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BENEDITO CALIXTO
Calixto e as Capitanias Paulistas - 07


Clique na imagem para ir ao índice da obraAlém de refinado pintor, responsável por importantes telas que compõem a memória iconográfica da Baixada Santista, Benedicto Calixto foi também historiador e produziu várias obras no gênero, como esta, Capitanias Paulistas, impressa em 1927 (segunda edição, revista e melhorada, pouco após o seu falecimento) na capital paulista por Casa Duprat e Casa Mayença (reunidas).

O exemplar, com 310 páginas, foi cedido a Novo Milênio para digitalização pela Biblioteca Pública Alberto Sousa, de Santos, através da bibliotecária Bettina Maura Nogueira de Sá, em maio de 2010. A ortografia foi atualizada, nesta transcrição (páginas 33 a 44):

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Capitanias Paulistas

Benedito Calixto

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Imagem: cabeçalho de página da obra (página 33)

CAPÍTULO III - SEGUNDA FASE DO LITÍGIO

Lopo de Souza como donatário das 180 léguas. - D. Alvaro Pires de Castro, conde de Monsanto, move-lhe demanda. - D. Marianna de Souza da Guerra, condessa de Vimieiro, como sucessora de seu irmão Lopo de Souza. - Sentença a favor do conde de Monsanto, dando-lhe direito sobre as capitanias de Itamaracá e Santo Amaro. - Carta régia de 10 de abril de 1617, confirmando essa sentença. - Subterfúgios do conde de Monsanto, para se apossar da Capitania de S. Vicente. - Martim Corrêa de Sá e Pedro Cubas como loco-tenentes da condessa. - Manoel Rodrigues de Moraes, procurador do conde de Monsanto. - O governador geral, d. Luiz de Souza, ordena aos camaristas de S. Vicente que dêem posse ao conde, de todas as vilas da capitania de São Vicente.

disposição testamentárias de d. Izabel de Lima de Souza e Miranda, diz fr. Gaspar, última donatária da linha de Pero Lopes de Souza, seu avô, deu novo motivo às confusões antigas; assim como foi causa de outras confusões modernas, o conde de Monsanto, d. Alvaro Pires de Castro, por se intitular donatário de São Vicente, sem o ser, e não se apelidar, como devia, donatário de Santo Amaro, pois era assim que até então tinham feito os descendentes de Pero Lopes.

Essa desordem produziu o engano em se reputarem da Capitania de São Vicente todas as terras que o conde possuía, sendo algumas de Santo Amaro.

Morrendo sem descendentes aquela fidalga e vendo extinta a geração do dito Pero Lopes, declarou, no seu testamento, que a Lopo de Souza, seu primo, donatário da Capitania de S. Vicente, competia a sucessão nas duas capitanias de Santo Amaro e Itamaracá. De ambas, pois, se apossou o dito Lopo de Souza; e, como deste modo ficou ele sendo donatário de Santo Amaro e S. Vicente, os "povos que ignoravam a causa disso, ficaram entendendo que Lopo de Souza era senhor de ambas, como herdeiro de Martim Afonso, seu avô.

"Não obstante, sempre falavam em Capitania de Santo Amaro, sem ninguém saber qual era, onde tinha sua verdadeira posição ou sede e de quantas léguas se compunha.

"O mencionado Lopo de Souza, sua irmã d. Marinna de Souza da Guerra, condessa de Vimieiro e d. Luiz de Castro, conde de Monsanto (continua fr. Gaspar), todos eram netos do dito Martim Afonso de Souza; isto, porém, não obstante, nunca o conde intentou herdar a Capitania de S. Vicente, porque conhecia a preferência incontestável de seus primos, os quais eram filhos de varão (Pero Lopes de Souza), e ele de fêmea (d. Ignez de Pimentel); mas, opôs-se à sucessão da outras capitanias de Santo Amaro e Itamaracá e, unicamente sobre estas, moveu demanda a Lopo de Souza, com o fundamento de se acharem os litigantes no mesmo grau de consangüinidade a respeito da última possuidora e nem um dos dois trazer a sua origem do instituidor Pero Lopes de Souza, e o conde ser mais velho do que Lopo de Souza.

"Este desfrutou, em sua vida, as capitanias litigiosas, porque ainda não estava decidido o pleito; morrendo, porém, sem descendentes, a 15 de outubro de 1610, instituiu sua herdeira e sucessora a condessa de Vimieiro, sua irmã".

Contra esta senhora prosseguiu a demanda movida pelo conde de Monsanto, d. Alvaro Pires de Castro, filho de d. Luiz de Castro, o primeiro autor que originou o pleito.

Alguns anos depois,um dos juízes nomeados por el-rei para resolver  questão, deu a sentença seguinte [21]:

"Vistos estes autos, libelos dos autores o conde e condes de Monsanto, artigos de habilitação nos quais por falecimento do conde d. Luiz de Castro se habilitou seu filho d. Alvaro Pires de Castro, que como mais velho sucedeu no condato e está pronunciado, que com ele e a condessa sua mãe, por ficar em posse e cabeça do casal, corresse esta causa; contrariedades dos réus habilitados, por falecer Lopo de Souza, irmão da condessa de Vimieiro; mais artigos recebidos - doações e papéis juntos; minha provisão porque mandei que os desembargadores do Paço determinassem a quem pertencia esta Capitania de Itamaracá, breve e sumariamente sem apelação nem agravo. Mostra-se fazer el-rei d. João III doação a Pero Lopes de Souza de juízo e herdade, para ele e seus descendentes, ascendentes e transversais, e bastardos, não sendo de danado coito - de 80 léguas de terras na costa do Brasil, em a Capitania de Itamaracá, repartidos pelo modo conteúdo da dita doação, e por morte de Pero Lopes de Souza vir a dita capitania a d. Jeronyma de Albuquerque sua filha, mulher de d. Antonio de Lima e por sua morte lhe suceder d. Izabel de Lima sua filha, que faleceu sem descendentes. Consta destes Autos que o conde d. Luiz de Castro e Lopo de Souza, falecidos, e a condessa de Vimieiro, ré, com a dita d. Izabel de Lima, serem todos primos segundos, por o dito Pero Lopes de Souza ser irmão de Martim Afonso de Souza, avô do autor, e réu, do qual ficarão dois filhos, convém a saber, Pero Lopes de Souza, que faleceu na jornada de África, com el-rei d. Sebastião, e d. Ignez de Pimentel, casada com d. Antonio de Castro, conde de Monsanto, pai do conde, autor, originário - d. Luiz de Castro, e Pero Lopes de Souza (falecido na guerra) e ficando Lopo de Souza, réu originário, falecido, e a condessa de Vimieiro sua irmã, à qual pretende, pertencer-lhe a dita capitania, por ser da linha masculina, e por seu pai viver por glória ao temo que d. Izabel de Lima, possuidora da dita capitania, e além disso haver a dita d. Izabel nomeado o dito Lopo de Souza seu primo na dita capitania. Prova o autor, que de Pero Lopes de Souza não ficou mais que uma filha, de que nasceu d. Izabel de Lima, última possuidora, e a linha de Martim Afonso de Souza não fazer ao caso, por ele não haver sido instituidor do dito Morgado conforme a Ordenação do Reino, nem ser possuidor senão Pero Lopes de Souza, seu irmão, nem morrer em batalha o pai da ré condessa, nem isto viver por glória; porque o Direito comum instituiu isso somente para escusar das tutorias e outros encargos públicos, e a Ordenação destes reinos, no Livro II, tít. 35, parágrafo 1º, não instituiu o viver por glória senão em casos entre tios, sobrinhos, cujo pai faleceu na guerra, e assim sucedem em todos os casos das Sentenças, que se alegam, nem o haver nomeado d. Izabel a seu primo Lopo de Souza, na dita capitania, lhe dá direito algum, por ela falecer sem filhos: o que tudo visto, e a forma de orientação e mais autos, e como nesta causa não podem haver lugar tais razões, em que se fundam os réus, e como se prova estarem os autores originários em igual grau, com a defunta d. Izabel, e bem assim ser o dito conde de Monsanto mais velho em idade do que o dito Lopo de Souza, julgo pertencer a dita Ilha do Itamaracá ao conde d. Alvaro Pires de Castro, habilitado com os rendimentos da morte de d. Izabel, em diante, dos quais haverá a parte que lhes cabe da condessa sua mãe e outrossim autora; e condeno aos réus nas custas dos autos. Lisboa, 20 de maio de 1615..."

De posse desta sentença, recorreu o dito conde de Monsanto a S. Majestade, pedindo carta de confirmação por sucessão das oitenta léguas concedidas a Pero Lopes de Souza. Esta Carta foi passada em Lisboa, a 10 de abril de 1617, e confirmada, segunda vez, aos 3 de julho de 1628.

A condessa de Vimieiro, enquanto durou este pleito, não requereu confirmação pela sucessão das duas capitanias litigiosas, Santo Amaro e Itamaracá, nem mesmo da de São Vicente, da qual ninguém lhe disputava e, sem controvérsia, lhe pertencia.

Dessa circunstância, ou dessa imprevidência, originou-se uma anormalidade que ainda mais prejudicou a causa da dita condessa donatária. "Como nem esta, nem o conde de Monsanto, tinham carta de confirmação das capitanias de S. Vicente e Santo Amaro - observa fr. Gaspar - nenhum deles as governou de fato e de direito até o ano, que depois direi, e todos os capitães, ouvidores e oficiais de Justiça eram nomeados por el-rei, ou pelo governo geral, na falta da provisão régia".

Esta anormalidade durou até 1624, que foi quando terminou esta 2ª fase do litígio.

Como se vê do texto desta Carta de Sentença, dando ganho de causa ao conde de Monsanto, a questão não ficava claramente resolvida, porque a referida sentença dia que "julga pertencer a dita ilha de Itamaracá ao conde d. Alvaro Pires de Castro", e nada diz, nada julga sobre a posse das duas seções, da Capitania de Santo Amaro, isto é, das quarenta léguas ao Sul da barra de Paranaguá e das dez léguas intercaladas neste litoral, da barra do Juqueriquerê à barra da Bertioga.

Vamos ver, entretanto, os recursos ou os subterfúgios de que se prevaleceu o conde de Monsanto para se apossar, não só das oitenta léguas da doação de Pero Lopes de Souza, como também da Capitania de São Vicente e das suas quatro vilas.

Quando essa sentença final chegou o Brasil, era capitão-mor de São Vicente, Martim Corrêa de Sá, sujeito de qualificada nobreza (fr. Gaspar - Memorias) e pai do general Salvador Corrêa de Sá e Benevides, a quem S. Majestade havia feito capitão-mor por três anos, se tanto durasse  demanda, segundo consta da sua Carta-patente, datada de 22 de fevereiro de 1618.

Sendo-lhe necessário ir à cidade do Rio de Janeiro, havia declinado do seu cargo na pessoa do alcaide-mor Pedro Cubas, para que governasse a Capitania de São Vicente durante a sua ausência.

A provisão deste substituto foi registrada na Câmara de S. Vicente, a 20 de dezembro de 1620.

O alcaide-mor Pedro Cubas não chegou, entretanto, a tomar pose do seu cargo na Câmara de São Vicente, por lha ter impedido o loco-tenente do conde de Monsanto, Manoel Rodrigues e Moraes, que no ato da posse exibiu, como embargo, uma procuração do donatário, d. Alvaro Pires de Castro e Souza.

Essa procuração "é digna de ler-se!", exclama o cronista vicentino, "pela incrível novidade de se constituir senhor, o dito conde, não só das oitenta léguas de Pro Lopes, que, diz, lhe haviam sido julgadas, mas também da Capitania de São Vicente, doada a Martim Afonso de Souza, mandando tomar posse, em seu próprio nome, das quatro vilas que então havia nestas partes, sem lhe servir de embaraços a evidência, de que todas elas desde o seu princípio haviam dado obediência a Martim Afonso e aos seus sucessores, sem contradição de pessoa alguma".

A procuração apresentada na Câmara pelo dito loco-tenente, é assim concebida:

"Saibam quantos este instrumento virem que, no ano do nascimento de Nosso Senhor Jesus cristo, de mil seiscentos e vinte, aos onze dias do mês de junho do dito ano, em esta vila de Cascais, nos Paços do Conde de Monsanto, senhor desta vila e donatário da Coroa da Capitania de Itamaracá do Estado do Brasil, e legítimo sucessor e possuidor dela, e bem assim da Capitania de São Vicente, e das 50 léguas de costa na dita Capitania, e de todas as povoações sitas nelas. Logo pelo dito senhor foi dito... e logo ordenado por seu procurador em todo abundoso e bastante... a Manoel Rodrigues de Moraes, morador em esta vila de Cascais, e ao qual disse que dava, e outorgava... poder... para que o dito seu procurador... assim dentro das cinqüenta léguas de costa, e em toda as povoações, que estão na Capitania de São Vicente, como em todo o estado do Brasil, em especial lhe dá poder para, em seu nome e do dito senhor conde de Monsanto, d. Álvaro Pires de Castro e Souza, tome posse da dita povoação de S. Vicente, e S. Paulo, e Cananéia, e Conceição,  todas as mais vilas que estiverem pelo sertão, e pela costa, dentro das cinqüenta léguas de que ele outorgante é senhor, capitão-mor e governador, conforme as suas doações e assim poderá ele dito seu procurador tomar posse com todas as pretensas de direito, da capitania, ou capitanias que lhe pertencerem e haver, conforme a sua dita doação e melhor ele dito seu procurador a puder tomar. E não havendo contradição de pessoa alguma, assim no tomar da posse como em todas as demais coisas pertencentes às ditas povoações, a ele conde de Monsanto, e aos direitos que nela tem, como donatário da Coroa, lhe dá poder a ele seu procurador e substabelecidos, para que em juízo e fora dele possa requerer etc... Testemunhas, que a todo foram presentes, o capitão Manoel Pestana Pereira, secretário do dito senhor, e Pedro da Motta Leite, criado do dito senhor... E eu Domingos Garbosa da Costa, tabelião que o escrevi etc. ..." (Arquivo da Câmara de São Vicente, Liv. de Registro que serviu pelos anos de 1616 - fls. 37 vrs.).

Além desta procuração, Manoel Rodrigues de Moraes apresentou ainda a cópia da petição, que na sua passagem pela cidade da Bahia, havia feito ao governador geral do Estado, d. Luiz de Souza:

"Diz o conde de Monsanto, d. Alvaro Pires de Castro e Souza, por seu procurador bastante, Manoel Rodrigues de Moraes, que falecendo da vida presente d. Izabel de Lima, sua tia, mulher, que foi de Francisco Barreto de Lima, houve dúvida entre o suplicante e o conde de Vimieiro, sobre a sucessão das oitenta léguas de terra, que a dita d. Izabel de Lima tinha neste estado, como herdeira de Pero Lopes de Souza, a quem foram dadas, nas quais se inclua a Capitania de Itamaracá, e a de São Vicente, e procedendo-se na causa, foi dada sentença em favor dele suplicante, que apresenta; por meio da qual tomou posse, por seu procurador, outrossim, da Ilha de Itamaracá; e porque ora quer tomar posse também da Capitania de S. Vicente, por lhe pertencer juntamente pela dita sentença que Sua Majestade tem confirmada, das ditas doações como delas consta: Pede a v.s. que porquanto a dita Capitania de S. Vicente é muito distante, e as Justiças, que hora são dela, por seu particular respeito, e assim outras pessoas interessadas lhe poderão pôr algum embargo ou dúvida a dita posse, e havendo de recorrer a esta Relação lhe fica mui grande trabalho, e se manterá muito tempo por causa das monções; e assim lhe mande passar Provisão, para o capitão e mais Justiças, e os oficiais da dita Capitania de S. Vicente, o meterem de posse, vista a dita sentença e confirmação. E Receberá Mercê".

Qualquer pessoa, que tivesse assistido na Capitania de S. Vicente, ou lido a sentença mencionada (pondera ainda fr. Gaspar), desprezaria a súplica de Manoel Rodrigues e reportaria insensata toda a pessoa que pretendesse empossar esta capitania ao conde de Monsanto, em virtude de uma tal sentença na qual só lhe fora julgada uma parte das oitenta léguas de Pero Lopes.

Não se conduziu, porém, desta sorte o governador geral, sendo que na sua pessoa concorriam circunstâncias especiais, para melhor, do que ninguém, conhecer a injustiça de tal petição; pois tinha governado as capitanias do Sul por morte de seu pai d. Francisco de Souza; havia morado nas vilas de Santos e S. Paulo, bem como em S. Vicente e reconhecido, portanto, que a todas estas vilas governava Lopo de Souza, neto de Martim Afonso de Souza, quando ele aqui assistiu.

Se teve notícia das contendas passadas, nesse conflito de jurisdição entre os herdeiros de Martim Afonso e os de Pero Lopes, também havia de saber que o único objeto das dúvidas, havia sido a Ilha de Santo Amaro; porque, até o dia em que o conde assinou a procuração referida, ninguém havia pensado que nas oitenta léguas de Pero Lopes estivesse compreendida a Ilha de S. Vicente, com suas duas vilas, e muito menos se podia imaginar ainda que as vilas de Itanhaém e Cananéia estivessem fazendo parte da Donataria de Santo Amaro!

Não obstante, deferiu d. Luiz de Souza a petição do procurador do conde de Monsanto, mandando por uma provisão de 5 de novembro de 1620, que os camaristas de S. Vicente e de todas as vilas da dita capitania, o reconhecessem como procurador do conde e lhe dessem posse, nos termos seguintes: "Hei por bem e mando, que apresentando o dito Manoel Rodrigues de Moraes, a procuração do dito conde de Monsanto e assim o traslado da sentença de que se trata, o metam logo de posse desta Capitania de São Vicente, e de tudo o que nela pertencer ao dito conde d. Alvaro Pires de Castro e Souza, sem dúvida nem embargo algum, fazendo-se Autos da dita posse e registrando-se como a dita sentença nos livros da Câmara da Capitania; o que assim cumprirão e farão cumprir e guardar inteiramente como nesta minha provisão se contém, sob pena de mandar proceder contra os que do contrário fizerem, como me parecer etc. ...".

Esta provisão era, como se está vendo, um verdadeiro atentado que cometia o governador geral do Brasil, contra o direito do donatário de S. Vicente.

D. Luiz de Souza, de resto, sempre se manifestou adverso à causa dos donatários de S. Vicente, "cujos poderes e direitos foram sempre derrogados e usurpados por este, governador geral", segundo afirmam os cronistas desta capitania.

Para dar, entretanto, um "ar de benignidade e tolerância" ao seu ato despótico, o governador, em carta particular, aos camaristas de S. Vicente, dizia que "dessem posse a Manoel Rodrigues de Moraes, na forma de sua provisão, mas sem inovarem coisa alguma a respeito do governo da terra".

Ao chegar, porém, ao Rio de Janeiro, na sua viagem da Bahia para S. Vicente, Manoel Rodrigues de Moraes intimou logo a Martim Corrêa de Sá que fizesse desistência, na sua pessoa, do cargo que ocupava, de capitão-mor de São Vicente. Este fidalgo respondeu-lhe altivamente, que nada havia que desistir, visto como ele, Martim de Sá, era representante de Lopo de Souza e não do conde de Monsanto; que manteria o seu prestígio nas terras doadas a Martim Afonso, das quais o dito conde, sem título algum, pretendia se fazer senhor.

Ao chegar a São Vicente, Manoel Rodrigues de Moraes disto se queixou amargamente, em um requerimento que dirigiu aos camaristas, aos quais apresentou a dita provisão do governador geral, pedindo que, sem demora o apossassem da Capitania de S. Vicente e da de Santo Amaro, com todas as jurisdições delas, e com todas as coisas a elas pertencentes, assim e da maneira que Lopo de Souza as passaria etc.

O fato de não se achar em S. Vicente o capitão-mor governador Martim Corrêa de Sá, e a tibieza dos camaristas, em não darem pose imediatamente ao substituto deste, que era, como já dissemos, o alcaide-mor Pedro Cubas, fez com que não só os oficiais do conselho, como as demais autoridades se submetessem às imposições de Manoel Rodrigues de Moraes.

"Admirou aos oficiais da Câmara a injustiça do despacho do governador geral; porém, temerosos de que d. Luiz executasse a sua comunicação, mandando-os conduzir para a cidade da Bahia, carregados a ferros, onde os oprimisse em masmorras por todo o tempo do seu governo, como muitas vezes faziam os governadores gerais aos que deixavam de cumprir as violências de seus despotismos, executaram a ordem, e deram a posse ordenada" (fr. Gaspar - Memorias).

O único vereador que de alguma forma protestou, declarando abaixo de sua assinatura, que respeitava o direito de S. Majestade "ou de quem o tiver", foi Jorge Corrêa; os demais, submeteram-se a tudo.

O auto de posse foi lavrado na Câmara de S. Vicente, a 11 de janeiro de 1621. A 13 do mesmo mês, pôs-se o cumpra-se na Vila da Conceição de Itanhaém; no dia 16, na Vila de Santos; e no dia 25 do mesmo mês de janeiro, na Vila de São Paulo.

E assim, com o beneplácito de todas as Câmaras, se consumou este atentado contra os direitos dos herdeiros de Martim Afonso de Souza, na pessoa de sua legítima descendente, pela linha masculina, d. Marianna de Souza da Guerra, condessa de Vimieiro.

BRAZÃO D'ARMAS DOS CONDES DE VIMIEIRO: As armas desta casa são as mesmas de Bragança: duas aspas de vermelho e santor, sobre campos de prata. Nas aspas cinco escudos das quinas de Portugal (uma orladura dos castelos), entremeadas de quatro cruzes (de calatrava) vazias do campo. Timbre: um cavalo branco com três laçdas no pescoço em sangue, bridado de ouro com cabeçada e rédeas de vermelho. (Memorias Historicas Gent. dos Grandes de Portugal, por d. Antonio Caetano de Souza).

Imagem inserida entre as páginas 36 e 37 da obra


[21] Arquivo da Câmara da Vila de Guaiana, Liv. VIII de Registro a fls. 81.

Imagem: adorno da página 44 da obra