Imagem: reprodução parcial do jornal Cidade de Santos de 28 de julho de 1900
Acervo: Hemeroteca Municipal de Santos
Respigando
Não sou daqueles que negam absolutamente certas
aparições e nem é possível negar, porque quem acredita na existência de outra vida, naturalmente, sanciona a possibilidade do aparecimento de
visões, ou melhor, de espíritos que vêm ao mundo, em suas formas mais puras.
Entretanto, não serei eu quem vá acreditar no aparecimento do fantasma do cemitério do
Paquetá e acho mesmo que é grave tolice afirmar a sua existência.
Os espíritos atrasados que se deixam emocionar por notícias adrede preparadas, são
sujeitos a desvarios, a falsas visões que, em dados momentos psicológicos, podem determinar desarranjos mentais de gravidade.
O fantasma do cemitério do Paquetá não passa de uma brincadeira de mau gosto que tem
determinado muita gente sair fora de horas dos seus lençóis para verificar a sua veracidade.
Ora, não é justo que a imprensa assim incomode a população e dê trabalho à polícia
para manter a ordem a horas mortas da noite.
A missão do jornal é, às vezes, bem diversa do que deveria ser e não se compreende
como em uma cidade civilizada se deixem embalar por fantasias dessa ordem.
O que se está dando durante as noites, nos arredores do cemitério, necessário se torna
coibir para evitar fatos de maior gravidade, porque licitamente a polícia não pode permitir a aglomeração de povo, fora de horas, quanto mais que os
imprudentes não faltam nessas ocasiões.
Acertada anda a polícia pondo cobro a semelhantes arruaças à meia noite e bem andará a
imprensa aconselhando ao povo que fique em casa, porque os fantasmas dificilmente podem aparecer às multidões.
Se realmente houvesse alguma coisa fora do natural, para quem conhece as condições
necessárias às revelações de além túmulo, facilmente verificaria que, se o fantasma aparecesse para uma ou duas pessoas, só excepcionalmente se
revelaria a um grande número de pessoas, com crenças indefinidas.
Os aparecimentos de qualquer visão às multidões são casos pouco conhecidos, o que não
dá com aparecimentos de entes queridos às pessoas queridas, mas, isoladamente, ou em reuniões revestidas de caráter íntimo, onde a concentração
determina o estabelecimento das correntes fluídicas que põem em contato as forças psicológicas, que mal começam a ser estudadas e conhecidas.
O simples caráter de curiosidade que predomina nas pessoas que concorrem a uma
reunião, como a que ontem vimos no cemitério do Paquetá, era uma força mais que necessária para repelir qualquer comunicação entre as forças astrais
que vagam nos espaço nas proximidades da terra. Explicados os fatos por esse prisma, que é hoje uma ciência experimental como o têm demonstrado os
sábios do mundo inteiro que se têm dedicado ao estudo das forças ocultas, fácil é verificar-se que no cemitério do Paquetá não tem aparecido
fantasma algum e a insistência em se propalar semelhante tolice só traz prejuízos à sociedade e deve ser coibida pela polícia.
Aqueles que, escudados nas opiniões de Allan Kardec, Crooks, Rochat, Assakoff e tantas
outras notabilidades científicas, acreditam em uma relação íntima, presidida por força incontestável, entre a humanidade terrestre e a espiritual,
não podem sancionar o sacrílego princípio que preside a divulgação dessa enorme mentira do fantasma do Paquetá.
As pessoas bem intencionadas que se não deixem embalar pela
fantasia dos noticiaristas e fiquem em suas casas, na cama que é lugar quente.
Imagem: reprodução parcial do jornal Cidade de Santos de 28 de julho de 1900
Acervo: Hemeroteca Municipal de Santos
O Fantasma
Natural curiosidade tem conduzido muitos habitantes desta cidade aos arredores do
cemitério do Paquetá, desejando ver o fantasma que dizem ali aparecer.
Da curiosidade, porém, passaram ao abuso e ontem algumas pessoas pretenderam escalar
os muros e penetrar no cemitério.
A força de cavalaria ali postada, para prevenir qualquer
acontecimento, conseguiu dispersá-las, tendo recebido instruções para não consentir agrupamento nas imediações.
Ilustração publicada com essa coluna, em 28/7/1900
Badaladas
[...]
***
- Vamos ver o fantasma?
- O quê? Já não bastam os que eu vejo de dia.
- Julgava-os somente noturnos.
- Não preciso ir ao Paquetá. Estão ali um, dois, três...
- Quem?
- Os meus cadáveres.
***
[...]
Padilha
Imagem: reprodução parcial do jornal Cidade de Santos
de 28 de julho de 1900
Acervo: Hemeroteca Municipal de Santos
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