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Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 01/24/01 12:02:32
Edição 092 - JAN/2001 

Cidade

Que tal congelar São Paulo?
“Com limitação de espaço, haverá uma expansão populacional menor”

Roberto Luís Troster (*)
Colaborador

A cidade de São Paulo começou o ano de 2001 com uma equipe nova na prefeitura, enfrentando velhos problemas. A lista das dificuldades que devem ser solucionadas é extensa: transporte, segurança, questão social e saneamento para citar alguns. Um exemplo é a questão do transporte: a cada ano que passa, os congestionamentos se tornam mais longos e o sistema de transportes coletivos mais sobrecarregado. Os índices de violência sobem, os hospitais lotam, a população de rua se multiplica etc. Enfim, a qualidade de vida da cidade se deteriora sem parar. 

A cidade de São Paulo tem 10,5 milhões de habitantes, e ganha 150 mil habitantes todos os anos com nascimentos e imigrações. Ou seja, uma população maior que a de algumas capitais brasileiras é adicionada à capital bandeirante. O que implica em mais demanda de transporte, de vagas nas escolas, de leitos nos hospitais, de esgotos etc. 

O aumento da população incentiva a criação de mais lojas, mais restaurantes, mais hotéis com seus respectivos problemas de mais congestionamentos, mais lixo, mais violência, mais tudo.

Taxas... - O denominador comum a todos os problemas municipais é que eles aumentam a uma taxa linear com o crescimento da população; todavia, o custo das soluções sobe a uma taxa exponencial. A saturação do espaço municipal faz com que os custos de melhoria sejam proibitivos. Ilustrando o ponto, para solucionar o problema do transporte em São Paulo, é necessário expandir o metrô a um custo centenas de vezes superior à solução do mesmo problema numa cidade de tamanho médio. Além dos custos serem altíssimos e a demanda de soluções gigantesca, o orçamento da prefeitura da cidade é limitado. 

Para deteriorar o quadro ainda mais, existe um aspecto perverso na solução dos problemas de São Paulo. Se de alguma forma a qualidade de vida da cidade melhorasse, isso incentivaria a vinda de mais migrantes o que paradoxalmente, acabaria agravando os problemas de superpopulação. Ou seja, a solução dos problemas é muito difícil e complexa. 

Uma proposta fácil de implementar e que pode ajudar muito é a de congelar a área construída da cidade. A medida pode amenizar alguns dos problemas existentes e evitar o aspecto perverso mencionado acima. O efeito mais importante dessa solução é que limitaria o crescimento da população da cidade e, com isso, restringiria o crescimento dos problemas. Uma lei congelando a área construída é viável legalmente, pois a concessão de alvarás de construção é uma prerrogativa da administração municipal. Basta, apenas, a vontade política da atual prefeita. 

Implementação - A medida seria feita por meio de uma lei municipal que fixaria, nos níveis atuais, a área construída de cada bairro da cidade, mantendo a atual lei de zoneamento. Pela lei de congelamento proposta, para conseguir a autorização para construir uma área em determinado bairro da cidade, seria necessária a comprovação de haver demolido a mesma área no bairro em questão. 

Dessa forma, a área construída em cada bairro ficará congelada. Como a área construída permanecerá estável com a lei de congelamento, isso reduzirá o aumento dos problemas. A lógica da solução proposta é simples: com uma limitação de espaço construído, haverá uma expansão populacional menor, e conseqüentemente não haverá um aumento grande na pressão por ruas, segurança, hospitais, escolas etc. 

A lei municipal de congelamento também teria um efeito colateral que ajudaria os atuais proprietários de imóveis, que ganhariam um valor de demolição. Como para construir seria necessário demolir, os incorporadores, além de terem que comprar o terreno para seus empreendimentos, teriam que comprar outros imóveis no bairro e demoli-los para conseguir o alvará de construção. 

Isso aumentaria o preço dos imóveis da cidade, o que é bom para os atuais proprietários. Haveria uma diminuição nos ganhos da especulação imobiliária na construção de novos empreendimentos, porém um incentivo maior para reformar os atuais, em razão dos maiores custos para edificar. 

Efeitos - Um outro efeito colateral seria uma melhoria no nível de qualidade dos imóveis. Os piores imóveis da cidade teriam um valor de demolição maior que o valor intrínseco. Dessa forma, haveria uma pressão do mercado comprando imóveis de pior qualidade apenas pelo valor de demolição para construir. Evidentemente, tem que haver uma preocupação especial para que imóveis com valor histórico não sejam demolidos, mas isso pode ser resolvido facilmente através de incentivos convenientes. 
 

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O congelamento da área urbana proposto é uma solução de longo prazo para alguns problemas apenas e seu impacto, a curto prazo, é mínimo.
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Um aspecto negativo é que a medida aumentará a pressão que existe sobre a população marginalizada que não tem vivendas regularizadas. Todavia, esse é um dos maiores problemas atuais da cidade, não é trivial e será intensificado com a medida proposta. A outra dificuldade da lei de congelamento é que deve enfrentar os interesses da especulação imobiliária que será prejudicada. 

Se a lei for sancionada e funcionar, haverá uma transferência da pressão populacional de São Paulo para outros municípios, especialmente os vizinhos. E isso é justamente o que se busca. Apesar de seus problemas, esses municípios não têm um nível de saturação urbana tão elevado quanto o paulistano. Dessa forma, a solução de seus problemas não será tão cara, e a relação custo-benefício dos problemas urbanos do Estado melhorará.

Os problemas de São Paulo vêm de muito tempo atrás e não existe uma solução mágica, instantânea. É necessário trabalhar muito, em muitas frentes. O congelamento da área urbana proposto é uma solução de longo prazo para alguns problemas apenas e seu impacto, a curto prazo, é mínimo. Porém, permitirá um horizonte mais definido para a cidade e um crescimento mais ordenado e de melhor qualidade.

(*) Roberto Luís Troster é professor titular da PUC-SP e editor de ‘Um Novo Século, Um Novo Brasil’ (Makron Books).