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HISTÓRIAS E LENDAS DE S. VICENTE - BIBLIOTECA - Na Capitania de S.V.
Washington Luís e a capitania vicentina (17)

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Além de governador paulista e presidente do Brasil, Washington Luiz Pereira de Souza foi escritor e historiador, sendo responsável pela construção dos monumentos históricos do Caminho do Mar, na subida da serra entre Santos e São Paulo, em 1922, para comemorar o centenário da Independência do Brasil.

Uma das suas mais importantes obras foi esta, Na Capitania de São Vicente, publicada em 1956 (um ano antes da morte do autor) pela Livraria Martins Editora, da capital paulista. Com 341 páginas mais 7 introdutórias, a obra foi impressa pela Empresa Gráfica Revista dos Tribunais, também de São Paulo.

O exemplar de número 956 foi cedido a Novo Milênio para digitalização, pela Biblioteca Pública Alberto Souza, de Santos, através da bibliotecária Bettina Maura Nogueira de Sá, em maio de 2010. Páginas 211 a 214, com ortografia atualizada:

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Na Capitania de São Vicente

Washington Luís

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Capítulo XVI - Domingos Rodrigues

Domingos Rodrigues capitaneou uma entrada que, em 1600, estava no sertão. Tinha ele, nessa época 44 anos, conforme declarou em uma justificação em S. Paulo, que se acha junto ao inventário de Francisco da Gama (Inv. e Test., vol. 1º, pág. 365). Essa entrada foi feita no sertão da Parnaíba, como se vê de outro processo judicial de cobrança, intentado por Ascenço Ribeiro, e também junto ao mesmo inventário (Inv. e Test., vol. 1º, pág. 361 e seguintes).

Francisco da Gama fez parte da bandeira de João Pereira de Souza, que se dispersou, ao que parece, no sertão da Parnaíba. Ele se reuniu à bandeira de Domingos Rodrigues e no arraial deste cabo, no mesmo sertão da Parnaíba, morreu, tendo sido feito o inventário de seus poucos, pouquíssimos bens, a 11 de fevereiro de 1600, inventário que depois foi anexado ao judicial promovido em S. Paulo (Loc. cit., pág. 339).

Conhecem-se alguns membros dessa bandeira, pela arrematação que lá fizeram da mesquinha bagagem do sertanista e das fianças prestadas para pagamento em povoado, na volta.

Assim se vê: Domingos Rodrigues, cabo da entrada, Matias Gomes, escrivão do arraial, Antônio de Zouro, Braz Gonçalves, o velho, Pero Velho, Antônio de Andrade, arrematantes e fiadores, e Tristão de Oliveira, declarante dos bens.

Fez parte dessa bandeira Ascenço Ribeiro, como se depreende do processo de cobrança por este intentado.

Nenhum desses nomes se encontra entre os que compuseram a bandeira de João Pereira de Souza. Nas Atas da Câmara de S. Paulo, nem no seu Registro Geral, nenhuma referência há a esta entrada. É possível que ela tivesse sido feita em socorro da gente de João Pereira de Souza que no sertão da Parnaíba ficara, conforme requerimento da Câmara de S. Paulo (Atas, vol. 2º, pág. 40). É possível também que Domingos Rodrigues a tivesse realizado por sua própria iniciativa e lá recolhesse Francisco da Gama, extraviado havia três ou quatro anos, e que assim veio a morrer no seu arraial.

A única certeza, que se tem, é que, em 1600, estava a bandeira no sertão e chegou até o Rio Paraupava, pois que se encontra no Inventário de Martim Rodrigues (Inv. e Test., vol. 2º, pág. 6) avaliação de uma índia da nação Guoayá, que diz ser escrava, da entrada de Domingos Rodrigues, de Paraupava. Dela se tem notícia em época em que d. Francisco de Souza já se achava na vila de S. Paulo.

Dos inventários recolhidos ao Arquivo Público do Estado de S. Paulo, o de Francisco da Gama é um dos mais estragados pelas traças, que o roeram e rendilharam, e pela umidade que, em muitas páginas, apagou frases e linhas inteiras, tornando difícil a sua leitura.

Além disso, estão a ele acostados, como então se dizia, ou a ele se fizeram juntada, como hoje se exprime a linguagem forense, sem ordem cronológica, o inventário feito no sertão, o testamento, e os traslados de diversas justificações, processos de cobrança de dívidas, nos quais faltam as primeiras e últimas páginas, que os distinguiam uns dos outros não só pela diferença do papel como da letra dos escrivães que os lavraram. Isso se pode verificar nos autos originais. Mas, hoje, publicados em letras de forma e em páginas seguidas, e não poderia ser de outra forma, pelo Arquivo do Estado, não se distinguem mais uns dos outros, se confundem, tornando difícil a sua compreensão. Pude eu distinguir, porque tomei notas em 1902 dos autos originais.

Naturalmente pesquisadores pertinazes, que pacientemente se dedicam a essa ordem de estudos, podem tudo deslindar e esclarecer.

O inventário de Francisco da Gama foi iniciado em S. Paulo a 23 de dezembro de 1600; montaram os seus bens a 56$500 dos quais deduzidas as custas judiciais e o pagamento das dívidas sobraram 11$773 para a viúva, Jerônima Fernandes, e 11$715 para a filha única, Maria, que, nessa época, tinha cinco anos, e da qual foi feito tutor João de Santana, seu avô torto, pois que era padrasto da viúva.

Francisco da Gama era alfaiate, e, por diversas vezes, nesses papéis de inventário, foi designado como Francisco da Gama, o moço, o que faz supor que seu pai, com o mesmo nome, ainda vivia nesse tempo. Possivelmente o pai foi nomeado procurador dos índios forros de S. Paulo por provisão de d. Francisco de Souza em fevereiro de 1601 (Registro Geral, vol. 1º, pág. 103).

Domingos Rodrigues é nome que se encontra freqüentemente nos papéis da época, sem designação que o distinga. É nome comum entre portugueses, e que, com os documentos estudados, não permite fazer identificação segura. Há um Domingos Rodrigues que foi juiz ordinário em 1606. Um Domingos Rodrigues foi casado com Ana de Alvarenga, filha de Antônio Rodrigues de Alvarenga. Há diversos Domingos Rodrigues.

A 21 de março de 1598, em vereança, a Câmara da Vila de S. Paulo se inquietava pela sorte da bandeira de João Pereira de Souza e requereu ao capitão-mor "que se mandasse socorro à nossa gente que ficara no sertão, porque não vinha, nem se sabia se eram mortos ou vivos" (Atas, vol. 2º, págs. 39 e 40).

É de notar que este requerimento foi dirigido ao capitão-mor Jorge Correia, que já reassumira o seu cargo, e nesse cargo estava desde 19 de Julho de 1597, porque nesta data é a esse capitão, Jorge Correia, que a Câmara de S. Paulo se dirige pedindo carcereiros, ferro, prisões, para os delinqüentes da vila (Atas, vol. 2º, pág. 26). Ainda a 22 de novembro de 1597, a Câmara de S. Paulo leu cartas suas, cujo assunto não foi registrado, e, portanto, não se conhece, mas que foi considerado, sendo resolvido "que viesse ele em pessoa à vila de S. Paulo porque é de seu cargo especular o que deve e dar remédio no feito e no que se faz e pode suceder" (Atas, vol. 2º, pág. 29).

Ainda inquieta pela sorte da bandeira, a Câmara requereu de novo a 14 de novembro de 1598, mas já a Roque Barreto, então capitão-mor, "porquanto a nossa gente que ficou no sertão da companhia de João Pereira de Souza não vinha e podia estar necessitada de socorro e que era bem que se lhe desse socorro e se soubesse de (que) modo estava, pois é bem de todos (Atas, vol. 2º, pág. 47).

A devassa instaurada contra Jorge Correia não dera resultado criminal (e nem esse intuito teve d. Francisco de Souza), pois que Jorge Correia exerceu seu cargo após a prisão de João Pereira de Souza.

O que importava para D. Francisco de Souza era que o capitão, por ele mandado, fora preso e não poderia levar a cabo a entrada ao sertão, e que a opinião dos jesuítas e de seus partidários prevaleceria, não se fazendo por conseqüência as explorações, que deveriam encontrar as minas desejadas, com o desânimo de alguns e com a dispersão dos bandeirantes.

Na Bahia, o governador geral do Brasil sentiu que as atividades dos sertanistas vicentinos se perderiam e, que os seus esforços para descobrir as fabulosas minas de Robério Dias, procuradas antes por João de Souza e por Gabriel Soares de Souza, nenhum resultado teriam.

Resolveu, pois, passar-se para a Capitania de S. Vicente para coordenar o trabalho dos bandeirantes, acalmar os jesuítas e assim descobrir o ouro cobiçado e obter o marquesado das Minas.