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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - SEU BAIRRO/mapa
Caneleira, um bairro de quem aceitou o desafio (3)

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Publicado em 9/12/1982 no jornal A Tribuna de Santos

 Leda Mondin (texto) e equipe de A Tribuna (fotos)


O Jabaquara AC ajudou a valorizar a Caneleira
e pode se transformar no centro de lazer que a Zona Noroeste não tem

Velho Jabuca, herói de outros tempos...

Ano de 1914. Um grupo de jornalistas espanhóis do Bairro do Jabaquara corria listas para fundar uma agremiação que congregasse membros da colônia. Era uma forma de matar as saudades da pátria.

Na hora de escolher o nome, não houve muita discussão: Espanha Futebol Clube. E as cores da camisa não poderiam ser outras se não o vermelho e o amarelo, para relembrar a bandeira da Espanha. Faltava apenas fixar a data da fundação, de preferência num dia histórico, para que o ato jamais fosse esquecido pelos esportistas.

A 15 de novembro, o Espanha surgia oficialmente. Jogou sua primeira partida num campinho do Jabaquara, contra o Afonso XIII. O empate por um gol não diminuiu o brilho da festa, onde não faltaram doces, salgados, vinhos e licores.

Logo o Espanha atraiu a simpatia dos santistas. Em 1917, entrou no primeiro campeonato promovido pela Liga Santista de Jogos Atléticos. Foi campeão em 18, 19 e 20, ficando definitivamente com a Taça Grande Café D'Oeste.

Passava o tempo, crescia o número de simpatizantes e logo o campinho do bairro ficou pequeno para receber tanta gente. Com o apoio de colaboradores, a diretoria construiu, em 1924, o Estádio Antônio Alonso, na Rua 28 de Setembro.

A partir daquele ano, o clube começou a "mandar" nos jogos. Em tardes gloriosas, vencia as maiores equipes do futebol paulista. E, graças à bravura e à garra de Gomes, Apelian, Dito, Manolo, Marreiros, Vilas, Argentino, Izolino, Espoleta, Tito e Passos, o Espanha ganhou o carinhoso apelido de Leão do Macuco.

O primeiro jogo internacional do clube, em 30, não se apaga da memória de quem o assistiu. O Leão tinha como adversários os temíveis argentinos, mas a fama da seleção de Buenos Aires não o intimidou. Quanto Apolito marcou o primeiro gol, o Espanha se encheu de razão, lutou, e conseguiu o gol de empate por intermédio de Cassoli.

Esse resultado, porém, durou pouco: disposto a provar que a tarde era brasileira, o Espanha partiu decididamente para o ataque e conquistou a vitória com dois tentos assinalados por Bento.

Mais glórias, na década de 40 - No Estádio Antônio Alonso, o Espanha comemorou o 20º aniversário de fundação, empatando com três gols com o CA Juventus, e o 30º, vencendo o Canto do Rio FC, da Liga Principal do Futebol Carioca, por 3 a 2, com gols de Veiga e um de Baltazar, o Cabecinha de Ouro.

Em 1938, os primeiros dissabores. Havia muitas contas para pagar e os credores, mesmo adorando o clube, não estavam dispostos a esperar eternamente. O jeito era vender o patrimônio, pagar as contas e adquirir outro terreno com o que sobrasse.

No ano seguinte, o Espanha deixa definitivamente o Macuco e instala-se na Ponta da Praia, um dos piores bairros de Santos na época. O campo não atendia as exigências e servia apenas para treinamentos, mas, apesar disso, na década de 40 o clube viveu uma de suas melhores fases. Entrava em campo com uma das linhas de ataque mais respeitadas do futebol paulista - Doca, Baltazar, Bahia, Leonaldo e Tom Mix - e com tantos craques em campo os jogadores sabiam que em nenhuma hipótese o jogo terminaria em 0 x 0.

E a década de 40, de tantas boas atuações, reservava uma outra surpresa para o clube: durante a II Guerra Mundial, o governo brasileiro proibiu o nome de países em clubes esportivos. Então, os dirigentes resolveram chamá-lo Jabaquara AC, em homenagem ao bairro em que nasceu.

...e a luta ingrata para sobreviver

As coisas iam muito mal. Outubro de 1957. O Jabaquara estava para desaparecer. Os jornais publicavam em manchetes que o Leão do Macuco estava morrendo.

Na verdade, desde 1954 as coisas não andavam muito bem. Naquele ano, o Jabaquara quase foi rebaixado pela Federação Paulista de Futebol para a Divisão de Acesso. Valeu a perspicácia e a habilidade de seu advogado.

Em 1957, novamente o time deixava a desejar. Falava-se em contratar novo técnico: lembraram-se do famoso argentino Nélson Filpo Nunes. Graças a ele, o Jabaquara venceu todos os demais jogos que teve pela frente e inclusive venceu o Santos por 6 a 4, na casa do adversário.

Mas a Portuguesa acabou contratando Filpo. Enquanto ele livrava o time das últimas colocações, em 1959 o Jabaquara necessitava novamente dos seus trabalhos. Pela segunda vez, voltou a salvar o rubro-amarelo.

Porém, parecia que seu destino estava traçado. Em 1963, estava às vésperas de cair para a Divisão Inferior. Mais uma vez, os diretores saíram atrás de Filpo, que estava em Portugal, dirigindo o Évora.

Filpo reassumiu a 2 de novembro de 1963. Poucos acreditavam na reabilitação. O velho Jabuca estava na última colocação, com 33 pontos perdidos e, para piorar, perdeu os três jogos seguintes. Todos diziam que era o fim de tudo.

Em 63, rebaixado - Pouco depois, a torcida voltou a ter esperanças. O Jabaquara enfrentou o Juventus, na Vila, e mesmo com uma apresentação razoável conseguiu empatar por um gol. Uma vitória bonita contra o XV de Piracicaba, por 3x1, deixou os jabaquarenses em festa. E alegria ainda maior, venceu a Portuguesa de Desportos pelo mesmo resultado. Faltavam apenas dois jogos para encerrar o campeonato e, se o Leão vencesse as duas partidas, teria oportunidade de disputar com a  Prudentina, penúltima colocada, o chamado rebolo.

Um dos adversários seria o Santos. Exatamente a 11 de dezembro de 1963, estavam alinhados no gramado da Vila Belmiro, o Jabaquara e o Santos. O último, com uma posição privilegiada na tabela, podia perder. Mas isso não aconteceu: arrasou o Leão do Macuco numa goleada histórica de 5 a 3.

Olhos vermelhos, lenço na mão, os torcedores olhavam o placar. Ninguém comentava os lances, ninguém falava do primeiro gol do Coutinho. Alguns diziam que o Santos poderia ter entregue o jogo. Outros achavam que o Santos não ganhou, o Jabaquara perdeu.

Era o fim de um trabalho gigantesco: o Jabaquara caiu para a 2ª Divisão.

De 67 a 82 - Os torcedores sofreram um golpe ainda maior em 1967: o Jabaquara abandonou os campos de futebol. Retornou 10 anos depois, fez campanhas regulares.

Em 1980, a convite da Federação, participou da 2ª Divisão. Foi rebaixado. Técnicos pediram exoneração ou foram demitidos. Presidentes também. No ano passado, disputou o campeonato pela 3ª Divisão e não conseguiu se classificar. Este ano, para surpresa de muitos, participou de jogos pela 2ª Divisão. Numa jogada política, Nabi Abi Chedid aumentou o número de times da 2ª Divisão, e graças a isso o Jabaquara subiu.

Mas, pouco adiantou, porque caiu novamente para a 3ª. Ficou entre os piores times da temporada neste ano em que completou 68 anos de vida. Tem-se sobressaído no ciclismo, mas o pessoal tem saudades mesmo é daquele futebol bonito, dos lances que os espanhóis de "sangue caliente" gostam de recordar para seus filhos e netos. Lances que eles estão certos de ver repetidos nos campos deste Brasil.

Um leão como símbolo da esperança que não se acaba

Muitos torcedores do Santos e do Jabaquara não se sentem nem um pouco constrangidos em admitir a paixão que sentem pelo Jabaquara. Sabe-se lá o que esse clube tem de especial para conquistar tantos corações!

Mas como simpatia e carinho não enchem barriga, a falta de dinheiro persegue o clube feito galinha atrás do milho. Primeiro, teve que vender seu estádio na 28 de Setembro; depois, viu-se obrigado a se desfazer da propriedade da Ponta da Praia para saldar outras dívidas.

Em 1961, novamente um grupo de abnegados resolveu comprar uma casa para o clube. Procuraram de cá e de lá e acabaram escolhendo um canto escondido da Caneleira, um bairro sem qualquer expressão na época.

O proprietário pediu Cr$ 15 milhões (velhos), quantia bem respeitável na ocasião, sendo um milhão logo de cara e promissórias de Cr$ 500 mil mensais. O Jabaquara lutou muito, vendeu títulos patrimoniais e conseguiu pagar a dívida em dia. Em 1964, pagou a última prestação e recebeu a escritura definitiva da área de 67.380 metros quadrados, o bastante para a construção de um grande estádio.

Mas o estádio continuou sendo apenas um sonho. O projeto, simples e bonito, está afixado na parede para o pessoal ver como vai ser esse clube. Por enquanto, o máximo que o Jabaquara conseguiu foi ajeitar o campo e construir um bom ginásio de esportes.

Quem sabe, com a chegada de milhares de moradores no vizinho bairro Vila São Jorge, a partir da entrega dos apartamentos do Conjunto Parque dos Engenhos, o Jabaquara possa aumentar seu quadro associativo e montar algum esquema para realizar as obras restantes. Afinal, o clube é dono de uma imensa área e tem possibilidade de se constituir no centro de lazer que os moradores da Caneleira, e da Zona Noroeste como um todo, não têm.

O leão amarelo, exposto na entrada principal, permanece como um símbolo de esperança. E muita gente descrente há de ouvi-lo rugir bem alto lá do seu reduto na Caneleira.

Veja as partes [1], [2] e [4] desta matéria
Veja Bairros/Caneleira

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