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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - KRIKRI
(3) Nomeação oficial pelo prefeito nomeado

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O concurso ganhou força, e no Aquário Municipal o número de visitantes também aumentou bastante. No dia 11/7/1977, já se registrava o início da adaptação da foca ao novo ambiente, começando a se alimentar. Nesse dia, porém, a surpresa: o prefeito nomeado para o município pelo regime militar que então governava o Brasil, Antonio Manoel de Carvalho, anunciava ter decidido que a foca se chamaria Farofeiro, mesmo sabendo que esse rompante autoritário - que visava desmontar o concurso promovido por um jornal que lhe fazia oposição política - estaria prejudicando muitos santistas que já participavam da promoção com sugestões de nomes. Esse episódio foi registrado pelo depois editor de Novo Milênio, em matéria publicada no dia 12/7/1977 no Cidade de Santos:


Prefeito nomeia foca ( publicado no jornal Cidade de Santos em 12/7/1977)

O prefeito já nomeou a foca

Apesar da grande receptividade que vinha obtendo - em especial junto às crianças - o concurso promovido pelo CIDADE DE SANTOS e pelo Aquário Municipal, para batizar a foca encontrada há dias próximo à Dow Química, em Guarujá, o prefeito Antonio Manoel de Carvalho decretou, ontem, o batismo do animal, denominando-o Farofeiro, nome que não constava de nenhuma das sugestões recebidas por este Jornal.

O batismo ocorreu ontem à tarde, em seu Gabinete, ao receber a Imprensa. O prefeito, atribuindo a sugestão do nome a um grupo de turistas que esteve visitando o Aquário domingo, anunciou: "não tem nada desse troço de concurso. É Farofeiro e acabou". Após afirmar que o nome de sua preferência, entretanto, era outro, o chefe do Executivo sacramentou a escolha, elogiando o bom humor dos turistas: "concordo plenamente com esse nome. Está decidido e pronto!"

Embora agradando a um grupo de turistas - a ser verídica a versão de que o nome Farofeiro foi sugerido por forasteiros, domingo - o chefe do Executivo frustrou dezenas de crianças santistas, o grande contingente eleitoral que vinha enviando sugestões ao CIDADE DE SANTOS e, mais uma vez, ao mesmo tempo, impediu que a população - ou parte dela - se manifestasse.

Apesar do decreto batismal, o prefeito não anunciou se pretende oficializar a denominação, em cerimônia no Aquário.

Antes do encerramento, era grande o sucesso que o concurso vinha obtendo e grande número de cartas estava chegando à redação deste jornal, com sugestões para o nome da foca-macho, que foi colocada no tanque ao ar livre existente no Aquário Municipal de Santos, juntamente com o leão-marinho Macaé e três tartarugas-gigantes.

Embora, inicialmente, a foca não se alimentasse, devido a problemas normais de ambientação, a presença brincalhona de Macaé está levando a foca a se ambientar rapidamente, e antes mesmo do previsto, e esse animal começou a comer os peixes que os tratadores do Aquário lhe dão. Também já está curado o ferimento na boca, produzido pela rede usada na captura, e o mamífero vem reagindo muito bem ao novo ambiente.

Enquanto isso, grande número de pessoas continua afluindo ao Aquário, para conhecer a nova atração, e esse interesse também é demonstrado pela quantidade de cartas que continua, diariamente, chegando à redação deste jornal. A escolha seria realizada no dia 15, por uma comissão de membros do Cidade de Santos e o administrador do Aquário, Arnaldo de Oliveira, sendo aquele mamífero batizado no domingo, dia 17 de julho, com a presença do autor da sugestão vencedora. Entretanto, devido à arbitrária medida adotada pelo alcaide nomeado, o concurso foi cancelado.

As crianças sugerem - Divulgamos hoje as sugestões enviadas a este jornal, com a justificativa e nome do autor, em seguida:

Alberto Roberto - "porque agora ele é o astro, o máximo, o excesso; os outros habitantes do Aquário são figuração" (Rachel Cândida Soares Garcia);

Balanoglossus (sem justificativa - significa: protozoário que vive enterrado na areia, segundo dicionário de Aurélio Buarque de Holanda) - telegrama enviado por Franky - da avenida Floriano Peixoto, 67, apartamento 913;

Chaplin - porque a foca é brincalhona e por ser solitária (Terezinha Aparecida Rodrigues);

Dino - nome pequeno, bonito e de um animal de grande estima para Fred Flintstone, personagem de um desenho-animado da TV (Edemir Rodrigues);

Dino Cézar -  "porque assim como o Dino da novela, ele chegou e abafou. É assunto corrente na cidade. E além do mais é bonito e charmoso como o cantor" (Rachel Candida Soares Garcia);

Dowk - devido ao local onde apareceu, próximo à indústria Dow Química (Walmir Gomes, de Vicente de Carvalho - Paicará);

Dow - também devido ao local onde foi encontrada (Raphael Luiz Junqueira Thomaz, de São Paulo, participante do IV Encontro de Procuradores Municipais, ocorrido em Santos, na semana passada);

Encontro - por ter sido a foca encontrada durante a realização do IV Encontro de Procuradores Municipais (sugestões de Maria de Lourdes Junqueira Thomaz, de São Paulo, também participante desse congresso);

Flipper - lembrando o personagem de um filme de televisão (Nilza Rodrigues, 11 anos de idade);

Fofinho - "nas fotos que eu vi no jornal, a foca é fofinha, gorducha e vai fazer a alegria das crianças que a forem ver. É um nome simpático, que qualquer criança, mesmo as mais pequenas, não terá problema para pronunciar" (Ana Maria Santos dos Passos, de São Paulo, 10 anos de idade). Maria do Carmo Veiga Tierro envia a mesma sugestão, "porque é gordinho, engraçadinho e é uma coisa fofa";

Joca - "por ser um nome gozador e alegre, que combina com focas-macho" (Evanize Rodrigues);

Marco Polo - sem justificativa (David Richter, comerciante);

May Towr - lembrando um filme-desenho da televisão (Simone Dutra da Graça);

Papillon - "por ser um fugitivo de sua casa natal e, atualmente, uma atração turística, sendo que o mesmo não queria ser adotado ou acostumado à sua nova casa, em que viverá o resto de sua existência" (Eduardo Rodrigues);

Gibão - sem justificativa (Pedro Miguel Damaceno - Cubatão);

Sântar - por ser um animal super-inteligente (José Cardoso);

Tremendão - lembrando uma marca de arroz "muito gostoso e que rende bem mais que os outros" (Herminda Alves Carvalho);

Vadinho - lembrando um personagem do filme Dona Flor e Seus Dois Maridos, também boêmio como a foca, alegre e brincalhão (Josefa Mônica Santana).

Carlos Alberto Pereira da Silva envia dois nomes: Lorina - lembrando o navio encalhado, "porque os dois chegaram de surpresa", e Pedro Di Lara, porque é muito parecido".

Também a redação - O concurso também despertou grande interesse na redação do Cidade de Santos, com os jornalistas indicando diversos nomes. Entre eles, Abissair Rocha (da coluna Quebrando o Sigilo), "pela lembrança que me traz de um investigador de polícia, cujo apelido é Santão, sugiro que o mamífero receba o mesmo nome, isto é, Santão". Outro jornalista, Francisco Aloise Ferreira, sugere o mesmo nome, "pela esperteza que a caracteriza. Porém, se a mesma for infernal como dizem, a sugestão seria Bebê Diabo". (N.E.: a referência é a um colega que estava se formando como jornalista, Edison Carpentieri, que já nos tempos de faculdade era conhecido como Bebê Diabo - lembrando que todo jornalista iniciante também é conhecido como foca).

A redação ainda sugere: Lorino, Corintiano, Bonitão, Cláudio Coutinho, Excelsior, Geraldão, João Bobo, Idi Amin, Dadá, Xuxu, Fofoca, Juliano, King-Kong, Flop, Floquinho, Falcão, Focão, Alcebíades, Meningexerxes, Focadélica, José Bonifoca, Fóc-fóc, Fofura, Fócrates, King-foca, Fifo.

As últimas antes do ato - Até o momento em que surgiu a bomba do encerramento do concurso pelo burgomestre, continuavam chegando cartas com sugestões para o nome da foca, e mesmo depois dessa decisão, da qual a redação tomou conhecimento às 15h30, mais cartas foram chegando. Estas eram as sugestões enviadas:

Lúcio - "porque Lúcio é o nome de um peixe" (Lúcio José da Silva);

Boa Vinda - sem justificativa (Manoel Pereira Nunes);

Dona Xepa - sem justificativa (Ana Leonilda Rocha Weins);

Netuno - "Netuno é o nosso Deus do mar e o que a trouxe para embelezar o nosso Aquário foi o mar. Então, eu acho que sendo Netuno, ele representará o Deus do Mar, o Mar e a nossa cidade. E também por ser uma foca-macho. Mas ficará a cargo de vocês a escolha" (Marta Janete de Faria - morro do Pacheco, ligação 62, Valongo).

Waldenei - Menção especial deve ser dada a Waldenei Gonçalves de Barros - da Rua Cunha Moreira, 197, apartamento 3 - que enviou dez bonitas cartas, com nomes e justificativas, que bem demonstram seu interesse:

Rock - "porque eu tenho um laboratório de Pesquisas, porque mais tarde eu quero ser um zoólogo. Então eu comprei um casal de porquinhos da Índia e um deles, o macho, era seu nome Rock. Mas daí, uma vez mais a minha mãe chegou para dar os porquinhos, novamente. Mas eu estudei eles";

Lord - "esse nome foi de um cãozinho que eu tive, criei ele desde pequeno, a raça dele era Rife. Quando ele tinha 3 anos a minha mãe deu ele. Deu porque saltava muita pulga. E nesse dia que ela deu eu comecei a chorar muito, muito, muito mesmo. Vocês sabem o que é criar uma coisa que seja de estimação, desde pequena, e quando fica um pouco maior uma pessoa chega e dá essa coisa? Dói muito";

Rane - "esse nome surgiu quando eu fui à praia jogar bola e um colega do meu colega apareceu para jogar também";

Krikri - "eu dei esse nome porque achei simples e fácil de falar";

Fred - "por causa do programa dos Flintstones que dá depois do Mundo Animal";

Lutz - "esse nome foi escolhido por mim, no dia em que eu estava fazendo um laço de lutz para apanhar cobras, foi então que surgiu o nome";

Béker - "esse nome foi por causa que onde eu estava escrevendo, olhei para a minha mesa de experiência e vi o meu copo de Béker";

Fujão - "por ter ele saído do Habitat dele";

Homo - "foi, acho, quando eu vi a chave de classificação de animais na parede do meu laboratório"

Hérnie - "surgiu esse nome quando eu estava vendo na TV o filme A Família Robinson e um dos garotos se chamava Hérnie. Foi daí que eu tirei o nome. Espero que aceitem uma das cartas que remeti, porque deu muito trabalho para fazê-las e custou dinheiro".

Essas foram as cartas enviadas até ontem, quando a medida do burgomestre veio acabar com o que já se tornava uma eleição de grande alcance e interesse, não só nesta cidade, mas também em Vicente de Carvalho, Cubatão e São Paulo, e mais uma vez, o alcaide vem frustrar inúmeras criancinhas, como Waldenei Gonçalves de Barros, restando à população santista a tristeza de ver, mais uma vez, a autoridade nomeada abusando de seu poder para ferir a democracia, que diz defender, cujos princípios básicos dão "do povo, para o povo, pelo povo".

A redação do CIDADE DE SANTOS sente-se como Waldenei, endossando seu pensamento quando justificou o nome Lord para a foca, a qual, afinal, não merecia receber nome como esse - Farofeiro - que envergonha uma cidade que, afinal, dizem ser a "Terra da Caridade e da Liberdade".


A foca já tem nome, escolhido pelo prefeito (publicado no Cidade de Santos em 12/7/1977)

Mas o concurso não terminaria assim. Na mesma edição, a coluna Política/Bastidores publicava a nota:

"Noé e sua arca - Depois de presenciar desolado os últimos acontecimentos envolvendo animais em Santos, como o incêndio do gorila (boneco) King Kong na praça da Independência, a captura de uma foca-macho (já apelidada de Farofeiro) no Estuário e a apreensão dos cachorros, na praia, determinada pelo prefeito, o vereador Noé de Carvalho dizia ontem que vai construir uma arca, igual à do meu xará, com 150 metros de comprimento, 25 de largura e 15 de altura. Mas não vou encher de animais, não; vou é colocar gente que está precisando sumir do mapa e jogá-la em alto mar. E olha que precisa dar muitas viagens, para conseguir limpar essa terra".

No dia 13/7/1977, o jornal Folha de São Paulo publicou, no caderno Folha Ilustrada, a nota, curiosamente transferindo a gestão do prefeito santista Antônio Manoel de Carvalho para o município vizinho de Guarujá...:

"Acabou a brincadeira! A foca é minha"

Uma foca foi encontrada no Guarujá, durante o IV Encontro dos Procuradores Municipais, e levada para o Aquário Municipal de Santos. As crianças, que sempre gostam de dar nomes aos bichos, começaram a escolher um para a foca. É uma foca macho, daí os nomes masculinos. O jornal Cidade de Santos e o próprio aquário promoveram um concurso para a escolha do nome. Chegaram à redação milhares de cartas, inclusive de outros Estados. O vencedor seria conhecido no próximo dia 15 e o batizado dia 17, com uma festa. Foi aí que chegou o prefeito de Guarujá, Antônio Manoel de Carvalho, e acabou com a brincadeira das crianças: "Não tem nada deste troço de concurso. Ele foi encontrado no Guarujá e sou eu quem dou o nome. Vai se chamar Farofeiro e pronto" - Jorge Gonzalez Cordero.

Também no dia 13, a coluna Bastidores/Política do jornal Cidade de Santos voltava à carga, na página 2:

A foca e as fofocas - Sem dúvida, a foca, nova atração do Aquário Municipal, foi o principal assunto discutido ontem na Câmara, principalmente depois que o prefeito a denominou de Farofeiro - nome que, aliás, não agradou ninguém, com exceção do vereador emedebista Moacir de Oliveira, que disse: "Acho que esse nome é bom". Para Washington Mimi Di Giovanni, que é membro da Sociedade Protetora de Animais de Santos e um dos mais contundentes defensores dos cachorros que o prefeito quer prender, o nome ideal para a foca é Bagunça "porque eu tinha uma jaguatirica que fazia a maior bagunça em casa e como as focas domesticadas fazem de tudo, esse nome caía bem melhor que Farofeiro", disse Mimi, que afirma não perder o programa Mundo Animal na televisão, "e, por coincidência, hoje (ontem) o programa todo foi sobre focas e leões-marinhos".

A foca e as fofocas - Todos os vereadores condenaram a atitude do prefeito em dar um nome à foca, quando este jornal e a direção do Aquário realizavam o concurso Dê um nome à foca, privando assim os santistas, e principalmente as crianças, de participarem da promoção. Indagado sobre o assunto, o vereador Rubens Lara, líder do MDB, limitou-se a balançar a cabeça e dizer: "Sem comentários...". Paulo Pimentel (MDB) e Ely de Carvalho (Arena) também não quiseram entrar no mérito da questão, enquanto que um dos vice-líderes do MDB foi mais audacioso: "Ora, é lamentável que num momento em que o município perde uma Cosipa-2, enfrenta um sério problema com a poluição e outros por aí, as autoridades estejam interessadas em pegar cachorro e dar nome a foca. Sinceramente, não dá para entender", destacou o emedebista.


Charge do cartunista J. C. Lôbo publicada em 13/7/1977 no jornal Cidade de Santos)

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