Habitação
Governo muda, mas não satisfaz
Renata Viana
O impacto
das recentes medidas do Governo, como a suspensão do crédito
para a classe média através da Caixa Econômica Federal,
agravou ainda mais a situação dos setores que participam
da indústria imobiliária. Em vez de atender aos anseios do
setor, que nos últimos anos espera a definição de
uma ampla política habitacional, o governo apontou para um novo
modelo habitacional que só traz dúvidas e incertezas.
Apesar de sofrer os efeitos da conjuntura
internacional, o mercado da construção civil vinha reagindo
de forma positiva, até que uma série de acontecimentos modificou
esse rumo. Os escândalos ocorridos no Congresso, a crise energética
e a recessão econômica na Argentina assombraram e fizeram
despencar a credibilidade do governo, espantando de vez os investidores.
Depois, o fantasma da crise econômica mundial, ocasionada pelo terrorismo
nos EUA, veio ampliar ainda mais o clima de indefinição que
permeia a indústria imobiliária.
A medida mais preocupante é
a suspensão dos financiamentos imobiliários para a classe
média (leia box). Como um dos primeiros reflexos,
houve o esfriamento do mercado secundário em função
das Cartas de Crédito que estavam sendo concedidas a este público.
Responsável pela alavancagem do mercado de novos, a retração
do mercado de imóveis de segunda mão vai resultar na queda
do mercado como um todo.
Popularização -
Muito embora o governo tenha anunciado que se trata de uma medida temporária,
a suspensão torna evidente a tendência de direcionar os financiamentos
oficiais para a aquisição da casa própria em função
das classes mais populares. A justificativa dada pela instituição,
contudo, sem que fossem anunciadas outras medidas de incentivo a este tipo
de habitação, não satisfez nem respondeu às
necessidades do mercado.
“A classe média não
ficará desamparada porque vem sendo atendida pela CEF há
mais tempo”, acredita Waldir Monti, gerente de mercado da CEF na Baixada
Santista. Ele afirma que a instituição tem intenção
de antecipar o projeto de consórcio de imóveis para o início
de 2002, assim como a Carta de Crédito, que deve ser relançada
com outras características.
Um dos motivos que levaram a Caixa
a afastar-se da classe média é que o banco encontra-se “superaplicado”
em financiamentos habitacionais e o montante emprestado supera as operações
de caderneta de poupança. Para aplicar no mercado imobiliário,
a CEF cobrava dos mutuários 12% de juros ao ano enquanto captava
recursos no mercado à taxa Selic, equivalente a 19%.
Alternativas - Domingos Augusto
de Oliveira, proprietário da Construtora Conpral, também
atribui a falta de investimentos externos às deficiências
do Poder Judiciário. “Talvez os bancos estrangeiros não se
sintam seguros porque a Justiça é lenta e não funciona
como deveria”, analisa. Para ele, o panorama tende a se modificar devido
aos efeitos das Medidas Provisórias 2.221 e 2.223. “Antes, torcíamos
para que a inadimplência não existisse porque não existiam
mecanismos de retomada”, conta ele. O construtor afirma que as empresas
terão que entender como funcionam os novos mecanismos de oferta
de crédito disponibilizados com as medidas. “Teremos que nos adaptar
o mais rápido possível”, diz.
Neste contexto, o financiamento direto
com as construtoras foi uma das alternativas encontradas pelos empresários
para não perder mercado. Para José Marcelo Ferreira Marques,
presidente da Associação dos Empresários da Construção
Civil da Baixada Santista, a Assecob, e proprietário da ConstruHab,
trata-se de uma opção menos burocrática que serve
principalmente à classe média.
“Os santistas têm medo de se
comprometer com instituições financeiras porque as taxas
de juros são muito altas”, esclarece, lembrando que as construtoras
financiam os valores em prazos razoáveis com taxas de juros semelhantes
às dos bancos. Ele ressalta a importância dos financiamentos
concedidos por bancos privados, mas revela que esta não é
uma característica do mercado da Baixada Santista. “Grande parte
das construtoras já passaram a trabalhar apenas com o financiamento
direto”, diz o dirigente.
Medidas
não definem |
Lançada
no final de 8/2001, a suspensão temporária dos financiamentos
habitacionais para a classe média foi uma determinação
do governo em conseqüência da reestruturação patrimonial
sofrida pela CEF dentro do programa de ajustes dos bancos federais.
O corte é
válido para as modalidades Carta de Crédito Individual Caixa
(recursos da caderneta de poupança), Poupança de Crédito
Imobiliário (poupanção, que se destinava à
compra de imóveis usados), Imóvel na Planta (cuja renda mínima
exigida sobe para R$ 3.250,00) e Convênio Caixa do Trabalhador. A
determinação prevê andamento normal apenas às
linhas de crédito que utilizam recursos do FGTS voltadas às
famílias com renda inferior a R$ 2.000,00.
Em resposta
às reações negativas do mercado à suspensão,
o governo lançou no início de 9/2001 a Medida Provisória
2.223 que criou mecanismos como a Cédula de Crédito Imobiliário
(CCI), que facilita a cessão e a securitização de
créditos imobiliários, e a Letra de Crédito Imobiliário,
que pode ser emitida pelas instituições financeiras para
a captação de recursos.
Além
disso, foi editada também a MP 2.221, relativa à adoção
facultativa do Patrimônio de Afetação, que isola um
determinado empreendimento do patrimônio da construtora. A partir
daí, o setor continua aguardando novos ajustes do governo, como
a redução da taxa de juros, visando definir uma política
habitacional eficiente. |
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