HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS
Gironda, o primeiro a ser implodido
Pioneiro em toda a Baixada Santista, na demolição pelo sistema de implosão (em
21/1/1990), o Gironda também foi conhecido como Hotel Comodoro
Notícia publicada no jornal santista A Tribuna, em 20 de janeiro de 1990 (sábado):
Em função dos preparativos para demolição, ...
Foto: Roberto Konda, publicada com a matéria
Edifício Gironda vira atração no Bairro do Gonzaga
A implosão do antigo Edifício Gironda, amanhã, fez com que o prédio virasse atração
turística do Gonzaga, e assunto obrigatório de todas as conversas no bairro. A área será interditada hoje à noite, e os
prédios vizinhos evacuados uma hora antes. A implosão, marcada para as 8 horas, deve durar três segundos, cercada de todas as garantias. Num raio de
200 metros - recomenda a Defesa Civil -, janelas e portas dos prédios precisam ser fechadas, e removidos os carros das garagens.
...o Gironda tem despertado a atenção... de curiosos que passam pelo Gonzaga
Foto: Roberto Konda, publicada com a matéria
Implosão do Gironda vira atração no Gonzaga
O Edifício Gironda, construído em 1939 na Rua Jorge
Tibiriçá, junto à Rua Alamir Martins, e que já foi hotel Comodoro Boulevard Santos Hotel, será implodido amanhã, e deve desaparecer numa nuvem de pó
em três segundos.
A implosão, a primeira no gênero em Santos, segundo o engenheiro Manuel Jorge Dias,
responsável técnico da empresa CDI Demolidora, será às 8 horas e está cercada de toda a garantia, inclusive seguro de vida dos 238 moradores dos
edifícios vizinhos - Aratuá, Gávea, Inca e La Rochelle -, e de duas casas térreas, segurados igualmente contra danos materiais e eventual perda
completa.
O Gironda, de forma inesperada, se transformou numa atração do Gonzaga onde, nos
últimos dez dias, a implosão entrou de forma compulsória em todas as conversas e reuniões. Cada morador do bairro já passou pelo menos uma vez pela
Rua Jorge Tibiriçá, nas últimas horas, a pé ou de carro, para dar uma olhada no velho edifício, um dos mais bonitos da orla da praia nas décadas de
40 e 50.
A mesma curiosidade levou ao Gonzaga moradores de outros bairros da Cidade, além de
muitos turistas, munidos de câmaras fotográficas e de vídeo, para colher imagens atuais que permitirão comparações posteriores.
A curiosidade, entretanto, preocupa a Comissão de Defesa Civil e as autoridades
policiais, que certamente terão muito trabalho para manter os populares à distância, na madrugada e início da manhã do domingo.
"Vou ficar acordado toda a noite", explicou Lauro Tognezzi, que mora no Edifício Santa
Cecília, na Rua Jorge Tibiriçá, "para não perder nenhum lance. Sei de outras pessoas, entretanto, que vão fazer vigília no meio da rua"...
Preparativos - Ontem foram vistoriadas as perfurações onde serão depositadas as
cargas explosivas. O material - composto de gelatina especial que substitui as espoletas geralmente utilizadas em outras implosões -, só será
instalado hoje, provavelmente no período da tarde, com a presença do engenheiro titular da equipe da CDI Demolidora, Hugo Takahashi.
Alguns andares do Gironda receberam cobertura de Telcom, uma tela metálica que evita o
lançamento de fragmentos. O inovador da explosão, segundo explicou o engenheiro Manoel Jorge Dias, é o acessório detonador, considerado
revolucionário no mercado brasileiro, testado, com êxito, na demolição do antigo Palácio da Justiça, no Rio de Janeiro.
Diferentes equipes da Eletropaulo e da Telesp estiveram no local, por volta das 10
horas, promovendo o remanejamento de fios, cabos, transformadores elétricos e instalações telefônicas, que serão novamente remanejados e ligados no
domingo, depois da implosão.
Também o pessoal da Sabesp esteve no Gironda, removendo todas as ligações externas de
água e esgoto. Por exigência técnica, as tubulações internas não removidas foram vedadas com material argiloso, para impedir entrada ou saída de ar
no momento da detonação.
A Secretaria de Obras e a Comissão de Defesa Civil distribuíram carta-circular aos
moradores dos prédios vizinhos, explicando todos os procedimentos que devem ser adotados, a partir da noite de hoje. Os edifícios e casas serão
evacuados uma hora antes da implosão, e vistoriados pelo Corpo de Bombeiros depois da demolição do Gironda, antes da liberação e retorno dos
moradores.
... de curiosos que passam pelo Gonzaga
Foto: Roberto Konda, publicada com a matéria
Edifício já foi hotel de luxo
Pesquisa A Tribuna
O Edifício Gironda foi um dos primeiros prédios a serem construídos na área a orla
marítima, no fim da década de 30 (as obras datam de 1939). Nos anos 40, transformou-se num dos hotéis mais luxuosos de Santos, sendo considerado
superior ao Atlântico.
O fim dos anos 30 marca o início da urbanização de Santos. O então prefeito Aristides
Bastos Machado mandou pavimentar avenidas e construiu o primeiro trecho do jardim à beira-mar. Nos primeiros anos da década
de 40, tudo continuou mais devagar, devido à recessão resultante da 2ª Guerra Mundial. Mas, no final, terminada a guerra e inaugurada a
Via Anchieta, Santos começou a crescer demográfica, turística e urbanisticamente. O hotel do Edifício Gironda iniciou então
seu apogeu.
Apesar dos apart-hotéis constarem dos costumes mais recentes, o Gironda pode ser
considerado pioneiro nessa categoria. O hotel possuía muitas alas ocupadas por moradores fixos, que dispunham da privacidade de um apartamento e das
comodidades dos serviços de hotelaria. Na história do Gironda estão registrados vários proprietários e mais dois nomes para o edifício: Comodoro e
Boulevard Santos Hotel.
O Gironda sempre funcionou como hotel. As últimas transações comerciais ficaram a
cargo da Imobiliária Paulo Norberto Neves, que chegou a pensar numa adaptação do prédio para funcionamento de um apart-hotel moderno. No entanto, a
estrutura comprometida impediu essa realização. |
Em 22 de janeiro de 1990 (dia seguinte à implosão), o mesmo jornal A Tribuna
registrou:
Pontualmente, às 8 horas, um trabalho preciso de especialista levou ao chão toneladas
de concreto. No lugar do Gironda surgirá um moderno empreendimento, com 13 andares e muito luxo em seu interior
Fotos: Irandy Ribas, publicadas com a matéria
Em três segundos, o Edifício Gironda veio abaixo
Lizete Araújo
Aconteceu tudo como o programado na implosão do Edifício
Gironda, ontem, na esquina das ruas Jorge Tibiriçá e Alamir Martins, Gonzaga. Exatamente às 8 horas, foi acionado o detonador que fez explodir os 25
quilos de dinamite colocados em pontos estratégicos do prédio, principalmente nos três primeiros andares. Segundos depois, toneladas de concreto
vinham abaixo, levantando uma espessa nuvem de poeira. Um curto espetáculo que terminou com aplausos dos muitos populares que assistiam à cena, e
abraços entre a equipe da CDI Demolidora, empresa responsável pela implosão.
Pouco depois, enquanto o helicóptero da Polícia Militar sobrevoava a área,
pás-carregadeiras da Prefeitura começaram a amontoar o entulho para liberar a rua. Rapidamente as equipes da Eletropaulo também iniciavam o serviço
para religar a rede de energia.
Na comemoração, os cumprimentos maiores ficaram para o engenheiro Manoel Jorge Dias,
de 34 anos, responsável técnico pela demolição. Ele não se preocupou em cronometrar, mas garantiu que não se passaram mais de quatro segundos.
"Saiu tudo dentro do previsto", disse, observando que nem mesmo o poste próximo ao
prédio, que não pôde ser retirado, sofreu qualquer dano. Com o sucesso do trabalho, o engenheiro já previa novas implosões na Cidade a partir de
agora.
Dias revelou que, além da preocupação com a segurança dos moradores, havia certo
receio quanto à casa vizinha ao Gironda. Na moradia, o único dano visível era a destruição do muro lateral ao edifício.
De propriedade de José de Souza Jr., a residência começou a ser vistoriada menos de
meia hora após a implosão, pelo perito José Geraldo Neves, da 2ª Vara Civil, e por um assistente técnico solicitado pela família. Enquanto ainda
seguia a verificação na casa, o advogado Luiz Carlos Felipe informou que aparentemente apenas o muro teria sido afetado.
Uma densa nuvem de poeira cercou o lugar, sufocando quem burlou o bloqueio
Foto: Reinaldo Ferrigno, publicada com a matéria
Esquema de segurança começou cedo
Durante todo o decorrer da semana, foram tomadas as providências para a derrubada.
Fios tiveram de ser remanejados, assim como cabos e transformadores elétricos e instalações telefônicas da área. Paralelamente aos cuidados
técnicos, houve instrução aos moradores. Já na noite de sábado, haviam sido bloqueados os principais acessos àquele trecho do Gonzaga.
Ontem, estiveram em ação 65 homens do Corpo de Bombeiros, mais integrantes da Comissão
de Defesa Civil. Da véspera até o momento da demolição, 150 policiais militares estiveram trabalhando naquela área. O esquema montado para a
implosão mobilizou ainda equipes da Eletropaulo, Telesp, Demutran e Secretaria de Obras da Prefeitura.
Os preparativos começaram logo cedo. Por volta das 6h30, o tráfego na avenida da
praia, a partir da Avenida Conselheiro Nébias, foi interditado ao tráfego de veículos. Meia hora depois, começava a retirada dos moradores dos
edifícios Aratuá, Gávea, Inca e La Rochelle.
Deste último os bombeiros retiraram um jovem, que fora operado no meio da semana e
ficou na ambulância da corporação até a liberação para retorno aos apartamentos. Os quatro prédios e mais duas casas estavam cobertos por seguro,
cujo valor total, em dezembro, era de Ncz$ 300 mil, segundo o engenheiro José Carlos Sanches, da Itaú Seguradora.
Máquinas da Prefeitura deram logo início à remoção do que sobrou do prédio
Foto: Reinaldo Ferrigno, publicada com a matéria
Bloqueio - Os moradores, assim como populares residentes nas proximidades e de
outros bairros, que foram assistir à implosão, ficaram concentrados na esquina da avenida da praia com a Rua Jorge Tibiriçá.
Quando o proprietário da Construtora Praiamar Ltda., Daoud Georges Issa - responsável
pelo projeto do novo prédio que será levantado no terreno -, acionou o detonador e o Gironda veio abaixo, a Polícia Militar e a Defesa Civil tiveram
que conter os curiosos que, de imediato, queriam ver de perto o que sobrou do prédio. Quem conseguiu furar o bloqueio foi impedido pela poeira
sufocante.
O entulho resultante da demolição foi doado pela construtora à Prefeitura. Segundo o
secretário de Obras, Cláudio Abdala, o que puder ser recolhido por caminhões será aproveitado para encascalhamento de vias públicas. A remoção deve
começar ainda hoje.
O Edifício Gironda, construído na década de 30 e que chegou a ser um luxuoso hotel,
dará lugar a um empreendimento também de luxo. Ali será construído um prédio de 13 pavimentos, com um apartamento por andar. A previsão da Praiamar
é de terminar a obra em dois anos.
Momento da detonação: expectativa
Foto: Mingo Duarte, publicada com a matéria
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Já o jornal O Estado de São Paulo registrou assim a implosão, na sua edição de
terça-feira, 23 de janeiro de 1990:
Edifício Gironda: no lugar, apartamentos de luxo
Foto: Ana Dantas/AE-21/1/1990, publicada com a matéria
Santos implode prédio de 1939
SANTOS - Foram precisos apenas três segundos para que o Edifício Gironda, no
bairro do Gonzaga, viesse abaixo anteontem. A implosão, a primeira realizada na Baixada Santista, consumiu 25 quilos de dinamite, distribuídos em
pontos estratégicos, e pegou algumas pessoas de surpresa. O motivo do susto se deveu ao fato de que não foi acionado o último alarme, previsto para
30 segundos antes da implosão. O engenheiro Manoel Jorge Diniz Dias, da CDI Demolidora, disse que o resultado foi superior às expectativas, uma vez
que o único dano causado foi a queda do muro da casa situada ao lado do prédio. A implosão custou, segundo o proprietário do Gironda, Ncz$ 500 mil.
No lugar do prédio construído em 1939 e considerado um dos mais luxuosos da cidade na época, vai surgir um outro de 13 andares, com apartamentos de
alto luxo. |
Em 10 de fevereiro de 1990, as fotos da implosão eram usadas em uma charge incorporada a
uma matéria do jornal A Tribuna (caderno AT Especial) sobre os riscos do uso inadequado de rojões e outros fogos de artifício:
Reprodução parcial da matéria e charge de Seri, sobre fotos de Roberto Konda
Quando o estouro é mais embaixo
Vera Leon
Pôr abaixo o Edifício Gironda, num ensolarado domingo
gonzaguiano, não foi assim tão de improviso como sugere a ilustração do Seri, em montagem com fotos de Roberto Konda. Mas este personagem segurando
na mão um poderoso rojão, que pode causar estragos incalculáveis, é um pouco conhecido de cada um de nós.
Ou é um pouco cada um de nós que alguma vez buscou, através de fogos de artifício e de
estampido, extravasar alegrias, comemorar gols, festejar a passagem do ano, saudar os santos juninos ou fazer mais quente o Carnaval. Quando tudo
corre bem, isto é, quando o rojão faz aquele estrondo (só o estrondo) de arrasar quarteirão e manda seus tiros para assustar as estrelinhas no céu,
a festa acaba em festa. Porém, ai porém, há casos diferentes que registram outro fim de festa, invariavelmente com muita dor, algumas vezes com
tragédia mesmo e seqüelas irreversíveis.
Quem já passou pela experiência sabe o quanto ela é
traumática e quem nunca a viveu (felizmente) conhece pelo menos a história de alguém que repensou e mudou a maneira de comemorar qualquer fato. A
tragédia não bate só à porta do vizinho e em algumas circunstâncias ela é imprevisível e não permite sequer um socorro. Em outras, no entanto, os
fatos à nossa volta deveriam ser interpretados como um sinal de alerta, como uma mensagem para que olhemos a vida não como uma coisa descartável,
mas como um tesouro que nos foi dado para ser cuidado com respeito e amor.
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