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Movimento Nacional em Defesa
da Língua Portuguesa
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NOSSO IDIOMA
Minhas opiniões no debate do Idioma
Carlos Pimentel Mendes (*)
Permitam-me, na qualidade de responsável
pela colocação na Internet das páginas do MNDLP, que reúna aqui algumas posições que tenho apresentado no fórum
Idioma, para usar como referência quando tiver de voltar ao assunto, evitando a repetição de mensagens extensas. Destaco que as
opiniões aqui representadas nem sempre coincidirão com o pensamento do MNDLP, devendo ser consideradas em princípio como
exclusivamente de caráter pessoal.
Os textos receberam uma classificação básica por tema (o índice) e em
alguns casos são antecedidos pela mensagem (em verde ou vermelho) que originou o comentário. Grifei (em negrito) alguns trechos
chaves de minha argumentação:
I) Liberdade de expressão/nazismo/alfabetização.
II) Espinha dorsal do idioma
III) Definição de MNDLP/Mercado para produtos em
português
IV) Tradução de nelogismos
V) Projeto de lei sem fundamento?
VI) Estrangeirismos e a defesa da economia nacional
VII) Aula de informática
I) Mensagem enviada por Sônia
Bidutte em 11/8/2000:
"Acho que qualquer imposição a respeito da língua cheira a nazismo. Todos
têm o direito de se expressar da maneira que quiser. Ninguém tem o direito de impor um sentimento de patriotismo. Acima da pátria
está a individualidade de cada cidadão desde que essa individualidade não venha a prejudicar outros. Não vejo nenhuma intenção de
prejudicar alguém quando utilizo um termo em língua estrangeira. Somos uma pátria livre e temos o direito de nos expressar da
maneira que quisermos. Querer regular os termos que usamos para nos expressar é o mesmo que condenar Guimarães Rosa por ter criado
novos termos. Qual a diferença entre criar novos termos e adotar outros que já existem?
Preconceitos contra línguas estrangeiras? Preconceitos contra os povos
que as utilizam? É preciso ter muito cuidado com essa lei. Repito: vivemos num país livre e cada um deve ter o direito de se
expressar da maneira que quiser. Essas imposições me cheiram a nazismo. Uma nação precisa de leis para que as pessoas não
possam prejudicar outras com seus atos. Só. Ninguém pode ser obrigado a usar as palavras impostas por uma lei. Isso é o mais
completo absurdo.
Afinal, vivemos numa democracia ou não? Fico imaginando uma "brigada
linguística" exigindo o cumprimento da lei. Seria mesmo "digno de uma comédia surrealista".Essa lei fere os meus princípios de
democracia. Uso a palavra que eu quiser e pronto: do inglês, francês, alemão, sânscrito, esperanto ou seja lá qual for. Ou será que
a GESTAPO vai me prender por isso? Acorde, minha gente! Essa lei é no mínimo ridícula. Já que vocês querem defender a unidade do
país, comecem organizando movimentos de alfabetização em massa. Eu disse ORGANIZANDO e não REIVINDICANDO. O povo agradeceria,
garanto. Abraços a todos.
Sonia Bidutte
Atibaia-SP"
Cara Sônia,
Sabia que, em russo, seu nome é um diminutivo carinhoso de Sofia,
palavra grega que significa Sabedoria?
Suas ponderações são válidas, e peço aos colegas de lista que as
considerem como oportunidade ótima para debatermos - em alto nível de educação - essas questões, que estão de fato na cabeça de
muita gente.
Concordo com você que todos têm o direito de se expressar. Os
filósofos gregos debateram muito esse ponto, a liberdade de expressão é um bem pelo qual a Humanidade deve lutar. Mas, esses mesmos
filósofos, os amigos (filo = amigo) do Saber (sofos, daí Sofia), também entenderam que o direito de um termina onde começa o
direito do outro. Essa definição é a base de qualquer teoria social, não é possível uma sociedade em que cada um faça o que
quiser, quando quiser e como quiser, sem considerar os direitos dos demais.
Assim, para permitir a convivência social, foram criadas regras,
que necessariamente limitam um pouco a liberdade de cada um, até para que direitos conflitantes sejam acomodados. Se todos têm o
direito de matar, como fica o direito de permanecer vivo? Democracia é um conjunto de regras sociais como qualquer outro sistema
político...
Bem, no caso do idioma, imagine se cada um de nós se expressasse sem
qualquer regra?
xouflçjçluuojlkç~kjlkhjkhoiuiualsilIIIIIIJHho´çqão
Entendeu a linha acima? Usei minha liberdade plena de expressão... Por
um momento, violei seu direito a entender o que lhe está sendo dito. Daí as convenções necessárias. De que nosso idioma oficial é o
Português. Dentro do idioma, que os verbos devem ser conjugados de determinada forma, assim por diante.
Quando você usa um termo em língua estrangeira, talvez em certas
situações não traga prejuízo algum ao interlocutor. Mas, se estivesse em dificuldades dentro do Brasil, você gritaria "Help!",
"Au secours!" - ou "Socorro!" ? Se gritar "Au secours!", vai se sentir prejudicada quando ninguém prestar socorro?
Quando criamos um termo dentro de nossa língua, esse termo é uma
derivação que se encaixa em nossas regras gramaticais (ao menos, deveria), mantendo parte do conceito original. Estamos
acrescentando uma dimensão a um conceito que já dominamos. Portanto, estamos enriquecendo nosso idioma.
Quando substituímos um termo de nosso idioma por uma palavra de
outra origem, estamos impedindo que nosso idioma evolua, ao mesmo tempo em que ajudamos na evolução de um idioma concorrente. Nosso
idioma tem seu uso diminuído, e com isso toda a nossa cultura é diminuída também.
Disse concorrente, pois idioma é também um produto cultural,
negociável internacionalmente, e grande fonte de riquezas. Se o português fosse o idioma dominante, talvez você estivesse
trabalhando hoje em Paris, Washington, Moscou, ensinando o nosso idioma aos lá residentes. E ganhando dinheiro com isso. É por isso
que outros povos buscam fazer com que usemos seu idioma. Assim, eles não gastam tanto dinheiro traduzindo filmes, músicas e manuais
para nosso idioma, e ainda ganham dinheiro ensinando o idioma deles para nós.
Além disso, formam no Brasil um mercado consumidor da música caipira
deles (que eles chamam de country music), dos filmes deles (veja a história de como foi destruída a indústria cinematográfica
brasileira), até das festas deles (estamos deixando de comemorar as festas juninas para festejar o Dia das Bruxas). Poderíamos estar
faturando muito vendendo aos irmãos estrangeiros livros, revistas e filmes baseados em nosso riquíssimo folclore, e com isso menos
gente no Brasil estaria sem emprego, não é?
Assim, defender o idioma não é de preconceito, mas uma forma de
defesa de nossa comunidade nacional. Se você despreza o português e valoriza o idioma de outro povo, está agindo contra os
interesses de nossa comunidade chamada Brasil, na medida em que transfere poder a esses outros povos. O poder de nos forçar a pensar
e agir como eles, consumir os produtos deles, trabalhar para o enriquecimento deles. O poder de fazer (por meio de técnicas de
indução coletiva) com que aceitemos incondicionalmente o que eles nos vendem, inclusive o que eles mesmos consideram como lixo e não
querem na casa deles.
Você falou de nazismo. Hitler não pegou em armas para se impor ao povo
alemão, ele seduziu os arianos com o sonho de superioridade dessa raça. De repente, já era proibido ser contrário a tais teorias.
Estamos agora sofrendo algo parecido. Como "todo mundo" fala inglês, quem não sabe inglês é inferiorizado. Para se virar numa cidade
brasileira, você "tem" de saber o que é delivery, home, personal, food, e saber como se pronuncia
corretamente o nome de um prédio. "Tem" de gostar de Halloween e de "country music", mas detestar "música caipira".
O estadunidense que vem ao Brasil se acha no direito, em certos casos,
de só falar inglês, nós é que temos de entendê-lo. Isso não lhe "cheira a nazismo"? As matrizes estrangeiras de várias corporações
já exigem que os produtos sejam lançados no Brasil com nomes e até embalagens em idioma estrangeiro. Nas gravadoras e nas rádios, a
maioria absoluta das músicas é em inglês, com a desculpa de que "é o que o público quer". Qual você pensa que foi o argumento de
Hitler para condenar os judeus? E como você pensa que Hitler, com a parceria do propagandista Goebbels, fez com que o povo quisesse
a dominação ariana?
Bem, não pretendemos que haja dominação por parte do nosso idioma.
Ficaria contente apenas se houvesse igualdade de condições. Veja: em seu próprio país, você compra um produto nacional e tem que
contratar um tradutor juramentado para entender o manual e o contrato de garantia. Caso não entenda, azar o seu. Se o
videocassete não gravar o programa por você não ter entendido adequadamente o manual, você fica no prejuízo, nem pode reclamar com o
fabricante. Acha isso normal e aceitável? Gostaria que o contrato do seu cheque especial viesse com cláusulas exclusivamente em
sânscrito? Ou em castelhano, usando palavras especialmente escolhidas pela semelhança com o português, mas de forma a induzi-la a
erro - que você só vai perceber quando não encontrar mais o dinheiro na conta?
Não é exagero. Vou exemplificar com um golpe acontecido ainda no ano
passado, aplicado não pelo Zé da Esquina, mas pela maioria das grandes corporações de informática. Assustados com a ameaça de
processo dos clientes, em função da Falha do Milênio (um defeito de fabricação), os fabricantes de computadores e programas
incluíram nos contratos de garantia a informação (em inglês): "adequado ao Bug do Milênio". Você vê isso, entende que não terá
problemas. Só que não é bem assim. Só depois dos problemas é que as empresas prejudicadas perceberam a malandragem: os fabricantes
colocaram no contrato a palavra "capable" em lugar de "compliant", que tem tradução parecida, mas em inglês é muito
mais abrangente. A diferença é que, no primeiro caso, os fabricantes livram a cara quando o equipamento pseudo-garantido
falha.
Não temos no MNDLP preconceito contra línguas estrangeiras, o que
temos condenado é a anarquia que está se formando, com situações ridículas de substituição de palavras. Como uma escola de
inglês colocar um anúncio em inglês para atrair alunos. Se a pessoa já sabe inglês, o anúncio é inútil. Se não sabe, o anúncio
também é inútil, pois o público-alvo não vai entender a mensagem.
Até aí, azar dessa escola. Mas, se eu tiver de saber outro idioma para
entender que corro o perigo de ataque por um cão ao entrar numa casa brasileira, pois a placa não foi escrita em português, vou
brigar feio. O dono tem a obrigação legal de me alertar para o perigo, e não pode escolher a seu bel-prazer qualquer um dos mais de
dez mil idiomas e dialetos existentes no mundo. Não tenho a obrigação de saber todos eles. Muito menos de conhecer um idioma que
essa pessoa tenha inventado só para usar na tal placa.
Perdoe a extensão desta mensagem, que ainda continua. É que, de fato,
o tema é amplo.
Completando o raciocínio. Se existem leis, seria desejável que
simplesmente elas fossem obedecidas por todos. A lei proibe matar, então ninguém mata. Na prática, não é o que acontece. Se um
parente seu levar um tiro, você considerará uma comédia surrealista que uma brigada policial saia no encalço do agressor? (Bem,
no Brasil, talvez, mas é outra história...). É preciso que alguém atue no sentido de fazer com que as leis sejam cumpridas.
Inclusive a do idioma.
Por fim, a questão de alfabetização em massa. Em inglês, francês,
espanhol, sânscrito, mandarim... ou em português? Alfabetizar significa ensinar a alguém as regras do alfabeto, dentro de um
idioma escolhido. Que regras, então, se em sua opinião cada um deve ter o direito de se expressar da maneira que quiser? Quando o
professor reprova o aluno por não saber as regras gramaticais, deve ser levado ao Tribunal de Nuremberg? Afinal, ele está
impondo ao aluno a condição de só ser aprovado se seguir determinadas regras. Isso é o que você parece classificar como nazismo...
Usando o raciocínio que você apresentou, o aluno tem o direito de se expressar até numa língua que ele mesmo inventar e que ninguém
mais compreenda, e ser considerado alfabetizado.
Há gente (pouca, embora) cuidando da alfabetização. Aliás, ela é
obrigação constitucional do Estado-nação. No que pudermos, certamente vamos ajudar. Mas não havia quem cuidasse do problema dos
estrangeirismos. Não podemos fazer tudo. Queremos fazer ao menos uma parte. "Organizando e não reivindicando" o uso da língua que os
brasileiros escolheram oficialmente para se comunicarem.
II) [17/8/2000] Venho colocar
para debate esta questão:
Algumas pessoas, nesta lista ou em jornais e programas de
televisão, partem da premissa de que a língua portuguesa não corre perigo enquanto as pessoas apenas importam as palavras e as
encaixam em nossa estrutura gramatical. To delete seria perigoso, deletar não.
Considerando tal premissa, entendo que não estaria ferindo gravemente
nosso idioma ao escrever:
Be or not be
em lugar de
Ser ou não ser.
Reparem que criei uma adaptação, a frase original em inglês seria To
be or not to be, revelando uma outra construção gramatical. Já que "abrasileirei" a célebre frase de William Shakespeare, retirando
a partícula "to", devo entender que o resultado está plenamente de acordo com a gramática portuguesa, não ferindo a espinha dorsal
do idioma, que se vergou mas resistiu a tantas outras aculturações (francesa, italiana, espanhola etc.).
Mantendo a premissa, e unindo-a à de que uma língua viva deve poder
importar expressões de outros idiomas ou se renovar através de neologismos, sem qualquer controle, devo entender que numa prova
qualquer de Língua Portuguesa serei aprovado se construir frases assim. O professor pode corrigir erros de concordância, mas nunca
os de grafia, pois na verdade não são erros, mas neologismos que acabei de inventar e devem ser incorporados ao nosso idioma. Certo?
Bem, para mim, errado. Penso que não é o esqueleto que define a
personalidade do ser humano. Por analogia, se me permitem a liberdade, não é o esqueleto do idioma que o define.
Esqueleto por esqueleto, da mesma forma que homem e mulher são
considerados da mesma espécie humana, português e espanhol têm esqueletos bastante parecidos. O francês não fica tão distante,
ou o italiano, já que todos provêm do latim.
Talvez o idioma seja mais definido pela grafia das palavras e por
sua sonoridade do que propriamente pelo "esqueleto". Vá lá que seja, atribuamos pesos iguais a sonoridade, grafia e "esqueleto".
"Be or not be" não é portanto sequer um neologismo válido, nem mesmo uma transliteração aceitável, é simplesmente uma
aberração.
Se concordamos até aqui, concordamos também que é inaceitável o uso de
expressões como "printar" e "deletar".
O emprego de expressões de outros idiomas só é compreensível na
situação de não termos em nosso idioma palavras que exprimam o mesmo conceito. E o ideal é que os doutores da língua, os filólogos,
analisem o caso e divulguem a expressão - o neologismo - mais ajustada ao caso, dentro dos cânones de nosso idioma.
E este é um problema a ser enfrentado. Concordo em que precisará
ser aprofundado o debate sobre a aplicação da lei projetada pelo deputado Aldo Rabelo, pois infelizmente temos visto que os
representantes da Academia Brasileira de Letras e os autores de dicionários estão preguiçosamente adotando a tática de incluir
quaisquer palavras na lista de vocábulos de nosso idioma, sem qualquer reflexão prévia. Isto é, parece até que basta alguém usar
uma palavra estrangeira uma vez em algum lugar do mundo, no meio de uma frase em português, para ela ser considerada automaticamente
incorporada ao nosso idioma. Temos debatido sobre isso nesta lista. Nessa linha de raciocínio, logo o Português será a língua com
mais vocábulos do mundo, pois incorporará todos os vocábulos de todos os outros idiomas...
Bem, eis a idéia. Creio que pessoas com maiores e melhores
conhecimentos poderão continuar daqui o raciocínio e levá-lo a conclusões aceitáveis. Embora creia que os comentários acima estejam
dentro da média dos conceitos expressos pelo MNDLP, e eu seja membro da coordenação desse movimento, esclareço que esta mensagem
deve ser entendida apenas como posição pessoal, uma contribuição ao debate, talvez um ponto de partida para estabelecermos futuras
diretrizes do movimento quanto à defesa de nosso idioma.
Aguardo os comentários dos participantes desta lista. Em alto nível,
por favor.
Gostaria de lembrar que o MNDLP não é composto, até o momento, por
doutores na língua, mas por pessoas comuns, de variadas profissões, de diferentes crenças e posições partidárias, com diferentes
níveis de escolaridade, todas falíveis, mas unidas pelo objetivo comum de tentar melhorar o uso que fazemos de nosso idioma.
Todos estão conscientes de que isso é um projeto para mais de uma
geração, e que no entretempo vamos continuar usando expressões estrangeiras - até por distração ou pela necessidade de nos fazermos
entender pela média do público. Apontá-las é válido, como chamamento à conscientização, ao raciocínio sobre esses casos pontuais,
mas penso (posição pessoal!!!) que não devemos fazer disso o cavalo-de-batalha. Nem sempre podemos - no contexto atual - usar as
palavras ideais -, e muitas vezes até faltam definições sobre quais sejam elas. O que é bem diferente de incentivar o uso de
palavras estrangeiras e a adoção irracional de costumes estrangeiros (ponto a debater: sei que esta é uma zona de sombra, precisa de
mais debates para ser mais esclarecida...)
A idéia é que, a partir de um passo inicial como o projeto de lei
ora em tramitação na Câmara Federal e a criação do MNDLP, gradualmente as pessoas comecem a discutir o que está acontecendo com o
idioma, sua importância como elemento de identidade nacional, até mesmo os aspectos socioeconômicos envolvidos na defesa do idioma
(com implicações na riqueza nacional, no mercado de trabalho etc.).
E então, que seja pactuado algum tipo de "contrato social" que
estabeleça até onde é aceitável/defensável ou não o uso de estrangeirismos. Passando pela definição de que dicionários são
sérios ou caça-níqueis, do que pode ser entendido como efetivamente incorporado ao idioma ou é "forçação de barra" de meia dúzia de
novos-ricos que penduram palavras como pendurariam melancias no pescoço se isso fosse "chic" - como eles dizem.
"Nem superprotetor que sufoque, nem tão liberal que permita cair no
abismo, mas dentro de parâmetros que permitam que se desenvolva e se firme nos próprios pés" (este é o conceito, talvez alguém
já o tenha citado antes, até com melhores palavras).
III) Mensagem de LFAP (*) em 15/8/2000:
Sabe por que eu decidi participar da Lista?
Porque a Lista faz parte do Movimento Nacional em Defesa da Língua
Portuguesa!
A Dona Sonia deixou transparecer claramente, na sua opinião pessoal, que
o Projeto do Deputado Aldo é pura perda de tempo, então por que ela estava na Lista?
Quem está errado? Eu, um radical nacionalista?! Ou a Dona Sonia?! Será
que eu estou mal informado sobre os objetivos do MNDLP?!
Eu explico:
É um MOVIMENTO...
A palavra expressa o sentido de ação, de união em torno de um mesmo
objetivo! Uma união passiva ou ativa?! Se for ativa, então os integrantes devem fazer um pouco mais do que ficar digitando palavras
bonitinhas para os demais lerem ao final do dia, certo? Eles devem praticar o que aprendem no Movimento!
O Movimento é NACIONAL...
Ou seja, é integrado por brasileiros, e, para mim, a palavra "brasileiro"
já define metade da essência do Movimento!
É Nacional em DEFESA...
Oh sim! Está ficando cada vez mais claro! A outra metade da essência já
está quase definida! É uma união de brasileiros defendendo algum
interesse
específico! Isso é bom!
É em Defesa da LÍNGUA PORTUGUESA...
Uau! Heureca! É isso! O Movimento não defende o "sirilês" ou "jiquivês" -
defende o Português! Isso significa que todos os integrantes do Movimento
são defensores da Língua Portuguesa?! Bom, nem tanto, pois a Dona Sonia
não compartilhava das mesmas idéias! Então por que ela não fundou o
Movimento
Nacional em Defesa do Sirilês?! O que ela estava fazendo aqui, debochando
do Português com a aceitação de todos?! Uma regrinha radical-nacionalista
básica, para você meditar: "Toda ação de Deboche e Ataque deve produzir
uma reação maior de Deboche e Ataque".
Enfim, caso você queira tomar algumas aulas extras sobre o
radical-nacionalismo é só prosseguir a conversa! Mas antes eu sugiro que você faça algumas leituras básicas, como por exemplo a vida
de Mahatma Gandhi, aquele líder indiano que conseguiu reunir multidões para queimar roupas inglesas em praça pública.
Sabe o que eu estava pensando? Dê uma olhadinha no seu relógio de
pulso. Se ele for como a maioria dos relógios, acredito que ao lado da data estará a abreviatura "TU"! O que é isso?! Eu te
pergunto: a maioria dos brasileiros sabe o que isso significa?! Por que não está escrito "TE" ou "TERÇA"?! Por isso fiquei
imaginando uma revolução cultural no Brasil, uma ação de desprezo às imposições estadunidenses... Imagine uma enorme fogueira em
praça pública, onde são queimados todos os relógios de pulso com grafia em inglês! Que tal?! Nós temos a coragem de fazer isso?! Nós
vamos exigir relógios de pulso com palavras em Português?! Não é por nada não, mas eu sou obrigado a utilizar um produto com várias
funções que eu desconheço completamente?! O que significa isso no meu relógio da Casio: "Hourly Time Signal", "Analog", "Set", "Water
Sports", "Select", "Mode", "Alarm", "Dual Time"???!!! Eu sou obrigado a compreender tudo isso???!!! Nós vamos defender a utilização
do inglês ou do Português???!!! Será que eu estou na Lista errada???!!! Hein, companheiro???!!! Pois fique sabendo que o "tio sam"
debocha na cara de todos nós, e vai continuar debochando e sugando o sangue do povo brasileiro!!! Você quer vender a sua
Pátria???!!! Ou você quer defender a sua Pátria???!!!
Mensagem de Sigmatec em 16/8/2000:
O LFAP(*) parece mais um lunático, e ainda nem
mesmo tem consciência de processos industriais, já que mostra-se totalmente ignorante em matéria de economia de escala: quem poderia
imaginar que a indústria estrangeira vá fabricar um reloginho só para o Brasil, em detrimento de MILHÕES de outros
consumidores no mundo todo, já que a indústria NÃO FABRICA relógios para um determinado país, mas para vender a sua LINHA DE
PRODUTOS, o seu ESTOQUE, para quem queira comprar, independentemente do idioma que fale, só porque um maluquete brasileiro não
concorda com isso?
Caro Carlos Haddad, caro LFAP(*) (por telepatia,
já que deixou a lista, segundo
soube): nem 8, nem 80, vejamos:
1) O Brasil, com mais de 150 milhões de habitantes, já tem um
mercado consumidor que justifica a produção de grande parte das mercadorias com caracteres em português. Pode ainda não ser um
mercado de alto poder aquisitivo, mas é considerável o suficiente para atrair a atenção das multinacionais. Bem pouco inteligentes
são as que não perceberem isso antes da concorrência.
2) As empresas que querem vender realmente, e não apenas empurrar
produtos goela abaixo dos cucarachas, têm uma política de nacionalização que inclui a tradução cuidadosa dos manuais para o
idioma local. Já abri embalagem de videocassete japonês, importado legalmente, e que chegou com manual em português perfeito,
instruções na tela também em português e também uma lista de oficinas de assistência técnica que incluía até uma na via em que moro.
Enquanto isso, certas empresas ditas nacionais fabricam em Manaus para obter descontos nos
impostos federais (bem, a mamata agora foi bem reduzida, mas esse é
assunto para
outra lista...) e nos impingem produtos em outros idiomas.
3) Várias multinacionais já perceberam que vendem muito mais se
cuidam da correta tradução de seus produtos, pois a maioria absoluta da população não domina idiomas estrangeiros e deixa de comprar
por simplesmente não entender como o produto funciona ou para que serve. Mahatma LFAP(*), se estiver me
sintonizando telepaticamente em meio à sua mais nova greve de fome em prol da paz na Índia, saiba que a Coca-Cola não usa há
muitos anos expressões como Drink Coke, seus anúncios são em português. Por que será? Os produtos da Microsoft, como o Windows,
também chegam em português, mesmo que um tanto macarrônico às vezes, e mereçam críticas quanto às falhas - é outra história. Mas,
quando o Windows chegou ao Brasil e por aqui se difundiu, era em inglês, lembram? Se o produto estava "consagrado" em inglês, por
quê a Microsoft se deu ao trabalho de traduzi-lo para nosso idioma? Não foi para fazer um agrado aos ativistas do MNDLP, que
surgiram bem depois - fica evidente que existiu uma forte razão de caráter econômico e que, feitas as contas, era mais lucrativo
fazer a tradução do produto...
4) Os itens acima valem para qualquer outro país: uma montadora de
automóveis norte-americana quebrou a cara no Japão ao tentar forçar os japoneses a comprarem carros com direção invertida em relação
ao padrão local. Quem tentar vender produtos nos mercados árabes fora dos padrões ditados pelas religiões e tradições locais dança,
a Sadia sabe muito bem a que me refiro. Experimente o McDonalds não adaptar seus produtos aos padrões do subcontinente indiano (por
lá, vaca é animal sagrado...) e veja o que acontece. Não me alongo com outros exemplos, creio que estes bastam.
5) Para completar esta parte: tenho no pulso um relógio marca Seiko,
produzido em Manaus (e não no bairro paulistano do Brás), que tem no mostrador opções para o dia da semana em inglês e em português.
Não paguei uma fortuna por ele, nem o comprei na Cidade do Leste paraguaia, mas numa relojoaria aqui de Santos mesmo, com
certificado de garantia (em português também) e nota fiscal.
"Mas se você é mesmo RADICAL, MACHO, "BAGUAL" (como se diz no Rio
Grande do Sul), dos bons, mesmo, amigo LFAP(*), então comece por ir à agência mais próxima do Banco do Brasil
que você conheça, e ATEIE FOGO à agência, ou pelo menos às máquinas do PERSONAL BANKING. Ou então vá até o Aeroporto de
Cumbica e ATEIE FOGO, DESTRUA todos os ônibus da Viação Pássaro Marron (que pertence à ARQUIDIOCESE DE APARECIDA DO NORTE,
depositária, na sua Catedral, da imagem de Nossa Senhora Aparecida, a Padroeira do Brasil ! ...) que fazem a ligação daquele
aeroporto com diversos pontos da cidade de São Paulo em viaturas AZUIS e VERMELHAS denominadas AIRPORT SERVICE..."
Ei, ei, ei, o MNDLP não endossa comportamentos extremistas como
esse. Vamos devagar com as sugestões, senão um alien é capaz de executá-las e ainda dizer que a sugestão partiu daqui...
Agora, analisemos a mensagem do "alien", que agora usará seus poderes
telepáticos para acompanhar esta lista:
> > Eu explico:
> > É um MOVIMENTO...
Movimento tanto pode ser provocado por um furacão como por um leve
sopro. Em cada caso, deve ser dosado para não extrapolar. Furacão não produz boa música na flauta e leve sopro não tira o pó do
tapete...
> > O Movimento é NACIONAL...
Nacional, não nacionalista, nazista ou nacional-socialista etc.
Atenção ao significado das palavras...
> > É Nacional em DEFESA...
Defesa em excesso vira ataque e se torna indefensável. Você pode até
matar um ladrão que ataca a sua família, mas se usar de requintes de crueldade contra ele, se matá-lo depois que já estava
imobilizado e sem condições de novos danos (vide caso do ônibus no Rio de Janeiro), a morte do ladrão será considerada crime, não
defesa, e será tão execrada pela sociedade como a brutalidade do ladrão.
> > É em Defesa da LÍNGUA PORTUGUESA...
Sim, pretende defender o idioma, não engessá-lo e sufocá-lo como o
fazem aquelas mães superprotetoras, nem deixá-lo tão livre para se atirar no abismo, como fazem certos pais ultra-liberais. Não é
fácil encontrar a dose certa, mas o MNDLP vem se esforçando para isso. Temos debatido muito na coordenação do MNDLP essas questões,
e entendemos que o Brasil está inserido num contexto mundial de nações.
Queremos que seja respeitado nosso direito de usar o idioma português
nas comunicações entre os brasileiros, da mesma forma como os estadunidenses usam o inglês, os franceses o francês e os chineses o
chinês (com direito a todas as variantes regionais, os dialetos, sim). Mas também entendemos que "quando em Roma, faça como os
romanos", isto é, fale em italiano (ou latim, se necessário...). Em New York, fale em inglês. Em Paris, fale em francês. Para isso,
você precisa aprender esses idiomas, ou ter um tradutor por perto.
Portanto, nada contra escolas de francês, inglês, espanhol, italiano,
russo ou japonês. Nada contra o ensino de outros idiomas nas escolas, públicas ou particulares (esse conhecimento é enriquecedor).
Nossa luta é outra: é contra os "macaquitos" que simplesmente, para "aparecer", em vez de pendurar melancias no pescoço, penduram
palavras de outros idiomas nas frases que emitem, nas placas que afixam em seus estabelecimentos. E, geralmente, sequer têm noção do
significado dessas palavras e expressões que tentam usar...
Como disse, não é fácil encontrar a dose certa. Para isso, precisamos
de gente com idéias diferentes, pois o debate ajuda a afinar o discurso, além de propiciar oportunidades para que também coloquemos
nossas idéias. Apenas gostaria que fosse MANTIDO O ALTO NÍVEL (desculpem o "grito", mas às vezes faz-se necessário...), pois um dos
sofismas mais conhecidos é aquele de desqualificar o oponente, em vez de criticar a idéia que ele apresenta. Aliás, poderia dizer
que é o contrário de outro sofisma, o argumento da autoridade (aquele do "Você sabe com quem está falando?"), em que se usa a
qualificação do orador como forma de impor a idéia por ele defendida. A idéia tem que vencer ou perder no debate por si própria, não
com muletas desse tipo, que apenas fazem suspeitar de sua fragilidade e inconsistência.
OK, diriam os anglófilos, o projeto em tramitação no Congresso tem
inconsistências, pontos que necessitam debate maior, e até alguns que - é uma suspeita pessoal - podem funcionar como naquela
história do bode colocado na sala de quem costuma reclamar (está ali para ser retirado e deixar o reclamante satisfeito...).
Pensem nisso... E lembrem que, com todos os defeitos apontados pelos detratores, está servindo pelo menos para mobilizar a sociedade
para uma discussão importante.
Bem, esta mensagem já virou quase um discurso, deixo a análise do
projeto de lei para um próximo debate, quando terei o prazer de expor minhas idéias e ler/ouvir as de todos os debatedores. Sem
sofismas como os argumentos de autoridade, por favor.
P.S.: combate-se com a pena por vezes muito mais eficientemente que
com a arma, embora não pareça no primeiro momento, pois o combate não se dá à flor da pele, mas lá no fundo do cérebro. Os
defensores do idioma têm armas muito mais poderosas que os punhos e os gritos, embora alguns duvidem disso e prefiram usar a cabeça
para... dar cabeçadas!
Não é à toa que a Imprensa é chamada popularmente de Quarto Poder,
depois de Executivo, Legislativo e Judiciário, enquanto as Forças Armadas são apenas um setor subordinado ao Poder Executivo.
Pensem nisso...
IV) Tradução de neologismos [4/7/2000]
Estou pensando no comentário de uma estudante de nível superior
(jornalismo), na reportagem sobre o trabalho de preservação de nosso idioma no Tribu (do jornal santista A Tribuna,
sábado passado) - que registro, pois não foi incluído na versão eletrônica do jornal. Ela
observa que seria difícil alterar certas expressões por não existirem similares com tradução perfeita em nosso idioma. Até concordo
com ela em alguns casos, especialmente certos termos técnicos. Mas o exemplo que ela deu é "shopping center". Ou seja, ela
conhece um shopping center, freqüenta regularmente suas lojas, e não sabe que isso é simplesmente um "centro comercial".
Lembro do caso de alguém que pensou que Delivery seria um concorrente
do China in a Box, situado no mesmo prédio desse restaurante (a propósito, fui conferir para nossa seção de humor, mas eles já
aportuguesaram - não lembro agora se corretamente, mas ainda que não esteja correto o novo cartaz, pelo menos está em nosso
idioma).
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O problema das editoras é complicado, e eu também enfrento situações
assim. Quando se coloca termos simples, logo tem um "especialista" criticando que o nível baixou, que o editor não conhece o jargão
do setor, que o texto não é mais dirigido a técnicos, mas a leigos - e portanto é muito primário, não terá novidades que interessem
a um especialista. Ou seja, o leitor avalia a profundidade de um texto pela quantidade de termos técnicos e citações incluídas, e
quanto mais hermético à compreensão, mais celebrado é o seu escritor, mostra "que ele conhece extremamente o assunto sobre o qual
está escrevendo, já que consegue encaixar todos esses termos complicados".
É um dado cultural, no Brasil é tradição a "elite cultural" falar
enrolado para ser entendida (?!?) apenas por pessoas do mesmo nível - em português mesmo (ou francês, latim, até árabe e alemão,
antes mesmo da invasão inglesa. Melhores exemplos: atas de assembléia, texto escrito por advogado. Antigamente, até o início dos
anos 60, até a missa era em latim, começando pelo Dominus vobiscum...
Pensando bem, vem de muito mais longe: na Europa, até as corporações
de pedreiros, marceneiros, construtores navais etc. procuravam dificultar ao máximo que pessoas fora de seu meio pudessem entender o
seu trabalho, assim preservavam seu mercado de trabalho. Não é por acaso que maçom é uma sociedade originada nos "pedreiros
livres"...
No Egito, os escribas usavam uma escrita bem floreada, que só eles
entendiam, e com isso garantiam para si uma parcela considerável de poder. Daí, quem simplifica as coisas e permite que as massas
tenham acesso ao conhecimento é considerado um traidor da classe que até então se beneficiava dessa exclusividade de conhecimento.
Essa tendência milenar - conhecimento não difundido significa poder
para quem o detém - é que vem desaguando agora nessa moda de falar difícil, usar expressões complicadas, para mostrar elitismo. Quem
simplifica o texto é rejeitado por esse grupo, e o pior é que, de fato, quem lê um texto de fácil compreensão lembra da cartilha das
primeiras letras, acha que o autor do texto não faz parte da elite que domina o conhecimento, já que não usa o jargão dessa elite.
Não é por acaso que ficção científica é considerada genericamente como baixa ciência.
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Vou parando por aí, senão desenvolvo uma tese. A minha saída foi
colocar um glossário junto com o jornal eletrônico Novo Milênio, e aportuguesar pelo menos as expressões que ainda não
estejam consagradas, barrando excessos como o mais recente "e-frastructure" (tentativa mal sucedida de escrever e-infrastructure, ou
infra-estrutura eletrônica).
Nesta altura do campeonato, tentar traduzir mouse para rato, ou
mesmo para dispositivo apontador, por incrivel que pareça, já seria introduzir um ruído na comunicação (jargão de jornalista:
significa colocar uma expressão que dificulta o entendimento, a comunicação, soa estranha aos nossos ouvidos).
Assim, o que sugiro é pelo menos segurar as novas ondas de
estrangeirismos, procurando frear o processo de desintegração de nosso idioma. Com o tempo, ao ocorrer a reversão do processo,
podemos então começar a alterar os termos consagrados, como mouse.
No caso das editoras, elas poderiam tornar explícito o processo de
ajuste dos termos ao nosso idioma, através de um selo na capa dos livros em que defendem o idioma e também de um texto explicativo
em páginas internas, explicando aos tais professores e especialistas que o uso de termos nacionais não reduz o nível do texto,
apenas visa defender a soberania brasileira através do idioma. Mas, realmente, isso precisaria estar inserido dentro de uma ampla
campanha, desenvolvida simultaneamente em todo o Brasil, seria ingenuidade esperar que uma editora vá arriscar suas vendas
enfrentando sozinha uma tradição que, como disse acima, é milenar. O que poderá ajudar é se a lei do idioma passar no Congresso,
aí as editoras terão ao menos a desculpa de que estão ajustando os termos para cumprir a lei...
V) Mensagem de "Ferrari Maira"
(Maira Ferrari) em 22/8/2000:
"Lamento ter que informá-los que o projeto do deputado Aldo Rebelo ou
qualquer projeto purista é completamente despropositado, pois a língua é um organismo vivo e social, que sofre mudanças naturais;
uma língua não é aquela encerrada em gramáticas e dicionários. Além disso, estrangeirismos não são uma ameaça à língua, visto que
não a descaracteriza, pois uma língua não é formada só de palavras; além de estrangeirismos não modificarem o léxico, não
desestruturam a sintaxe ou semântica da língua.
É preciso lembrá-los que a língua portuguesa enriqueceu-se muito com
palavras de origem tupi-guarani, por exemplo, e a única preocupação desse fórum são os anglicismos. O que ocorre não é um problema
de cunho linguístico e sim político-econômico. É inevitável aceitar que os Estados-Unidos, hoje, dominam muitos países, o Brasil é
um deles e isso reflete-se na língua. Também é inegável que palavras inglesas são para nós, refés do capitalismo 'yankee", muito
mais charmosas e modernas que palavras portuguesas. Portanto, se algo deve ser combatido, é a dominação de um país sobre o
outro, o que não tem nada a ver com a linguagem!"
Depois de meu computador quase fundir, estou reiniciando minha
participação na lista, interrompida desde sexta-feira passada. E de cara encontro esta mensagem, que chega a ser difícil comentar,
tal o nível de "certeza" do autor, que apenas comunica suas posições como se fossem fato consumado e indiscutível. Mas, vamos lá:
lamento ter de informar que:
1) O projeto não é despropositado. No mínimo, já teria valido pelo
simples fato de provocar o debate, quem sabe acordando algumas pessoas para o problema.
2) De fato, a língua é um organismo vivo. Como uma criança, que
precisa de cuidados para se desenvolver, de limites estabelecidos para se encaminhar. Repito a expressão que usei em outra mensagem:
"nem tão superprotetora que sufoque, nem tão liberal que deixe cair no abismo".
3) Os estrangeirismos em si não são ameaça à língua, de fato, mas
quando um grupo de pessoas, em vez de colocar melancias no pescoço, começa a pendurar palavras estrangeiras nas frases, em boa parte
dos casos sem sequer ter noção de seu significado (ou da falta dele), então é hora de as pessoas se preocuparem. A situação é
tal que as pessoas já estão deixando de se comunicar, pois cada um se julga no direito de usar quaisquer palavras, em quaisquer
construções gramaticais, com qualquer pronúncia, em qualquer lugar, com qualquer pessoa.
Dentro do que postulam Ferrari Maira e outros seguidores dessa teoria
da liberdade total, llhls0 oihl w3kj ~çao jhpo nhçaao - e tratem de entender o que escrevi, pois eu me considerarei no direito de
promover mudanças idiomáticas a meu bel-prazer, problema de vocês entender o que escrevi. Estou pensando até em propor que nossos
legisladores produzam uma lei toda escrita com esses termos, obrigando todo mundo a segui-la (como a ninguém é lícito ignorar a lei,
assim que a lei "lhzáswl" for aprovada, tratem de cumpri-la e não bufem...). "Right"?
4) Maira parte de uma premissa falsa para completar o raciocínio, pois
o MNDLP e seu fórum não se preocupam "apenas" com os anglicismos, mas com o uso indiscriminado de palavras provenientes de todos
os demais idiomas. Nas fronteiras brasileiras, por exemplo, há problemas com o castelhano. Segundo: as palavras inglesas não são
"refés" (reféns?) do capitalismo ianque, necessariamente. Boa parte delas, na verdade, veio da Inglaterra, não dos Estados Unidos. E
quem disse que são charmosas? Ou modernas? Respeito a opinião expressada, mas não concordo. Site, por exemplo, vem do latim, não tem
nada de moderno, é um termo até bem antigo. E se é para falar de charme, traduza para inglês a palavra saudade, veja como fica
charmosa...
----- Encerrada a parte formal do comentário, permitam-me algumas
divagações...:
Charme por charme, deveríamos então voltar a seguir o inglês da
Inglaterra, bem mais "charmoso" que as aberrações norte-americanas. Os ingleses sabem, por exemplo, o nível social da pessoa pelas
palavras que ela emprega. Assim, um aristocrata inglês usa a "charmosa" palavra home, enquanto o populacho estadunidense usa "house".
Lembra daquele quadro, "Lar, doce lar"? Pois é, não traduza como "House, sweet house"...
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Se é para ser uma charmosa e moderna person, não vá ao shopping,
como os monkeys daqui, vá ao mall. Que é como o pessoal designa, lá nos EUA, os mercados... Aliás, Ferrari Maira se contradiz. Se é
pessoa adepta do tal modernismo charmoso, por quê não enviou sua mensagem em "yankee language"? Seria um festival de fucks e afins
digno de um movie "moderno" e "charmoso" de Hollywood...
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Lembrei agora, a propósito: o cúmulo do charm é ir a um desses shoppings
e mostrar que está up-to-date, solicitando na Eat's Place um caprichado cheese-dung. Peça também que o boy "to make water" e sirva,
pois é, segundo os norte-americanos, um líquido de sabor "very special", principalmente quando bebido ainda quentinho (hottest), em
grandes goles... Se não puder ir ao shopping, encomende ao Delivéri, ele provavelmente entrega em domicílio... Contam os adeptos do
american way of life, ao voltarem de Miami, que essa novidade em refeição expressa anda fazendo bastante sucesso nos States, eles
experimentaram e adoraram, ainda mais com todos esses nomes modernos, de charmosa sonoridade...
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Talvez nosso Hino Nacional (National Anthem) deva ser modernizado, não
acha? No macarrônico english dos shoppings, ficaria algo charmoso como "Listen of the Ypiranga the soft borders..." - não é mesmo?
Só é preciso fazer um downsizing (encurtá-lo), para caber no padrão de tempo médio de execução das músicas, definido pelos global
players, as gravadoras e rádios globalizadas...
As cores da Bandeira, veja como estão ultrapassadas... Green (das
matas que "eles" estão levando) e yellow (do ouro que "eles" já levaram) nem combinam muito com o moderno Brazil; blue & red
em stripes deixariam The Flag bem mais charmosa e condizente com a national reality...
E não esqueçamos de atualizar The National Stamp (pois é, o Selo
Nacional...): o nome do country que um day foi [República dos Estados Unidos DO Brasil] deveria sofrer logo o "inevitável" upgrade
para [República do Brasil DOS Estados Unidos]...
Em nome do charme e da modernidade, o próprio name Brasil precisa ser
changed, ficaria mais charmoso se nosso país fosse chamado de US'Backyard (não vou traduzir, senão o charme se esvai)...Yes!...?
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Por aqui, a despeito da citada dominação "inevitável", vou procurando -
enquanto me for permitido - speak portuguese. Afinal, "I'm not a dog, no..."
VI) Mensagem de Antônio
Gelviro à lista Idioma em 27/8/2000:
"Prezado Bodini
Obrigado por sua atenção. Fidalguia que me encoraja a pôr minhas
dúvidas na arena, com o cuidado de deixar claro que sou um defensor da língua portuguesa. Quem sabe esta advertência poderá
livrar-me de piparotes...
Permita-me opinar que o caso do Canadá, por v. citado, é antípoda ao
nosso. Tratam-se lá de um país e duas nações. Um país em que vigem duas línguas de cultura, remanescentes da colonização bipolar,
ambas com projetos de hegemonia nacional, também no campo econômico. O Brasil, ao contrário, pode orgulhar-se de ter idioma único,
fator, ele mesmo, da integração nacional. Nunca jamais repudiamos a língua portuguesa, apesar de imposta pelo colonizador a ferro e
fogo. Foram para as calendas as utopias nativistas da "língua brasileira", ainda que no seu exército militassem generais das letras
como o grande Alencar. O mesmo Alencar que ornamenta seus romances com galicismos brilhosos pelo grifo.
Sinceramente, acho, no que concerne aos estrangeirismos, e falando
exclusivamente deles, ou seja, deixando de lado, por medida tática, outras formas de defesa da língua, há exageração na repulsa. Que
me dizem de palavras e locuções alienígenas que, mantidas na grafia original, foram incorporadas e enriqueceram nosso idioma:
show, cheque, warrant, dumping, hacker, miss, gangster, gay, lobby, lycra,
baby, baby-doll, baby-sitter? Na época em que foram incorporadas ao português, talvez soassem exóticas, mas,
atualmente, estão perfeitamente integradas. Ao proibirmos estrangeirismos de livre curso, como deletar, site, etc. , não
estaríamos desprezando a capacidade da língua de assimilar contribuições?
Creio que o desvio alencarino deste nobre Movimento consiste em
idealizar uma “substituição de importações”, negando a denominação embutida nos produtos importados. Se o artefato chama-se fax,
por que insistirmos em fac-símile? Se navegamos pelo website, que razão suprema há para sugerirmos sítio – palavra que, para
nós brasileiros, remete à chácara?
Permita-me, por sua paciência, citar o grande filólogo e gramático
Celso Cunha, um homem acima de qualquer suspeita, organizador e paladino da língua portuguesa:
"Na realidade, o problema do
empréstimo lingüístico não se resolve com atitudes reacionárias, com estabelecer barreiras ou cordões de isolamento à entrada de
palavras e expressões de outros idiomas. Resolve-se com o dinamismo cultural, com o gênio inventivo do povo."
Noutra passagem, de seu livro "Língua Portuguesa e Realidade
Brasileira", o eminente filólogo observa: "Sem se aperceberem de que o ingresso de galicismos em fins do século XVIII e
princípios do século XIX era o natural efeito de irradiação dos fulgores da cultura francesa – da Ilustração, da Enciclopédia, da
Revolução, do Romantismo – os puristas portugueses e, atrás deles, os brasileiros, julgaram poder impedir tal invasão submetendo os
espíritos a uma atmosfera de pânico. Na entrada de galicismos viam uma nova ofensiva dos bárbaros (barbarismo passou a ser mesmo o
sinônimo mais usado de galicismo), e já prenunciavam a anarquia, a decomposição e a morte do idioma."
Pois bem, detida essa “ofensiva de galicismos”, o português estaria
isento de palavras como greve, aval, avalancha, baderna, bilheteria, batom, bicicleta, blague, boate, bobina, vitrina, boné,
bucha, bugre, cachecol, camelô, caminhão, carnê, carroceria, caviar, ficha, marmita, restaurante...a lista é infindável e, ao passar
nela os olhos, pergunto-lhes: esses estrangeirismos enfraqueceram , descaracterizam, desfiguraram o português falado no Brasil?
Pedindo, como Viera, desculpas por não ter tido tempo de ser breve,
Antônio Gelviro"
Carlos Pimentel Mendes, em 28/8/2000:
De fato, sempre convivemos com os estrangeirismos, alguns acabaram enriquecendo nosso
idioma.
Quero entretanto destacar a diferença da situação atual - e me permitam a mensagem um pouco
longa, não há como apresentar em poucas linhas algo próximo a uma tese de mestrado - e mesmo assim será forçosamente um estudo
resumido e incompleto:
Em alguns casos, como o da palavra "lycra", tratava-se de um novo produto industrial que
simplesmente não tinha na época um termo correspondente em nosso idioma, aliás tratava-se de um nome próprio e marca registrada (da
DuPont, se não me engano). Em outros, como show (tínhamos "espetáculo"), a palavra foi enfiada meio à força no idioma, mercê da
necessidade de alguns de mostrarem falsa erudição usando termos de outros idiomas, identificando-se assim com a elite econômica, na
esperança de colher migalhas que sobrassem de seu banquete (continuem lendo e compreenderão melhor...).
Ainda assim, era uma palavra ou outra entrando periodicamente, o tecido do idioma suportava
o rombo sem ser destruído, acabava se recompondo, a palavra até ganhava grafia e sonoridade aportuguesadas (abajur, vitrô). Da mesma
forma como o organismo humano, bem nutrido, suporta uma gripe e se recompõe, às vezes até se fortalece para combater futuros
ataques.
Agora, nestes últimos anos, os rombos estão ocorrendo de forma muito rápida e
sistemática, impossibilitando até mesmo a assimilação e a reflexão sobre seu significado. E não se trata de termos necessários
para designar novos produtos, mas de substituição pura e simples de palavras por outras que, em muitos casos, sequer existem no
suposto idioma original com aquela acepção (vejam a seção Ria... para não chorar!, nas páginas Web do MNDLP).
Venda vira sale, desconto vira off, eliminar vira deletar, folclore vira folk, música popular vira
pop music, música sertaneja vira country music. Verdadeiro exemplo de infecção múltipla, levando à falência geral dos
órgãos...
Quando digo sistemática, não é só pela quantidade avassaladora de palavras entrando
simultaneamente no nosso linguajar, é pela substituição acelerada de conceitos, misturada com um desprezo pela cultura nacional. E
este é o ponto crucial da questão.
Veja: talvez não houvesse problema em substituir eventualmente música sertaneja por
country music, se não estivéssemos ao mesmo tempo substituindo a nossa música sertaneja pela música sertaneja norte-americana.
Talvez (...) música popular por pop music, se (...) nossa música popular pela
música popular norte-americana, com o problema adicional de impedir o exercício de nosso idioma, ou de qualquer reflexão, já que
as palavras, quando existem e têm algum significado, estão em idioma estrangeiro e são pronunciadas de forma quase incompreensível.
Reparem: as pessoas já não ouvem música, curtem (ouvem) "um som"...
Talvez (...) folclore por folk, se (...) nosso folclore junino não fosse transformado em
country folk dos EUA, nosso saci-pererê fosse desprezado em favor do Halloween, nossos vaqueiros não virassem cowboys, nossos
rodeios não virassem rodeos, nossas festas não virassem "fest" etc. etc. etc.
Talvez (...) eliminar por deletar, se (...) nossos talentos em programação de
computadores tivessem oportunidade de criar produtos nacionais de informática e exportá-los, na mesma proporção como importamos
(pelo menos). Isto é, que tivéssemos financiamentos para produzir nossos jogos (e conheço gente que vale por uma equipe inteira de
programadores japoneses e estadunidenses, isso reconhecido por "eles" - já que, diante de tanto desprezo por nossa cultura, é
preciso usar argumentos de autoridade como esse), em vez de importar os "games" de combate mortal e atropelamento de crianças
que aqui têm chegado.
Quando a elite econômica e formadora de opinião adota os valores de outro país,
desprezando os valores nacionais, sinaliza para toda a população que os valores nacionais são desprezíveis, que bons mesmo são os
valores de outro país. Acontece que a elite econômica tem comumente interesse em fazer essa sinalização: geralmente, é
revendedora ou representante dos produtos estrangeiros aqui vendidos, ou seja, ela lucra quando a população despreza os valores
nacionais. Se preferimos country music em vez de música sertaneja, aumentamos o endividamento do Brasil importando discos,
filmes e vídeos, patrocinando espetáculos de artistas estrangeiros (Rock in Rio...). Isso é transferência de riqueza nacional para o
exterior, e as elites econômicas nacionais ganham nesse processo, por isso são tão favoráveis.
Reparem como os artistas que vêm ao Brasil são geralmente personagens em final de carreira.
Reparem como também no setor cinematográfico existem pacotes de filmes em que, para se trazer um filme "bom" é preciso comprar os
direitos de exibição também de pelo menos uns dez "ruins" (tão ruins que, em alguns casos, ficam nas prateleiras, pois as
próprias distribuidoras sabem que estão muito abaixo do padrão mínimo de qualidade). Idem, na música (não é fantasia ou delírio,
verifiquem a informação com as distribuidoras cinematográficas e gravadoras). Isso destrói o argumento de abertura cultural
que poderiam apresentar para justificar essa invasão de produtos culturais estrangeiros. Com essa "venda casada", para termos acesso
a algo de bom na cultura estrangeira temos de comprar dez vezes mais lixo cultural. Mesmo o "bom" só chega ao Brasil geralmente em
segunda mão, é o que se chama de "sobrelucro marginal", isto é, um lucro inesperado depois que o produto já pagou os investimentos e
deu os lucros esperados originalmente. Uma espécie de sobrevida econômica.
Ao mesmo tempo em que entregamos nossas divisas em troca desse lixo cultural, não temos
dinheiro para apoiar nossos artistas, muitos de grande talento. Além de haver bem menos dinheiro circulando internamente no
Brasil, pois ele está sendo carreado para o exterior, não temos como promover nossa gente e fazer concorrência com os artistas
estrangeiros. Ou seja, importamos, mas não temos como promover nossas exportações. O que também interessa a essa elite
econômica representante de interesses estrangeiros (nada de política partidária aqui, estou falando exclusivamente de Economia!),
pois assim não haverá concorrência com os produtos por ela/eles comercializados.
Notem: no tempo da dominação cultural francesa, o significado econômico disso era o
patrocínio da vinda de algum cozinheiro francês ao Brasil, algum produto caro (e portanto inacessível à maioria da população, pois o
objetivo era estabelecer a diferença entre quem tinha poder para adquiri-lo ou não) etc. Agora, a dominação cultural é
acompanhada por produtos que individualmente têm valor relativamente baixo, o que permite a massificação do consumo e portanto uma
ampla sangria em nossas divisas econômicas. Há uma diferença enorme entre os valores monetários carreados para o exterior em
relação a cada uma dessas dominações culturais.
Bem, e o que têm os estrangeirismos com isso?
A ligação é pela forma como essa elite representante de interesses estrangeiros se mantêm. É
preciso que valorizemos o que vem de fora e desprezemos nossa cultura. Então, nosso sertanejo é apresentado como alguém inculto,
beirando a idiotice, mal trajado etc. Já o sertanejo estadunidense é apresentado como astro de cinema (sem o cheiro do estábulo),
artista de televisão, o último grito da moda, com todo o charme e glamour (sim, usando essas palavras estrangeiras, faz parte do
charme e do glamour usar essas palavras...).
Assim, procuramos imitar o sertanejo estadunidense, pois é lá que dizem estar o fabuloso El
Dorado... Usamos as palavras do cowboy, as roupas e o cigarro do cowboy (isto é importação de produtos), ouvimos os
discos do cowboy (lá se vão as nossas divisas com pagamento de direitos autorais, quando não dos próprios produtos) etc. E
passamos a idolatrar o cowboy, que aqui se apresenta acompanhado por seus representantes comerciais - a tal elite econômica
já citada -, aos quais também transferimos poder e prestígio. Já o nosso sertanejo... se não colocar um fivelão no cinto e fumar
cigarros Marl..., será considerado apenas um idiota a mais, indigno de ser ouvido pelos cidadãos bem-nascidos nas cidades
brasileiras.
Faz parte do jogo, portanto, a identificação com a cultura do país que nos vende seus
produtos. Se a máscara cair, e começarmos a analisar a qualidade dos produtos culturais que aqui aportam, veremos o lixo que são na
maioria dos casos. Ou, pelo menos, que eles nada têm a ver com nossa cultura (reparem como as crianças desenham atualmente os
índios, não parecem todos navajos ou cherokees?)
Essa conscientização significaria um grande prejuízo para os produtores, mas
principalmente para a elite que revende aqui esses produtos (o produtor estrangeiro simplesmente reforça as vendas em outro
país, compensando o prejuízo com as vendas menores aqui, mas o revendedor/intermediário nacional fica sem o negócio).
Para que a máscara não caia, é preciso que seja massificante o processo de endeusamento
da cultura estrangeira, de forma a que qualquer voz discordante seja sufocada pelos próprios conterrâneos, através da
ridicularização. É importante que parcela expressiva da população esteja alienada e não pare por um momento sequer para analisar
a questão, chegando a ver como ameaça quem tente mostrar a realidade, para que seja difícil as vozes discordantes se unirem e
começarem a ser ouvidas. Há um conto clássico, A Roupa Nova do Rei, que ilustra a questão e o risco que o "rei" corre,
se um menino abrir os olhos e perceber que ele na realidade está despido...
O endeusamento passa inclusive pela substituição de nossa memória cultural. Vejam as
seleções de músicas "que ficaram em nossa memória" dos anos 60, 70 e 80, na opinião das gravadoras (expressa nas capas dos discos e
nos folhetos publicitários). Quem viveu nessas décadas vai notar que a maior parte das músicas citadas provavelmente nem fez sucesso
significativo, está ali para compor o disco, enquanto as melhores realmente, as que realmente marcaram, muitas vezes estão fora do
catálogo, por ter o artista caído em desgraça perante as gravadoras, morrido, estar atrelado a outra gravadora etc. Reparem ainda
como, em muitos casos, a seleção contempla na quase totalidade músicas estadunidenses, desprezando as de outros lugares do mundo que
tenham na época furado o cerco publicitário e feito sucesso por aqui) e mesmo quase toda a produção musical brasileira. Mero acaso?
Por fim, já mostrei em mensagens anteriores como, ao incorporarmos sem reflexão palavras
estrangeiras, estamos empobrecendo nosso idioma e nossa cultura. Alguém traduziu recentemente nesta lista CPU como Central de
Processamento Único (por influência da sigla inglesa CPU), e não como o correto Unidade Central de Processamento (UCP). Ao não fazer
essa reflexão, deixou de notar que no "coração" do computador existem outros processadores trabalhando em paralelo, passando a idéia
de que só existe um. Tal pessoa teria condições de criar ou pelo menos montar um computador? Longe de uma crítica específica, o que
desejo com o exemplo é mostrar que, ao incorporarmos palavras sem o conhecimento pleno de seu significado, estamos na verdade
empobrecendo nosso idioma e nossa cultura.
Não é o que fazem os macacos e papagaios, imitando os gestos e sons humanos sem a mínima
consciência de seu significado? Um papagaio aprende realmente a falar (e a pensar), apenas imitando os sons humanos?
Como podemos criar produtos culturais nobres, se praticamente só absorvemos lixo estrangeiro
e, além de tudo, ainda absorvemos mal esse material, sem reflexão? Completa-se o ciclo: sem um idioma rico em que possamos trocar
conhecimentos e experiências, condenamo-nos ao subdesenvolvimento perene, já que ficamos sem as condições básicas para a geração de
produtos culturais próprios, enriquecendo nosso patrimônio cultural.
Fecha-se o círculo vicioso: somos pobres e incultos porque não podemos desenvolver nossa
cultura. Não podemos desenvolver nossa cultura porque gastamos nossas riquezas desenvolvendo e apoiando a cultura estrangeira.
Endeusamos a cultura estrangeira por que a consideramos melhor e, com isso, aumentamos ainda mais o consumo de produtos
estrangeiros. Não resta dinheiro para patrocinar nossos valores culturais, muito menos para criar produtos de exportação neles
baseados. Somos pobres e...
Se um pobre dá a um rico uma nota de cem e recebe em troca uma de dez, o pobre fica mais
pobre e o rico mais rico. O truque está em o rico convencer o pobre de que a nota de cem é em moeda local, não tem valor, e a de dez
é em dólar, vale mais. Parece estranho, mas bastam alguns efeitos de pirotecnia, e espalhar a história de que o dólar é melhor,
tê-lo no bolso atrai mulheres (ou homens, conforme o caso) deslumbrantes, automóveis e iates, e a mágica funciona. Há quem acredite,
e só ver nos jornais o número de vítimas dos contos-do-vigário...
P.S.: exagero na repulsa: a toda ação corresponde uma reação. Se a invasão
indiscriminada dos estrangeirismos aumenta, a repulsa também será maior. É fato histórico que as pessoas até que toleram uma
ditadura branda, mas na hora em que ela ultrapassa o limite considerado tolerável, a reação vem, às vezes também exagerada, como
forma de repor a balança no equilíbrio... É a história da última gota no copo cheio, a reação não é medida pela gota extra, mas
por todo o líquido já contido no copo...
VII) -
LFAP (*) escreveu em 11/8/2000:
Eu trabalhei como instrutor em cursos de Informática durante quase quatro
anos, e agora (depois de conhecer o MNDLP) fico imaginando como seria a minha aula, pois eu faria questão de ser um instrutor do
estilo francês (desejo brevemente poder dizer: 'um instrutor do estilo brasileiro'). Imaginem só:
"Prezados alunos:
A Computação possui dois grandes grupos: os equipamentos(1) e os
programas(2). Entre os equipamentos encontramos o monitor, a impressora, o ponteiro(3), o teclado, a torre e outros. A torre é a
parte principal da máquina, pois dentro dela encontramos a Central Única de Processamento – alojada num pequeno circuito
integrado(4). Por fora da torre estão os compartimentos(5) de disquete, o botão liga-desliga(6), o botão para reiniciar(7), etc."
Será que alguma escola de Informática aceitaria um instrutor
utilizando essas palavras tão estranhas?!!!
Significado das palavras 'ininteligíveis' acima:
(1) = Hardware
(2) = Software
(3) = Mouse
(4) = Chip
(5) = Drive
(6) = Botão Power
(7) = Botão Reset
Outras palavras que eu faria questão de 'distorcer':
(8) E-mail (abreviatura de electronic mail, ou seja, correio
eletrônico) = eu 'envio um e-mail' ou 'envio pelo e-mail'?! Esqueça! Eu envio uma carta pelo correio eletrônico. Eu possuo um
endereço de correio eletrônico. É isso!
(9) Internet = Rede Mundial de Computadores, ou, simplesmente, Rede
Mundial (será que essa expressão vai pegar?!)
(10) Site = Sítio contendo páginas eletrônicas.
(11) Link = Seção dentro de uma Página.
(12) Home = Página principal de um Sítio.
(13) Browser = Programa que permite a navegação entre os Sítios.
LFAP(*), sei que não é tão simples assim
acostumar os ouvidos dos seus alunos ao som de um idioma latino, depois de ficarem quase surdos com aquele lixo musical (isso, dito
pelos mesmos que nos remetem essas "pérolas"). É clássica a imagem do "cucaracha" com o aparelho de som tamanho gigante sobre
o ombro, o som em volume máximo, geralmente sem ter a mínima noção do que é "cantado", sentindo-se elogiado quando o "cantor" lhe
diz, em alto e bom som: "Fuck You!"
Já que citou o estilo francês, saiba que na França se usa nas escolas, nas revistas, nos
jornais e à mesa dos cafés, palavras ainda mais estranhas para nós, como logiciel (software...).
Empregando suas próprias palavras: alguma escola decente de informática aceitaria um
instrutor que nem sabe da existência de vários processadores num mesmo computador? Ou que é possível colocar numa página Web
vínculos para outras páginas?
O uso de palavras em nosso idioma (constitucionalmente, o Português) obrigaria os
instrutores a um exercício mental salutar. Perceberiam, por exemplo, que a tão falada CPU (Central Processing Unity) corresponde à
nossa também bastante usada Unidade Central de Processamento. Caros maestros (não é assim que andam traduzindo "master"?),
sabiam que "Unity" significa "Unidade", não "Único"?
Vejam como a simples tradução de uma palavra acenderia uma luz na cabeça dos
respeitáveis maestros, que passariam a entender esse componente como o processador central, não como sendo o único processador.
Lembrariam então que existem no mesmo computador processadores dedicados a vídeo, som etc.
Se tivessem de procurar um dicionário para traduzir "link", veriam que tal palavra
tem o significado de "vínculo", e perceberiam que o tal vínculo até pode apontar para uma seção da mesma página, como pode apontar
para uma página qualquer colocada num computador de qualquer outro país. Se o significado de "link" fosse tão limitado assim, a rede
mundial de computadores (Internet, pois não? Nomes próprios não precisam de tradução...) seria apenas um arquipélago, com os tais
vínculos apontando exclusivamente para seções das próprias páginas, ficando estas isoladas entre si...
Quanto aprendizado, na simples tradução de duas palavras!...
Fazendo engenharia reversa de seu raciocínio: não deveria o instrutor ao "estilo
estadunidense" usar na conversa com os alunos também os demais termos na forma inglesa (printer, keyboard, tower,
diskette)?. Aproveitaria para explicar como fica "por fora da torre" o leitor de disquetes, que você definiu como
"compartimento", dando a entender que se refere ao modelo "interno", mais comum... Viu como usar nosso idioma ajuda a clarear o
raciocínio?
A propósito, você chama de "power" o interruptor de energia elétrica de seu "home"?
Em caso positivo, seus familiares e visitantes sabem a que dispositivo está se referindo?
Perdoe a ironia, embora tenha apenas empregado o mesmo recurso que usou em sua
mensagem. Não entenda esta resposta como um mero ataque frontal, mas como uma outra forma de
encarar a questão, que pode ajudar a entender o problema e a razão de ser do Movimento Nacional em Defesa da Língua Portuguesa -
MNDLP.
Consideramos que, ao nos esforçarmos para traduzir os termos estrangeiros, estamos
realizando um exercício de aprendizado que ajuda a entender melhor o significado desses termos, e isso faz com que aumentemos o
nosso conhecimento, podendo assim criar produtos em vez de apenas comprá-los prontos de outros países. A criação local de produtos
de informática é que vai permitir elevarmos nosso padrão de vida, talvez um dia nos igualarmos economicamente aos estadunidenses
que tantos tentam imitar.
Sabemos que não é fácil mudar a mentalidade, mas alguém tem de plantar a semente, para que
um dia possam ser colhidos os frutos.
P.S.: browser pode ser traduzido como "navegador", tanto que é assim que aparece na
documentação do Internet Explorer, e seu concorrente direto foi batizado como "Netscape Navigator".
Mouse, em português e espanhol, foi traduzido como rato, ratón. Se os brasileiros
não gostam de pegar no rato, nem no ratinho, podem denominar o produto como dispositivo apontador, ou simplesmente como apontador -
pois ele serve justamente para apontar um lugar na tela, usando-se o botão para confirmar a opção por esse lugar.
Por quê não usamos keyboard em vez de teclado, seguindo seu raciocínio? Veja que o
problema da inteligibilidade (você escolheu a palavra, eu usaria "compreensão", de pronúncia mais coloquial) está mais relacionado
ao termo escolhido na tradução - e ao costume de usá-lo - que a uma questão de absorção de conceitos. ...
(*) Carlos Pimentel Mendes é
jornalista, editor de Novo Milênio e membro do MNDLP.
Caro LFAP, assim chamado para evitar a identificação,
como pediu na mensagem abaixo transcrita:
Conta uma lenda que uma pessoa foi aconselhada por um sábio a ir ao
alto de um monte e espalhar pedacinhos de papel, ao sabor do vento. Cumpriu a tarefa e voltou ao sábio, que então lhe mandou
recolher todos os papelitos que espalhara. A pessoa bem que tentou, mas tornou à presença do sábio, triste por não ter conseguido
cumprir essa nova tarefa: alguns dos papéis voaram longe e talvez nunca sejam encontrados.
Respondeu o sábio: assim são as palavras: uma vez lançadas ao vento, é
praticamente impossível recolhê-las todas depois, daí ser tão importante pensar bem antes de falar.
Fiz o que pude para satisfazê-lo. A sigla já não o identifica, mas não
posso garantir que versões anteriores desta página, ou de suas mensagens na lista, não estejam circulando mundo afora, copiadas
pelos internautas e arquivadas por sistemas de pesquisa automática na Internet. Elas talvez ressurjam das cinzas, nos locais e
momentos mais inesperados.
Seja feliz!
Pimentel
Prezado Pimentel,
Saudações!
Há cerca de dois anos atrás eu participei da lista de discussão em defesa
do idioma nacional. Infelizmente, durante a minha participação, enviei opiniões extremadas e imaturas, o que acabou gerando certas
desavenças entre alguns integrantes da lista. Peço, sinceramente, que me desculpe por tais atitudes desastradas da minha parte.
Sendo assim, gostaria de solicitar, por gentileza, que o senhor retire os
meus depoimentos da sua página na Internet.
Cordialmente,
LFAP
BH, 22/06/2002 |