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Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 09/08/00 23:13:18
Edição 088 - AGO/2000 

Editorial

Dinheiro público e salários

Luiz Carlos Ferraz, editor

Duas perguntas básicas devem ser feitas aos candidatos que disputam as eleições a prefeito e vereador: o que acham do dinheiro público e o que pretendem fazer com o seu respectivo salário. Será a partir dessas respostas, comparadas com os exemplos do cotidiano de cada um, especialmente daqueles que buscam a permanência nos postos fazendo das tripas coração, que será possível traçar um perfil do político que queremos para nos representar, seja no Executivo ou no Legislativo municipais. 

É lamentável, mas parece ainda vigorar na cultura do político tradicional que o dinheiro público, em vez de significar de todos, quer dizer de ninguém. Tratado assim, no caso do Executivo, o prefeito é embalado pelo seu poder discricionário e pela frágil fiscalização exercida pelos outros poderes, e acaba agindo descuidadamente, aplicando os recursos em projetos nem sempre prioritários, e pior, gastando o que não tem e endividando a Municipalidade. No caso do Legislativo, diante da possibilidade de qualquer cidadão vir a ser vereador, a briga por uma das cadeiras disponíveis significa para muitos a certeza de salário fácil - afinal é dinheiro público - com pouco esforço. 

Assim é que, em cada município, no pleito de 1º de outubro, há centenas de candidatos querendo ocupar uma vaga de vereador e outros tantos de prefeito. Em face disso, e até considerando o exemplo de inúmeros países, como reagiriam esses candidatos se para a função pública de prefeito e vereador - especialmente de vereador, para a qual não se exige dedicação integral - não houvesse salário? Será que sem remuneração haveria tantos interessados em prestar serviços a sua comunidade?

Nas Câmaras, renovação já

Com a manutenção da regra da reeleição para a vaga de vereador, somente em casos de morte (caso do santista Noé de Carvalho) ou de postulação ao cargo de prefeito (caso do Tomas Söderberg) ou vice-prefeito, a grande maioria dos atuais vereadores da Baixada Santista é candidata a mais quatro anos de mandato.

Trata-se de uma tendência que inibe a evidente necessidade de renovação nos atuais quadros políticos – alguns citados em denúncias cabeludas envolvendo narcotraficantes e investidores internacionais -, o que deixa claro que ser vereador tornou-se uma profissão rentável, aliás não como qualquer outra, onde são exigidos resultados e comportamento exemplar para a permanência no cargo. Ao contrário, cada vez mais a política na vereança é confundida com negócio, ou melhor “business”, o que é um desvio e tanto.

Para ser vereador, mais do que “capacidade empresarial”, é fundamental que haja vocação em servir à cidadania para desapegar-se de um polpudo salário e demais regalias, como a nomeação de assessores, totalizando, no caso de Santos, um rendimento em torno de R$ 30 mil por mês, coisa de R$ 350 mil por ano.

Bom exemplo em Santos da legislatura que está no fim é o do vereador Jama, do PSDB. Ele doou todos os seus salários e de assessores ao Desafio Jovem, entidade ligada à igreja evangélica, que cuida de dependentes em drogas, e hoje gaba-se de um mandato livre das denúncias e ter ajudado o tratamento de dependentes.
Jama motivou atitude semelhante da candidata do Partido Verde, Sandra Netto, que registrou escritura pública doando todos os seus vencimentos e de assessores, caso eleita, a entidades que cuidam de menores carentes. “A função de vereador não pode ser remunerada”, afirma ela.

Propina a federais no Porto

A CPI do Narcotráfico da Assembléia Legislativa ouviu, no dia 23, o depoimento do empresário Osvaldo Ferreira Vicente, sócio-proprietário da empresa Arizona Machinery Sales Importação e Exportação Ltda., de São Paulo, que relatou como sua empresa foi lesada e extorquida por um grupo de funcionários da Receita Federal que agem mancomunados com despachantes aduaneiros e donos de armazéns no Porto de Santos. 

Segundo a denúncia, a empresa de Vicente importou para a Metalúrgica Ozam, de Indaiatuba, 16 prensas mecânicas usadas do Japão. A metalúrgica teria contratado – por 300 mil dólares - um engenheiro que produziu laudo falso sobre a natureza do equipamento, de modo a reduzir de 45% para 5% o IPI dos produtos importados. A empresa acabou ficando apenas com 8 das prensas encomendadas e outros lotes acabaram sendo apreendidos no porto, somente sendo liberados mediante pagamento de propinas e participação em leilões viciados comandados por três fiscais da Receita, um despachante aduaneiro e uma empresa de armazenamento de cargas e terminal alfandegado. 

Embora não haja denúncias referentes a tráfico de drogas, o depoimento do empresário reforçou na CPI a convicção da vulnerabilidade da movimentação de cargas em contêineres no porto de Santos, tanto pela menção à abertura ilegal de contêineres no armazém alfandegado quanto pela participação em fiscais da Receita em atividades criminosas relatadas pelo depoente. A CPI já denunciou que mais de 95% das cargas em contêineres no porto de Santos são movimentadas sem fiscalização de seu conteúdo, o que leva à suspeita de vários órgãos policiais internacionais e nacionais sobre tráfico de drogas, armas e contrabando através do porto.