A término da Primeira Guerra Mundial, em novembro de 1918, a frota da armadora Nelson Steamship Navigation Co., consistia em tão somente nove vapores, alguns dos quais eram de
construção bem antiga e ultrapassada, como o Highland Laird (de 1899), o Highland Enterprise (de 1903) e o Highland Watch (de 1904). Em finais de 1925, a Blue Star Line,
empresa concorrente, anunciou em Londres a ordem de construção de cinco grandes unidades de capacidade mista (passageiros e carga, esta última sobretudo em porões refrigerados), destinadas à linha sul-americana do Atlântico.
Um ano mais tarde, começaram a ser lançados nesta rota os primeiros navios desta série, a qual seria formada pelo Almeda, Avila, Andalucia, Avelona e Arandora.
Para fazer face a essa situação de concorrência e, ao mesmo tempo, necessitando renovar sua frota envelhecida, a Nelson Line (subsidiária já então do Grupo Royal Mail Steam Packet) recebeu,
em outubro de 1926, autorização dos acionistas principais, liderados por lorde Kylsant (Owen Phillips), para a construção de cinco navios a motor com instalações frigoríficas e acomodação para passageiros em três classes distintas.
O desenho desses novos transatlânticos foi confiado a Art Woods, que, na época, ocupava função dupla na organização da Nelson Line, sendo gerente geral da armadora e membro do Conselho de Administração.
A tarefa de construção do quinteto foi atribuída ao Estaleiro Harland & Wolff, de Belfast, do qual lorde Kylsant era presidente, após o falecimento de Lorde Pirrie, em 1924.
Surgiu, desde modo, a partir de 1928, a segunda série de Highlands, composta pelos navios Highland Monarch, Highland Chieftain (1929), Highland Brigade (1929), Highland Hope
(1930) e Highland Princess (1930).
Embarcação tinha 165,8 m de comprimento por 21,15 de boca e capacidade para 701 passageiros
Detalhes - As principais características técnicas desta série eram as seguintes:
Propulsão: em duplo hélice, ambas movidas por dois motores a óleo de oito cilindros e passos quádruplos com 9.500 cavalos-vapor (cv), dando
uma velocidade de cruzeiro de 15 nós (28 quilômetros horários).
Espaço de carga: quatro porões, três dos quais calafetados, para o transporte de produtos frigorificados ou congelados, representando cerca de
500 mil metros cúbicos.
Desenho: inovativo e linhas retas, castelo de proa alongado, ponte de comando em estrutura separada, duas chaminés largas e achatadas, muito
próximas entre si, dois mastros e popa do tipo cruzador.
O quarto da série, o Highland Hope, entrado em serviço de linha em fevereiro de 1930, foi perdido tão somente nove meses depois de ter encalhado na costa portuguesa, próximo à localidade de Peniche, em 9 de
novembro.
Havia zarpado de Londres no dia 15, com destino a Buenos Aires, tendo a bordo 150 passageiros e 139 tripulantes, sob as ordens do comandante Thomas Jones. Após escalar em Boulogne e Vigo (onde embarcaram outros 217
passageiros), o Highland Hope deixou este último porto no final da tarde do dia 8, com destino a Lisboa, porto que jamais alcançaria.
Às 4 horas, após passar próximo ao Farol de Burlings, o navio foi envolto por espesso nevoeiro e, 50 minutos mais tarde, colidiu com os rochedos de Farilhões, em cima dos quais ficaria imobilizado.
Mais um - Apesar de várias tentativas de desencalhe, o transatlântico permaneceu firmemente preso às rochas, sendo semanas mais tarde declarado perda construtiva total e abandonado. Após esta perda, a Nelson
Line decidiu ordenar outro navio similar da série, com a finalidade de substituir o Highland Hope. Surgiu assim, em 1932, o Highland Patriot.
Em agosto de 1932, por decisão do Conselho de Administração da Royal Mail, foi extinta a Nelson Steamship Navigation Co., desaparecendo, assim, dos mares, após 42 anos de existência, a bandeira da armadora,
vermelha com um N negro, dentro de um diamante branco e as cores vermelhas (contra faixas estreitas em branco, negro e branco) das chaminés de seus navios, que passaram para a frota da Royal Mail, conservando, porém, os nomes originais.
O Highland Chieftain serviu a rota sul-americana de fevereiro de 1929 até seu fim, em 1960, realizando centenas de viagens para o Atlântico Sul, inclusive no período bélico entre 1939 e 1945, transportando
milhares de toneladas de carne e outros alimentos para a Grã-Bretanha, assim como seus irmãos gêmeos.
O único desta série empregado de outra forma durante o conflito foi o Highland Brigade, que, no início de 1940, foi transformado em navio-transporte de tropas, navegando neste tipo de utilização em múltiplas
rotas conforme as necessidades que a guerra impunha.
Este cartão postal de Laire Giraud reproduz quadro de Kenneth Shoesmith,
mostrando um navio da série Highland atracando em Santos
Obsoletos - A construção de três modernas unidades para a Royal Mail, a partir de 1959 (o Amazon, o Aragon e
o Arlanza) tornaram obsoletos os quatro Highlands, ex-Nelson Line e, desta maneira, o Highland Brigade,o Highland Princess e o Highland Chieftain foram colocados à venda.
Os dois primeiros foram adquiridos pela armadora Latsis, passando para a bandeira grega respectivamente com os nomes de Henrietta e Marianna.
Em outubro de 1959, o Highland Chieftain foi vendido a uma empresa armadora com sede em Gibraltar, a Calpe Shipping Co. Ltd., na época proprietária de uma frota de navios de pesca de baleias operando nas
águas em torno do continente antártico.
O ex-transatlântico da Nelson e Royal Mail foi então rebatizado com o nome de Calpean Star e transformado em navio-depósito e de acomodação a serviço das tripulações das baleeiras que operavam em permanência
nas zonas de pesca do extremo meridional do Atlântico Sul. Sua utilização nessas funções foi, porém, bem curta, pois só teve a duração de cinco meses.
Em março de 1960, o Calpean Star saiu da zona de pesca antártica com seus porões frigoríficos repletos de carne de baleia destinada aos mercados europeus. Antes, porém, de atravessar o Atlântico, o
Calpean Star, necessitando de reparos no timão, fez escala em Montevidéu para a realização destes consertos. No porto desta capital, o navio permaneceu por muito mais tempo do que havia sido inicialmente previsto, isto é cerca de dois meses.
Explosão - No dia 1º de junho, a embarcação zarpou de Montevidéu com destino a Londres, só percorrendo algumas poucas milhas dessa viagem. A cerca de três milhas da
costa, nas águas do Rio Prata em frente à costa uruguaia, ocorreu uma explosão na casa de máquinas que provocou rombo no casco e penetração de água.
O Calpean Star imobilizou-se e afundou ligeiramente de popa, em bordo inclinado e com estrutura permanecendo por dois terços fora d’água, o terço restante tocando o fundo lamacento do curso fluvial. Embora,
na teoria, o salvamento não constituísse problema maior, de modo inexplicável o Calpean Star foi declarado como perda construtiva total pela companhia seguradora Lloyd’s e abandonado.
Subsequentemente, intervieram uma empresa uruguaia, a administração portuária e a prefeitura marítima de Montevidéu, tentando rebocar o navio. Passaram-se meses e nenhum êxito nas tentativas de desencalhe. Enquanto
isso, a forte correnteza do rio fazia com que o casco do navio penetrasse cada vez mais nas áreas lamacentas do fundo e assim, mês após mês, sua superestrutura foi desaparecendo.
O navio de turismo e carga, naufragado no Rio da Prata, em foto do santista Ezio Begotti
Odor - A enorme quantidade de carne de baleia apodrecida nos porões desprendia tão forte odor fétido, que empesteava as proximidades da área, ponto de passagem para todo o tráfego marítimo de e para
Montevidéu.
Por volta de 1962, boa parte da superestrutura do Highland Chieftain já havia sido recortada para ferro-velho e o que restava do navio, definitivamente abandonado aos elementos.
Outro casco, também submerso e bem mais famoso, o do couraçado de bolso alemão Graf Spee, jaz a apenas três milhas de distância do Calpean Star.
Resta ser mencionado o destino final do Highland Monarch, cuja demolição, em 1960, marcou praticamente o fim de toda uma era no transporte de alimentos perecíveis entre os países platinos, o Brasil e o Reino
Unido. |