Clique aqui para voltar à página inicialhttp://www.novomilenio.inf.br/cultura/cult114b.htm
Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 10/04/14 15:55:22
Clique na imagem para voltar à página principal
CULTURA/ESPORTE NA BAIXADA SANTISTA - JUNOT
Lucas Rodrigues Junot (1)

Leva para a página anterior

Nascido em Santos em 20 de janeiro de 1902, faleceu em sua cidade natal em 29 ou 30 de agosto de 1968. Bacharel em Ciências Matemáticas pela Faculdade de Ciências da Universidade de Coimbra (Portugal), participou da Tuna Acadêmica de Lisboa. Atuou no Observatório Astronômico e Geográfico de São Paulo e como chefe do Instituto Regional de Meteorologia do Ministério da Agricultura, entre outras atividades nessa área e na da Pesca Marítima. Foi professor de Matemática em diversas entidades, publicou diversos livros.

Fadista, poeta, cartógrafo, geólogo, matemático, geógrafo, historiador, também colaborou em jornais santistas e se notabilizou em Portugal como cantor e autor de fados, como registrou em 8 de março de 2008 o blogue português O Canto e a Música de Coimbra (acesso: 4/10/2014 - mantida a grafia portuguesa nesta transcrição):

Lucas Rodrigues Junot

Imagem publicada com a matéria

8 DE MARÇO DE 2008

LUCAS RODRIGUES JUNOT (1902 - 1968) - Cantor

Lucas Junot: Um Brasileiro a Cantar Coimbra [i]
(Texto com base na investigação do Rui Lopes, feita no ano de 2005)

Lucas Rodrigues Junot nasceu em Santos, Brasil, a 20 de Janeiro de 1902. Filho de emigrantes portugueses em terras de Vera Cruz e morre na mesma cidade brasileira, a 29 de Agosto de 1968.

É em Santos que aprende as primeiras letras e faz os primeiros estudos até que em 1914 a família decide regressar a Portugal, instalando-se em Coimbra junto às escadas do Quebra-Costas onde habitará antes de se mudar para Montarroio. Segundo Jorge de Cantanhede é para saber onde ficavam as míticas escadas do Quebra-costas que Lucas Junot abordará pela primeira vez um polícia em Portugal, que o terá amedrontado um pouco.

Já instalado em Coimbra, é nesta cidade que frequentará o Liceu até ingressar no Curso de Matemática na Faculdade de Ciências, em 1922. Porém, já nesta época algo o destacava: cantava Fado de Coimbra quando ainda era “bicho”. Fará parte da Tuna Académica da Universidade de Coimbra, participando nas famosas tournées a Espanha (1922) e ao Brasil (1925).

A cantar Coimbra destacava-se pela sua voz característica, que Artur Paredes lhe viria a dar o epíteto de "Gata Miadeira". Cantou muitas Canções de Coimbra, como por exemplo: Fado dos Passarinhos (Passarinho da Ribeira), Fado Sepúlveda, entre outros, em que se acompanhava ele próprio à guitarra. No entanto, ficará mais conhecido por ser o autor do célebre Fado de Santa Clara (eu ouvi de Santa Clara …), que segundo Divaldo Gaspar de Freitas terá sido inspirado ao passar a ponte de Santa Clara a olhar para Santa Clara.

Deixaria para a posterioridade vários discos de setenta e oito rotações que foi gravar a Londres.

Contudo, também continuava a cursar Matemática concluindo o curso em 1927. Paralelamente ao curso de Matemática, também namorava aquela que seria a sua futura esposa: Eugénia Gaupin de Abreu e Sousa.

Segundo Maria Isabel Cabral Moncada Cordeiro, que vivia com a tia Eugénia em Abrantes, Lucas Junot ia de comboio de Coimbra a Abrantes namorar a sua tia, fazendo-se sempre acompanhar da sua guitarra em que fazia grandes serões a tocar e a cantar no quintal da casa. Nesse mesmo ano, ter-se-á casado com a Dª. Eugénia, num casamento de que nasceram três filhos: um rapaz e duas raparigas, e rumou a Luanda onde trabalhou no Banco de Angola. Porém, o seu desejo era regressar ao Brasil Natal, pelo que regressou a Portugal e no ano seguinte rumou para Santos.

Divaldo de Freitas refere que, ao chegar ao Brasil, quando perguntaram ao carregador de quem era a bagagem que transportava este respondeu, apontando para Lucas Junot: São daquele português! Chegava ao Brasil ao ponto de ser confundido com um português, porque levava Coimbra para o Brasil.

Instalou-se em Santos, mas também trabalhou no Rio de Janeiro e em S. Paulo, tendo feito parte da Academia de Ciências.

Já a trabalhar no Brasil havia algo que mexia sempre com o seu coração: Coimbra! Que fazia tenção de rever antes de deixar esta vida e sempre que Divaldo de Freitas vinha a Coimbra dizia-lhe: abrace Coimbra por mim!. Pois sempre que havia encontros de Antigos Estudantes de Coimbra ou algo relacionado com Coimbra, Lucas Junot era sempre presença assídua. Pois, quando foi fundada a Associação dos Antigos Estudantes de Coimbra no Brasil, Lucas Junot foi um membro fundador e dos membros mais activos desta.

Em 1967, cumpriu-se o desejo de rever Coimbra ao ter ganho uma Bolsa da Gulbenkian. Regressou a Coimbra, tendo ficado admirado com tudo, pois, não podemos esquecer que quando Junot foi para o Brasil ainda era o tempo da Velha Alta de Coimbra. Além disso, também aproveitou o seu tempo em Portugal para visitar os seus contemporâneos da Universidade de Coimbra.

Quando esteve em Lisboa, também visitou a loja da Valentim de Carvalho na baixa lisboeta, em que perguntou se ainda tinham algum disco do "Rouxinol do Mondego" (nome pelo qual era conhecido nos seus tempos de Coimbra). Disseram-lhe que tinham um disco mas que era uma relíquia da casa, pelo que não o venderiam a ninguém, a não ser que o próprio Lucas Junot lá fosse. Foi então que Junot mostrou o passaporte e se identificou, pelo que acabaram por lhe oferecer o disco.

Segundo Maria Isabel Cabral Moncada Cordeiro, também visitou Santarém, tendo estado na sua casa e ido junto à sepultura de Pedro Álvares Cabral. Essa senhora acompanhou os tios ao aeroporto onde os salvou de não poderem embarcar devido a uma taxa de cem escudos que era necessário pagar e eles apenas tinham dinheiro brasileiro que ninguém queria trocar, pelo que lhes facilitou os cem escudos e os tios embarcaram para o Brasil.

Tinha cumprido o seu sonho: rever Coimbra antes de falecer! Pois, no ano seguinte, faleceu a 29 de Agosto em Santos, tendo sido sepultado no cemitério de Paquetá no dia seguinte, enquanto que a sua viúva ainda viveria muito tempo, pois, faleceu há dois anos em Santos com noventa e sete anos de idade.

Desta forma, resta-nos o seu memorial através dos discos e do seu espólio de Coimbra que se encontra no Museu Académico, onde a sua filha e neta vieram há cerca de seis anos doar ao Museu a Guitarra, a Capa, uma Fotografia, Discos, e as Fitas de Curso.

Para terminar, deixo também a letra das mais célebres Canções de Coimbra que Junot cantou.

PASSARINHO DA RIBEIRA

Passarinho da ribeira
Se não és meu inimigo
Empresta-me as tuas asas
Deixa-me ir voar contigo

Ao longe cortando espaço
Vai um bando de andorinhas
Que te levam um abraço
E muitas saudades minhas

FADO SEPÚLVEDA

Dizem que amar é viver
Mas mesmo morte que fosse
Que me importava morrer
Pois se o amar é tão doce

Se os meus olhos te incomodam
Quando estão à tua frente
Eu prefiro arrancá-los
Para te amar cegamente

FADO DE SANTA CLARA

Eu ouvi de Santa Clara
Gemidos de alguém que chora
Era a Rainha pedindo
Por mim a Nossa Senhora

Aos pés de Nossa Senhora
Rezando pedi-lhe um dia
Que não rezasse chorando
Que os anjos entristecia

[i] Rui Pedro Moreira Lopes. Licenciado em História e Pós Graduado em Ciências Documentais (Arquivo) pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Guitarra de Coimbra do Grupo de Fados de Coimbra de Abrantes fundado em 1983 pelo Dr. José Amaral.

PUBLICADA POR CANTO E MÚSICA DE COIMBRA À(S) 06:36

Esta biografia também teve uma versão publicada no jornal português Correio da Manhã, de Lisboa em 7 de dezembro de 2000 (acesso: 4/10/2014 - mantida a grafia portuguesa nesta transcrição):

Rui Lopes, o apaixonado do fado, que conta a história de Junot

Foto: Ricardo Almeida, publicada com a matéria

07.12.2008 00:00
A vida do brasileiro que cantava o fado

Lucas Junot nasceu no Brasil e estudou em Coimbra nos anos 20. Gravou quatro discos de fado. Esta é uma história que Rui Lopes, também apaixonado pelo fado de Coimbra, conta com prazer.

Na rua dos Coutinhos, junto à Sé Velha, em Coimbra, mais precisamente no número 3, há uma placa que informa ter ali vivido o estudante universitário Lucas Junot, 1902-1968. Em 1997, Rui Lopes, natural de uma freguesia de Abrantes, foi, também ele, estudar para Coimbra e, passando certo dia na dita rua, tomou nota mental do que ali estava escrito. 'Nunca até àquele momento tinha ouvido falar de tal personagem', conta Rui Lopes, que entretanto se fez historiador e no próximo dia 13 lança a fotobiografia do estudante brasileiro que cantou Coimbra. Esse mesmo – Lucas Junot.

Nasce a 20 de Janeiro de 1902 na cidade de Santos, estado de S. Paulo, filho de portugueses que, como tantos outros, atravessaram o Atlântico em busca de uma vida menos má. A família regressa a Portugal em 1914. Lucas tem 12 anos. Conclui os estudos na Escola Primária Anexa da Sé Velha, segue para o Liceu Dr. José Falcão e, após alguma indecisão sobre o curso, estuda Matemática na universidade.

Deve ser verdade que Matemática e Música andam de mãos dadas pois é então que o brasileiro pega na guitarra e dá uso à voz. Tal como Rui Lopes, que também aprendeu a tocar guitarra quando foi estudar para Coimbra. Não vem à baila a assiduidade académica do historiador mas não há dúvida de que Junot falta às aulas quando começa a acompanhar a gente do fado.

'Entre tantos brasileiros que aqui estudaram ele foi o único que se interessou a sério pelo fado de Coimbra', sublinha Rui Lopes, a quem acorre de súbito a lembrança de 'há cerca de um mês ter encontrado duas raparigas da tuna feminina Mondeguinas que falavam português do Brasil'.

Já Lucas Junot cantava sem qualquer sotaque. Não há vogal acentuada à maneira do povo irmão ou consoante enrolada quando a voz maviosa que entoa: 'Eu ouvi de Santa Clara/ Gemidos de alguém que chora/ Era a rainha pedindo/ Por mim a Nossa Senhora'. O poema, musicado por Francisco Menano, do fado de Santa Clara é de autoria do próprio Junot. Surgiu, afirma Rui Lopes, 'de forma espontânea quando ele ia a passar na ponte de Santa Clara' e do outro lado viu o mosteiro onde está sepultada a Rainha Santa Isabel.

Os fados ‘de Santa Clara’, ‘dos Passarinhos’ e ‘Sepúlveda’ são apenas alguns entre os que deixou gravados em quatro discos de 78 rotações. 'Ele e o Menano pertencem à primeira década de ouro do fado de Coimbra, nos anos 20', esclarece o autor da fotobiografia. O lirismo corre-lhes no sangue e transparece na voz de prolongados e e inquietantes agudos de Junot. Ele e Menano são os últimos dos líricos, antes da ‘revolução’ que Artur Paredes, pai de Carlos, e Eduardo Bettencourt – 'açoriano e não madeirense' – trouxeram ao fado/canção de Coimbra.

O primeiro momento na história do livro propriamente ‘lido’ pode ter sido aquele em que Rui Lopes repara na placa sobre o número 3 da rua dos Coutinhos. Mas o incentivo para começar a trabalhar na fotobiografia do estudante brasileiro que cantava fado de Coimbra só surgiu em 2005, 'durante uma conversa no Instituto de Paleografia e Diplomática'. Organizava-se a VII Semana Cultural da Universidade de Coimbra, subordinada ao tema ‘O Abraço Lusófono’ e falava--se de antigos estudantes oriundos dos Países Africanos de Expressão Oficial Portuguesa. É bem sabido que, por exemplo, Agostinho Neto, que foi presidente da Angola após a Independência, estudou Medicina em Coimbra em 1948. E estudantes brasileiros? – perguntaram. Foi então que Rui Lopes, estudioso da história do fado/canção de Coimbra, decidiu aprofundar a vida e obra de Lucas Junot.

Tendo terminado, em 1927, o curso e já casado com Eugénia, o matemático e fadista parte para Angola, onde lhe nasce o primeiro filho. Se, pouco depois, regressa a Portugal é por ter sido bafejado pela sorte grande – em 1928 ganha a Lotaria do Natal. Mais tarde sobra-lhe ainda dinheiro para, com a mulher e já três filhos, rumar ao Brasil, onde trabalha como jornalista em Santos e foi investigador de matérias relacionadas com a Meteorologia e a Astronomia.

Em busca de informação e imagens que documentassem a vida de Lucas Junot, o historiador Rui Lopes enviou uma série de e-mails para todos aqueles que, em Santos, poderiam ajudá-lo. Sem grande resultado. Ninguém sabia do paradeiro da família de Junot. Até ao dia em que um chefe de polícia, luso-descendente e casado com uma portuguesa, se mobilizou para localizar os descendentes de quem também tinha raízes em Portugal. Lucas Junot nunca foi de ficar muito tempo no mesmo sítio e, ao que parece, os seus netos também não. Tinham-se mudado para o Mato Grosso do Sul, 'do outro lado do Brasil'. Feito o contacto, tudo correu sobre rodas. 'Passado um mês enviaram-me toda a documentação.' E, ironia das ironias, depois de tanto tempo sem resposta, Rui Lopes descobriu que um dos netos de Junot vivia há 17 anos em Portugal. Em Portimão.

Lucas Junot 'não estava muito preocupado em gravar e fazer uma carreira' – acredita Rui Lopes –, mas não esquece Coimbra. É membro da Tertúlia Académica no Brasil, canta o fado de Coimbra para os amigos e garante que antes de morrer há-de ver a cidade outra vez. E assim foi. Regressa em 1967. Morre um ano depois, no Brasil.

Em 1969, mesmo à entrada da rua dos Coutinhos, na casa onde Lucas Junot morou enquanto estudante, foi colocada uma placa alusiva. Nem isso o salvou do esquecimento – não fosse, décadas mais tarde, um estudante que também tocava guitarra, gostava como poucos do fado de Coimbra e a quem interessava a história desta forma de cantar ter passado naquela rua e esforçado os olhos para ler o que ali estava escrito. 'É uma figura pouco conhecida em Portugal e, pelo que pude aperceber-me, também no Brasil.' É verdade que em Santos existe uma rua com o nome dele. Mas em terra de samba, o fado não vinga. E também por lá, hão-de ser poucos os que dão atenção às placas. Mesmo às que guardam boas histórias.

O SONHO DE REVER COIMBRA

Lucas Rodrigues Junot nasce no dia 20 de Janeiro de 1902 na cidade de Santos, estado brasileiro de S. Paulo. Os pais, José Maria Rodrigues Junot, natural de Cadaixo, Miranda do Corvo, e Adelaide da Conceição Franco Rodrigues, que nasceu em Dois Portos, concelho de Torres Vedras, tinham emigrado para o Brasil no final do século XIX. Fixam-se em Santos e abrem uma mercearia.

Em 1914, a família regressa a Portugal e passa a viver em Coimbra. É nesta cidade que Lucas estuda até obter a licenciatura em Matemática. Lá conhece também aquela que vem a ser a sua mulher, Eugénia Cecília Gaupin de Sousa, uma 'alfacinha de gema'. Os dois partem para Angola. Lucas ganha a sorte grande e volta com a mulher e os três filhos a Portugal. Por pouco tempo. Pouco depois instala-se no Brasil.

Nunca esquece a cidade do Mondego. Em Santos continua a cantar o fado de Coimbra para os amigos. Trabalha primeiro como jornalista. Ensina Matemática. Torna-se assistente do Observatório Astronómico de S. Paulo. Trabalha também nos Serviços de Meteorologia. Morre em 1968. Depois de rever Coimbra.

Casa da Rua dos Coutinhos 3, junto ao Largo da Sé Velha, em Coimbra/Portugal: ali viveu o então estudante Lucas Rodrigues Junot

Imagens: Google Maps/Street View de outubro de 2009 (acesso: 4/10/2014)

 

Leva para a página seguinte da série