Vista aérea da legendária Ilha da Moela, à entrada da baía de Santos,
cujo farol foi edificado em 1830
Foto publicada com a matéria
Farol da Moela, o mais antigo do litoral paulista: 150 anos
Desde os tempos mais remotos que os faróis vêm prestando
relevantes serviços na salvaguarda dos navegantes, atuando como verdadeiros sentinelas nos portos de todo o mundo, motivo pelo qual são tão antigos
como a navegação - pois, desde que o homem se lançou ao mar, logo percebeu os sérios riscos que teria pela frente, compreendendo então a necessidade
de garantir o seu regresso ao porto, principalmente à noite.
Nos primórdios da Humanidade, haviam os sinais luminosos, através de grandes fogueiras
acesas no cume das colinas ou morros litorâneos, visando iluminar os recifes, assinalando ao mesmo tempo o porto ou ancoradouro aos navegantes que
voltavam do mar. Tal processo de iluminação marítima ainda era adotado no terceiro século antes de Cristo.
De simples fogueiras no cimo dos montes costeiros, surgiram torres luminosas, erguidas
à entrada dos portos, como o farol de Gênova, na Itália, que foi levantado em 1183, no topo de um promontório, no mesmo local onde há mais de oito
séculos também eram acesas fogueiras enormes para atrair a atenção dos tripulantes dos barcos.
O célebre farol da ilha de Faro, em Alexandria, no Egito, apontado como uma das sete
maravilhas do mundo antigo, remonta ao ano de 285 antes de Cristo, constituindo-se, portanto, numa prova de antigüidade de concepção. Segundo a
história, o farol de Alexandria (a primeira torre luminosa) veio a proporcionar uma grande segurança aos navegadores da época, isso pela sua
colossal torre de cento e oitenta metros de altura, toda decorada em mármore pelo arquiteto Sóstrato de Acnido.
O majestoso farol de Alexandria, uma das sete maravilhas do mundo antigo
Estampa do Almanaque Eu Sei Tudo, de 1950, publicada com a matéria
(cor adicionada por Novo Milênio)
Com o passar dos séculos, as primitivas fogueiras foram substituídas por grandes
lanternas de vidros, inclusive por lâmpadas a óleo, de mecha chata, colocadas diante dos espelhos esféricos. Todavia, tal sistema não tinha grande
alcance, isso devido à má concentração da luz, sendo que posteriormente é que foram utilizados os faróis de grande alcance.
Por volta de 1783 é que foi adotado o farol de longo alcance e eclipse, inventado pelo
francês Teulère, engenheiro-chefe da província de Guyenne, que ampliou lâmpadas com refletor, montadas sobre aparatos animados de um movimento de
rotação, revolucionando assim o antiquado sistema de iluminação marítima.
Num artigo que focaliza o assunto, publicado no Almanaque Bailly-Bailliere
(Madrid, 1936), encontramos um interessante relato, que vale a pena ser transcrito em parte:
"Teulère, em 1874, teve a idéia de ampliar a lâmpada de dupla corrente de ar que
Argand acabava de inventar; além disso substituiu os espelhos esféricos por espelhos parabólicos, no foco dos quais a chama da lâmpada era colocada;
o feixe assim refletido era cilíndrico e tinha um alcance muito maior. Finalmente, teve a idéia de associar várias lâmpadas como refletores,
idênticas uma às outras, para aumento do brilho, e instalar tudo sobre uma plataforma movida por um mecanismo de relojoaria. Tinha-se, assim, o
primeiro modelo de faróis giratórios, e podia-se desde então, por interrupções convenientes, ter os faróis de eclipse ou, pela interposição de
vidros coloridos, ter os faróis de setor. Cabe, pois, a Teulère o mérito de ter sido o primeiro realizados dos primeiros faróis propriamente
ditos..."
Apesar da descoberta de Teulère, foi dado um passo decisivo em 1825 pelo físico
Fresnel, com a invenção do "dente escalonado", um sistema que era formado por uma lente central, de forma ordinária, rodeada por uma série de anilos
de cristal de seção triangular, dispostos de modo que tudo, inclusive a lente, tinham o mesmo foco principal, resultando num dispositivo capaz de
iluminar a metade do horizonte.
Com o aproveitamento do sistema Fresnel, os faróis foram convertidos em maravilhosos
aparatos que, com a linguagem de suas luzes, guiavam os navegantes durante a noite. Já em 1841 instalou-se uma luz à Fresnel, com lampiões de
petróleo e ótica giratória, sobre um carretel com rodas e com visibilidade de qualquer ponto do mar. Somente em 1936 é que a luz de gás foi
substituída por uma incandescência elétrica, surgindo posteriormente o de gás de petróleo ou acetileno, com dezenas de quilômetros de alcance.
Convertidos em maravilhosos aparatos, os faróis, com a linguagem de suas luzes vistas
de qualquer ponto do mar, passaram a guiar os navegantes durante a noite
Estampa do Almanaque Bertrand de 1909, publicada com a matéria
(cor adicionada por Novo Milênio)
O Farol da Moela
Inúmeros são os faróis localizados na costa brasileira, sendo que no Litoral Paulista
poderemos mencionar o farolete da Lage, inaugurado em 1919 e reformado em 1931 e que fica a cerca de 20 milhas do
porto de Santos. Mas, o mais antigo farol do nosso litoral é o da Ilha da Moela, que se prolonga de Norte a Sul, à entrada da baía de Santos, e que
é visível do Guarujá.
Essa ilha, segundo revela o Major Eufrásio de Azevedo Marques ("Apontamentos
Históricos, Geográficos, Biográficos, Estatísticos e Noticiosos da Província de São Paulo"), "foi dada por carta de data a Gonçalo Nunes Chaves
pelo Capitão-mor Diogo Pinto do Rego", isso a 27 de dezembro de 1631. Mas, ela é conhecida desde os tempos mais remotos pelos índios pela
denominação de Itamirindiba, e mais tarde é que passou a chamar-se da Moela, devido à sua aparência característica, pois o seu perfil lembra uma
moela gigantesca.
Sua posição no Oceano Atlântico é de 24º 03' de latitude Sul e 46º 16' de longitude
Oeste, e fica distante da Ponta do Monduba cerca de 1,2 milhas e a 9 milhas a S-E de Santos, possuindo as seguintes dimensões: 1.000 metros em seu
maior comprimento na direção N-S por 700 metros em sua maior largura, na direção E-W, perfazendo uma área de duzentos e sessenta e seis mil metros
quadrados.
Na legendária Ilha da Moela existe um farol que foi edificado no alto de uma chapada
na fralda da montanha e inaugurado em 31 de julho de 1830, mantendo-se até a época atual em plena atividade, prestando inestimáveis serviços aos
navegantes que demandam ao porto de Santos. E, no tocante à sua história, é sabido que em épocas remotas era apenas um facho luminoso que orientava
os navegadores nas noites escuras.
De acordo com o seu memorial histórico, a instalação do farol na ilha ocorreu da
seguinte forma:
"Em 3 de julho de 1829, por indicação de um dos Membros da Câmara dos Deputados, ficou
resolvido pela mesma, saber de Sua Majestade, o Imperador, quais eram os portos do Império em que existiam faróis e que se cobravam impostos. Em 8
de março de 1830 recebeu o Imperador, da Junta do Comércio, Agricultura, Fábricas e Navegação, em resposta à sua consulta, a seguinte notícia sobre
o farol da Província de S. Paulo: 'Que desde 1º de maio de 1820 foi cobrado impostos de faróis aos navegantes no porto
de Santos por um facho luminoso que se acendia todas as noites escuras na ilha da Moela, próxima à entrada daquele porto, a fim de, com essa
importância, construir-se um farol naquela ilha'.
"Anteriormente, em 26 de julho de 1826, o sr. Miguel José de Oliveira Pinto expunha em
carta ao sr. Manoel Carneiro de Campos, um dos membros do Conselho da Província de S. Paulo, os planos e desenhos pedidos para um farol necessário
ao porto de Santos e colocado na ilha da Moela. E em sessão do Conselho daquela Província, no dia 27 de setembro do mesmo ano, foi resolvido pedir à
Junta do Comércio a quantia precisa à sua construção, e esta por sua vez fez subir às mãos de Sua Majestade, o Imperador, que, em despacho
favorável, houve por bem, também, permitir que o Chefe de Divisão, Paulo Freire de Andrade, dirigisse a construção do mencionado farol e
apresentasse novo plano e desenhos, o que foi logo cumprido e posto em prática...".
Foi o primeiro farol a ser instalado nas costas do Estado de São Paulo, passando a
incandescente a querosene a partir de 1852. Já em 1870, o farol - fixo de cor branca - contava com três faroleiros, o primeiro Manoel Francisco
Dias, e os segundos: Francisco Borges e Lourenço de Souza, além do patrão da lancha de socorro, Procópio Fernandes Martins, e mais seis remadores,
segundo descrição do Almanaque de Santos, de 1871.
No ano de 1884, de acordo com o Almanaque do mesmo ano, o primeiro faroleiro
era o furriel (reformado) Manoel Joaquim José de Sant'Anna; o segundo José Pedro dos Santos e o terceiro Leopoldo José Bernardo. E a 13 de maio de
1895, em substituição ao aparelho de luz que existia até o ano de 1852, foi inaugurado um novo aparelho de luz dióptrico de "primeira ordem",
montado em torre cilíndrica de alvenaria, com o plano focal elevando-se a 9,50 metros acima do solo e a 103,50 acima do preamar.
No findar do século passado (N.E.: século XIX),
o farol da Moela, sob a inspeção da Capitania dos Portos - segundo registro do Almanaque Santista, de 1899 -, contava com Antonio Bernardo
como primeiro faroleiro; Pedro Felipe Gonçalves (o segundo); Mathias Teixeira Borges e Benedicto Teixeira (os terceiros).
Com o alvorecer deste século (N.E.: século XX),
prestavam serviço no farol da Moela os seguintes faroleiros: 1º - Antônio Bernardes; 2º - Pedro Felipe Gonçalves; 3º - Armando Rosa de Oliveira; 4º
- Joaquim José Sant'Anna. E em 1912, lá permaneciam três faroleiros, um patrão e remadores. Por volta de 1922, o farol contava com a seguinte
equipe: 1º faroleiro (Encarregado) - João da Silva Rocha; 2º faroleiro - Bento Bernardo de Salles; 3º faroleiro - Antonio de Araújo; Patrão -
Juvêncio Ferreira de Camargo e mais quatro remadores.
Pelos anos de 1948, o farol da Moela foi completamente remodelado, passando a ter um
alcance de 19 milhas. Até então era manual, sendo que a luz era obtida a querosene. Cinco anos depois, foi reformado e passou a ser alimentado por
energia elétrica, aumentando o seu alcance para 26 milhas.
Em 1953 a ilha passou a contar com uma estação de meteorologia e, em dezembro de 1956,
também foi dotada de um radiofarol de 300 milhas de alcance, o primeiro a ser instalado na costa do Estado de São Paulo, oferecendo assim maior
segurança à navegação em toda aquela área.
Naquela época, a estação-rádio da ilha contava com um radiotelegrafista da Marinha,
que era o encarregado do equipamento eletrônico. Contava igualmente com um radiotelegrafista auxiliar e também com um técnico de meteorologia; com
um motorista de Primeira Classe, encarregado dos motores e geradores do radiofarol. Quanto ao pessoal do farol luminoso, era integrado pelos
seguintes faroleiros: Jorge de Castro (encarregado), Roberto Barbosa Lobo e Carlos da Silva Araújo.
O farol foi edificado no alto de uma chapada na fralda da montanha, instalado numa
torre cilíndrica de alvenaria, pintada de branco, com 10 metros de altura e com o foco luminoso numa altura de 110 metros acima do nível do mar,
emitindo luz alternada com lampejos branco e encarnado, sendo alimentado por energia elétrica de geradores que funcionam diuturnamente. O aparelho
de luz é protegido por vidraças.
Quanto ao radiofarol, de funcionamento circular contínuo, fica numa torre metálica
numa altura de 72 metros, com um alcance de 300 milhas, transmitindo numa freqüência de 305 Kos. (N.E:
quilociclos), em emissão circular de quatro e meio e quatro e meio segundos. Como complemento do equipamento de auxílio à
navegação, foi instalada na ilha uma buzina de cerração, para orientar os navegantes por ocasião das cerrações, e que foi extinta posteriormente.
Na ilha, além das instalações do farol, existem as casas dos faroleiros e de seus
familiares, contando ainda com uma guarnição da Marinha de Guerra e com agente de Atividades Marítimas e Fluviais, representado pelos faroleiros
Israel Anacleto da Silva e João Ribeiro Sellares.
Sob a jurisdição da Diretoria de Hidrografia e Navegação e da
Capitania dos Portos do Estado de São Paulo, o farol da Moela - que no ano passado (N.E.:
1980 - esta matéria deve ter sido escrita em 1981, embora publicada em março de 1982) completou o seu sesquicentenário
de instalação - prossegue até os dias atuais como uma sentinela vigilante do mar e, quem sabe, como um guardião das riquezas, que, de acordo com a
lenda, foram ali deixadas pelo corsário inglês Thomas Cavendish no século XVI e que estão ocultas em algum ponto
qualquer da ilha.
Pesquisa e texto de J. Muniz Jr.
Um belíssimo farol decorativo em miniatura até hoje no alto da fachada da antiga Casa Farol,
defronte ao Mercado Municipal de Santos
Foto publicada com a matéria
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