O Jabaquara AC ajudou a valorizar a Caneleira
e pode se transformar no centro de lazer que a Zona Noroeste não tem
Velho Jabuca, herói de outros tempos...
Ano de 1914. Um grupo de jornalistas espanhóis do Bairro do
Jabaquara corria listas para fundar uma agremiação que congregasse membros da colônia. Era uma forma de matar as saudades da pátria.
Na hora de escolher o nome, não houve muita discussão: Espanha Futebol Clube. E as cores da camisa não poderiam
ser outras se não o vermelho e o amarelo, para relembrar a bandeira da Espanha. Faltava apenas fixar a data da fundação, de preferência num dia
histórico, para que o ato jamais fosse esquecido pelos esportistas.
A 15 de novembro, o Espanha surgia oficialmente. Jogou sua primeira partida num campinho do Jabaquara, contra o
Afonso XIII. O empate por um gol não diminuiu o brilho da festa, onde não faltaram doces, salgados, vinhos e licores.
Logo o Espanha atraiu a simpatia dos santistas. Em 1917, entrou no primeiro campeonato promovido pela Liga
Santista de Jogos Atléticos. Foi campeão em 18, 19 e 20, ficando definitivamente com a Taça Grande Café D'Oeste.
Passava o tempo, crescia o número de simpatizantes e logo o campinho do bairro ficou pequeno para receber tanta
gente. Com o apoio de colaboradores, a diretoria construiu, em 1924, o Estádio Antônio Alonso, na Rua 28 de Setembro.
A partir daquele ano, o clube começou a "mandar" nos jogos. Em tardes gloriosas, vencia as maiores equipes do
futebol paulista. E, graças à bravura e à garra de Gomes, Apelian, Dito, Manolo, Marreiros, Vilas, Argentino, Izolino, Espoleta, Tito e Passos, o
Espanha ganhou o carinhoso apelido de Leão do Macuco.
O primeiro jogo internacional do clube, em 30, não se apaga da memória de quem o assistiu. O Leão tinha como
adversários os temíveis argentinos, mas a fama da seleção de Buenos Aires não o intimidou. Quanto Apolito marcou o primeiro gol, o Espanha se
encheu de razão, lutou, e conseguiu o gol de empate por intermédio de Cassoli.
Esse resultado, porém, durou pouco: disposto a provar que a tarde era brasileira, o Espanha partiu decididamente
para o ataque e conquistou a vitória com dois tentos assinalados por Bento.
Mais glórias, na década de 40 - No Estádio Antônio Alonso, o Espanha comemorou o 20º aniversário de
fundação, empatando com três gols com o CA Juventus, e o 30º, vencendo o Canto do Rio FC, da Liga Principal do Futebol Carioca, por 3 a 2, com
gols de Veiga e um de Baltazar, o Cabecinha de Ouro.
Em 1938, os primeiros dissabores. Havia muitas contas para pagar e os credores, mesmo adorando o clube, não
estavam dispostos a esperar eternamente. O jeito era vender o patrimônio, pagar as contas e adquirir outro terreno com o que sobrasse.
No ano seguinte, o Espanha deixa definitivamente o Macuco e instala-se na Ponta da Praia, um dos piores bairros
de Santos na época. O campo não atendia as exigências e servia apenas para treinamentos, mas, apesar disso, na década de 40 o clube viveu uma de
suas melhores fases. Entrava em campo com uma das linhas de ataque mais respeitadas do futebol paulista - Doca, Baltazar, Bahia, Leonaldo e Tom
Mix - e com tantos craques em campo os jogadores sabiam que em nenhuma hipótese o jogo terminaria em 0 x 0.
E a década de 40, de tantas boas atuações, reservava uma outra surpresa para o clube: durante a II Guerra
Mundial, o governo brasileiro proibiu o nome de países em clubes esportivos. Então, os dirigentes resolveram chamá-lo Jabaquara AC, em homenagem
ao bairro em que nasceu.
...e a luta ingrata para sobreviver
As coisas iam muito mal. Outubro de 1957. O Jabaquara estava
para desaparecer. Os jornais publicavam em manchetes que o Leão do Macuco estava morrendo.
Na verdade, desde 1954 as coisas não andavam muito bem. Naquele ano, o Jabaquara quase foi rebaixado pela
Federação Paulista de Futebol para a Divisão de Acesso. Valeu a perspicácia e a habilidade de seu advogado.
Em 1957, novamente o time deixava a desejar. Falava-se em contratar novo técnico: lembraram-se do famoso
argentino Nélson Filpo Nunes. Graças a ele, o Jabaquara venceu todos os demais jogos que teve pela frente e inclusive venceu o Santos por 6 a 4,
na casa do adversário.
Mas a Portuguesa acabou contratando Filpo. Enquanto ele livrava o time das últimas colocações, em 1959 o
Jabaquara necessitava novamente dos seus trabalhos. Pela segunda vez, voltou a salvar o rubro-amarelo.
Porém, parecia que seu destino estava traçado. Em 1963, estava às vésperas de cair para a Divisão Inferior. Mais
uma vez, os diretores saíram atrás de Filpo, que estava em Portugal, dirigindo o Évora.
Filpo reassumiu a 2 de novembro de 1963. Poucos acreditavam na reabilitação. O velho Jabuca estava na última
colocação, com 33 pontos perdidos e, para piorar, perdeu os três jogos seguintes. Todos diziam que era o fim de tudo.
Em 63, rebaixado - Pouco depois, a torcida voltou a ter esperanças. O Jabaquara enfrentou o Juventus, na
Vila, e mesmo com uma apresentação razoável conseguiu empatar por um gol. Uma vitória bonita contra o XV de Piracicaba, por 3x1, deixou os
jabaquarenses em festa. E alegria ainda maior, venceu a Portuguesa de Desportos pelo mesmo resultado. Faltavam apenas dois jogos para encerrar o
campeonato e, se o Leão vencesse as duas partidas, teria oportunidade de disputar com a Prudentina, penúltima colocada, o chamado rebolo.
Um dos adversários seria o Santos. Exatamente a 11 de dezembro de 1963, estavam alinhados no gramado da Vila
Belmiro, o Jabaquara e o Santos. O último, com uma posição privilegiada na tabela, podia perder. Mas isso não aconteceu: arrasou o Leão do Macuco
numa goleada histórica de 5 a 3.
Olhos vermelhos, lenço na mão, os torcedores olhavam o placar. Ninguém comentava os lances, ninguém falava do
primeiro gol do Coutinho. Alguns diziam que o Santos poderia ter entregue o jogo. Outros achavam que o Santos não ganhou, o Jabaquara perdeu.
Era o fim de um trabalho gigantesco: o Jabaquara caiu para a 2ª Divisão.
De 67 a 82 - Os torcedores sofreram um golpe ainda maior em 1967: o Jabaquara abandonou os campos de
futebol. Retornou 10 anos depois, fez campanhas regulares.
Em 1980, a convite da Federação, participou da 2ª Divisão. Foi rebaixado. Técnicos pediram exoneração ou foram
demitidos. Presidentes também. No ano passado, disputou o campeonato pela 3ª Divisão e não conseguiu se classificar. Este ano, para surpresa de
muitos, participou de jogos pela 2ª Divisão. Numa jogada política, Nabi Abi Chedid aumentou o número de times da 2ª Divisão, e graças a isso o
Jabaquara subiu.
Mas, pouco adiantou, porque caiu novamente para a 3ª. Ficou entre os piores times da temporada neste ano em que
completou 68 anos de vida. Tem-se sobressaído no ciclismo, mas o pessoal tem saudades mesmo é daquele futebol bonito, dos lances que os espanhóis
de "sangue caliente" gostam de recordar para seus filhos e netos. Lances que eles estão certos de ver repetidos nos campos deste Brasil.
Um leão como símbolo da esperança que não se acaba
Muitos torcedores do Santos e do Jabaquara não se sentem nem
um pouco constrangidos em admitir a paixão que sentem pelo Jabaquara. Sabe-se lá o que esse clube tem de especial para conquistar tantos corações!
Mas como simpatia e carinho não enchem barriga, a falta de dinheiro persegue o clube feito galinha atrás do
milho. Primeiro, teve que vender seu estádio na 28 de Setembro; depois, viu-se obrigado a se desfazer da propriedade da Ponta da Praia para saldar
outras dívidas.
Em 1961, novamente um grupo de abnegados resolveu comprar uma casa para o clube. Procuraram de cá e de lá e
acabaram escolhendo um canto escondido da Caneleira, um bairro sem qualquer expressão na época.
O proprietário pediu Cr$ 15 milhões (velhos), quantia bem respeitável na ocasião, sendo um milhão logo de cara e
promissórias de Cr$ 500 mil mensais. O Jabaquara lutou muito, vendeu títulos patrimoniais e conseguiu pagar a dívida em dia. Em 1964, pagou a
última prestação e recebeu a escritura definitiva da área de 67.380 metros quadrados, o bastante para a construção de um grande estádio.
Mas o estádio continuou sendo apenas um sonho. O projeto, simples e bonito, está afixado na parede para o
pessoal ver como vai ser esse clube. Por enquanto, o máximo que o Jabaquara conseguiu foi ajeitar o campo e construir um bom ginásio de esportes.
Quem sabe, com a chegada de milhares de moradores no vizinho bairro Vila São Jorge, a partir da entrega dos
apartamentos do Conjunto Parque dos Engenhos, o Jabaquara possa aumentar seu quadro associativo e montar algum esquema para realizar as obras
restantes. Afinal, o clube é dono de uma imensa área e tem possibilidade de se constituir no centro de lazer que os moradores da Caneleira, e da
Zona Noroeste como um todo, não têm.
O leão amarelo, exposto na entrada principal, permanece como um símbolo de esperança. E muita gente descrente há
de ouvi-lo rugir bem alto lá do seu reduto na Caneleira. |