinha também uma imprensa engajada nas questões sindicais, com cerca de 120 jornais e revistas. Apesar disso, este período da história santista e brasileira foi muito pouco estudado.

Foi o que levou o jornalista e historiador Paulo Matos a produzir este material (que obteve o primeiro lugar do Concurso Estadual Faria Lima-Cepam/1986, da Secretaria de Estado do Interior de S. Paulo). Ampliado e revisado, para publicação em livro, tem agora sua edição pioneira em Novo Milênio:

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Santos Libertária!

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Imprensa e história da Barcelona Brasileira 1879-1927

PARTE II - A imprensa da Barcelona Brasileira

Capítulo IV - Ação operária

 

As greves do período

As greves do século XIX (1889, 1891 e 1897) tiveram uma organização "subterrânea", em que era difícil a negociação pela ausência de interlocutores. A batalha operária nasce antes dos sindicatos. Em 1891, um reformista vem do Rio e Janeiro para intermediar as negociações, em que atua também a mutualista Sociedade União Operária - suprindo a necessidade de canais: era o tenente Vinhaes.

Em 1897, a violência militar da República recém-instaurada por um golpe mostra sua força, de passagem. Em agosto, tropas chegam de trem e embarcam para esmagar Canudos, no sertão baiano, para um massacre sem precedentes na história brasileira. Sobre os operários ela se revelará cada vez mais forte e intensa, na perspectiva da consolidação do sistema.

Como fator das vitórias das greves do século XIX, está presente a carência de mão-de-obra. Ainda assim, na de 1891 dois mil trabalhadores do porto são demitidos e substituídos pelos krumiros (fura-greves) de Quintino de Lacerda, que ainda comanda os ex-escravos. Antes da primeira greve geral brasileira, ocorrida em Santos, a organização proletária já sae manifestava em ocorrências esparsas, como a greve de 1877. Esta é a primeira de que se tem registro, que aparece no filme Libertários, do diretor Lauro Escorel. Edgar Rodrigues também se refere a ela.

Em 1888, há registros de uma greve na construção civil, que Aziz Simão, em seu livro Sindicato e Estado, analisará como "violenta". Em 1889, há uma greve de carregadores e em dezembro ocorre um conflito violento no porto, em que são enviados 40 praças de São Paulo - na primeira intervenção do gênero, que irá se repetir amiúde.

Atuam nesta greve os cônsules de Portugal e Espanha, para "acalmar" seus patrícios. Os trabalhadores teriam atirado dois praças ao mar e ferido um terceiro, avariando diversas peças do navio Setêmbria. É o que publica o jornal A Província de São Paulo, de 13/12/1889, segundo escreveu Paula Beilgeman em seu livro Os companheiros de São Paulo. São movimentos que vão obter vitórias nas greves do século XIX, por força de contingências econômicas como a ausência de mão-de-obra - e enfrentar uma duríssima repressão nas seguintes.

A primeira greve geral do país, a que nos reportamos, vai mostrar pela primeira vez o exército de reserva dos ex-escravos, que desempenham o papel de krumiros (fura-greves), sob a direção do antigo comandante do quilombo do Jabaquara, Quintino de Lacerda. Trabalharam "à boca da mauser", segundo a imprensa da época, em citação de Lucia Gitahy, muitos até a exaustão e a morte - caindo dos pontões que ligavam a terra aos navios.

A greve de agosto de 1894 começa entre os telegrafistas e empregados da São Paulo Railway, a Inglesa, reivindicando 30% de aumento nos salários, reporta Paula Beilgemann. Recebem a solidariedade dos conferentes e operários e são reintegrados. De 13 a 28 de outubro de 1897, a greve de 400 estivadores paralisa o porto e chega a torpedeira Tymbirá, com 267 homens da Marinha e da Força Pública - segundo escreve o jornal Correio Paulistano, de 17/8/1894.

Em 1897, nova greve se inicia após um acidente no vapor Salinas, em 13 de outubro, citada por Edgar Rodrigues, com dois mil trabalhadores paralisados - que apedrejam a sede da Docas. Demissões, tropas federais e vasos de guerra estão presentes.

Em 1900, na greve dos carroceiros, anarquistas e socialistas atuam juntos, como lembra o jornal A Plebe, de 31/5/1919. Em 1903, agitações no porto contra o sorteio entre os marítimos matriculados para preencher os claros na armada, ameaçando-se uma greve.

Em 1905, a SIUO lidera a greve dos carroceiros contra uma lei municipal obrigando-os a serem fotografados para poderem exercer a profissão, ficando-os na polícia. Em 13 de junho, paralisação de estivadores contra a discriminação no pagamento a um grupo, procedida pelo mestre-estivador Porfírio Amazonas - que se amplia e paralisa toda a categoria. A Docas obriga seus trabalhadores a furar o movimento, obrigando-os a fazerem o serviço de estiva. Chega o couraçado Tamandaré, com 57 fuzileiros navais e 74 soldados da Força Pública, mais 20 praças do Rio de Janeiro.

A empresa do porto, em um procedimento que seria rotineiro, traz o pessoal que trabalha na sua fazenda Pilares e de Outeirinhos. Em 16/6, a greve se estende para carroceiros, carregadores da Docas, trabalhadores em armazéns, City, lixeiros, tecelões, Inglesa, matadouro, padeiros, construção civil e até barbeiros e engraxates. E exigiu a intervenção, além do delegado, do vice-cônsul italiano e da Associação Comercial. É o que conta o relatório da FOLS ao Congresso Operário de 1913. Foi a primeira greve a ultrapassar as fronteiras locais, tendo ocorrido paralisações também no Rio de Janeiro, em solidariedade.

Segundo o jornal Diário de Santos, que cobriu o movimento, foi a mais ampla das paralisações desde o século XIX e durou 8 dias, com centenas de prisões, fracassando ao final. Entre os presos estavam os líderes operários Primitivo Raimundo Soares (Florentino de Carvalho, como era chamado), Antonio Filgueiras Vyeites, Manoel Gonçalves e Albino Cayres.

Toda a diretoria da SIUO foi presa nessa greve, quando é recusada a união com a Primeiro de Maio, que passa por uma transformação, ressurgindo com o nome de Centro de União de Classes Primeiro de Maio. Reunindo foguistas, maquinistas e outras classes, Edgar Carone cita a greve dos carroceiros, em setembro, com apoio do jornal A Tribuna - que destaca o caráter "pacífico" do movimento. É o que escreve o Jornal Operário, de 17/9/1905, que transcreve uma reportagem do órgão local É fundada neste ano a Sociedade Progresso dos Trabalhadores Brasileiros, uma tentativa dos "amarelos" de penetrar no movimento operário.

Em 1906, ocorre a greve da Paulista, quando apenas boatos fizeram com que o presidente Rodrigues Alves mandasse para cá dois vasos de guerra, com tropas. Durante o transcurso da paralisação, a polícia invadiu e fechou sindicatos aqui e em São Paulo, furando o movimento com funcionários enviados para manter a estrada de ferro funcionando.

Nessa época, ocorrem divergências na SIUO, quando Severino Antunha aparteia o "fanatismo religioso e patriótico" de um orador. Funda-se a Liga dos Proprietários de Veículos, como registra o Jornal Operário, de 1/10/1905, para comprar "... polícia, metralhadoras, vasos de guerra, autoridades, tudo o que seja possível para extinguir o fogo das greves".

Em 1906, a SIUO se reorganiza no Centro Internacional União dos Sindicatos, já sob o influxo anarco-sindicalista. AO ano de 1907 é o da luta pelas 8 horas de trabalho, que se propunha a alcançar a reivindicação até o 1º de maio do ano seguinte. A comemoração do Dia do Trabalhador é feita com referências ao significado da data, em contraste com os festejos promovidos por outros, como registra o jornal Terra Livre, de 10/5/1907. Há um comício em solidariedade ao educador racionalista Francisco Ferrer, com mais de 300 pessoas presentes. Ferrer fora fuzilado na Espanha, registra a mesma publicação. É fundada a União dos Trabalhadores em Café.

Em 15 de junho de 1907, pedreiros, pintores e carpinteiros se unem para formar o seu sindicato de resistência. Seu programa é anarco-sindicalista e vai resultar na fundação da FOLS, em 19 de junho. Em 1908 haverá uma das maiores greves do período, a última pela batalha das 8 horas, em fevereiro. Em agosto desse ano, ocorrem 3 greves, no Moinho Santista, da Publise & Carbone, entre os carroceiros e pedreiros. Em 1909 é a vez dos trabalhadores do britador da Prefeitura, que quer rebaixar seus salários de 4$000 para 3$000, como registra o jornal A Tribuna de 28/3 desse ano. O órgão publica convocatórias para encontros de trabalhadores.

No dia 30 de abril de 1909, reúnem-se dois mil trabalhadores na porta da Internacional e da FOLS, de onde discursaram das janelas os  líderes operários Luiz La Scala, Gregório Martins, José Lousada, José Campos e o dr. Tito Brasil. A Câmara Municipal decreta feriado no 1º de Maio e a Docas é obrigada a fechar seus armazéns diante da ausência absoluta de trabalhadores, que decretaram unilateralmente o feriado, votado na manifestação. Em junho, vem a luta pelo reconhecimento do sindicato dos padeiros e os calceteiros da Prefeitura fazem greve pelas 8 horas de trabalho, sendo todos demitidos pelo prefeito.

Em junho de 1910, trabalhadores conclamam a sociedade civil a boicotar as obras da nova igreja matriz da cidade, com anti-clericalismo virulento na sua linguagem. Numa cidade em que faltam escolas e hospitais, dizem, pululam as igrejas. Este ano terá várias greves setorizadas na construção civil, que conseguiu manter as 8 horas e reabrir a FOLS na Rua General Câmara. Mesmo durante os anos difíceis de 1909/1911, a FOLS manteve suas reuniões semanais de discussão e educação política, com seus pequenos mas ativos sindicatos. Cumprindo o papel das federações operárias, que foi o de reunir esforços para a luta, fortalecendo as pequenas organizações.

O custo de vida é a causa das greves de 1912, com demonstrações massivas contra a inflação, que culminam com as greves de julho e agosto. Santos tem 4 vezes mais sócios dos sindicatos anarco-sindicalistas que o Rio de Janeiro, 22.500 contra 5.000. Possuindo 12.500 associados a mais do que São Paulo, publica o jornal A Noite, citado por Maran, em 19/11/1912. Greves no porto, em que atua Florentino de Carvalho, deportado um ano antes, sendo novamente expulso. Pararam 4 mil operários, na greve de 18 dias. Maciça repressão de navios e trens repletos de tropas.

O ano de 1913 mostra o renascimento do movimento operário, que refluíra. A economia brasileira declinava e entrava em depressão, com o advento da Primeira Guerra Mundial. A saca de café cai de preço e atinge a queda máxima em 1915, quando custa $ 9,18 contra $ 14,92 em 1913. A construção parou no Brasil, as fábricas reduziram a produção e a semana de trabalho, estancando o movimento operário, que já estava abalado no período de prosperidade. As raras greves de 1914, 1915 e 1916 foram mais reivindicativas do pagamento de salários atrasados do que por aumentos salariais.

Foram diversos os fatores que levam à eclosão das greves de 1917/1918, quando o número de empregos era menor que o de trabalhadores. Entretanto, foi a maior do período. E tomou conta do país, determinando a superação da prática repressiva como a única solução. O ministro da Agricultura, Pedro de Toledo, propôs nessa época a criação de feiras-livres, para venda de alimentos mais baratos, sem atravessadores. Este é denunciado como um plano "anarquista e socialista", pelos comerciantes.

Com a retomada do processo econômico em 1916, o mercado mundial se abria novamente para a indústria brasileira, resultando em um período de prosperidade sem precedentes - da qual o trabalhador ficou à margem. Apenas alguns sindicatos reviveram em 1916. O custo de vida salta dm 1917/18.

A 1º de maio, um comício no Largo Marquês de Monte Alegre, em frente à Inglesa SPR, tem a palavra de Eládio Antunha, Manuel Perdigão e Manoel Campos. Desfile pelas ruas ao som uníssono das canções proletárias, a Internacional - "avante, vítimas da fome..." -, Primeiro de Maio e Filhos do Povo. Eram tempos de combate.

No dia 13 de julho de 1917, a União Geral dos Trabalhadores de Santos (UGTS) promove em sua sede social, na Rua Braz Cubas, 375, um comício em solidariedade aos operários de São Paulo em greve, assim como uma reunião para debater as reivindicações que serão apresentadas pelos operários santistas.

Ocorre uma onda contínua de greves em todo o país, com ampla participação dos trabalhadores, o período mais ativo da história sindical brasileira - justificado parcialmente pelas condições econômicas da Época. Os operários haviam ficado 4 anos sem aumento de salários e tinham consciência da necessidade de reaver o prejuízo, tendo se reforçado seu papel no processo produtivo.

Expandidos, os operários imigrantes já eram "brasileiros", dispostos a se integrar ainda mais na luta social, a tornar o Brasil sua terra permanente. O envolvimento no sindicalismo era um meio necessário para sua sobrevivência, para os que haviam procurado evitá-lo antes. O resultado é o movimento mais massivo do período.

A epidemia de gripe de 1918 e a desproporcional repressão, além de alguns acordos, arrefecem a vitalidade do movimento grevista, que prosseguirá até 1921. Em 1918, ocorre a tentativa do putsch bolchevista no Rio de Janeiro, já sob as influências da Revolução Russa de 1917. Em Santos, a greve dos empregados da Docas em 1919 faz cair a repressão em 7 de maio, quando a cavalaria persegue os manifestantes no mercado municipal. Espancando quem encontrasse pelo caminho, fere várias pessoas. A imprensa local denuncia a ação da polícia e um vereador pediu a punição dos envolvidos no massacre, é o que registra o jornal A Tribuna, de 13/5/1919.

A ação da reação

Em 11 de maio, a estação de bondes da Vila Mathias, em Santos, é ocupada pelos operários em greve e o delegado Ibrahym Nobre toma um tiro no peito, que resvala no botão da gravata. Em 29 de julho, Ascelyno Dantas, um dos administradoras da Docas, é assassinado na rua. Uma multidão representando "as melhores camadas sociais da cidade", resolveu fazer justiça com as próprias mãos e pilhou a sede da União dos Estivadores.

Dias depois, o jornal A Tribuna noticiava com destaque a fundação do Batalhão Patriótico das Classes Conservadoras, para prestar seu "apoio incondicional" no combate à "ameaça radical" que se desenhava, após a Revolução Russa e a tentativa bolchevista no Rio de Janeiro. Em dezembro de 1920, três líderes operários eram condenados a 30 anos de prisão, escreve A Tribuna em 16/12. Em meio à maciça repressão, pilhagem de sindicatos, deportações em massa e prisões, a situação chega a estremecer as relações entre a Itália e o Brasil, ameaçando-se o rompimento de relações entre os países.

Manoel Campos é encarcerado, acusado de cumplicidade no assassínio de um feitor da Docas, noticia o jornal operário Spártacus, em 20/9. Campos dirigia o jornal operário Na Barricada, em São Paulo, entre 1915 e 1916. Espanhol, esteve em Santos na mobilização grevista entre 1912 e 1913. E com os estivadores da Docas do Rio de Janeiro, em 1918, tramando a revolução. O vereador Heitor de Moraes pede um habeas-corpus para 474 trabalhadores da City presos na greve.

O Brasil nunca havia presenciado uma onda de greves tão intensa, plantando o que parecia ser um poderoso movimento sindical. As elites já falavam em reformas sociais e eram poucos os que optavam pelo uso da repressão, considerando a questão social como "caso de polícia".

Em 1923, os trabalhadores gráficos desencadeariam outra greve em São Paulo, reunindo em um memorial as principais reivindicações da classe, ao lado da salarial - como a jornada de 8 horas. Que já havia sido conquistada na Rússia, nas batalhas de 1905. Os patrões não reconheceram a União dos Trabalhadores Gráficos, que assinava o documento. Após 42 dias de paralisação, alcançam a vitória. E é a partir daí que se inicia o reconhecimento das entidades operárias. Outras greves viriam até o final do nosso período, já sob a liderança do PCB e dos novos métodos políticos.

Novos conceitos

O presidente Rodrigues Alves, que anteriormente havia negado a existência de qualquer crise social no país, já reconhecia que os trabalhadores tinham problemas sérios, declarando que o Brasil precisava reformular sua legislação social, harmonizando os interesses do capital e do trabalho. Em 1917, o deputado socialista Maurício de Lacerda apresenta no Congresso uma síntese das reivindicações operárias. É preso e acusado de bolchevista.

O governador do RIo Grande do Sul, Borges de Medeiros, foi decisivo para que se recusasse a proposta da instituição desses direitos operários, que instituíam um Departamento Nacional do Trabalho no modelo já instituído em São Paulo. Enviou um telegrama considerando "limitadora da liberdade" (empresarial) a imposição de limitações ao trabalho de menores. E "inconstitucional" a fixação da jornada de 8 horas.

Borges de Medeiros foi a quem se opôs e depois aderiu o futuro ministro de Vargas, Lindolfo Collor, farmacêutico por vocação, jornalista e formulador legislativo. Quem dirigiria seu jornal A Federação e instituiria, a partir de 1931, a legislação trabalhista, observando-se a partir daí o caráter dessa legislação.

Em janeiro de 1919, havia chegado a primeira lei de compensação para a classe trabalhadora. Em 1920, a lei Arnolpho Azevedo, que regulava a expulsão de estrangeiros, foi utilizada pela primeira vez na greve da Docas de Santos.

Alguns empregadores anunciam a concessão espontânea da jornada de 8 horas. Em 1º de maio, algumas empresas, incluindo o reacionário Jornal do Comércio, da capital, dão folga aos seus empregados. Em dezembro de 1920, Manuel Campos é preso e torturado em Santos, para onde fora trazido pelo delegado Ibrahym Nobre. Todos os que o viram ficaram horrorizados com o seu estado após as torturas, noticia o jornal O Combate, de 18 e 19 de janeiro de 1921.

O delegado santista Ibrahym Nobre indiciaria 16 operários, cuja prisão considerava importante, entre os quais João Gutierrez, João Domingos Gonçalves e o diretor da Gazeta do Povo, que estavam implicados no atentado a três pessoas. O nome de Antonio Julião, português e professor de uma escola moderna, estava entre os indiciados. Acusado de ser mentor e principal responsável pelas greves - acusando-o de criar 5 comitês para "auxiliar no trabalho revolucionário, sem sair de casa", noticia O Combate de 23/12/1921.

O clima de guerra responderia ao ímpeto grevista, que a partir de 1921 se reduzirá, após a liquidação do movimento anarco-sindicalista por uma série de fatores. Para Maran, a intensidade das greves gerais minou as energias do movimento operário e ofereceu ao governo a chance de esmagar, com todo o vigor repressivo, a mais intensa mobilização operária de que se teve notícia no país

Trabalho livre e conquistas

Mal planejadas, deflagradas nos momentos de redução da produção, as greves davam oportunidade para o patronato efetuar as demissões sem maiores prejuízos. Mas todas estas ocorrências produziriam resultados, plantando a clareza da necessidade de reformas sociais - que se fizeram "por cima", evitando o colapso da organização econômica. Aqui, estava presente a tradição do trabalho livre dos portos, que a Docas quis sufocar, mas que garantiu conquistas nesse processo de luta operária.

Vitoriosas no século XIX, as greves enfrentaram a violência da repressão e em 1917/1921 atingiram o auge e foram esmagadas com suas entidades e militantes. A repressão, entretanto, não é o fator determinante nessa experiência do movimento operário, tomando-se por referência a Argentina. Cuja organização dos trabalhadores também foi intensamente reprimida e que sobreviveu, apesar. E era também composta majoritariamente por imigrantes, difíceis de serem incorporados na ação coletiva. O que se dará completamente apenas após muitos anos de Brasil - nas greves de 1917/1918 - no auge e no final do movimento operário mais intenso que o Brasil conheceu.

A destacar, o caráter diferenciado de Santos nesse processo, com apenas uma empresa empregadora de grande escala, concentrando trabalhadores em uma área estreita e próxima. Era a senha da mobilização, como fora a da violência repressiva. Após apaziguado o momento do auge grevista, os donos do país refletiram e concederam, na perspectiva do controle. Foi como se as elites dissessem "antes os anéis do que os dedos" , que colocariam no seguro.

Cobertura da imprensa

Os jornais operários são irregulares na cobertura das greves, coisa que o Avanti! - jornal socialista de São Paulo - é o primeiro a fazer, em 1908. Quando a Docas avança para assumir o controle da capatazia, desenhando novos conflitos. O jornal O Diário apóia os exportadores até 1891, quando é "adquirido" pela Docas. Que terá também o apoio dos jornais O Estado de São Paulo e Cidade de Santos. À imprensa operária restaram as "análises" e "avaliações", atuando no dia a dia com seus boletins inflamados, como durante a greve de 1908.

A imprensa e a luta operária da Santos Libertária, como de resto no Rio de Janeiro e em São Paulo, gravariam na lei as conquistas e reivindicações proletárias, a partir de 1930. Quando se concretizaram parcialmente - e sob controle - as raízes dessa luta de meio século. Santos nunca mais foi a mesma, como o Brasil, após este movimento operário. Oxigenada pelos ventos alísios, a cidade abraçou sempre as causas das maiorias oprimidas, deixando lições para a história humana.