Na Ilha Diana, todos se conhecem e a comunidade é tão unida
a ponto de ninguém precisar fechar portas e janelas à noite
Ilha Diana
Um núcleo de pescadores artesanais, escondido atrás da curva de um rio, onde a maior parte das melhorias
reivindicadas pelas populações das grandes cidades não faz falta. Um lugar tranqüilo onde os moradores formam uma grande família, não sabem o que
é roubo ou violência
Imaginem um lugar de onde só se possa ver morros distantes,
ilhotas cobertas por vegetação baixa e um rio de águas tranqüilas. Imaginem que nesse lugar vive uma comunidade tão unida a ponto de ninguém
fechar portas ou janelas à noite. Um recanto onde homem e natureza convivem em total harmonia.
Melhor do que imaginar é saber que um local como esse existe, nada tem a ver com ficção científica e faz parte
de Santos.
Quem duvidar pode dar uma chegadinha na Ilha Diana, que está situada na margem direita do Rio Diana e fica a uns
15 minutos de Santos, utilizando-se um barco a motor. E não adianta tentar vê-la da margem do Estuário: o rio faz uma curva, deixando-a muito bem
escondida do mundo. Para sorte dos moradores, naturalmente.
São poucos os santistas que sabem da existência da ilha. Menos ainda os que já estiveram lá algum dia. Mas quem
vai não se arrepende, gosta do que vê e se admira da simplicidade e hospitalidade de sua gente.
O núcleo não poderia ser mais pitoresco: abriga 23 moradias, todas voltadas para o rio. Há uma única de
alvenaria, três de madeira e tijolo. As demais são de madeira, mas jeitosas e pintadinhas. Não faltam jardins e vasos ornamentando as fachadas. Em
uma das casas, até um velho vaso sanitário foi transformado em floreira.
O arruamento é inteiramente espontâneo e ninguém reclama da falta de asfalto: o pessoal gosta de sentir a terra
sob os pés e o cheiro bom que toma conta do ar quando a chuva cai, depois de um dia de muito sol.
Eles aprendem a gostar do mar e desde pequenos andam às voltas com a pescaria
Futebol é a maior atração, e o Diana o maior orgulho - Vendas, bazares, mercearias? Não há nada disso na
Ilha Diana. Os botecos da dona Dina, da Xirley e da Geny são os únicos estabelecimentos comerciais. Pequenos, estoques reduzidos, só
garantem a cachaça boa para espantar o frio. Para abastecer a casa de alimentos, produtos de limpeza e coisas do tipo, o jeito é seguir para
Santos ou Vicente de Carvalho.
Nesses barzinhos os homens se reúnem para trocar um dedo de prosa, tocar pandeiro, violão e ver se a voz agüenta
umas horas de cantoria. Melhor diversão que essa, só o futebol proporciona.
Quando o glorioso Esporte Clube Diana joga, não falta gente para torcer e vibrar com os lances decisivos
do Eugênio e do Eduardo Hipólito, dois dos melhores jogadores. O time é o grande orgulho da ilha e dificilmente decepciona. Dia desses, venceu o
visitante Rua Quarta por 1x0 e conquistou um troféu: até hoje os craques comemoram o feito.
Nem a televisão consegue entusiasmá-los tanto. Mesmo porque os aparelhos funcionam com baterias que duram no
máximo três dias. O recarregamento custa em média Cr$ 1 mil, a menos que os moradores recorram à Base Aérea, que o faz gratuitamente.
Aliás, apelar à Base Aérea virou rotina na vida daquela gente. Lá se busca os serviços de assistência médica e
dentária e mesmo condução, em casos de emergência. A unidade garante a assistência espiritual, por meio de seu capelão, e criou classes isoladas
de 1ª a 4ª séries, para evitar que as crianças deixem de estudar devido às dificuldades de locomoção.
Centro comunitário, a novidade depois que chegou a água - Entra e sai ano, mas a Ilha Diana continua com
a mesma feição. Na beira do rio, os trapiches são os mesmos de anos atrás. Só muda a cor dos barcos que ficam atracados sob a sombra das
árvores que crescem junto à margem. Mas o colorido mais bonito fica por conta das roupas e da pele bronzeada dos homens que pescam camarão,
ajeitam redes e outros instrumentos de trabalho.
Os meninos observam, aprendem. O destino de muitos deles é serem pescadores. Ainda mais que na ilha a prática da
agricultura fica difícil devido à terra lodosa, com características de manguezal. Poucas famílias conseguem cultivar algumas hortaliças no fundo
dos quintais.
A última grande mudança no aspecto geral da Diana foi a demolição do velho barracão de madeira, que servia de
igreja e escola. Em seu lugar, a Prefeitura está construindo um centro comunitário (alguém lá já tinha ouvido falar em centro comunitário?).
As paredes vão subindo aos poucos. Volta e meia falta material e as obras ficam paradas. As crianças se cutucam
e comentam que ali vai ser uma escola. Os adultos não vêem a hora de assistir a primeira missa.
Essa construção é a primeira grande novidade, desde que a ilha ganhou água encanada, a 7 de janeiro do ano
passado. Até aquela data, a comunidade tinha que ir buscar água na Base Aérea, porque só jorrava água salgada dos poços abertos.
A tarefa desgastante ficava por conta das mulheres, pois os homens permaneciam às voltas com a pesca, a
subsistência da família. Lá iam elas remando, estuário acima, com um tambor de 200 litros cheio. O caíque não afundava por milagre.
Não foi à toa que todos festejaram a chegada da água encanada. Agora, tudo o que pedem é luz elétrica, para
poderem comprar geladeira e conservar os alimentos. A época não permite desperdícios.
Nada mais pedem dos progressos da civilização.
As crianças são muitas: correspondem a 50% da população
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