Internacional
A guerra visível
e a guerra secreta (3)
Estes
textos estão circulando pela Internet, através de listas
de debates em português, e apontam uma outra razão, mais profunda,
para os Estados Unidos desejarem a guerra com o Iraque. O primeiro foi
transmitido em 10/2/2003, em mensagem eletrônica repassada por Pedro
Castilho, do Rio de Janeiro, sem identificação de autoria:
Manifestação
mundial pela paz: protestos contra a guerra em Bagdad, no Iraque
Captura de
tela: transmissão ao vivo, TV CNN em inglês, Atlanta/EUA,
15/02/03 17:20
O outro motivo
dos EUA no Iraque
Está
posta a intenção de Bagdá trocar o dolar pelo euro
na comercialização do petróleo, ao reprovar as sanções
da linha-dura de Washington e encorajar os europeus a desafiarem isto.
Mas a mensagem política custará ao Iraque milhões
em renda perdida.
Desde 2000,
o Iraque está prosseguindo com seus planos de deixar de usar o dólar
norte-americano em seu oil business apesar das advertências
de que o movimento não tem sentido algum financeiro.
Bagdá
insistiu e recebeu aprovação da ONU para vender óleo
através do programa óleo-para-comida, em euros. O Iraque
havia ameaçado suspender todo o óleo que exporta - aproximadamente
5 por cento do total do mundo - se o pedido fosse rejeitado.
Pierre Shammas,
perito em questões do Oriente Médio, direto da base em Chipre
da Arab Press Service, diz que a idéia de trocar pelo euro é
vista com interesse pelo Irã, e que se vários produtores
de óleo fizessem isto poderiam criar um estouro do dólar
que debilitaria Washington.
Ele afirma
que outro possível candidato para a conversão ao euro poderia
ser a Venezuela, cujas relações com Washington endureceram
quando o Presidente Hugo Chávez acenou para Fidel Castro de Cuba
e visitou Saddam Hussein em Bagdá.
Shammas chama
o movimento de emocional, impossível de entender com argumentos
econômicos. São políticos falando. Eles não
são experts, eles não são de bancos centrais
nem são oil men.
Mas ele diz
que Saddam sente que a estratégia é o custo que lhe permite
puxar uma linha clara no que o Iraque vê como dois campos da opinião
mundial, relativos às sanções de ONU.
De um lado,
os EUA e a Inglaterra - um país também fora da zona de euro
- querem manter sanções rígidas contra o Iraque, até
Bagdá provar que não tem mais arma de destruição
em massa.
Do outro, conduzido
por um euro-usuário, a França - junto com a Alemanha, Rússia
e China – favoráveis a que se aliviem as sanções,
sob argumentos humanitários enquanto buscam-se o desarmamento.
O maior
pesadelo do Federal Reserve é a OPEP - Por outro lado, o efeito
de uma mutação do dólar para o euro por parte da OPEP,
seria que os países consumidores de petróleo teriam de despejar
dólares das reservas dos seus bancos centrais e substituí-los
por euros. O dólar entraria em crash com uma desvalorização
da ordem dos 20% a 40% e as consequências, em termos de colapso de
divisas e inflação maciça, podem ser imaginadas (pense-se
na crise de divisas da Argentina, por exemplo).
Haveria um
fluxo de fundos estrangeiros para fora do mercado de capitais dos EUA e
de ativos denominados em dólares. Haveria certamente uma corrida
aos bancos tal como nos anos 30, o atual déficit na balança
de transações correntes tornar-se-ia inútil, o financiamento
déficit orçamentário cairia em moratória, e
assim por diante. Em resumo: o cenário básico de uma
crise econômica típica no 3º Mundo. |
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Manifestação
mundial pela paz, em 14 e 15/2/2003
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Em Brasília
Captura de
tela: Rede Globo de TV, Brasil, 14/02/03 20:32 |
Em
São Paulo
Captura de
tela: Rede VTV, São Paulo/SP, 15/02/03 17:18
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O segundo texto foi repassado pelo
internauta Marcos Komatsu à lista de debates sobre negócios
Widebiz,
em 21/2/2002, com a observação de que o autor do artigo aparece
como articulista de vários sites, identificando-se como professor
de História em Brasília:
As verdadeiras
razões de Bush
Por Said
Barbosa Dib, professor de História
Não
são justas as análises simplificadoras e ingênuas da
mídia que colocam o presidente George W. Bush como um monstro ou
um energúmeno sanguinário. Mesmo que seu intelecto não
seja dos mais geniais, ele não é, definitivamente, um camarada
mau nem bobo. Pelo contrário, é um cidadão patriota
que está tentando salvar os EUA da bancarrota, impedir a queda do
Império sob seu comando.
Digo isto porque,
ao contrário do que se fala, o governo norte-americano está
totalmente desesperado com a ruína iminente da sua economia. Segundo
W. Clark, do jornal Indy Time, o temor do Federal Reserve (Banco
Central americano) é de que a Organização dos Países
Exportadores de Petróleo (Opep), nas suas transações
internacionais, abandone o padrão dólar e adote definitivamente
o euro.
O Iraque fez
esta mudança em novembro de 2000 - quando o euro valia cerca de
US$ 0,80 - e escapou ileso da depreciação do dólar
frente à moeda européia (o dólar caiu 15% em relação
ao euro em 2002). Esta informação, se analisada por aqueles
que conhecem os problemas estruturais do sistema de Breton Woods e as atuais
limitações energéticas dos norte-americanos, coloca
em dúvida a hegemonia do dólar no mundo e explica a razão
pela qual a administração Bush quer, desesperadamente, um
regime servil na história Mesopotâmia.
Se o presidente
norte-americano tiver sucesso, o Iraque voltará ao padrão
dólar, não correndo o risco de servir de modelo alternativo
para outros países dependentes como o Brasil. É por esta
razão que o governo norte-americano, ao mesmo tempo, espera também
vetar qualquer movimento mais vasto da Opep em direção ao
euro.
Por isso, essa
informação é tratada quase como um segredo de Estado,
pois governos dependentes como o nosso, que apostaram tudo no modelo neoliberal,
iriam para o fundo do poço junto com seus chefes norte-americanos.
Isso porque os países consumidores de petróleo teriam de
despejar dólares das reservas dos seus bancos centrais - atualmente
submetidos ao FMI- e substitui-los por euros. O dólar entraria em
crash
com uma desvalorização da ordem de 20% a 40% e as conseqüências,
em termos de colapso da divisas e inflação maciça,
podem ser imaginadas. Pense-se em algo como a crise Argentina em escala
planetária, por exemplo.
Na verdade,
o que permeia toda essa discussão é a chamada crise dos
combustíveis fósseis. O físico e pensador Batista
Vidal lembra que "as reservas de petróleo estão extremamente
concentradas em poucos pontos do planeta, pois o total descoberto no mundo
está situado em vinte campos supergigantes". Assim, na ótica
do Primeiro Mundo, se os atuais países em desenvolvimento realmente
se desenvolvessem, o Mundo teria ou que descobrir meia dúzia de
campos super pergigantes ou o petróleo acabaria em 10 ou 15 anos.
Por isso, o sistema de poder financeiro mundial, subjugado pelo padrão
dólar, está completamente desacreditado, falido.
Os bancos estão
caindo aos pedaços em todos os países ditos desenvolvidos,
principalmente nos Estados Unidos e Japão. Prevê-se um colapso
a qualquer momento. Agora o que sustenta isso? Devido à ocupação
militar no Oriente Médio - ampliada a partir da crise do petróleo
da década de 70 -, mesmo com o déficit público monstruoso
dos EUA, o dólar inflacionado compra artificialmente o petróleo,
base de toda a economia americana e ocidental.
Portanto, Sadam
selou o seu destino quando, em fins de 2000, decidiu mudar para o euro.
A partir daquele momento, uma outra Guerra do Golfo tornava-se um imperativo
para Bush Jr. Ou seja, o que está em jogo não é nem
o caráter texano caricato de Bush, nem uma questão de segurança
nacional norte-americana, mas a continuidade da falácia do dólar.
E esta informação
é censurada pela imprensa norte-americana e suas vassalas tupiniquins,
bem como pela administração Bush, pois pode potencialmente
reduzir a confiança dos investidores e dos consumidores, criar pressão
política para formação de uma nova política
energética que gradualmente nos afaste do petróleo do Oriente
Médio e da órbita anglo-americana e fazer com que projetos
como o nosso Pró-Alcool mostrem sua força. |
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Manifestações
mundiais pela paz, em 14 e 27/2/2003
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Culto pela
paz realizado em em Roma, Itália
Captura de
tela: TV Italiana RAI International, 14/02/03 17:11 |
Manifestantes
na Itália tentam evitar a saída de trem com armas para uso
na guerra do Iraque
Captura de
tela: Rede Globo, 27/02/03 13:32
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Filtrando-se a linguagem fortemente
partidarista deste terceiro artigo - repassado via Internet por Pedro Castilho,
do Rio de Janeiro, em 23/2/2003 -, restam dados importantes para o entendimento
da crise EUA/Iraque:
O IV Reich
de Bush?
15 de
fevereiro - marco inaugural de nova fase da luta antiimperialista
José
Reinaldo Carvalho (*)
O mundo não
é mais o mesmo depois da jornada planetária de 15 de fevereiro.
Nunca se registrara algo semelhante na história.
Aproximadamente
6 milhões de pessoas de mais de 70 países atenderam à
convocação do Fórum Social Mundial e saíram
às ruas e praças de suas cidades para dizer não à
guerra imperialista em preparação pelos EUA.
Ao fazê-lo,
pronunciaram-se de forma contundente contra os tenebrosos planos da superpotência
norte-americana de impor, à custa de sofrimentos e horrores para
toda a humanidade, o seu domínio sobre os povos e nações.
Isto confere um sentido novo e revolucionário aos protestos populares
que se vêm avolumando há tempos, um sentido novo e revolucionário
ao movimento pela paz.
Trata-se de
um importante salto de qualidade na luta dos povos, que exercerá
influência progressiva no evoluir do quadro político internacional.
Objetivamente inaugura nova fase da luta antiimperialista. Nunca as posições
norte-americanas mereceram tamanho isolamento político e social.
O Brasil também viverá os reflexos dessa mudança.
Tudo indica
que as massas começam a compreender o que está em jogo. O
projeto de imposição do poder imperialista americano manu-militari
ameaça a civilização. As manifestações
de 15 de fevereiro foram o sinal de que em todo o mundo é forte
a percepção de que ou se detém o braço assassino
dos agressores imperialistas comandados por George W. Bush, ou a humanidade
viverá doloroso transe a prazo largo, com o fenecimento das liberdades,
o desaparecimento das nações independentes, a refundação
do colonialismo, naturalmente que em bases novas, consoante a ordem econômica
da globalização imperialista.
A iminência
da guerra americana contra o Iraque, segundo passo ( o primeiro foi a guerra
que devastou o Afeganistão) da guerra infinita proclamada
pelo presidente dos EUA após os malsinados acontecimentos de 11
de setembro de 2001 põe por terra todas as ilusões e falácias
fabricadas ao longo dos anos 90 do século 20, quando o de que mais
se falou foi sobre a recuperação dos EUA, através
dos caminhos do crescimento econômico, da abertura de um novo ciclo
virtual, duma nova era de ouro, que tornara possível ingressar num
novo século americano com o exercício da hegemonia
estadunidense, através do poder brando. Não faltou
quem na esquerda se deixasse seduzir por tal poder.
Mas já
naquela altura o poder americano tinha muito mais de brutal do que de brando,
porquanto os planos de dominação planetária do imperialismo
norte-americano, de imposição do IV Reich, na apropriada
expressão do talentoso escritor comunista luso-brasileiro Miguel
Urbano Rodrigues, não começaram com a nova Administração
estadunidense chefiada por George W. Bush.
Remeto o leitor
à leitura do agudo e percuciente artigo “A humanidade contra o IV
Reich”, publicado em Resistir.
Se o 15 de
fevereiro nos mostra uma mudança de qualidade na luta antiimperialista,
ela ocorreu precisamente porque nunca na história moderna a humanidade
viveu a braços com semelhante crise e sob tão graves ameaças.
O sistema capitalista dá sinais de que vive uma inarredável
crise estrutural, chamado de capitalismo senil pelo cientista social
e economista Samir Amin.
A economia
norte-americana, centro nevrálgico do sistema, exibe colossais desequilíbrios,
que irradiam instabilidade para o conjunto do sistema. Quanto maior é
a crise, tanto maior é a militarização da vida no
Planeta.
Os Estados
Unidos transformaram os territórios de vários países
em campamento militar. Suas instalações militares encontram-se
em 70 países. Seu poder de fogo, em tropas, armas convencionais
e de destruição em massa, principalmente nucleares, é
infinitamente maior ao de qualquer outro país. O orçamento
militar dos EUA mobiliza recursos equivalentes ao PIB brasileiro e a mais
de 30% do total de gastos militares das outras nações.
A guerra contra
o Iraque tem como fim precípuo dar passos consistentes para consolidar
o poder norte-americano. Depois do Iraque outros alvos serão atacados.
A outra motivação é o petróleo, base energética
fundamental da economia mundial. O movimento contra a guerra expressou
muito bem essa compreensão: "Não à guerra por petróleo!"
"Não ao sangue por petróleo" foram as frases mais lidas nos
cartazes e faixas conduzidos pelos milhões de manifestantes.
Em seu último
pronunciamento, o chefe do imperialismo norte-americano desdenhou de público
as manifestações e reiterou seus intentos guerreiros. Não
sabemos se as manifestações terão sido suficientes
para impedir a consumação do crime, mas ao isolar e condenar
a política imperialista dos EUA, inauguraram uma nova fase da luta
antiimperialista.
(*)
Jornalista, vice-presidente e secretário de Relações
Internacionais do Partido Comunista do Brasil, autor de Conflitos
Internacionais num Mundo Globalizado (Ed. Alfa Omega, São Paulo,
Brasil, 2003). |
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Manifestações
mundiais pela paz, em 14 e 27/2/2003
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No Cairo,
Egito
Captura de
tela: Rede Globo de TV, Brasil, 27/02/03 13:31 |
Em
Melbourne, Austrália
Captura de
tela: Tv Deutschewelle, Colonia/ALemanha, 14/02/03 16:05
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Este artigo de W. Clark, em português
de Portugal, acompanha muito de perto - em alguns trechos com as mesmas
palavras - a idéia apresentada no primeiro texto desta página.
Foi repassado pelo internauta carioca Pedro Castilho, em 2/2/2003:
A razão
real para a guerra ao Iraque
W. Clark
(*)
O maior
pesadelo do Federal Reserve é que a OPEP, nas suas transacções
internacionais, abandone o padrão dólar e adopte o padrão
euro. O Iraque efectuou esta mudança em novembro de 2000 (quando
o euro valia cerca de 80 centavos de dólar) e na verdade escapou
com perfeição da firme depreciação do dólar
frente ao euro (o dólar caiu 15% em relação ao euro
em 2002).
A razão
real porque a administração Bush quer um regime fantoche
no Iraque - ou melhor, a razão porque o conglomerado empresarial-militar-industrial
quer ali um governo fantoche - é que dessa forma o país reverterá
ao padrão dólar e assim permanecerá. (E ao mesmo tempo
espera também vetar qualquer movimento mais vasto da OPEP em direcção
ao euro, especialmente do Irão, o segundo maior produtor da OPEP
que está a discutir activamente uma mudança para o euro nas
suas exportações de petróleo).
O maior pesadelo
do Federal Reserve é que a OPEP, nas suas transacções
internacionais, abandone o padrão dólar e adopte o padrão
euro. O Iraque efectuou esta mudança em Novembro de 2000 (quando
o euro valia cerca de 80 centavos de dólar) e na verdade escapou
com perfeição da firme depreciação do dólar
frente ao euro (o dólar caiu 15% em relação ao euro
em 2002).
A razão
real porque a administração Bush quer um regime fantoche
no Iraque - ou melhor, a razão porque o conglomerado empresarial-militar-industrial
quer ali um governo fantoche - é que dessa forma o país reverterá
ao padrão dólar e assim permanecerá. (E ao mesmo tempo
espera também vetar qualquer movimento mais vasto da OPEP em direcção
ao euro, especialmente do Irão, o segundo maior produtor da OPEP
que está a discutir activamente uma mudança para o euro nas
suas exportações de petróleo).
Além
disso, apesar de a Arábia Saudita ser um Estado cliente dos EUA,
o regime saudita parece cada vez mais fraco/ameaçado por uma maciça
intranqüilidade civil. Alguns analistas acreditam que uma Arábia
Saudita revolucionária pode ser plausível devido a uma impopular
invasão americana do Iraque (tal como no Irão cerca de 1979).
Sem dúvida a administração Bush está agudamente
consciente destes riscos. Portanto, o quadro de pensamento neoconservador
implica uma presença militar vasta e permanente na região
do Golfo Pérsico numa era pós-Saddam, para a eventualidade
de ser necessário cercar e capturar os campos petrolíferos
sauditas no caso de um golpe por um grupo anti-ocidental. Mas voltemos
ao Iraque.
Saddam selou
o seu destino quando, em fins de 2000, decidiu comutar para o euro (e posteriormente
converter em euros o seu fundo de reserva de US$ 10 mil milhões).
A partir daquele momento, a fabricação de uma outra Guerra
do Golfo tornava-se inevitável sob Bush II. Somente as circunstâncias
mais extremas podem eventualmente travar agora este desenlace e duvido
muito que alguma coisa possa fazê-lo - excepto a substituição
de Saddam por um regime flexível.
O grande
quadro - Na grande perspectiva conjunta, tudo o mais - além
da divisa de reserva e das questões petrolíferas sauditas/iranianas
(ou seja, as questões políticas internas e as críticas
internacionais) - é periférico e tem consequências
marginais para esta administração. Além disso, a ameaça
dólar-euro é suficientemente poderosa para que eles prefiram
arriscar um retrocesso económico a curto prazo a fim de evitar o
crash
do dólar a longo prazo com uma mudança do padrão da
OPEP do dólar para o euro. Tudo isto ajusta-se dentro do Grande
Jogo mais vasto que abarca a Rússia, a Índia e a China.
Esta informação
sobre a divisa utilizada na venda do petróleo do Iraque é
omitida/censurada pelos media americanos, bem como pela administração
Bush & pela Reserva Federal, pois tal verdade pode potencialmente reduzir
a confiança dos investidores e dos consumidores, reduzir os empréstimos/gastos
dos consumidores, criar pressão política para a formação
de uma nova política energética que gradualmente nos afaste
do petróleo do Médio Oriente e, naturalmente, travar a marcha
rumo à guerra no Iraque. Trata-se quase de um segredo de Estado.
Uma das poucas discussões acerca disso foi o artigo Baghdad Moves
To Euro, publicado em novembro de 2000 pela Radio Free Europe.
Por outro lado,
o efeito de uma mutação do dólar para o euro por parte
da OPEP seria que os países consumidores de petróleo teriam
de despejar dólares das reservas dos seus bancos centrais e substituí-los
por euros. O dólar entraria em crash com uma desvalorização
da ordem dos 20% a 40% e as consequências, em termos de colapso de
divisas e inflação maciça, podem ser imaginadas (pense-se
na crise de divisas da Argentina, por exemplo).
Haveria um
fluxo de fundos estrangeiros para fora do mercado de capitais dos EUA e
de activos denominados em dólares. Haveria certamente uma corrida
aos bancos tal como nos anos 30, o actual défice na balança
de transacções correntes tornar-se-ia inútil, o financiamento
défice orçamental cairia em default, e assim por diante.
Em resumo: o cenário básico de uma crise económica
no 3º mundo.
[*]
do Indy Times. |
Este artigo do escritor John Le Carre,
escrito pouco antes da mobilização mundial anti-guerra de
15/2/2003, foi repassado pelo internauta Pedro Castilho, do Rio de Janeiro,
em 23/2/2002:
Região
produtora de petróleo, junto ao Mar Cáspio
Os Estados
Unidos enlouqueceram
John Le
Carre (*)
Os Estados
Unidos entraram num de seus períodos de loucura histórica,
mas este é o pior de todos: pior que o macartismo, pior que a invasão
de Cuba em Baía dos Porcos e de longe pior que a guerra do Vietnã.
A reação após o 11 de setembro ultrapassa tudo o que
Osama Bin Laden poderia ter imaginado em seus sonhos mais repulsivos.
Tal como na
época de Joseph Mc Carthy, as liberdades públicas, que tornaram
os Estados Unidos alvo de inveja em todo o mundo, estão desaparecendo
sistematicamente. A combinação de uma imprensa submissa com
os interesses privados das corporações confirma, uma vez
mais, que o debate que se deveria produzir em todas as praças e
ruas cinge-se a poucas colunas da imprensa da costa leste.
Esta iminente
guerra foi planejada anos antes de Bin Laden aparecer; contudo, foi ele
que tornou possível a deflagração dessa guerra. Se
não existisse Bin Laden, George Bush e seus parceiros ainda estariam
tentando explicar assuntos tão complicados como, por exemplo, de
que maneira foi eleito; o escândalo Enron; seu inescrupuloso favoritismo
pelos potentados; seu menosprezo visceral pelos muito pobres, pela ecologia
e por toda uma gama de acordos internacionais unilateralmente negados.
Além do mais, poderiam nos explanar por quê apoiam Israel,
que teima em manter seu desprezo pelas resoluções da ONU.
Bin Laden camuflou convenientemente tudo isso.
Os Bush estão
em seu melhor momento. Dizem agora que 88% dos norte-americanos são
a favor da guerra. O orçamento de defesa dos Estados Unidos aumentou
mais 60 bilhões de dólares, ora atingindo a incrível
soma de US$ 360 bilhões. Toda uma maravilhosa geração
de armas nucleares a caminho. Já podemos respirar sem dificuldade.
Não fica bem claro, todavia, que tipo de guerra os 88% dos americanos
apóiam. Por favor, respondam, quanto vai durar a guerra? Qual será
o custo de vidas de jovens americanos? Quanto custará ao contribuinte?
E, por fim, qual será o custo – imaginando-se que a maioria dos
88% é gente humana e decente – em vidas iraquianas?
O modo como
Bush e seus colaboradores conseguiram desviar a cólera americana
de Bin Laden para Saddam Hussein é um dos melhores atos de magia
da história nas relações públicas. No entanto,
conseguiram. Uma recente pesquisa aponta que um em cada dois americanos
acredita agora que Saddam Hussein foi o responsável pelo ataque
às Torres Gêmeas. Porém, o público norte-americano
não está apenas sendo enganado. Está sendo aterrorizado
e mantido na ignorância e no medo. Essa neurose, orquestrada cuidadosamente,
pode facilmente levar Bush e seus acólitos conspiradores à
vitória nas próximas eleições. Aqueles que
não são a favor de Bush são contra ele. Pior ainda,
são a favor do inimigo.
O reiterado
apelo religioso para enviar as tropas norte-americanas ao campo de batalha
é talvez o aspecto mais doentio desta possível guerra surrealista.
Bush menciona Deus amiúde. Deus tem opiniões políticas
muito particulares. Deus apontou para os Estados Unidos e disse para eles
salvarem o mundo, de um modo ou outro, sempre que convier aos Estados Unidos.
Deus designou Israel para ser o nexo da política dos Estados Unidos
no Oriente Médio e quem quer que se oponha a esta idéia é:
a) anti-semita; b) anti-norteamericano; c) a favor do inimigo, portanto
traidor; d) um terrorista.
Deus também
mantém relações que causam pavor. Nos Estados Unidos,
onde todos os homens são iguais debaixo de seu divino olhar, talvez
não entre eles mesmos, a família Bush é formada pelo
presidente, por um ex-presidente, um ex-chefe da CIA, pelo governador da
Florida e pelo ex-governador do Texas.
Presença
militar, uma constante nas áreas do petróleo
Referências?
George W. Bush, 1978-1984, o mais alto executivo da Bush Energy/Bush Exploration,
companhia petrolífera; 1986-1990, o mais alto executivo da companhia
de petróleo Harken. Dick Cheney, 1995-2000, o mais alto executivo
da companhia petrolífera Halliburn. Condoleezza Rice, 1991-2000,
o mais alto executivo da companhia petrolífera Chevron (puseram
o nome dela num navio-petroleiro). Nenhuma dessas associações,
contudo, afeta a integridade do trabalho de Deus.
Para ser membro
dessa equipe deve-se acreditar no bem absoluto e no mal absoluto, e Bush,
com muita ajuda de seus amigos, da família e do seu Deus, está
aí para nos dizer quem é quem. O que Bush nunca dirá
é a verdade verdadeira do porquê vamos à guerra. O
que está em jogo não é o eixo do mal, é o petróleo,
o dinheiro e a vida do povo. A desgraça de Saddam é que governa
o país que dispõe da segunda jazida petrolífera mais
extensa do mundo. Bush a deseja conquistar, e aquele que o ajudar a conseguir
receberá uma fatia do bolo. Quem não ajudar, vai ficar chupando
o dedo.
Bagdá
não constitui atualmente perigo para os seus vizinhos e é
nenhum para os Estados Unidos ou para a Grã-Bretanha. O que está
em jogo não é uma ameaça militar iminente ou terrorista,
mas o imperativo econômico do crescimento dos Estados Unidos. O que
está em jogo é a necessidade dos Estados Unidos ostentarem
seu poderio militar.
A interpretação
mais acertada da parte que cabe ao meu compatriota Tony Blair em tudo isso
é que ele imaginou que montando o tigre poderia dominá-lo.
Porém, não pôde. Temo agora que o próprio tigre
o encurralou e ele não tem mais como escapar.
É ridículo
demais que, quando Blair fala, estando entre as cordas do ringue, nenhum
dos líderes da oposição britânica pode desferir-lhe
um soco. Essa é a tragédia britânica, a mesma dos Estados
Unidos: quando nossos governos se desdizem, mentem ou perdem credibilidade,
o eleitorado encolhe os ombros e simplesmente olha para outro lado. Essa
deve ser a melhor chance de sobrevivência pessoal de Blair: às
11h00 desse sábado, o protesto mundial e as Nações
Unidas improvavelmente encorajadas, o que forçaria Bush a guardar
seu revólver na cartucheira sem disparar.
O pior para
Tony Blair seria, com a ONU ou sem ela, conseguir nos arrastar para uma
guerra que, se houvesse alguma vez vontade para negociar energicamente,
teria sido evitada. Uma guerra que não tem sido discutida mais democraticamente
nos Estados Unidos nem na Grã-Bretanha nem na ONU. Desse modo, Blair
fará com que nossas relações com a Europa e o Oriente
Médio entrem em conflito para perdurar décadas. Terá
ajudado a dar lugar a imprevisíveis represálias, à
inquietação no âmbito interno e à debacle na
região do Oriente Médio. Seja bem-vindo o partido de uma
política externa ética.
Existe uma
saída intermediária, porém extremamente difícil:
Bush implementa seus planos bélicos sem a aprovação
da ONU e Blair se mantém à margem. Adeus às relações
especiais.
Sinto-me humilhado
quando escuto meu primeiro-ministro proferir seus sofismas de paroquia
em relação a esta aventura. Sua ansiedade a respeito do terror
é compartilhada por todo homem de bom senso. O que não consegue
explicar é como conciliar um assalto mundial ao Al-Qaeda com um
assalto ao território do Iraque. Estamos mergulhados nessa
guerra, se ela ocorrer, para garantir que a folha de parreira de nosso
relacionamento especial não caia, colher o que nos caiba no butim
petroleiro e porque, depois dos apertos de mão e abraços
em Washington e Camp David, Blair tem de comparecer ao altar.
(*)
John Le Carre é escritor britânico. Artigo especial para o
jornal estadunidense The
New York Times. |
Contrastes
nas terras do petróleo: torre de televisão nova, atrás
de torres de petróleo velhas,
em Baku,
junto ao Mar Cáspio
Veja:
A
guerra visível e a guerra secreta (abertura)
A
guerra visível e a guerra secreta (1)
A
guerra visível e a guerra secreta (2) - análises em inglês
e francês |