João Carlos de Souza quer custeio das despesas com reforma
Foto: Nirley Sena, publicada com a matéria
Patrimônio
Surpresa e revolta
Donos dos imóveis relacionados no processo de tombamento aberto pelo Condepasa
reclamam por não terem sido comunicados com antecedência. queixam-se também das restrições causadas pela medida
Da Reportagem
Surpresa, indignação e revolta. Foram algumas das
reações dos proprietários dos 12 imóveis que, na última segunda-feira, foram incluídos no processo de tombamento, aberto pelo Conselho Municipal de
Defesa do Patrimônio Cultural de Santos (Condepasa).
A maioria prefere aguardar a comunicação oficial para se manifestar sobre o assunto.
No entanto, é quase unânime a opinião de que o tombamento vai trazer limitações ao uso dos prédios.
"Como vão tombar o meu imóvel? Não estou sabendo de nada. Isso é um absurdo",
desabafou o aposentado João Carlos de Souza, ao ser avisado por A Tribuna que a sua moradia (número 680 da Avenida Conselheiro Nébias) está
na lista dos imóveis em processo de tombamento.
Construído em 1929, o casarão pertence à família da esposa do aposentado desde 29 de
março de 1950. O prédio precisa de reformas pois apresenta sinais visíveis da falta de conservação.
"Se a Prefeitura vai realmente tombar o meu imóvel, então que custeie as despesas da
conservação", reclama Edna Gomes Henriques, que ficou "chateada" com o possível tombamento. "Ninguém nos consultou antes".
O presidente do Educandário Santista, Roberto Ferreira Pinto, também demonstrou
surpresa com o processo de tombamento do imóvel que abriga a instituição. Apesar de desconhecer as implicações da decisão do Condepasa, acredita que
haverá restrições.
"A medida pode ser boa para a Cidade, mas para o Educandário trará prejuízos.
Ficaremos amarrados toda vez que tivermos que fazer uma reforma", explica Ferreira Pinto, ressaltando que a decisão sobre a contestação do
processo será da diretoria.
A entidade também teve outro imóvel incluído no processo de tombamento. O prédio é
ocupado por um colégio particular (veja o quadro).
No Colégio Stella Maris, a informação foi recebida com cautela. De acordo com a
diretora da instituição, irmã Maria Bernardete da Silva, só haverá uma manifestação oficial depois que a medida for discutida com a congregação
responsável pelo colégio.
Abandonado - Nos prédios visitados por A Tribuna, a maioria encontra-se
ocupado por moradia ou atividade comercial ou educacional. Uma das exceções é o da Avenida Conselheiro Nébias, 703, que passa por reforma. Ao final
das obras, o imóvel deverá abrigar uma pizzaria.
O prédio em piores condições fica no número 310 da avenida. Sem telhado e paredes
parcialmente demolidas, o casarão é o retrato do abandono. O mato e o entulho já tomam conta das instalações.
Prazo - A lista traz ainda imóveis ocupados pelo poder público, o que poderá
facilitar o tombamento. A relação engloba os prédios do 6º Grupamento do Corpo de Bombeiros, do 4º Distrito Policial e do Fundo Social de
Solidariedade (FSS), que pertence à Gota de Leite.
Depois de comunicados oficialmente pelo Condepasa, por meio de carta registrada, os
proprietários terão 15 dias para contestar o pedido de tombamento, conforme prevê a Lei nº 753/91. A decisão deverá sair em um prazo de até um ano.
Saiba mais |
O patrimônio cultural, a ser preservado pelo tombamento, consiste em bens móveis e imóveis cuja
importância é de interesse público, da coletividade e da sociedade. Esses bens móveis e imóveis são representativos por seu valor histórico,
arqueológico, artístico, arquitetônico, etnográfico (*) ou mesmo ambiental (bens naturais). Os bens imóveis podem ser áreas de valor ambiental,
edifícios, sítios arqueológicos e monumentos. Os móveis têm como exemplo as coleções de um acervo de museu e objetos de valor artístico, como
bustos, quadros e peças artesanais.
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(*) Relativo ao estudo descritivo de um ou vários
aspectos sociais ou culturais de um povo ou grupo social
Fonte: Condepasa
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Dirigente do órgão garante não haver desvalorização
Imóvel tombado não é sinônimo de desvalorização. Quem garante é o presidente do
Conselho Municipal de Defesa do Patrimônio Cultural de Santos (Condepasa), Bechara Abdalla Pestana Neves.
Neves cita o exemplo do imóvel ocupado pela Caixa Econômica Federal (Caixa), na Rua
Marcílio Dias, na esquina com a orla da praia, no Gonzaga. "A Caixa fez reformas internas e instalou equipamentos modernos. E isso não
descaracterizou ou impediu a utilização do imóvel".
Outro exemplo citado é a Casa do Trem, situada na Rua Tiro Onze, no Centro. O prédio
histórico foi totalmente reformado, ganhando, inclusive, uma escada redonda nas dependências internas. "Todos os prédios tombados podem sofrer
intervenções. Agimos com flexibilidade para que esse uso aconteça".
Quanto à multa aplicada ao dono do Parque Balneário, Neves explicou que a sanção não
se refere à lavagem da fachada do imóvel, mas sim à pintura de um andar sem a autorização do Condepasa.
Ironia - Ao saber das afirmações do presidente do Condepasa, Armando Lopes, um
dos donos do edifício remanescente do Parque Balneário, reagiu com ironia: "Se a Prefeitura diz que o tombamento não prejudica, então arranje um
locador para o meu prédio. Há dez anos não consigo locá-lo".
A mesma opinião tem o advogado Andrey Guimarães Duarte, que defendeu Lopes no processo
que resultou na condenação da Prefeitura, no pagamento de uma indenização no valor de R$ 1 milhão 200 mil. "Pelo aspecto jurídico, até é possível o
uso do bem, mas a realidade fática é bem diferente".
Liberação |
"Todos os prédios tombados podem sofrer intervenções. Agimos com flexibilidade para que esse uso
aconteça"
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Bechara Abdalla Pestana Neves
Presidente do Condepasa
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Em três bairros, preservação se transformou em prioridade
Independente de qualquer obrigação imposta pelo Condepasa, moradores e comerciantes de
bairros do Campo Grande, Marapé e Vila Belmiro investem na conservação de imóveis históricos. Conciliando conservação com modernidade, as reformas
dão um novo colorido às construções.
Na Rua Pedro Américo, 32, no Campo Grande, a comerciante Maria Lúcia Mendes resolveu
investir na reforma do estabelecimento. Toda a parte interna foi reformada, preservando, porém, a fachada do imóvel, que ostenta o ano da
construção: 1926.
Além do rápido retorno comercial, com o aumento da freguesia, o investimento tornou-se
uma referência para o bairro, que abriga outros imóveis com a data do início do século 20.
"Como tenho a formação de arquiteta, fiz questão de manter as características do
imóvel. É um patrimônio que precisa ser preservado", diz Maria Lúcia, que não sabe se a reforma lhe dará direito a benefícios fiscais, como a
isenção do IPTU.
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Reformas dão um novo colorido às construções
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Risco - O exemplo da comerciante é elogiado, mas sofre uma séria concorrência.
Como estão localizados em ruas consideradas nobres para moradia, como a Duque de Caxias, a Teixeira de Freitas e a Visconde de Cairu, por exemplo, a
especulação imobiliária é uma ameaça iminente.
"Se nada for feito, a tendência é de que esses prédios sejam todos demolidos, para a
construção de apartamentos", alerta a comerciante Cleide Barbosa da Silva, dona de um bar em um prédio de 1923, na Rua Duque de Caxias, no Campo
Grande.
Lista do Condepasa
Em processo de tombamento - prédios
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Fotos: Nirley Sena
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6º Grupamento do Corpo de Bombeiros
Av. Conselheiro Nébias, 184 |
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Clínica de Repouso São Miguel Arcanjo
Av. Conselheiro Nébias, 188/190
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4º Distrito Policial
Av. Conselheiro Nébias, 258 |
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Casarão (sem ocupação)
Av. Conselheiro Nébias, 310
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Casarão
Av. Conselheiro Nébias, 361 |
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Fundo Social de Solidariedade
(Gota de Leite)
Av. Conselheiro Nébias, 388
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Casarão (moradia)
Av. Conselheiro Nébias, 586 |
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Educandário Santista
Av. Conselheiro Nébias, 680
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Colégio Positivus
(prédio de propriedade do Educandário Santista)
Av. Conselheiro Nébias, 686 |
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Casarão (em reforma)
Av. Conselheiro Nébias, 703
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Colégio Stella Maris
Av. Conselheiro Nébias, 771 |
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Casarão (moradia)
Rua da Constituição, 278
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Capitania dos Portos (*)
Av. Conselheiro Nébias, 488 |
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Estação Elevatória da Sabesp (*)
Esquina da Av. Conselheiro Nébias com a Av. Campos Sales
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(*) Obs.: O antigo prédio da Capitania dos
Portos e a Estação Elevatória da Sabesp já estavam em processo de tombamento
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Fonte: Condepasa
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Tire suas dúvidas |
1) O que é tombamento?
É uma ação do poder público que tem a finalidade de proteger um bem de interesse
coletivo de ser destruído, demolido, descaracterizado ou desfigurado.
2) Quais os critérios para o tombamento?
O bem pode ser tombado pelos aspectos históricos, arquitetônicos e afetivos. Não
precisa ser, necessariamente, um imóvel "antigo".
3) Quem pode pedir o tombamento?
O pedido de proteção pode ser feito por qualquer cidadão, abrindo-se um processo
minucioso, que analisará os aspectos históricos, arquitetônicos e afetivos do bem.
4) Quem decide pelo tombamento?
A decisão será do Condepasa (municipal) ou Condephaat (estadual), através de votação
dos membros do conselho.
5) Que outras implicações resultam do tombamento?
Com o tombamento, fica criada uma área envoltória de proteção com até 300 metros de
raio em torno do imóvel tombado.
6) O proprietário do bem tombado perde o imóvel?
O tombamento não tira o direito de propriedade do bem. Também não é uma
desapropriação. O proprietário continua utilizando o imóvel.
7) É possível fazer reformas em imóveis tombados?
Sim. O proprietário, porém, deverá comunicar, previamente, ao conselho toda e
qualquer modificação, reforma, restauração que pretenda fazer no imóvel tombado ou em processo de tombamento.
8) Há sanções para o descumprimento?
A não observância desses requisitos implica medidas penais previstas em lei. A multa
pode chegar até 50% do valor do imóvel.
9) Existem benefícios para os imóveis tombados?
O proprietário de um bem de interesse cultural que o mantiver em boas condições pode
requerer benefícios fiscais e urbanísticos, como a isenção do IPTU. |
Fontes: Condepasa e Condephaat
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