HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS -
GREVE!
Greve em 1980 (4)
No dia 20 de março de 1980, quinta-feira, a
imprensa informava não ter havido acordo entre o governo e os grevistas, razão da continuidade da greve. Assim era registrado pelo jornal santista A
Tribuna:
Mobilização dos trabalhadores continua grande mas o
clima é de absoluta calma
Foto publicada no jornal santista A Tribuna em 20/3/1980
Não há acordo
Continua a greve no porto. Dissídio vai ser julgado ainda hoje pelo TRT
A assembléia dos portuários rejeitou, ontem à noite, a proposta firmada pela Cia. Docas de
Santos e já homologada pelos ministros do Trabalho, Planejamento e dos Transportes. Após essa decisão, o plenário votou pela continuação da greve
iniciada no dia 17. A resolução foi tomada pela unanimidade absoluta de quase oito mil trabalhadores concentrados no Ginásio Municipal Antônio
Guenaga, cujos representantes atribuíram a causa do movimento paredista à "intransigência do patrão e do Governo".
A disposição de manter o trabalho paralisado foi manifestada com a mesma intensidade, mesmo
depois que o responsável pelo Comando de Greve, Arlindo Borges Pereira, comunicou que o dissídio ajuizado em janeiro, pelos sindicatos portuários -
exceção dos operários -, entrou na pauta do Tribunal Regional do Trabalho para ser julgado ainda hoje, em audiência marcada para as 15 horas.
Arlindo esclareceu que, se o TRT decretar a ilegalidade da greve, os trabalhadores e seus
sindicatos poderão correr o risco de ser punidos. A advertência, contudo, apenas serviu para irritar os participantes da greve, um dos quais
protestou que "a Justiça do Trabalho só tem sua máquina emperrada para decidir sobre ações reclamatórias comuns, não ocorrendo o mesmo quando o
julgamento do processo visa à eliminação do direito de greve".
Antes do encerramento apoteótico em que os grevistas, inclusive mulheres, cantaram, todos de
mãos dadas, o Hino Nacional, os alto-falantes anunciaram a presença, ali, dos presidentes de 10 sindicatos da Baixada Santista que iniciaram
uma campanha de arrecadação de fundos para ajuda financeira ao movimento dos portuários.
Entre dezenas de cartazes e faixas exibidos no ginásio, os manifestantes mostravam uma
"resposta a um ilustre desconhecido: o Porto de Santos pode não ser nosso, mas este gigante está parado e parado ficará, porque esta é uma greve
total, feita sem piquetes, que revela a consciência e a maturidade do trabalhador portuário".
O Comando de Greve encerrou a assembléia recomendando que os trabalhadores voltassem aos
respectivos sindicatos e não aceitassem provocações, a fim de preservar a ordem e a tranqüilidade com que decorre o movimento.
Encerrada a assembléia, o Comando de Greve esteve na Capitania dos Portos, onde se reuniu
com o capitão-de-mar-e-guerra Antônio Eduardo Cezar de Andrade, também Delegado do Trabalho Marítimo. Da sede da Capitania foi feita uma ligação
telefônica ao ministro Murilo Macedo, o qual solicitou a presença, hoje, em Brasília, dos dirigentes Walter Menezes e Rômulo A. Pereira de Souza,
para novas negociações. Essa informação foi confirmada nesta madrugada pelo líder portuário Arlindo Borges Pereira.
Os fuzileiros limitaram-se a ocupar diversos pontos estratégicos,
unicamente como força de prevenção
Foto publicada no jornal santista A Tribuna em 20/3/1980
|
Títulos do noticiário de 20 de março de 1980, em A Tribuna:
"Só expectativa no
cais vazio" (armazéns fechados, guindastes parados, equipamentos encostados no canto do cais e nenhum trabalhador portuário ao longo de todo o terminal,
pelo terceiro dia de greve. Apenas os funcionários do Armazém Frigorífico tiveram autorização expressa para trabalhar, evitando a deterioração da carga
ali depositada).
"Tráfego de
caminhões prossegue normalmente" (não há congestionamento de caminhões na área do porto causado pela greve, nem impedimentos nas estradas à passagem de
caminhões com destino a Santos).
"Marina I,
protestos" (embarcação panamenha operou normalmente com carga ro-ro, sob críticas dos doqueiros. Também o Delta Mar operou transbordando
carga para barcaças, sob responsabilidade da estiva).
"A legitimidade"
(deputado Antônio Rubens Costa de Lara condenou a atitude do governo perante a greve, em violento discurso na Assembléia Legislativa de São Paulo).
"Armadores não
desviam navios" (ainda não se justificou tal medida, pois o tempo de paralisação do porto ainda é pequeno, comparando com a ocasionada por chuva).
"Para Gomes
Barbosa, sério dano econômico" (prefeito apontava os reflexos negativos da greve para a economia regional).
"Unidade Portuária
chega de jatinho e traz a proposta" (representantes da Unidade Portuária viajaram de Brasília para Santos no jatinho do ministro do Trabalho, junto com
autoridades federais, portando uma proposta que seria divulgada apenas à noite, na assembléia extraordinária da categoria).
"Como passar o
tempo" (a versão humorística da Descoberta do Brasil, contada por Chico Anísio, foi um dos temas transmitidos pelos alto-falantes do sindicato, junto
com músicas e paródias, para amenizar a espera dos trabalhadores).
"Faltou
comunicação?" (explicou o capitão dos portos que uma folha de papel poderia ter evitado a greve: a CDS disse não ter recebido a comunicação do prazo de
15 dias para uma decisão sobre o aumento, emitida pelos trabalhadores).
"Em busca de
soluções" (para auxiliar nas negociações entre trabalhadores e autoridades, chegou a Santos no dia 19/3 o secretário paulista das Relações do Trabalho,
Sebastião Paula Coelho).
"A proposta da
Companhia Docas" (em 13 itens, assinada pelo superintendente geral J.M. Berenguer, aplicando ao Ganho Individual de Produtividade - GIP - de janeiro, de
Cr$ 639,96, a correção salarial de 33,2%, adicionando-se a importância de Cr$ 1.147,57 a título de aumento de produtividade, para se obter o valor de
Cr$ 2.000,00 para essa gratificação, entre outras medidas. Foi rejeitada pela assembléia dos trabalhadores).
Charge do jornalista José Carlos Silvares
Publicada no jornal santista A Tribuna em 21/3/1980
Panfleto assinado por trabalhadores e políticos, sobre a greve:
Ao povo de São Paulo:
O regime militar fascista, através da figura de seu Ministro do Trabalho, num ato de flagrante arbitrariedade e hostilidade contra a classe
trabalhadora, decretou no dia 17 de março a ilegalidade da justa greve que os portuários de Santos vêm realizando em defesa de seus salários
aviltados pela inflação criminosa que assola o nosso país.
A greve dos portuários de Santos é inteiramente legítima. É legítima porque foi deflagrada
numa Assembléia monstro que contou com a participação ativa e consciente de mais de 70% dos trabalhadores que compõem esta combativa categoria. A
greve é legítima porque foi deflagrada como um recurso extremo, depois que o caminho do diálogo foi rompido pelas autoridades da Cia. Docas de
Santos, que há mais de 20 dias vinham "cozinhando os trabalhadores em banho-maria", negando-se a levar em conta as exigências salariais legalmente
apresentadas pelos sindicatos que representam os trabalhadores da área.
A atitude do governo, ao decretar de maneira arbitrária e brutal a ilegalidade da greve do
porto de Santos, enviando inclusive tropas para o local, viola não apenas os interesses e direitos dos portuários santistas, mas também os do
conjunto da classe operária e de todas as forças democráticas do país. Esta atitude arbitrária visa tão somente tumultuar um movimento que vem se
dando, até o momento, de forma ordeira e pacífica.
Estamos seguros que tal atitude autoritária e irresponsável não ficará sem resposta. Estamos
seguros que os portuários de Santos saberão enfrentar e vencer com tranqüilidade e altivez estas novas dificuldades através das quais a ditadura
procura manter a sua criminosa política de arrocho salarial. Estamos seguros que os portuários de Santos contarão nesta justa luta com a total e
irrestrita solidariedade do Partido da Oposição - o PMDB -, de todos os sindicatos e de todo o povo brasileiro.
A GREVE É UM DIREITO!
VIVA A LUTA DOS PORTUÁRIOS DE SANTOS!
Trecho final do panfleto com mensagem ao povo paulista, com as assinaturas dos manifestantes
|
|