O promotor e o fundador do Lloyd Italiano, o Sr. Erasmo Piaggio, havia sido durante 9 anos (de 1894 a 1903) diretor de operações da NGI e, ao deixar essa última empresa, decidiu
criar sua própria companhia de navegação. Para tanto, conseguiu obter o apoio financeiro e político de uma série de personagens importantes do cenário social da Itália e, em novembro de 1904, em
Gênova, no Palácio Doria da Praça Príncipe, foi assinado o ato de cartório que dava nascimento ao Lloyd Italiano.
O Lloyd Italiano de 1904 não deve ser confundido com outra empresa italiana de navegação de mesmo nome, também fundada em Gênova e que teve vida relativamente curta, de 1871 a 1877.
Como presidente do Conselho de Administração foi nomeado Erasmo Piaggio, e como diretor geral o comandante Dionigi Biancardi. Cabe notar que o Lloyd Italiano foi a primeira empresa de navegação moderna fundada na
península itálica com capital exclusivamente italiano, e que Erasmo Piaggio era descendente de Rocco Piaggio, fundador de uma das primeiras empresas de navegação da Itália.
Encomendas - Em 1905, o Lloyd Italiano obteve a licença governamental para transportar emigrantes e, naquele ano, recebeu do estaleiro naval de Riva Trigoso o seu primeiro navio, o
Florida, de 5.156 t.a.b. No mês de setembro ele realizou a primeira viagem da companhia, entre Gênova e Buenos Aires.
O Florida receberia companhia na forma de outros cinco navios, que foram batizados Indiana, Mendoza, Luisiana, Virginia e Cordova, todos construídos em Riva Trigoso, com
exceção do segundo e do último acima mencionados. Os navios do Lloyd Italiano tinham na chaminé as cores amarela e preta, esta última pintada no bordo e em uma faixa estreita abaixo do bordo.
Dois anos depois de sua formação, o Lloyd Italiano transportaria, em 1906, com seus seis navios, 18.500 passageiros na linha para o Brasil e o Prata, e mais 20 mil na linha para a América do Norte. Tais números
faziam do Lloyd Italiano a terceira mais bem sucedida companhia com saídas de portos italianos (depois da NGI e do NordDeutscher Lloyd).
Em dezembro de 1907, as empresas italianas NGI, La Veloce e "Italia" assinaram um acordo de participação no aumento de capital do Lloyd Italiano e foram assim compradas 35 mil ações, que - somadas às 25 mil já em
poder da NGI por compra anterior - fizeram desta última a proprietária, por maioria do capital social, do Lloyd Italiano.
O desastre do Principessa Mafalda foi o maior jamais ocorrido nas costas brasileiras
Transatlânticos - Este aumento de capital proporcionou ao Lloyd Italiano a ocasião de ordenar, ao seu construtor naval preferido, dois navios transatlânticos de passageiros que deveriam ser os mais rápidos e
os mais luxuosos de todos os existentes na marinha mercante italiana.
Estes navios receberiam os nomes de Principessa Iolanda e Principessa Mafalda. O primeiro nem chegaria a navegar, pois, lançado ao mar em 22 de outubro de 1907, adernaria sobre o flanco de bombordo
tão logo entrou na água após deslizar na rampa de lançamento. Todas as tentativas de recuperá-lo, feitas pelo estaleiro construtor, foram em vão, e o Principessa Iolanda foi demolido in situ.
O segundo transatlântico deslizou ao mar sem incidentes no dia 22 de outubro de 1908, levando pintado na proa o nome de Principessa Mafalda, numa homenagem à filha do rei da Itália. O navio era, até então, o
maior construído na Itália e o seria até depois da Primeira Guerra Mundial.
Na denominada Ponte Passeio se encontravam todos os salões das classes de luxo e primeira, a segunda classe dispunha de locais à popa do navio e a terceira, nas duas partes inferiores. Os serviços da classe de luxo
e primeira eram fornecidos e controlados por pessoal pertencente aos grandes hotéis Excelsior (Roma) e Nacional (Lucerna, Suíça).
O Principessa Mafalda era dotado de 28 embarcações de salvamento no total, das quais 18 eram lanchas salva-vidas e 10 eram balsas de borracha. Além disso, possuía a bordo 80 bóias redondas de salvamento. O
transatlântico tinha certificado de registro marítimo italiano de 1ª classe válido até 24 de maio de 1929.
O Principessa Mafalda saiu de Gênova no dia 30 de março de 1909 para sua viagem inaugural com destino a Buenos Aires (via Nápoles, Barcelona, Rio de Janeiro, Santos e Montevidéu) sob o comando do
capitão-de-longo-curso Renzo Durant della Pene, ex-oficial comandante da Marinha de Guerra Italiana.
Em março de 1910, o senador Erasmo Piaggio apresentou sua demissão ao Lloyd Italiano, após fracassar na tentativa de recuperar, da NGI, o capital majoritário de sua empresa. O novo diretor-presidente seria o conde
Gerolamo Rossi-Martini.
Primeira Guerra - Em agosto de 1914, eclodiu o primeiro conflito mundial, e logo após a declaração de guerra, no dia 22 do mesmo mês, o Principessa Mafalda zarpou de Gênova com destino a Nova Iorque,
levando de volta a seu país cerca de 400 cidadãos americanos que se encontravam na Europa, surpreendidos pelo início das hostilidades. Esta viagem seria a única realizada pelo Principessa Mafalda no Atlântico Norte.
De retorno de Nova Iorque, o transatlântico foi destinado a servir de navio-hotel aos oficiais da Marinha Italiana que prestavam serviço na base naval de Taranto (Sul da Itália) e, nessa condição de imobilização,
permaneceu até 1918 e o fim do conflito. Nesse mesmo ano, no dia 18 de março, foi decidida a liquidação dos ativos do Lloyd Italiano e a fusão dos mesmos com a companhia proprietária, que era a NGI.
Desta decisão, o Principessa Mafalda passou para as cores preta e branca da NGI e, logo após o término da guerra, foi reformado e de novo colocado em serviço na Rota de Ouro e Prata, fazendo em média 12
viagens redondas por ano, entre Gênova e Buenos Aires.
Acidente raro - Tendo levantado âncoras do porto de Gênova no dia 11 de outubro de 1927, com destino à América do Sul - e levando a bordo 977 passageiros e 287 pessoas da tripulação -, o Principessa
Mafalda encontrou o seu fim no dia 27 do mesmo mês, naufragando a cerca de 300 milhas marítimas da costa da Bahia, na posição coordenada de 16º 48' de latitude Sul e 37º 41' de longitude Oeste.
O naufrágio ocorreu devido à ruptura do eixo porta-hélice de boreste do navio e à penetração de água através do próprio tubo do eixo - acontecimento muito raro na técnica e história marítima, sobretudo se
considerarmos que o eixo porta-hélice em questão havia sido revisado pelos técnicos do Registro Italiano (autoridade competente de inspeção naval) em fevereiro de 1926.
O acidente técnico ocorreu em pleno cair da noite, o que dificultou a obra de salvamento; embora o navio permanecesse flutuando até as primeiras horas da manhã, várias lanchas de salvamento foram arriadas com
excesso de passageiros e sem chefe de lancha, o que provocou o naufrágio de algumas delas.
Duzentos e setenta e quatro passageiros pereceram, assim como 20 tripulantes, inclusive alguns oficiais e o comandante Simone Guli - que, na melhor tradição marítima, recusou se salvar.
"Principessa Mafalda - Neste belo cartão-postal oficial da Navigazione Generale Italiana (NGI), o Principessa Mafalda já ostentava nas chaminés as cores da companhia, mas ele foi
construído em 1908 para o Lloyd Italiano, nos estaleiros de Riva Trigoso, perto de Gênova. Com 147 metros de comprimento e 9.210 toneladas, foi lançado ao mar um ano depois de seu irmão-gêmeo, Principessa Iolanda, ter afundado no dia da
entrega, no mesmo estaleiro. Seus nomes homenagearam filhas do rei italiano Vittorio Emanuelle III. Durante a Primeira Guerra, o Mafalda foi várias vezes atacado por bombardeios, mas escapou de afundar. Em 1918, a NGI incorporou a frota do
Lloyd, mas o Mafalda continuou na linha entre Gênova e Buenos Aires, com escalas em Barcelona, Rio de Janeiro, Santos e Montevidéu, no transporte de milhares de imigrantes, principalmente italianos. No dia 25 de outubro de 1927, na altura do
arquipélago dos Abrolhos, Bahia, um forte estrondo iniciou seu fim, quando tinha a bordo 1.259 pessoas, entre passageiros e tripulantes. O rompimento do tubo do eixo do hélice o fez adernar e a água invadiu a sala de máquinas. Foram algumas horas
de agonia. O SOS do rádio de bordo, instalado em 1910 pelo próprio Guglielmo Marconi gerou intenso trabalho de salvamento, envolvendo pelo menos outros seis navios que estavam nas proximidades e socorreram os náufragos, que lutavam contra o mar
revolto, a chegada da noite e os tubarões. Morreram 303 pessoas, numa das maiores tragédias do litoral brasileiro".
Imagem: Acervo José Carlos Silvares/fotoblogue Navios do Silvares (acesso:
13/3/2006) |