Editorial
Dinheiro público e salários
Luiz Carlos Ferraz, editor
Duas perguntas
básicas devem ser feitas aos candidatos que disputam as eleições
a prefeito e vereador: o que acham do dinheiro público e o que pretendem
fazer com o seu respectivo salário. Será a partir dessas
respostas, comparadas com os exemplos do cotidiano de cada um, especialmente
daqueles que buscam a permanência nos postos fazendo das tripas coração,
que será possível traçar um perfil do político
que queremos para nos representar, seja no Executivo ou no Legislativo
municipais.
É lamentável, mas parece
ainda vigorar na cultura do político tradicional que o dinheiro
público, em vez de significar de todos, quer dizer de ninguém.
Tratado assim, no caso do Executivo, o prefeito é embalado pelo
seu poder discricionário e pela frágil fiscalização
exercida pelos outros poderes, e acaba agindo descuidadamente, aplicando
os recursos em projetos nem sempre prioritários, e pior, gastando
o que não tem e endividando a Municipalidade. No caso do Legislativo,
diante da possibilidade de qualquer cidadão vir a ser vereador,
a briga por uma das cadeiras disponíveis significa para muitos a
certeza de salário fácil - afinal é dinheiro público
- com pouco esforço.
Assim é que, em cada município,
no pleito de 1º de outubro, há centenas de candidatos querendo
ocupar uma vaga de vereador e outros tantos de prefeito. Em face disso,
e até considerando o exemplo de inúmeros países, como
reagiriam esses candidatos se para a função pública
de prefeito e vereador - especialmente de vereador, para a qual não
se exige dedicação integral - não houvesse salário?
Será que sem remuneração haveria tantos interessados
em prestar serviços a sua comunidade?
Nas Câmaras, renovação
já
Com a
manutenção da regra da reeleição para a vaga
de vereador, somente em casos de morte (caso do santista Noé de
Carvalho) ou de postulação ao cargo de prefeito (caso do
Tomas Söderberg) ou vice-prefeito, a grande maioria dos atuais vereadores
da Baixada Santista é candidata a mais quatro anos de mandato.
Trata-se de uma tendência que
inibe a evidente necessidade de renovação nos atuais quadros
políticos – alguns citados em denúncias cabeludas envolvendo
narcotraficantes e investidores internacionais -, o que deixa claro que
ser vereador tornou-se uma profissão rentável, aliás
não como qualquer outra, onde são exigidos resultados e comportamento
exemplar para a permanência no cargo. Ao contrário, cada vez
mais a política na vereança é confundida com negócio,
ou melhor “business”, o que é um desvio e tanto.
Para ser vereador, mais do que “capacidade
empresarial”, é fundamental que haja vocação em servir
à cidadania para desapegar-se de um polpudo salário e demais
regalias, como a nomeação de assessores, totalizando, no
caso de Santos, um rendimento em torno de R$ 30 mil por mês, coisa
de R$ 350 mil por ano.
Bom exemplo em Santos da legislatura
que está no fim é o do vereador Jama, do PSDB. Ele doou todos
os seus salários e de assessores ao Desafio Jovem, entidade ligada
à igreja evangélica, que cuida de dependentes em drogas,
e hoje gaba-se de um mandato livre das denúncias e ter ajudado o
tratamento de dependentes.
Jama motivou atitude semelhante
da candidata do Partido Verde, Sandra Netto, que registrou escritura pública
doando todos os seus vencimentos e de assessores, caso eleita, a entidades
que cuidam de menores carentes. “A função de vereador não
pode ser remunerada”, afirma ela.
Propina a federais no Porto
A CPI
do Narcotráfico da Assembléia Legislativa ouviu, no dia 23,
o depoimento do empresário Osvaldo Ferreira Vicente, sócio-proprietário
da empresa Arizona Machinery Sales Importação e Exportação
Ltda., de São Paulo, que relatou como sua empresa foi lesada e extorquida
por um grupo de funcionários da Receita Federal que agem mancomunados
com despachantes aduaneiros e donos de armazéns no Porto de Santos.
Segundo a denúncia, a empresa
de Vicente importou para a Metalúrgica Ozam, de Indaiatuba, 16 prensas
mecânicas usadas do Japão. A metalúrgica teria contratado
– por 300 mil dólares - um engenheiro que produziu laudo falso sobre
a natureza do equipamento, de modo a reduzir de 45% para 5% o IPI dos produtos
importados. A empresa acabou ficando apenas com 8 das prensas encomendadas
e outros lotes acabaram sendo apreendidos no porto, somente sendo liberados
mediante pagamento de propinas e participação em leilões
viciados comandados por três fiscais da Receita, um despachante aduaneiro
e uma empresa de armazenamento de cargas e terminal alfandegado.
Embora não haja denúncias
referentes a tráfico de drogas, o depoimento do empresário
reforçou na CPI a convicção da vulnerabilidade da
movimentação de cargas em contêineres no porto de Santos,
tanto pela menção à abertura ilegal de contêineres
no armazém alfandegado quanto pela participação em
fiscais da Receita em atividades criminosas relatadas pelo depoente. A
CPI já denunciou que mais de 95% das cargas em contêineres
no porto de Santos são movimentadas sem fiscalização
de seu conteúdo, o que leva à suspeita de vários órgãos
policiais internacionais e nacionais sobre tráfico de drogas, armas
e contrabando através do porto. |