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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - Matadouro
Histórias do Matadouro Municipal (4)

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Quando se pensava que o último capítulo da história do Matadouro santista já estava escrito, chega a informação de que todos os seus equipamentos foram deliberadamente destruídos por uma entidade de interesse público que deveria preservá-los em razão do interesse histórico e cultural da cidade, ou oferecê-los a quem o fizesse, em vez de acabar com eles, em desrespeito à população santista que confiava nessa entidade.

As fotos desse triste capítulo da história do Matadouro foram encaminhadas a Novo Milênio em 7 de julho de 2011 e mostram como eram os equipamentos em 2009, justamente alguns dias ANTES da destruição praticada pelo Serviço Social da Indústria (Sesi) em suas instalações (o prédio ocupado é tombado pelo Patrimônio, mas o maquinário não havia recebido esse tratamento), mostrando também o DEPOIS dessa destruição.

A denúncia desse atentado ao patrimônio histórico santista foi assim publicada pelo jornal A Tribuna em 24 de julho de 2011, na manchete e na página A-8:

"DO ANTIGO MATADOURO, SÓ RESTARÃO LEMBRANÇAS - Abaixo, dois momentos de um mesmo cenário: peças quase centenárias que durante anos fizeram parte da História de Santos viraram sucata"

Imagem e legenda: reprodução da página A-1 de A Tribuna de 24/7/2011

 

Matadouro: patrimônio destruído

Maquinário que preservava a memória do local foi destruído, sobrando apenas restos, pedaços de história. no local onde ficavam as peças, expostas como em um pequeno museu, funciona agora uma academia de ginástica

 

Ronaldo Abreu Vaio

Da Redação

Parece que o céu é o limite quando o assunto é o descaso com o patrimônio histórico.

Esta semana, A Tribuna recebeu duas séries de imagens do interior do prédio do antigo Matadouro Municipal de Santos, local atualmente ocupado pela sede santista do Serviço Social da Indústria (Sesi). As fotos foram tiradas em setembro e em novembro de 2009.

Nelas, dois momentos distintos: na primeira série (à esquerda), o maquinário de apoio à preparação dos bois que alimentariam a Cidade, ainda intacto, inclusive com placas explicativas sobre o uso de cada dispositivo. Nessas placas, constavam a marca, a origem e o ano de importação dos equipamentos - a maioria era da década de 20, oriunda dos Estados Unidos e da Suíça.

Em uma das placas havia até explanação detalhada do funcionamento de um dos compressores, da General Electric, utilizado para criar o resfriamento a seco do frigorífico. Funcionava com amônia, bombeada pelas serpentinas, a temperaturas entre 15 e 20 graus negativos.

Pelo que essas primeiras fotos indicavam, até há bem pouco tempo, o prédio e seu maquinário eram preservados como um pequeno museu, extrato físico de um pedaço da História de Santos.

Mas quando se observa a segunda série de fotos, à direita, tirada dois meses depois, o que se vê é um cenário de guerra. Todo o maquinário está em pedaços pelo chão, arrasado a golpes de marreta e pela chama de maçaricos, como se deduz das imagens.

"Fiquei surpreso com o que vi ali. Não estavam desmontando, mas destruindo uma relíquia histórica. Meu neto, por exemplo, nunca vai poder ver aquilo de perto", indigna-se o autor das fotos, que pediu para não ser identificado.

Apagando a memória - Ao ver as fotos, o historiador Waldir Rueda ficou estarrecido. "Estou estranhando o Sesi, que apóia a cultura, dá cursos gratuitos, fazer isso. Esse maquinário não pertencia a eles; era um patrimônio da sociedae santista".

A importância histórica do Matadouro tem a ver com a sua função. Rueda explica que o maquinário restante era a representação física disso no presente, pois conhecendo a função das coisas do passado é possível reconstituir a realidade, tal qual era em dada época.

Quando se perde um vestígio físico de tal monta, corre-se o risco de apagar um pouco da memória da vida de um período.

"O boi era morto ali e rapidamente conduzido, de bonde, à Rua General Câmara, não por acaso, então chamada de Rua dos Açougues", conta. "Isso era assim, pois refrigeração praticamente não existia. O consumo da carne era quase imediato".

Voltando a comentar as fotos, Rueda se ressente. "Fui várias vezes ao Sesi, verifiquei que o maquinário era muito bem cuidado; por isso nunca entrei com um pedido de tombamento. Não pensei que iam fazer uma coisa dessas".

As fotos também foram encaminhadas ao Ministério Público. A promotora de Meio Ambiente e Patrimônio Histórico, Ana Paula Fernandes Nogueira Cruz, afirma que vai apurar o que aconteceu nesse caso.

O outro lado - O diretor do Sesi-Santos, Michel Christoforo Kabach, esteve em A Tribuna para explicar o ocorrido. "Ao longo de 25 anos, ele (maquinário) foi se degradando. E então, por uma necessidade de ampliação do espaço, a gente precisou tirá-lo de lá".

Kabbach apresentou um ofício do Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Santos (Condepasa), de 2010, atestando que o imóvel da Avenida Nossa Senhora de Fátima, 366, Jardim Santa Maria - o endereço do Sesi e do Matadouro - não é tombado por esse órgão.

Também mostrou cópia da escritura de doação do terreno, pela Prefeitura, de 1984. Nela, não se faz menção a nenhuma eventual obrigação do Sesi em relação ao prédio - ou ao equipamento - do antigo Matadouro.

Ou seja, não havia nenhum impedimento legal para que se perpetrasse a destruição do maquinário, Justificou Kabbach.

Contudo, reconhece que nenhuma entidade - pública ou privada - foi sequer procurada para uma eventual conservação das peças. E elas foram "desmanchadas" pois, "pelo porte, não tinha como tirar inteiras. Teria de demolir o prédio".

"No nosso saguão, do prédio principal, há fotos antigas registrando essa história. É uma maneira condizente de ficar demonstrado o período daquela época. A máquina em si, no nosso entendimento, não tinha utilidade", acrescentou.

Hoje, no local onde outrora funcionou o Matadouro, está instalada uma academia de ginástica, utilizada pela comunidade. Pois é, se os músculos vão bem, a memória anda fraca.

A história

O Matadouro Municipal de Santos começou a funcionar plenamente na década de 10 e continuou até o início da década de 70. Na época, a hoje populosa Zona Noroeste, com 14 bairros e cerca de 72 mil habitantes, não passava de um grande manguezal.

As reses eram descarregadas do trem em São Vicente e conduzidas até o seu destino, literalmente, final: no Matadouro eram abatidas. A carne, então, abastecia os pequenos açougues e até os particulares, que podiam comprar o produto diretamente no local.

O panorama começou a mudar quando foi inaugurada a linha 1 do bonde, que passava onde hoje é a Avenida Nossa Senhora de Fátima. com ela, surgiram as primeiras chácaras. Aos poucos, o Matadouro foi sendo incorporado por um cenário urbano incompatível com a atividade praticada.

À parte os estouros eventuais da boiada - para a festa da criançada - o subproduto do abatedouro eram o cheiro forte de carniça e a potencial contaminação do solo. A desativação aconteceu em 1973. Sete anos depois, em 1980, o terreno foi cedido ao Serviço Social da Indústria (Sesi), que instalou ali a sua sede em 1986.

Imagem: reprodução da página A-8 de A Tribuna de 24/7/2011

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