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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - PROCISSÕES - 9
Procissão de São Benedito

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Registrou em 5 de maio de 1930 o jornal santista A Tribuna (ortografia atualizada nesta transcrição):


"Aspecto da Procissão de São Benedito, ontem realizada"
Legenda e foto publicadas com a matéria

As solenidades de ontem, em louvor a São Benedito

Revestiram-se de brilhantismo as solenidades mandadas celebrar, ontem, no Convento de Santo Antonio do Valongo, pela Irmandade de S. Benedito, em louvor de seu patrono.

Às 7,30 horas, com o templo repleto de pessoas devotas, foi rezada missa, com comunhão geral, tendo sido distribuídas aos que participaram do banquete eucarístico lembranças da festa.

Às 15 horas, saiu do Convento de Santo Antonio do Valongo a imponente procissão de S. Benedito, à qual se incorporaram várias irmandades e associações religiosas.

A procissão, abrilhantada pela banda do Corpo de Bombeiros, percorreu o seguinte itinerário: ruas de São Bento, Visconde de Embaré, Praça dos Andradas (ao lado da cadeia pública), ruas Amador Bueno, D. Pedro II, General Câmara, Praça Rui Barbosa e Rua do Comércio, recolhendo-se novamente ao Convento de Santo Antonio.

Após pequeno descanso, realizou-se solene "Te Deum", ocupando a tribuna sagrada, para fazer o panegírico do santo festejado, o reverendíssimo cônego Oscar Sampaio, terminando a solenidade com exposição e bênção do Santíssimo Sacramento.

- Logo que terminou a missa, várias irmãs, acompanhadas do reverendíssimo cônego Oscar Sampaio, com permissão do dr. Aguinaldo Góes, delegado regional de polícia, fizeram uma visita aos detentos da cadeia pública, oferecendo, aos mesmos, doces, cigarros e pequenas lembranças da festa.

O assunto foi tratado pelo professor e pesquisador de História Francisco Carballa, em artigo enviado a Novo Milênio em 12 de maio de 2013:

Procissão de São Benedito

O santo que se chama Bento, Benito, Bendito ou Benedito é de linhagem nobre etíope. Viveu em Palermo, na Itália, e lá entregou seu espírito para Deus em 1589 d.C., e seu corpo ainda pode ser visto nos dias de hoje pois está incorrupto de forma natural
[01].

Rapidamente, no Brasil, começou uma devoção pelo santo, curiosamente pelos europeus, depois pelos nativos e finalmente pelos negros africanos. Quando foi canonizado, em 1804, já tinha em seu nome dedicadas muitas irmandades, capelas, igrejas e altares por todo o Brasil, honra cabível somente a quem era reconhecido pela Igreja como exemplo cristão e canonizado.

Na paróquia do mesmo nome, em Santos, está a Irmandade de São Benedito, ereta na igreja de Santo António do Valongo em 1780 para atender a evangelização dos africanos da região; quando saíram do Valongo, próximo da década de 1930, ocuparam - por pedido e licença concedida - a Igreja de Santa Cruz, que, segundo referências do clero ali instalado, foi construída em 1902
[02].

Ainda hoje podemos visitar, na Avenida Senador Feijó nº 444 - onde ainda se mantém, em memória e por pedido dos comerciantes do lugar -, uma imagem do santo em um nicho lateral.

A Irmandade teria saído de lá devido a uma pendenga de sacristia que ocorreu entre os irmãos e os padres camilianos quando quiseram comandar os sepultamentos e favorecer benfeitores da Ordem e tomar posse dos bens da Irmandade nos anos 1950. A questão culminou em 1956 [03] com a saída da irmandade de lá: eles tiveram por destino um terreno doado na Avenida Afonso Pena nº 350, onde permanecem até hoje, tendo a pedra fundamental da igreja ali ereta sido benzida em 1957. Hoje, é a Paróquia de São Benedito.

Sobre o dia do traslado da irmandade, conta o senhor Clóvis Benedito de Almeida, que na época era atuante na Irmandade. Ele e sua família não acompanharam a procissão de traslado, mas ficou com o pai e irmãos próximo da igreja (onde hoje é a loja H.Quintas), "pois estava muito cheio de gente e não se conseguia chegar até a igreja". Ele recorda ainda que, nesse dia, os bondes pararam de passar em frente ao local
[04].

A procissão saiu à tarde, lá pelas 15 horas, devido ao povo que se aglomerava no local, mas era para sair uma hora antes. Junto às irmandades convidadas foi o bispo de carro, seguindo pela Rua Senador Feijó até a Carvalho de Mendonça, onde a procissão virou para a Avenida Washington Luís; daí Clóvis voltou pra casa com seus pais, pois estava garoando. Os comerciantes choravam, assim como os moradores que não queriam que o São Bendito saísse dali [05].

Foi uma portuguesa que doou o terreno na Avenida Afonso Pena, onde fizeram uma capela de madeira (chamada de barracão pelo povo), ali colocando a imagem do santo. Clóvis recorda que um provedor, de sobrenome Trindade, "muito lutou pelo ideal de terem sua própria sede em 1956".

A procissão sempre ocorreu no primeiro domingo de maio, havendo um intervalo de alguns anos em que foi realizada no domingo mais próximo do dia 13 de outubro (o dia de São Benedito assim figura em calendário organizado pelo papa João Paulo II, pois sua festa era móvel ocorrendo na terça feira de Páscoa justamente no dia do seu falecimento - que no entender da fé seria o dia em que nasceu para a vida verdadeira no céu).

Ainda hoje ocorre uma cerimônia idêntica aos anos anteriores, em que as Irmandades de São Benedito  de outros locais (na maioria integrantes da CONISB
[06]) são recebidas e todos fazem uma prece de agradecimento, em seguida tomando um farto café comunitário, sempre antes da missa da manhã, para a qual outras irmandades da cidade também são convidadas.

Ocorre a missa festiva da tarde, que antes era às 18 horas, depois às 17 horas e mais recentemente passou para as 16 horas; assim, as irmandades visitantes retornam mais cedo ao seu lugar de origem. Após a missa sai a procissão, ao toque dos pequenos sinos da igreja: na frente vão as irmandades com suas opas, seus estandartes e as insígnias, vindo a seguir uma relíquia levada pelo pároco debaixo de um pálio de seis varas branco, depois um carro que leva o pesado andor de São Benedito (com a imagem adquirida no final dos anos 1950 para não usar a original, que é colonial e de madeira), e finalmente vem o povo em massa, embora no passado fosse a banda que fechava o cortejo.

Segue a procissão pela Avenida Afonso Pena e pelas ruas atrás da igreja até retornar à mesma, e em sua porta ocorre uma grande queima de fogos. Depois, ao som da banda e dos sinos, a imagem é recolhida para o interior da Igreja - entrando de costas conforme o ritual, pois assim, na cultura popular, o santo se despede do povo.

Havia um grande estandarte chamado de guião que, até o início dos anos 1970 (aproximadamente 1974), era usado pela irmandade, tendo cerca de três metros de altura. Segundo Clóvis Benedito de Almeida, a peça era confeccionada em tecido gorgorão branco, enfeitado com galões dourados e terminado nas duas pontas e nos dois cordões com borlas douradas. No centro do guião, a figura bordada (em estilo bem antigo) de São Benedito segurando uma cesta de flores, para recordar o milagre das flores
[07], inclusive cantado em um hino. Para conduzir aquele grande estandarte era necessário um grupo de cinco pessoas.

Outro costume que se manteve até o inicio dos anos 1970 foi o levante do mastro que na ponta tinha uma chapa bem dura onde estava pintada a figura de São Benedito segurando a criança do milagre [08]. Consta que a irmandade usava opa branca com a musseta negra, cor também aplicada aos veleiros, mas na metade dos anos 70 um pároco muito ligado à Teologia da Libertação jogou fora lanternas, veleiros e o famoso guião, para tristeza dos irmãos daquela Ordem.

Jaculatória e Hino de São Benedito

Benedito Santo de Deus amado;
Sede no céu nosso advogado.

Todos vos pedimos que nos alcanceis;
Favores e graças que tudo podeis.

Benedito Santo de Deus.........

Se nos conseguirdes que vos imitemos;
Na vida e na morte, felizes seremos.
Benedito Santo de Deus.........

Hino São Flores

01

Meu glorioso, São Benedito;
Com os famintos partia o pão;
E quando os frades lhe perguntavam,
O que levais, bondoso irmão.

São flores, são flores e em flores se tornarão;
São flores, são flores e em flores se tornarão;

02

Assim os bens, que Deus nos dá,
Se repartidos flores serão;
Que a vida amarga, triste e sofrida;
Dos desvalidos enfeitarão.

São flores, são flores...................

03

Também são flores o amor e a paz;
Que vou semear nos corações;
Dos pequeninos e oprimidos;
Sedentos de libertação.

São flores, são flores...................

04

São Benedito é amparo e guia
De seus irmãos de negra cor;
E por nos todos devotos seus;
Sempre intercede junto ao Senhor.

São flores, são flores...................

 


Notas:

[01] Assim considerado pela ciência quando, no corpo, o coração não entrou em processo de decomposição, sendo este o primeiro órgão que se decompõe e o último que se queima quando é cremado. Existem os corpos "que se conservam incorruptos", mas por intervenção humana.

[02] O curioso título "de Santa Cruz" é geralmente empregado quando existia o costume de se levantar uma capela, igreja ou ermida no local de um crime, acidente ou morte de uma pessoa muito querida. No caso deste templo, entretanto, não ficaram referências sobre o homenageado. A pessoa mais importante vitimada por um crime em suas proximidades foi Casimiro Alberto Matias Costa, em 1889.

[03] Consta que em 1956 ainda a capela de Santa Cruz que era conhecida por Capela de São Benedito, ali ocorrendo a festa do padroeiro em 6 de maio de 1956.

[04] O bonde da linha 6, que ia e voltava pela mesma via na contramão, pois só havia um par de linhas de trilhos assentada no chão.

[05] Passaram a evitar frequentar aquela capela que, segundo as pessoas diziam, resultou de um acordo entre o bispo e os camilianos para tomar posse do lugar, para isso tirando a dita irmandade de lá. Talvez seja esse um dos motivos pelo qual a igrejinha caiu por muito tempo num quase esquecimento.

[06] Conferência Nacional das Irmandades de São Benedito.

[07] Estando próximo de sua morte, disse aos frades de Palermo que iria morrer sozinho. Estes saíram para suas ocupações pastorais; de retorno encontraram-no deitado em seu leito e todo rodeado de cestas de lindas flores, sendo que não era época delas e algumas não eram conhecidas ali.

[08] Quando estava sendo realizada uma missa, uma carruagem atropelou uma criança e assim o povo saiu da igreja para ver o ocorrido; o santo, ao também sair e ver o desespero da mãe, tomou a criança em seus braços e começou a acalentá-la; de repente, ouviram um choro e ela - que estava morta -, foi entregue viva para sua mãe; em seguida, o santo convidou o povo a retornar para a missa.

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