Cidade
Planejar com cidadania
Renata Viana
Estatuto da Cidade institucionaliza
o desenvolvimento urbano no País e obriga municípios a respeitarem
regras de planejamento
Criado
pela lei 10.257/01, o Estatuto da Cidade começou a vigorar em 10/10/2001
e exigirá uma ampla reforma nas políticas de desenvolvimento
urbano nos municípios brasileiros. Preocupado com a aplicação
da legislação, o Instituto Brasileiro de Administração
Municipal (Ibam) criou o Programa “Jornada do Estatuto da Cidade”, que
reuniu em Santos autoridades e especialistas do setor habitacional, para
esclarecer as dúvidas a respeito da nova norma e sua aplicação
na Região Metropolitana da Baixada Santista.
Além de estudar casos como patrimônio
histórico, qualidade de vida, meio-ambiente e áreas ociosas,
o estatuto promete solucionar os problemas de áreas degradadas,
como favelas, cortiços e alagados. “A lei ordenará o planejamento
urbanístico no Brasil, atendendo às reclamações
históricas de arquitetos, urbanistas e engenheiros”, informa Vítor
Carvalho Pinto, gestor da Secretaria de Desenvolvimento Urbano da Presidência
da República (Sedu).
Depois de 11 anos de tramitação,
a elaboração do estatuto representa um avanço na revisão
do uso das propriedades urbanas. Para as cidades que abrigam mais de 22
mil habitantes, a lei torna obrigatória a elaboração
do plano diretor, instrumento que espelha o planejamento territorial da
cidade. O estatuto determina também que as atividades dos municípios
sejam controladas pelo Poder Judiciário e Ministério Público.
“Vamos acabar com os absurdos que vínhamos presenciando”, esclarece
Vítor. Ele revela que boa parte das cidades brasileiras não
possui arquitetos. “Esta é uma realidade insustentável a
longo prazo”, opina.
A maioria dos municípios
médios e grandes já tem plano diretor e deverá adaptá-lo
às modificações. Já aqueles que não
possuem nenhuma lei referente ao ordenamento urbano deverão elaborá-las,
ou terão de congelar os investimentos. “A cidade não poderá
realizar obras nem autorizar loteamentos se isso não estiver previsto
no plano diretor”, explica ele, ressaltando que esta é uma exigência
imediata.
O Estatuto da Cidade traz alterações
que ressaltam a importância do crescimento justo e organizado das
cidades. Das mudanças estabelecidas pela lei, a mais polêmica
é a participação ativa da comunidade na aprovação
dos projetos por meio de
fóruns ou conselhos de política urbana, audiências
públicas, debates e conferências.
As decisões serão negociadas
entre os setores envolvidos e a sociedade poderá vetar as decisões
que possam prejudicar a população. “Isto mostra a integração
entre a comunidade e o poder público”, afirma Koyu Iha, presidente
da Agência de Desenvolvimento da Região Metropolitana. Para
ele, a modificação é positiva porque estimulará
a discussão com a sociedade. “É importante ouvirmos a população”,
adverte Koyu.
O estatuto prescreve o Usucapião
Especial de Imóvel Urbano, que garante o direito à posse
para o cidadão que ocupar uma área ou edificação
urbana de até 250 metros quadrados como moradia, por cinco anos
consecutivos, sem que o proprietário a reclame. Além disso,
ficou estabelecido o direito de preempção, onde o Poder Público
tem preferência na compra de imóvel urbano a ser utilizado
para fins sociais, como programas e projetos habitacionais, regularização
fundiária, ordenamento
da expansão urbana e proteção de áreas de interesse
ambiental.
As modificações estipuladas
pelo Estatuto da Cidade têm sido vistas com otimismo pelas autoridades
da Baixada Santista por estimular a criação de programas
habitacionais. Clermont Castor, prefeito de Cubatão e presidente
do Conselho de Desenvolvimento da Região da Baixada Santista (Condesb),
afirma que a entidade dará continuidade ao plano diretor da metrópole.
“É uma incoerência falarmos em tirar pessoas das favelas se
não temos onde colocá-las”, explica ele, ressaltando que
o planejamento é fundamental para a remoção da população
das áreas de risco.
Conforme explica Carlos Eduardo Adegas,
vereador e presidente da Comissão Especial de Vereadores (CEV) criada
para discutir o Estatuto da Cidade, o município conta com uma área
insular de 39 quilômetros quadrados e não há espaço
para projetos habitacionais. Por outro lado, a área continental
da cidade possui 240 quilômetros quadrados, totalmente preservados.
O impacto das alterações
impostas pela nova norma dependerão da escala de cada município.
Nas cidades pequenas e médias que possuem muitas terras ociosas,
o IPTU Progressivo no Tempo causará efeitos significativos, uma
vez que aumenta, durante cinco anos consecutivos, a alíquota do
Imposto sobre Propriedade Predial até o limite de 15%.
A medida serve também de apoio
às autoridades na implementação de serviços
e equipamentos básicos de áreas carentes, como água
e saneamento básico. “O estatuto é uma iniciativa interessante
para as prefeituras que têm como meta o resgate das camadas inferiores”,
avalia Cibele Riva Rumel, presidente do Graprohab, o Grupo de Aprovação
de Projetos Habitacionais da Secretaria da Habitação do Estado.
Para ela, a nova lei resgata a responsabilidade social do governo e possibilita
investimentos sociais.
Os instrumentos
previstos na nova legislação: |
O Estatuto
da Cidade dedica grande parte de seu conteúdo às políticas
urbanas na esfera municipal. Os instrumentos previstos guardam semelhança
com alguns adotados internacionalmente para controle do solo urbano, mas
sua utilização tem sido restrita em função
de impedimentos políticos, culturais, históricos e jurídicos.
Abaixo, a descrição de cada um dos instrumentos mencionados
na lei, que são classificados, de acordo com sua natureza, em tributários,
financeiros ou econômicos, jurídicos, administrativos e políticos. |
Parcelamento,
edificação ou utilização compulsórios
A lei fixa
as condições e os prazos para implementação
do parcelamento, edificação ou utilização compulsórios
do solo urbano não-edificado, sub-utilizado ou não-utilizado
nas áreas incluídas no plano diretor. |
Imposto
predial e territorial urbano progressivo no tempo
Pune com tributo
de valor crescente os proprietários de terrenos cuja ociosidade
ou mal aproveitamento acarrete prejuízo à população.
Aplica-se aos proprietários que não atenderam à notificação
para parcelamento, edificação ou utilização
compulsórios. |
Desapropriação
com pagamento em títulos da dívida pública
Decorridos
cinco anos de cobranças do IPTU progressivo no tempo sem que o proprietário
tenha cumprido sua obrigação, o poder público municipal
desapropriará o imóvel, com pagamento em títulos da
dívida pública. |
Usucapião
especial de imóvel urbano
O cidadão
que ocupar área ou edificação urbana de até
250 metros quadrados para sua moradia ou de sua família, por cinco
anos consecutivos, sem que o proprietário a reclame terá
direito à posse, desde que não possua imóveis em seu
nome. |
Direito
de superfície
Possibilita
que o proprietário de terreno urbano conceda a outro particular
o direito de utilizar o solo, subsolo ou o espaço aéreo de
seu terreno, em termos estabelecidos em contrato e mediante escritura pública. |
Direito
de preempção
Confere ao
poder público municipal preferência na compra de imóvel
urbano, respeitado seu valor no mercado imobiliário e antes que
o imóvel de interesse do município seja comercializado entre
particulares. |
Outorga
onerosa do direito de construir
O município
deverá delimitar no plano diretor as áreas onde o planejamento
municipal indicar a possibilidade de maior adensamento populacional, que
pode ser atingido com o aumento da área construída. |
Transferência
do direito de construir
O proprietário
de imóvel poderá exercer em outro local o direito de construir
previsto nas formas urbanísticas em outro local e ainda não
exercido. Esta regra permite a preservação de imóveis
de interesse histórico, proteção ambiental ou operações
urbanas. |
Operações
urbanas consorciadas
Conjunto de
medidas coordenadas pelo poder público com a finalidade de preservação,
recuperação ou transformação de áreas
urbanas com da participação dos proprietários, moradores,
usuários e investidores privados. |
Estudo
de impacto de vizinhança
As atividades
e empreendimentos públicos em área urbana dependerão
da elaboração de estudo prévio de impacto de vizinhança
para obter licenças ou autorizações de construção,
ampliação ou funcionamento. |
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