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HISTÓRIAS E LENDAS DE S. VICENTE
Um feitiço vicentino...

Esta matéria do jornalista e escritor Hamleto Rosato foi publicada na edição de 7 de setembro de 1993 do jornal santista A Tribuna:

Mansueto Pierotti assina a escritura de compra do terreno do clube, em 20/6/1949

Feitiço virou S. Vicente A. Clube

Hamleto Rosato

O Feitiço que iremos abordar não é o que se virou contra o feiticeiro, segundo o brocardo popular. O feitiço de que vamos tratar relembra um grande jogador de futebol, que pertenceu ao Santos Futebol Clube, e cujo nome - Luiz Matoso - foi menos conhecido que o apelido.

Feitiço, ao que sabemos, nasceu no Cambuci, na Capital do Estado. Veio para o Santos. Goleador, chutava inclusive de bico. E, quando o fazia, era uma bala disparada.

Jovens esportistas de São Vicente, mas torcedores roxos do Santos F. Clube, de glórias mil segundo Plínio Marcos, resolveram fundar o Feitiço Atlético Clube. Uniram-se e passaram a trabalhar pelo clube, que teve grandes dificuldades para se firmar. Além de pagarem mensalidade, os jovens cuidavam da lavagem de uniformes. Faziam vaquinhas para cobrirem despesas. Tudo para justificar o nome do craque, do ídolo da torcida alvinegra, paulista e mesmo brasileira.

Mudança - Durante vinte e dois anos o Feitiço A. Clube marcou sua presença no esporte da Baixada Santista. Um dos jovens, porém, de muita visão, conversou com seus colegas. E ele, pelo esforço, pela dedicação ao clube, pela sua contribuição sempre presente, de todas as formas, sugeriu a mudança do nome para São Vicente Atlético Clube. O abnegado jovem Mansueto Pierotti, humilde, que cativara a amizade de todos os seus companheiros de ideal, viu sua proposta aceita. Não apenas seus companheiros de ideal comungaram da idéia, mas todos os vicentinos. Afinal, o nome era da própria e querida cidade, Celula Mater da Nacionalidade.

Aquele grupo de jovens que, esquecendo-se de que sábados e domingos podiam ser dias de lazer, iam para o amplo terreno onde ficaria o campo de futebol e, quem sabe, o estádio, pensavam todos. Tiraram o mato, nivelaram o terreno, retiraram as pedras, removeram a terra para que se pudesse plantar grama. Tudo com muita abnegação. Com esforço, com determinação. Eles estavam construindo um clube e formando uma história, baseada no amor, na vontade de vencer. E isso não faltou a nenhum deles. Aquele grupo de jovens era como uma só família.

Mansueto incitava seus colegas. Ele que foi goleiro, defendendo as cores de seu clube, que fez de tudo no seu grêmio, não se omitia em nada. Seu espírito de sacrifício estava sempre presente. Cobrava mensalidades, carregava saco de roupa, conduzia os jogadores para o campo e então, como torcedor, gritava, incitava, chorava, ria, enfim punha sua alma à mostra. O que é mais admirável nesse grupo que se formou é que todos, desde Orlando Intrieri, também um dos baluartes, até o mais simples funcionário do clube, apoiavam Mansueto, que realmente encarnava o espírito de luta e dedicação.

Terreno - Foi ainda Mansueto Pierotti que, como presidente do clube, lutou para a compra do terreno. Era a consolidação do sonho daqueles jovens que, amando São Vicente, desejavam dar a ela um campo de futebol à altura. E fizeram mais, deram um estádio e, em homenagem ao presidente-símbolo do clube, deram o  nome de Mansueto Pierotti.

O dia da assinatura da compra do terreno, no cartório do 6º Tabelião em Santos, foi de glória, de grande emoção, de uma luta vitoriosa, da satisfação de terem concretizado um grande sonho.

A foto, tirada no cartório, mostra Mansueto Pierotti assinando a escritura, vendo-se o jovem advogado Derosse José de Oliveira, que tratou dos papéis, e, junto à mesa, de terno cinza, à esquerda, Orlando Intrieri, e mais os srs. Álvaro Pinto da Silva Novaes e seu filho; dr. Álvaro Macedo Guimarães, proprietário do terreno; Eugênio Maurício da Silva (Buru), Manoel Luiz Barreiros, Juvenal Moreira da Silva, Joaquim S. Fernandes, Roberto Rodrigues (Bibi), que foi co-proprietário da Casa Rosário; Overlack Feitosa Franco e Laurinno Mirabelli. A foto recorda um grande companheirisimo, uma grande vitória, e, ainda, uma lição de vida que Mansueto Pierotti representa. Hoje, o clube é dirigido pelo veterano Pedrinho.

O clube também foi destacado na Poliantéia Vicentina, editada em 1982 para comemorar os 450 anos desse município (pelo pesquisador Fernando Martins Lichti, em publicação da Editora Caudex Ltda., São Vicente/SP), que citou:

Primeiro jogo do Feitiço, no campo situado no Parque Bitaru
Foto: Poliantéia Vicentina, 1982, Ed. Caudex Ltda., S. Vicente/SP

Embora o São Vicente Atlético Clube tenha deixado de chamar-se Feitiço desde 1950, foi com este nome que o fundaram, em 28/4/1928, os pioneiros Eugênio Pilar, José Bastos, Vicente Trindade, Antônio Gardon, Odair de Castro Lima, Eliezer Lopes Fernandes, Onofre Ricardo, Pérsio Neves Requeijo, Oscar Pfaff, Fernando L. Fernandes, Célio Flávio de Lima, Adair de Oliveira e Adair S. Dias.

Naquele mesmo dia, lavraram a ata de fundação, na casa da Rua Padre Manoel, nº 10, e puseram em campo sua primeira equipe, assim constituída: Rico, Dias e Gardon; Pérsio, Onofre e Bastos; Vicente, Odair, Pfaff, Eliezer e Ninando. E também elegeram sua primeira diretoria, assim composta: presidente, Oscar Pfaff; secretário, Eugênio Pilar; tesoureiro, Eliezer Lopes Fernandes; diretor de esportes, Célio Flávio de Lima.

O nome Feitiço, homenagem a Luiz Matoso, futebolista que se notabilizou no Santos com esse apelido, acabou sendo substituído, numa reverência mais lógica e mais apropriada, desta vez à própria cidade. Não obstante, por todas as conquistas feitas ao longo dos anos, quer nas competições esportivas, quer nos empreendimentos patrimoniais, o São Vicente Atlético Clube é o verdadeiro feitiço do nosso esporte, em sua mágica ascendência, que tanto glorifica os ideais de seus fundadores.

(...) Não poderia, porém, deixar de ser realçada a atuação de Mansueto Pierotti, sem dúvida a grande viga mestra do São Vicente Atlético Clube na consolidação do seu patrimônio. Não foi à toa que seus companheiros de diretoria deliberaram dar o seu nome à famosa Praça de Esportes do Parque Bitaru, inaugurada em 28/4/1958 (...) no terreno que Mansueto Pierotti adquiriu em 20/6/1949.


Bico-de-pena do artista Ribs mostra o Estádio Mansueto Pierotti, do SV Atlético Clube

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