23
BREVE HISTÓRIA DA LUTA ANTIMANICOMIAL NO BRASIL
Para Carrano,
a luta antimancomial no país foi retomada em Santos, em 1987
O militante antimanicomial Austregésilo Carrano Bueno dá a pista para a retomada do Movimento no
Brasil, que nos anos 70 existia com o nome de "Movimento Anti-Psiquiatria". Para ele, foi em Santos, em 1987, que reacendeu o movimento.
No seu manifesto lançado em 2003, "Exigências na reforma psiquiátrica", Carrano
denuncia os cemitérios clandestinos no Juquery e conta que "no ano de 1964, com a tomada do poder pela Ditadura Militar, todos os movimentos
populares foram proibidos no Brasil. E a psiquiatria brasileira teve o terreno apropriado para suas incursões de pesquisas e experiências com as
mais variadas drogas e eletroconvulsoterapia (eletrochoque) em cima de suas cobaias humanas, presas aos milhares em suas instituições
psiquiátricas."
Informa o militante antimanicomial que em 1964 havia 79 hospícios no Brasil, em 1985 eram 453. "O
Governo Militar bancava facilitando financeiramente as construções dos Hospitais Psiquiátricos, desde que os donos se comprometessem em aceitar as
pessoas enviadas por eles. A Ditadura Militar e a Psiquiatria Brasileira se vestiram como mão e luva, chegando ter uma média de 600.000 (seiscentas
mil) internações-ano.
Muitos brasileiros desapareceram, foram inutilizados, torturados e mortos dentro dos
Hospícios Nacionais, na sua grande maioria hospitais particulares, pertencentes a grupos de psiquiatras. E desses grupelhos de empresários da
loucura, associados e diretos participadores dos terrores da Ditadura Militar, ainda hoje muitos atuam e são os donos e associados das instituições
Psiquiátricas Brasileiras", relata Carrano.
Segundo ele, estes foram sócios-coniventes com as crueldades do sistema, que usava os hospitais
psiquiátricos como mais um dos locais de desovas dos indesejáveis pela Ditadura Militar - fossem eles "negros, prostitutas, cabeludos, militantes
políticos, homossexuais, subversivos, todos que afrontavam a moral e os interesses dos ditadores", diz.
"Em 1998, continua, nós do MLA – Movimento de Luta Antimanicomial - denunciamos, através da
Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, 30.000 (trinta mil) covas clandestinas dentro da Colônia Psiquiátrica Juqueri, nesse Estado. Nos anos
70, o Juqueri teve o absurdo número de pacientes, na mesma época, de 18.000 (dezoito mil) internos. Em outras instituições do gênero já foi
encontrado outro cemitério clandestino, em Santa Catarina. Nós acreditamos que haja mais cemitérios clandestinos em outras colônias e hospitais
psiquiátricos", analisa.
Carrano, que identifica "como parte da história" da luta antimanicomial os fatos de 1987 em Santos -
uma reunião com um grupo de técnicos em Saúde Mental, revoltados com o chamado tratamento psiquiátrico dado aos pacientes do "chiqueirão
Hospital Psiquiátrico Anchieta" -, no movimento em que estava presente o psiquiatra Domingos Stamato, em instituições que Carrano chama de
"Casas de Extermínio". E reivindica pagamento de valores como aos anistiados políticos para os torturados psiquiátricos. Ele saúda a Lei da Reforma
Psiquiátrica e reivindica a instituição da Rede de Trabalho Substitutivo para os 60 mil internos do país.
Como escreve o psiquiatra Walmor Piccinini, o Brasil sofreu uma certa defasagem nos
acontecimentos da Saúde Mental, inaugurando asilos quando seu questionamento era questionado em várias partes do mundo. Ao invés de utilizarmos
antigos mosteiros ou lazaretos como na Europa, construímos prédios imponentes.
Segundo o IBGE, em 1983 o Brasil tinha 427 hospitais psiquiátricos e 106.605 leitos, sendo 40.708 em
SP. Nos últimos dois anos, apenas, morreram nos hospitais psiquiátricos brasileiros 3.222 pessoas, sendo 1.332 em São Paulo. São quase dez mil
moradores (que permanecem de 6 meses a 50 anos) só em SP.
Mais de 75 mil pessoas internadas em 260 hospitais no país a um custo de R$ 500 milhões, que recebiam
eletrochoques e eram vítimas de operações cerebrais – lobotomias, que secionavam o cérebro e idiotizavam para sempre - 80% deles privados e
conveniados, realizando 400 mil internações anuais e tratando de apenas 0,52% da população.
Uma pequena parcela desse meio bilhão de reais eram aplicados – estes dados são de 2000/2001 - em
unidades extra-hospitalares nas modernas políticas de Saúde Mental, que adotam práticas de reintegração social e participação comunitária, como as
utilizadas no Anchieta. O nível de resolução é de 80%, escreve, quando associados métodos de reabilitação e reintegração com adesão espontânea do
paciente.
Em Santos, estes investimentos inteligentes fizeram reduzir drasticamente, ano a ano, as
internações em hospitais especializados. Voltando atrás: mais de mil pessoas mortas por ano só em SP, nessa época de horrores, mortes sem nenhuma
relação com a causa da internação.
Os manicômios eram depósitos de gente que, improdutiva economicamente, eram despejados lá pelas
famílias e se tornavam fonte de renda para empresários da Saúde Mental – em condições subumanas de existência, sob fome e tortura. Era essa a
realidade até anos atrás no país, que aqui não era diferente.
Bastava uma explosão, uma bebedeira, uma crise – e o destino podia ser o Anchieta, onde se entrava mas
não era certa a saída. Muitas foram as vidas que se perderam nesse redemoinho ceifador de vidas, típico de uma sociedade que separa e discrimina
grupos sociais que expulsa de sua convivência, pois inaproveitáveis para o mercado de trabalho.
O passado: o primeiro hospício
Em 1923 era fundada a Liga Brasileira de Higiene Mental, que a partir de 1930 passa se chamar
Assistência a Psicopatas do Distrito federal, sob a tutela do recém-formado Ministério da Educação e Saúde Pública.
No Brasil, a movimentação pela criação do primeiro hospício havia tido início em 1830, quando a
recém-criada Sociedade de Cirurgia e Medicina do Rio de Janeiro lança palavras de ordem que se tornaram um bordão bastante conhecido: aos loucos
o hospício. Clama-se pela necessidade de construção de um local específico para o abrigo de loucos, especialmente dos loucos pobres que vagavam
perigosamente pelas ruas, já que os loucos ricos já eram presos ou isolados em casa.
A cadeira de psiquiatria só seria criada em 1881 na faculdade carioca e a loucura
era tratada como uma questão jurídico-criminal no sentido da proteção social. Então recolhidos à Santa Casa de Misericórdia, cujo provedor José
Vicente Pereira teria grande participação na construção do primeiro hospício brasileiro, o Pedro II. No início, os pacientes ficavam em porões sujos
e com fome, acorrentados, entregues a carcereiros e guardas. A substituição das irmãs de caridade por médicos se deu apenas no final do século XIX,
quando os psiquiatras assumem a direção do hospício.
Em 1839, José Clemente Pereira salienta as deficiências do atendimento aos doentes mentais, isolados
em células na Santa Casa de Misericórdia. Em seu relatório sobre a questão, em 26 de julho de 1840, prevê a construção de um hospício de
alienados. Em 2 de novembro de 1840 é constituída a comissão que administrará sua construção e ainda antes de seu início os doentes mentais são
transferidos para uma casa existente no local, sob a guarda do administrador de obras. "Deve haver um professor que vá duas vezes por semana ao
local para prescrever e formular tratamentos", discute-se em reunião em 11 de novembro de 1842. Durou mais de dez anos a construção do Pedro II.
De maneira geral, até meados de 1850 no Brasil os doentes mentais eram colocados nas prisões ou em
celas especiais nas Santas Casas de Misericórdia. O primeiro hospício brasileiro foi o D. Pedro II, subordinado à Santa Casa de Misericórdia. Foi
construído em 1851, inaugurado em 5 de dezembro de 1852, no Rio de Janeiro, em 18 de maio de 1898 sua colônia agrícola. Dirigido por religiosos, só
depois de 30 anos pelo médico de clinica geral, Nuno Andrade, foi o exemplo pioneiro na América Latina do regime de liberdade para os psicopatas. E
em 1896 Franco da Rocha constrói o Hospital Colônia do Juquery, em uma área de 170 hectares, próximo à Estação do mesmo nome, com um projeto do
arquiteto Ramos de Azevedo.
No ano de 1934, quando várias legislações são implantadas, vem à luz o Decreto 24.559, que criou o
Conselho de Proteção aos Psicopatas, aglutinando vários segmentos como juízes de órfãos e menores, chefes de policia e OAB e representantes de
associações privadas de assistência social.
Em 1941, seria criado o órgão que passaria a gerir toda a política do setor, o Serviço Nacional de
Doentes Mentais, regulamentado apenas em 1938, em uma época em que era forte o conceito de eugenia e que o Brasil passava por um momento de
afirmação da raça forte que o governo autoritário desenvolvia – característica consolidada após 10 de agosto de 1937 com o Estado Novo.
O ideal ariano de Hitler encontrava espaço neste momento em que o Brasil se
aproxima do projeto nazi-fascista e o elogia nas palavras de Vargas. O ideal do corpo são se contrasta com o alienado, que precisa ser
isolado, por ser doente. O médico Adauto Botelho vai, então, iniciar uma campanha pela construção de hospícios em todo o país, isolados e em
forma de colônia, em que se pudesse colocar no trabalho o paciente de Saúde Mental, o que vinha ao encontro dos ideais do incipiente capitalismo
brasileiro.
A assistência aos psicopatas em São Paulo é uma das mais antigas do Brasil, lembra o Dr. Walmor
Piccinini em seu artigo sobre a História da Psiquiatria no Brasil. Diz ele que segundo o professor Pacheco e Silva (1945), o artigo 6 da lei
número 12 de 18 de setembro de 1848 autorizava o Governo a dar providências para a elaboração de plantas e orçamento de um hospício onde pudessem
ser abrigados todos os doentes do Estado.
Era, segundo Paulo Fraletti, citado por Ribas (JC – 1974), o Asilo Provisório de Alienados da capital
de São Paulo, inaugurado em 14 de dezembro de 1852, 9 dias depois do D. Pedro II. Em 1923, quando Gustavo Riedel, psiquiatra, funda no Rio de
Janeiro a Liga Brasileira de Saúde Mental, na meta de oferecer assistência aos doentes, seus sucessores, a partir de 1926, visavam também a eugenia
- o estudo das causas e condições que podem melhorar a raça e as gerações dos indivíduos.
A construção de grandes manicômios nos séculos XVIII e XIX no Brasil foi obra do Estado, seguindo os
preceitos de uma visão civilizatória humanista e higienista, que organizou as regras oficiais e os padrões da política de Saúde Mental no país, como
escreve Isaias Pessotti.
De 1938, quando um Decreto federal normatiza o atendimento à Saúde Mental, regulamentando o Decreto
24.559 de 1934, a política do setor é centrada no isolamento, na segregação e que operacionaliza legalmente o seqüestro de indivíduos, a cassação de
seus direitos civis e garante sua tutela pelo Estado, que vai vigorar até a recente lei do deputado Paulo Delgado.
Dos anos 30 em diante, a preocupação eugênica passa a ser fundamental, refletindo um programa racista
e moralista, que encarava como avarias cerebrais as doenças mentais. A partir daí o processo de tratamento não evoluiu nos quase 500 hospitais
psiquiátricos brasileiros, com mais de cem mil leitos, um quarto dos quais em São Paulo.
Era esse o quadro até 1989 - quando o processo desencadeado a partir da intervenção municipal no
Anchieta, acompanhado de ações similares, inclusive com a luta antimanicomial no Congresso Nacional, fez a superação democrática da questão.
No princípio
da luta antimanicomial, Nise da Silveira – "O anjo duro"
Interpretado por Berta Zemel, o grupo Luiz Valcazaras fez exibir no 36º Festival Internacional de
Londrina de 2003 o filme com esse nome - que interpreta a idéia de Nise da Silveira (1905-1999), que antecipou as teses da moderna psiquiatria -,
apresentado por três anos em festivais em Curitiba, Porto Alegre, Recife e São Paulo.
Anjo Duro faz uma homenagem a Rubens Correa, ator que trabalhou com temas da psiquiatria e
manicômios, em textos de Antonin Artaud. Esta nova visão da psiquiatria, do que se chamava loucura e passou a constar, como chamava ela, como
um dos estados do ser - estimulando a afetividade nos esquizofrênicos -, foi introduzida aqui por Nise da Silveira, nos anos 40. E se
expandiria na Itália, com Franco Basaglia em 1971, na prática a que se antecederia a psiquiatra brasileira que se opôs ao eletrochoque e à lobotomia
– levando-a a criar, em 1946, o Serviço de Terapia Ocupacional do Centro Psiquiátrico D. Pedro II no bairro carioca de Engenho de Dentro, que hoje
leva seu nome.
Ela havia sido levada para o setor em 1944 e o transformou. Todo esse aprendizado e evolução do
tratamento da Saúde Mental, em Nise, tem uma origem: os tratados de H. Prinzhorn e Karl Jaspers que, em 1922, inspiraram uma estudante da Faculdade
de Medicina da Bahia, a única mulher naquela turma de 1926, ao lado de 156 colegas.
Filósofo e psiquiatra, como Prinzhorn, Jaspers é autor do livro Psicopatologia geral, ligado à
fenomenologia (uma conversão de linhas da filosofia, baseada no existencialismo) de Husserl - um filósofo dos primórdios do existencialismo, como
Heidegger. Saída de Maceió, Nise da Silveira teve a ousadia de sair para estudar em Salvador em uma época em que às mulheres exigia-se apenas bons
casamentos. Era Nise da Silveira, inovadora intrépida no campo do tratamento da esquizofrenia.
A tentativa de Karl Jaspers era a de aplicar a fenomenologia de Husserl - captar a vivência do ouro
diretamente no comportamento em que está incluída a significação do ato, não procurando atrás, mas no próprio fenômeno - a interpretação dos
distúrbios mentais, valorizando a forma de consciência pessoal do vivido, a forma peculiar individual de conscientizar ou viver a experiência.
Nise era, como Telma, uma desafiadora dos valores estabelecidos, para revolucionar os conceitos e
métodos da psiquiatria no Brasil e no mundo, em contato, acompanhando e sugerindo experiências ao próprio Jung, como em 1957.
Graças a estes caracteres, os até então desprezados e oprimidos seres com transtornos mentais passaram
a vislumbrar chances de vida. Não mais humilhação, asilos, internação, operações cerebrais, choques, surras: muitos iriam ser artistas, passariam a
ter uma vida mais serena e feliz, como seres humanos portadores de direitos.
Enquanto Freud ingressara na análise da mente pela via da sexualidade, Jung adotara a espiritualidade
como marco de análise. Nise da Silveira, essa mulher, aprendeu na prática – criou – ao que chamava a emoção de lidar, a terapia ocupacional
que elevou a método científico, então desprezado.
Criadora de um novo léxico, seu horror ao sangue a levou à psiquiatria; seu horror ao sofrimento à
invenção das soluções humanitárias. A terapia ocupacional de então era apenas especializada em fazer os doentes limparem o prédio.
Para ela, atitudes como o coma insulínico ou eletrochoques - ou mesmo as lobotomias - apagavam as
funções psíquicas superiores, secionando, de modo irreversível, a ligação nervosa entre os lobos frontais e o cérebro. Com as lobotomias, concluiu
Nise, se transformava o indivíduo potencialmente recuperável em um idiota definitivo. Ela provou isso com desenhos antes e depois das operações
cerebrais aplicadas aos internos.
Sob sua orientação, os funcionários do Centro Psiquiátrico começaram a estimular os internos a terem
contato com várias atividades artísticas, incitando a criatividade e oferecendo novas ferramentas ao paciente para expressar e refletir seu estado
psíquico.
A esquizofrenia tem como característica a dissociação e a desordem da linguagem e o contato com a arte
o possibilita de representar seu mundo interno, suas angústias e seu processo de cura, "...o que não ocorre no mundo verbal e sim no mundo arcaico
dos pensamentos, emoções e impulsos fora das elaborações da razão e da palavra", como dizia Nise.
Nise, antes de Basaglia
Antes mesmo de Franco Basaglia revolucionar a psiquiatria com as políticas de desinternação que
concretizou em 1971 em Trieste, na Itália, Nise já combatia o que chamava de regime carcerário dos hospitais, nos anos 40. Ela, então, criou
as atividades do estímulo pela arte, buscando restaurar o elo rompido na mente dos pacientes através de técnicas livres de desenho, pintura e
modelagem.
Nise tinha conhecido e se aprofundado nas personalidades esquizofrênicas, nos pacientes que
chamava de clientes ou amigos, nos livros de Machado de Assis ou na Casa de Detenção em que esteve pela militância política de esquerda. Suas
experiências estão descritas em Memórias do Cárcere, de Graciliano Ramos. A riqueza do mundo dos psicóticos e sua sobrevivência digna, mesmo
após muitos anos de doença, foi observada por Nise – transmitidos na linguagem da arte, impedidas que estavam estas pessoas de estabelecer relações
pela linguagem ou raciocínio.
O Museu do
Inconsciente
Em maio de 1952, Nise fundou o Museu de Imagens do Inconsciente, com as obras criadas por seus
pacientes, revelando universos interiores que vislumbravam processos de cura e visão dos episódios que levaram à crise. Logo o Museu se
transformaria em um centro de estudos de caráter mundial, arquivando desenhos individualmente e permitindo a avaliação de processos psicóticos,
atualmente com mais de 300 mil desenhos, telas e esculturas em que estavam presentes elementos que permitiam a introdução na teoria junguiana.
Jung trabalhou bastante com esquizofrênicos e Freud com neuróticos, pois considerou inadequada a
utilização da psicanálise com os psicóticos. Jung foi pesquisador do orientalismo e das mandalas usadas na Yoga indiano e no Budismo
tibetano, desenhos de esquemas psicográficos representativos da união (yoga, palavra que traduz união) dos conteúdos da mente, a ordem
no caos psíquico.
Yoga e Budismo são psicologias do auto-conhecimento, em que os deuses (dovas) são
estados da mente e que tudo é transitório, dialético. Mandala significa círculo em sânscrito, uma forma que, segundo Jung, exprime a
defesa instintiva da psique contra a esquizofrenia. Construída a partir de um ponto central, para onde todos os outros elementos convergem, ela
funciona como uma tentativa de reorganizar o caos psicótico, ou seja, a confusão mental.
No budismo, os invasores são açuras e o melhor estado são os humanos. "Os
budistas são socialistas", disse o psicólogo Rivaldo Leão, "foram os primeiros a contestar o sistema de castas na Índia, defendendo que todos são
iguais".
Segundo Bleuer, um dos principais expoentes da psiquiatria clássica (1857-1939), a principal
característica da esquizofrenia é a cisão das funções psíquicas superiores, desagregando os elementos fundamentais da personalidade. Elementos
partidos foram notados por Nise, ao lado de outras formas harmônicas, penetrando no estudo das mandalas dos antigos textos orientais.
Nise, antecipando o NAPS
santista
Os desenhos avaliados por Jung a pedido de Nise foram de pronto reconhecidos em sua origem
esquizofrênica, que tem como característica da dissociação psíquica a desordem de linguagem, espacial e temporal. Leitora de toda a obra do
psiquiatra, em 1957 ela ganhou uma bolsa no Instituto Carl Gustav Jung na Suíça, em Zurique, participando nesse ano do II Congresso Internacional de
Psiquiatria – onde expôs obras do Museu do Inconsciente, valorizada por ele. Segundo Jung, o inconsciente fala a linguagem dos mitos.
Em 1956, Nise fundou a Casa das Palmeiras, um externato de portas abertas para egressos de tratamentos
em hospitais psiquiátricos. Esse instituto ainda está em funcionamento em Botafogo, no Rio de Janeiro, intermediário entre a internação e a
liberdade, exemplo dos NAPS santistas.
Em 1969, fundou o primeiro núcleo de estudo e difusão da obra do psiquiatra suíço Carl Gustav Jung no
Brasil, que se reunia informalmente desde 1954. Com base nestas experiências ela escreveu o livro Jung, vida e obra, em que sintetiza a
teoria do mestre adotada por ela como base teórica de seu trabalho.
Falecida em 30 de outubro de 1999, aos 94 anos, Nise deixou uma memória de trabalho pela humanização
da Saúde Mental, anterior mesmo a Franco Basaglia que, na Itália, em 1961, derrubou as paredes do manicômio para instalar uma nova face humana desse
tratamento. A discípula de Jung, pai da psicologia analítica, usava animais no tratamento, a quem chamava de co-terapeutas: com eles, seres
isolados em si mesmos estabeleciam ligações quase diálogos entre a fidelidade canina e a palavra unilateral.
A linguagem do afeto – um ponto de referência estável -, iniciado por Nise no tratamento de pessoas
com problemas mentais, hoje é utilizada na França, Estados Unidos e Suíça.
Nise foi uma precursora da psiquiatria alternativa e que antecipou Basaglia e Rotteli. E que fez
naquela cidade o Museu do Inconsciente – ao qual se seguiu o Museu Osório César. Esta psiquiatra inovadora atribuiu suas raízes ao trabalho
de Osório César na arte dos internos em um hospital psiquiátrico. Com oito mil obras, o mesmo número do Museu de Arte Contemporânea, na USP, o Museu
funciona na casa projetada por Ramos de Azevedo, onde viveu Franco da Rocha, o fundador do Juquery.
Nise da Silveira é a autora do livro Mundo das imagens, lançado em 1992, em que escreve "...o
mundo interno do psicótico encerra insuspeitadas riquezas e conserva, mesmo depois de longos anos de doença, contrariando conceitos estabelecidos. E
dentre as diversas atividades praticadas na nossa terapêutica ocupacional, aquelas que permitiam menos difícil acesso ao enigmáticos fenômenos
internos eram desenho, pintura, modelagem, feitos livremente..."
Bispo do Rosário, um artista no Juquery
No histórico da Saúde Mental, na revelação desses processos inovadores, confirmando-os, a presença de
Bira é vital. Sua memória exemplifica a forma de tratamento aplicada sobre os enfermos mentais, potenciais portadores de uma nova linguagem, que
serve à cura e à convivência pacífica no meio em que nasceram.
Um caso como o de Bira, o artista plástico e escritor Ubirajara Ferreira Braga, é significativo.
Ex-interno do Hospital Psiquiátrico do Juquery, começou a pintar aos 58 anos e tem quase 2.700 obras, 30% do acervo do Museu Osório César - que
reúne obras dos internos em SP.
Falecido no fim do ano de 2000, autoridades no setor, como a professora da pós-graduação da Escola de
Comunicações e Artes da USP, Maria Heloisa Toledo Ferraz – que escreveu um livro sobre a trajetória de Bira – não lhe poupam méritos, visíveis, como
no pintor Van Gogh.
Pintor incessante e fanático, período integral no ateliê do hospital de segunda a sexta, protestava
porque não podia pintar nos fins de semana. Seu cartão, que mandara imprimir, indicava sua qualificação: artista plástico, com endereço do Juquery.
Era a arte da loucura, traços de esquizofrenia, como é titulada a matéria que o reporta na
Ilustrada da Folha de São Paulo do dia 10 de janeiro de 2001, do jornalista Fábio Cypriano. Tema de documentário patrocinado pelo
Instituto Cultural do Banco Itaú, dirigido por Christian Cancino e Bernardo de Castro (A soltura do louco).
Bira tinha ainda intensa produção literária – pesquisas - e pretendia lançar um livro. Não foi
recebido pela irmã que morava na Baixada Santista, procurada pela equipe que lançou o filme. Nos cem anos do instituto, em 1998, no Sesc Pompéia,
foi o artista com maior número de obras em exposição: das 85 telas expostas, nove eram suas.
Como Arthur Bispo do Rosário, interno da Colônia Juliano Moreira, no Rio de Janeiro, foi um grande
produto da safra iniciada por Nise da Silveira. Desde 1923 que Osório César, o psiquiatra que escreveu "A expressão artística dos alienados" em 1929
- enviado a Freud e publicado por este na revista Imago –, se dedicou a estudar a arte dos internos.
"Não gosto que meus trabalhos fiquem nas gavetas dos acervos dos museus apenas simbolicamente. Arte é
para todas as camadas da população. "Arte é vida e ela não deve restringir-se só aos artistas e privilegiados", escreveu certa vez Ubirajara, em
carta a Heloisa. Com 2.615 obras, outras que provavelmente vendeu, o que era proibido no Juquery.
Franco da Rocha
Fundador do Hospital Colônia Juquery em 1896, escritor do primeiro livro sobre psiquiatria no Brasil,
parte de sua extensa produção), discípulo da ciência psiquiátrica como uma disciplina moral (como se tornou desde início do século XIX), Francisco
Franco da Rocha (1864-1933), nascido em um 23 de agosto, era paulista de Amparo formado no Rio de Janeiro - e foi um moralista em essência.
Ele morou e criou seus 6 filhos dentro do Juquery que fundou e foi o primeiro "medico residente"
deste que foi o maior hospital psiquiátrico da América Latina e símbolo da" modernidade" no tratamento dos enfermos mentais. Sim, quando esta era a
sofisticação de métodos de tortura como o banho com água fervendo, a inoculação de vírus da malaria (a maloterapia) e a insulinoterapia, a
lobotomia (operação cerebral) e o eletrochoque.
O Juquery já chegou a ter até 20 mil pacientes. Segundo a historiadora Maria Clementina Pereira da
Cunha, autora da tese Juquery, espelho do mundo - defendida na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP em 1986 -, o
hospital é "um depósito de loucos pobres".
"Na verdade, diz, o manicômio é uma instituição criada para marginalizar pessoas incapazes de se
adaptarem aos mecanismos sociais vigentes". Com uma ideologia, profundamente arraigada com a manutenção do status quo, Franco da
Rocha dizia que havia indivíduos que não são loucos nem normais, são "degenerados" que, explica, "são estados transitórios entre o são e o
louco". "Juntam-se a estes os desclassificados", diz, "tipos que não cabem nem na sociedade e nem no hospício".
Rocha chama a estes "desclassificados" os "agitadores,
candidatos constantes ao hospício". E diz que "os revolucionários são companheiros dos paranóicos", revelando que o "sonho de grandeza
do criminoso mostra-se claramente nos anarquistas e nos magnaticidas".
Como observa Alfredo Naffah Neto, "uma psiquiatria desta índole está, sem
dúvida, mais perto da política do que da medicina ou da psicologia e da política reacionária, que funciona como um leão de chácara das classes e
culturas dominantes para manutenção do status-quo". É como Rush, na mesma linha crítica aos que se rebelam, mas de apoio aos seus colegas que
fizeram a Independência americana, na rebeldia ao domínio inglês. Façam o que eu digo...
A liberdade dos defensores do manicômio
Dizia da Rocha que "a liberdade, quando se trata de doidos, não pode deixar de ser muito relativa.
A preocupação de evitar o aspecto de prisão, de dar ao asilo a aparência de uma habitação comum tem sido um pouco exagerada por alguns alienistas. O
caráter de prisão é, no entanto, inevitável: quando não estiver nos muros e janelas gradeados, estará no regimen (sic), no regulamento um tanto
severo, indispensável para um grande número de doentes...".
E receitando "seções diversas" no hospício para que se gradue a liberdade, lembra que "o
excesso de zelo pela liberdade dos loucos pode facilmente degenerar em futilidade...", como diz no livro Hospício e Colônias do Juquery.
O Maia de Santos e do Anchieta não era diferente e, mesmo após a intervenção de 1989, usou este argumento em artigo jornalístico.
O Brasil da contramão da história.
As políticas da ditadura e a
reação antimanicomial nos anos 70
A ampliação dos hospitais e internamentos após o Golpe Militar de 1964 não é senão mais do que uma
coincidência, mas uma identificação com a conjuntura histórica que o país atravessava, de uma tabela beneficiando os empresários do setor da saúde,
que teve um aumento de 599,9% na importação de equipamentos de 1961 a 1971. E da ampliação dos hospitais psiquiátricos – 110 em 1965; 351 em 1978 -
na contra-mão da tendência mundial de desospitalização, com o aumento de leitos e multiplicação da rede privada contratada. Era o reforço do mercado
da loucura.
M.P. Ferraz conta em seu artigo na revista Divulgação para a Saúde Mental no Brasil, em 1991,
com o Brasil vivendo a unificação dos institutos e criação do INPS, cresceram os investimentos em hospitais psiquiátricos - apesar da queda dos
investimentos na saúde de 3,42% em 1963 para 1,07% em 1973. E o movimento social se movimenta em torno da legislação do setor, promovendo discussões
e realizando experiências como a de Santos.
Alguns movimentos governamentais como o Prev-Saúde, Conasp e SUDS promoveram mudanças tímidas, sem dar
conta de especialidades de Saúde Mental, tais como o divórcio da população das opinião dos técnicos e a proximidade dos empresários do setor com o
Governo. As dificuldades econômicas transformam o hospício em albergue.
Mas do movimento pela humanização surgido nos anos 70 como reação às práticas da Ditadura Militar, que
torturava indiscriminadamente e não apenas nos manicômios, na repulsa a um tratamento feito à base de tortura que se expandia, se agregaram
médicos psiquiatras, psicólogos e outros profissionais, intelectuais e estudantes, formando o movimento de que faziam parte os trabalhadores
de Saúde Mental – obrigados a conviver com a barbárie existente e sujeitos aos seus perigos: nele, fabricavam-se loucos, seus companheiros
obrigatórios de trabalho – que se tornavam equipamentos perigosos.
Com as lições da Europa, de Basaglia a Foucault, entre outros, o Movimento Antimanicomial expandiu sua
identidade sob o lema Por uma sociedade sem manicômios. E seguiu promovendo seus encontros: em 1990, a proposta consensual era enfatizar o
atendimento extra-hospitalar nos ambulatórios, nos centros de saúde e na rede de atendimento primária, defendendo-se a internação em períodos
curtos, excepcionalmente.
No momento seguinte, crescem as forças pela desospitalização e inversão das práticas de atendimento
hospitalar. O Ministério da Saúde passa a recusar os pedidos de aumento de leitos nos manicômios.
Os governos estaduais intensificam as inspeções sanitárias, as investigações de maus tratos e ameaças
de fechamento de clínicas por condições precárias, superlotação e existência de celas-fortes.
Em 1990, chega a Declaração de Caracas, produzida pela Conferência Regional para a Reestruturação da
Assistência psiquiátrica no Continente, promovida pela Organização Pan-Americana, que conclama os países signatários a superar o hospital
psiquiátrico como serviço central para o tratamento de pessoas com transtorno ou doença mental, propondo uma rede diversificada e ampliada de
assistência sócio-sanitária, acessível e principalmente eficiente – entre outros pontos. Há um vai-e-vem de ações contra e a favor dos manicômios e
de seus donos.
Em 1992, o Ministério da Saúde lança a campanha Doença mental não é crime, com o propósito de
conscientizar a população contra os preconceitos em relação aos doentes mentais. Há uma meta em acabar com as internações e tratar os pacientes em
ambulatórios. Donos de clínicas privadas e hospitais conveniados se rebelam.
As denúncias crescem. Representantes da Associação Brasileira de Psiquiatria e da Comissão de Direitos
Humanos da OAB, médicos, psiquiatras, diretores e interventores da área de Saúde Mental das secretarias estaduais de saúde acusam as clínicas de
produzirem um estado assustador, com escassez de pessoal técnico por enfermaria, falta de higiene, técnicas violentas, excesso de medicamentos e
prazos acima da média nas internações.
O Ministério da Saúde faz concessões aos movimentos organizados, como a portaria 224/92, que submeteu
os hospitais a normas de atendimento psiquiátrico mais respeitoso aos pacientes e a Norma de Orientação Básica de 1996, que prevê a municipalização
do sistema psiquiátrico e o repasse de recursos federais aos municípios.
Esta só começaria a efetivamente funcionar em abril de 1999, quando o Ministério efetivamente ofereceu
verbas federais aos municípios que assumissem os serviços psiquiátricos até então sob o comando da União e dos estados. Nascem os CAPS e os NAPS, os
hospitais-dia, que fazem a mediação entre o ambulatório e a internação, oferecendo atendimento clínico e psicoterapêutico, lares abrigados e
oficinas terapêuticas, proibindo a reclusão nas celas-fortes.
Os adeptos da desospitalização defendem o deslocamento das verbas para a rede pública, diminuindo-os a
médio prazo e não se movimentando o processo em função do lucro. Os donos de clínicas defendem-se dizendo que estes cortes é que causam as carências
apontadas para o tratamento digno, menos pessoal e alimentação. Era o discurso que o doente mental "não podia ficar desamparado", contra a pregação
pelo fim dos manicômios.
O jogo era fechado: eles, os donos do negócio da loucura, não apareciam, mas faziam lobies
junto aos deputados. Em maio de 1991, a Federação Brasileira de Hospitais apresentou um abaixo-assinado ao Congresso Nacional exigindo o adiamento
por várias sessões do projeto de Lei do deputado Paulo Delgado. Que aprovado no Congresso, foi rejeitado pela Comissão de Assuntos Sociais do Senado
em 1995, fazendo-o voltar à Câmara para emendas e substitutivos.
O
lobie dos manicômios, que dão dinheiro
Em março de 1992, uma manifestação de duzentos familiares movimenta a Câmara Municipal do Rio de
Janeiro contra a redução de leitos nos hospitais psiquiátricos. O lobie se movimenta. O Ministério da Saúde envia ao Congresso um Parecer
Técnico favorável ao projeto de Lei, que diz que ele é "conciso, atemporal, aplicável e, portanto, oportuno", na gestão do Ministro Adib Jatene.
Apesar da convergência entre o Movimento Antimanicomial, grupos da sociedade civil, entidades na área médico-psiquiátrica e autoridades do setor
estatal, não houve a aprovação no Senado.
Denúncias dos trabalhadores da Saúde Mental ameaçam a intervenção no Hospital Dr. Eiras, em Pacambi.
Em 1992, o Fórum Gaúcho de Saúde Mental pressiona e faz aprovar a lei estadual 9.716. E em 1993 é debatido o projeto de lei 336/92, do deputado
estadual do PT Roberto Gouvêa. Que, entre outros pontos, impede a utilização do manicômio para internamento de alcoólatras, destacando ser esta a
primeira lei que trata da questão, que estes devem ficar em clínicas médicas e hospitais gerais.
Existem questões a suprir, não basta fechar o manicômio. O Movimento discute a relação de loucura e
pobreza: manicômio não é abrigo e pobre não pode ser punido com internação perpétua. A sociedade tem que encontrar soluções para a miséria e para a
falta de abrigos para os cidadãos que não se restrinja à hospitalização.
Em 1993, em Salvador, ocorre o I Encontro do Movimento Antimanicomial, sob o tema O Movimento
Antimanicomial como movimento social, e o II em 1995, em Belo Horizonte, sob o tema Cidadania e Exclusão. Nesse ano, diretores e
assistentes sociais da clínica conveniada Dr. Eiras e do Hospital Psiquiátrico do Juquery dizem que os pacientes não tem para onde ir, mesmo após
ter recebido alta.
Em 1996 acontece a Carta de Vitória, produzida pelo Encontro Nacional de Justiça e Doença mental, em
novembro, propondo entre outros pontos a alta progressiva e as saídas terapêuticas, o hospital-noite e o trabalho externo, a ampliação de ações
terapêuticas em novos espaço de ação psico-social.
Em 1997 o III Encontro do Movimento Antimanicomial aconteceu em Porto Alegre e o tema foi Por uma
sociedade sem exclusões, enfrentando um fato que é a dura oposição dos donos de hospitais e clinicas de Saúde Mental.
A integração dos doentes mentais em ambientes sociais (escolas e locais de trabalho) e a autonomia
para decidir sobre a própria internação são temas polêmicos. No relatório desse III Encontro, uma comissão apresentou meios de superar as
dificuldades de moradia e manutenção dos pacientes que deixaram os hospitais psiquiátricos, o Lar Abrigado e a Pensão Protegida.
A solução das pensões protegidas já tinha sido adotada na Espanha e na Inglaterra, com ajuda às
famílias para que possam receber seus membros sem interná-los. Também elaborou-se uma política de subsídios para construção e aquisição da casa
própria pelos usuários e oferta de remédios básicos pelo Ministério da Saúde.
A desospitalização não pode significar o abandono pelo estado dos cuidados médicos-psiquiátricos,
retornando aos padrões de assistência individualista baseados na família. Era necessário chegar a um acordo sobre isso com os familiares, deixando
claro que apenas a assistência estatal não garante a melhoria do atendimento nem da qualidade dos serviços.
A questão não é apenas econômica ou não alcançará sustentação moral. A estrutura tem que ser melhor do
que o manicômio impositor de sofrimento, restabelecendo-se os laços de solidariedade familiar, como defendeu-se em Santos. A maioria dos casos que
chegam aos sanatórios não é de internação, mas de desajuste, pedindo apenas atendimento ambulatorial.
A atenção psicológica integrada às demais modalidades clínicas configura-se como uma
política de assistência considerada mais apropriada e eficiente para tais casos, notadamente para as populações sem recursos para recorrer aos divãs
dos psicólogos particulares.
A lei estadual da Saúde
Mental
Em 2000 é aprovada a legislação proposta pelo PL 336, do deputado Roberto Gouvêa (PT), que trata
especificamente do tratamento que deve ser dado aos doentes internados, extinguindo os códigos de identificação, passando a serem identificados pelo
nome – e que eles tivessem o direito de recusar o tratamento.
O deputado Gouvêa é autor da Lei Complementar que criou o Código de Saúde do Estado de São Paulo, o
primeiro código estadual do país, em que consta uma norma específica para a Saúde Mental que a estipula como último recurso terapêutico.
Novas soluções viriam com a aprovação final da lei do deputado Paulo Delgado e a expansão da
consciência antimanicomial, reproduzindo os exemplos de Trieste e de Santos pelo Brasil, que encontra dificuldades para aprovação no Congresso
nacional devido aos lobies, enquanto que nos Estados as leis vão sendo aprovadas. A causa segue seu caminho, que encontraria seu ápice em
Santos. |