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HISTÓRIAS E LENDAS DE CUBATÃO - HISTÓRIA - BIBLIOTECA NM
A História Econômica de Cubatão (19)

Com o título: "Entre estatais e transnacionais: o Pólo Industrial de Cubatão", esta tese de doutorado foi defendida em janeiro de 2003 no Instituto de Economia da Universidade de Campinas (Unicamp) pelo professor-doutor Joaquim Miguel Couto, de Cubatão, que autorizou sua transcrição em Novo Milênio. O tema continua:

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ENTRE ESTATAIS E TRANSNACIONAIS: O PÓLO INDUSTRIAL DE CUBATÃO

Prof. Joaquim Miguel Couto

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Capítulo IV

Crise ambiental e reestruturação produtiva (as décadas de 80 e 90)

4.2 - O trabalho da Cetesb em Cubatão

Em julho de 1983, a Cetesb preparou e implantou o Programa de Controle da Poluição Ambiental em Cubatão, com as seguintes diretrizes: a) controlar as fontes de poluição ambiental; b) desenvolver estudos, pesquisas e atividades para obtenção de um quadro mais preciso da problemática ambiental; c) conscientizar as entidades e instituições da comunidade local quanto ao problema, suas dimensões e conseqüências (Cetesb, 1986:08) [32].

Entre julho de 1983 e julho de 1984, a Cetesb examinou em detalhes os complicados processos e operações industriais do Pólo Industrial de Cubatão, cadastrando as fontes poluidoras e os poluentes emitidos. Foram identificadas 320 fontes de poluição ambiental: 230 de poluição do ar, 46 de poluição do solo e 44 de poluição da água, comprovando a existência de 75 elementos poluentes na atmosfera de Cubatão. Em julho de 1984, ocorreu a fase de maior repercussão do programa: a autuação simultânea de todas as empresas do pólo industrial. Em seguida, foi discutido com cada empresa um plano individual de controle das fontes poluidoras [33].

O Programa da Cetesb visava reduzir ou eliminar os poluentes das 320 fontes de poluição até o final de julho/87. Para o controle do ar, a Cetesb concentrou-se na diminuição do material particulado, fluoretos, amônia, óxidos de nitrogênio, hidrocarbonetos e odores em geral.

Os estudos evidenciaram a existência de duas bacias aéreas distintas em Cubatão: Cubatão-Centro e Cubatão-Vila Parisi, cujo marco divisório seria o Rio Perequê, não existindo ligação da poluição entre as duas bacias. Assim, faziam parte do Cubatão-Centro, os bairros centrais da cidade e todas as empresas localizadas do Rio Perequê até o Rio Cubatão. Já em Cubatão-Vila Parisi, estavam os bairros de Vila Parisi e Jardim São Marcos e as indústrias localizadas no vale do Rio Mogi (Cosipa e Ultrafértil, entre outras).

A bacia de Cubatão-Vila Parisi, em razão das elevadas emissões, da topografia e da meteorologia desfavoráveis, concentrava grande quantidade de material particulado. As medições provaram que a bacia do Cubatão-Centro apresentava valores aceitáveis, inferiores a 12 das 25 estações instaladas na Grande São Paulo, enquanto a bacia de Cubatão-Vila Parisi tinha índices maiores que todas as estações de São Paulo (Ibid., p.08/11).

Segundo dados da Cetesb de 1984, apurados por Gutberlet (1996:120), eram lançados na atmosfera de Cubatão cerca de 30 toneladas de poluentes químicos por dia: 50,8% de gases inorgânicos, 37% de pó em suspensão, 11,8% de gases (vapores orgânicos) e 0,4% de ácidos (gases, vapores). O ramo de fertilizantes era o principal poluidor em gases inorgânicos, emissão de poeira em suspensão e ácidos, seguido pela siderúrgica e a indústria petroquímica.

Noutra pesquisa, a Cetesb estimou a quantidade de emissão diária de poluentes por indústria (Tabela 29). Verificou-se que as indústrias mais poluidoras do ar de Cubatão, em 1984, eram a Ultrafértil-Piaçagüera, Copebrás, Cosipa, Ultrafértil-Centro e RPBC. Ou seja, três estatais (Ultrafértil, Cosipa e Refinaria) e uma transnacional (Copebrás). Deve-se registrar, entretanto, que estas maiores poluidoras também eram as proprietárias dos maiores complexos industriais de Cubatão, sendo, portanto, compreensível que poluíssem mais o ambiente.

Após dois anos, o programa da Cetesb já mostrava resultados positivos. Entre 1984 e 1986, reduziu-se substancialmente a poluição ambiental na atmosfera de Cubatão (Tabela 30). A principal diminuição foi de material particulado, que caiu 79%, e cujos principais emissores eram as indústrias de fertilizantes (mediante a trituração de rochas fosfáticas) e a Cosipa (pelo seus depósitos de carvão) [34].

TABELA 29

Estimativa da emissão diária de poluentes em Cubatão (SOx, CO, CO2, NOx, NH4, CI, hidrocarbonetos,
flúor, aldeídos, ácidos, poeira, outros), 
para o ano de 1984 (em kg/dia)

Indústrias

Kg/dia

Indústrias

Kg/dia

1  - Ultrafértil Piaç.
634.458
12 - Gespa
3.226
2  - Copebrás
250.653
13 - Alba
2.775
3  - Cosipa
183.077
14 - Petrocoque
2.205
4  - Ultrafértil Centro
160.169
15 - Trevo
1.323
5  - RPBC
146.759
16 - Sant. Papel
1.243
6  - Indag/IAP
25.676
17 - Rhodia
1.059
7  - Estireno
10.847
18 - Santa Rita
988
8  - Solorrico
8.476
19 - Engeclor
241
9  - Manah
7.257
20 - União
178
10 - Union Carbide
6.383
21 - Liquid Quim.
97
11 - Carbocloro
5.958
TOTAL
1.453.048
Fonte: Cetesb (Citado por Gutberlet, 1996:121)

Já a poluição da água teve um índice de melhoria um pouco menor. Das 44 fontes de poluição apuradas, 25 estavam controladas em 1986 [35]. Quanto à poluição por resíduos sólidos industriais, depositados no solo de Cubatão, foram controlados 38 fontes de um total de 46 (Cetesb, 1986:19/21).

TABELA 30

Reduções obtidas nos principais poluentes lançados na atmosfera de Cubatão

Tipo de poluente

Emissões (toneladas/dia)

julho-84

julho-86

Redução (%)

Material particulado

236,6

49,7

79,0

Dióxido de enxofre

78,4

49,5

37,0

Dióxido de nitrogênio

61,1

52,7

14,0

Fluoretos

2,6

1,1

58,0

Amônia

8,7

2,6

70,0

Hidrocarbonetos

90,0

27,5

69,0

Fonte: Cetesb (1986:27)

Em 1988, um novo relatório da Cetesb ganhou as manchetes dos jornais, mas dessa vez com uma boa notícia: os peixes haviam voltado ao Rio Cubatão (Cetesb, 1988:12). O relatório apontava a Cosipa como a principal culpada pelos atrasos no cronograma de execução do programa ambiental [36].

Algumas outras indústrias já haviam sido penalizadas por também atrasarem seus cronogramas. Apesar disso, a Tabela 31 permite verificar os grandes avanços obtidos pela Cetesb nos quatro primeiros anos do Programa de Cubatão. Essa conquista da Cetesb está cristalizada na redução do número de Estados de Alerta e Emergência em Vila Parisi (Tabela 32) [37]. O último estado de alerta da região foi decretado em 1995. Até maio de 1992, haviam sido controladas 260 fontes de poluição. Em 1999, esse número havia subido para 288 fontes.

TABELA 31

Situação das fontes autuadas e controladas em Cubatão,
até dezembro/1988

Poluição

Autuadas

Controladas

Ar

230

174

Águas

44

33

Solo

46

42

Total

320

249

Fonte: Cetesb (1989:04)

TABELA 32

Episódios de poluição do ar (Vila Parisi)

Ano

Estado de Alerta

Estado de Emergência

1984

16

1

1985

14

1

1986

6

0

1987

4

0

1988

3

0

Fonte: Cetesb (1989:09)

Para o gerente da Cetesb em Cubatão, engenheiro Marcos da Silva Cipriano, o trabalho da empresa na cidade é ímpar, não sendo afetado por pressões políticas, mas somente por critérios técnicos. Um exemplo claro da autonomia da Cetesb é a proibição da dragagem do canal de acesso e da bacia de evolução da Cosipa, devido aos sedimentos de alto poder poluidor encontrados no local.

Desde 1996, a Cetesb proibiu a dragagem dessas áreas, e somente irá liberar mediante um projeto técnico satisfatório da Cosipa. Dessa forma, a Cosipa e a Ultrafértil correm o risco de não mais poderem entrar com navios em seus terminais, prejudicando toda a logística das duas indústrias.

Cipriano mostra dados que permitem ter uma visão clara da melhoria do ar em Cubatão. Em 1984, Vila Parisi registrava 280 microgramas por m³ de material particulado, enquanto, hoje, encontramos apenas 80 a 85 microgramas, mesmo assim, acima do padrão internacional de 50 microgramas por m³. Já no centro de Cubatão, os resultados são mais satisfatórios: de 120 microgramas em 1984 passou para 35 a 37 microgramas, estando, assim, dentro do padrão aceitável.

As duas principais fontes de material particulado em Cubatão, ainda sem controle, são a Unidade UFCC, da Refinaria Presidente Bernardes, e a Coqueria, na Cosipa. A Cetesb acaba de assinar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com a Cosipa, visando solucionar a poluição da Coqueria, e, em breve, espera fazer o mesmo na Refinaria. Atualmente, a Cetesb tem 19 TAC's sendo monitorados no Pólo Industrial de Cubatão. Por seu trabalho na cidade, a Cetesb é uma das empresas públicas mais respeitadas da região [38].

No entanto, nem só a Cetesb realizou trabalhos de monitoramento da poluição ambiental em Cubatão. Vários cientistas, brasileiros e estrangeiros, vieram para a região estudar a poluição ambiental da cidade. Entre eles, destaca-se a bióloga alemã, Jutta Gutberlet, que realizou uma pesquisa que viria a constituir em sua tese de doutoramento, defendida em 1990, na Universidade de Tubingen (Alemanha).

Segundo Gutberlet (1996), as emissões de poluentes podem ser medidas por aparelhos mecânicos sofisticados ou por métodos alternativos de bioindicação ou bioacumulação. Gutberlet optou pelo método da bioacumulação moss bag, utilizando musgos e líquens, retirados de regiões despoluídas e colocados em regiões fortemente poluídas [39].

O monitoramento moss bag foi realizado na região de Cubatão entre os meses de janeiro e dezembro de 1987, em 24 estações, com 12 períodos de exposição. Foram escolhidos 24 locais para implantar as Estações com os saquinhos de musgo [40].

O resultado da pesquisa mostrou que os locais de maior carga de metais pesados e alumínio eram as Estações localizadas no vale do Rio Mogi e próximas aos grande emissores (Cosipa e Refinaria): "Trata-se de pontos localizados todos na direção predominante dos ventos, mas a distância diferentes do emissor e em altitudes diferentes" (Gutberlet, 1996:155).

As Estações de monitoramento situadas a grande altitude (entre 731 e 791 metros), no vale do Rio Mogi e na direção principal dos ventos, também apresentou grande concentração de metais pesados. A causa dessa concentração de poluentes no vale do Rio Mogi está ligada a sua própria topografia, que torna aquele vale fechado pela Serra do Mar ao Nordeste, impedindo que a poluição se disperse, acumulando-se no seu interior. Com os dados obtidos sobre a quantidade de metal, Gutberlet confirmou os riscos da poluição atmosférica para a saúde da população de Cubatão.

As mais baixas taxas de poluição foram medidas nos bairros do Casqueiro e Cotas (na Serra do Mar), localizados a sotavento e longe dos centros de emissão, o que levou a autora a concluir a forte relação existente entre centro poluidor e acumulação dos metais. A região da estrada do Caminho do Mar, também apresentou baixa concentração de metais, menos para o níquel e o alumínio. Já as principais fontes de metais pesados eram a Cosipa e as fábricas de fertilizantes, localizadas, justamente, no vale do Rio Mogi. A região mais atingida pela poluição era, sem dúvida, Vila Parisi [41].


NOTAS:

[32] A Cetesb (Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental) foi fundada em 1968 pelo Governo do Estado de São Paulo, com a missão de controlar a poluição das águas. Posteriormente, ampliou sua funções, controlando também a poluição do ar e do solo. A Cetesb possui duas estações em Cubatão: Cubatão-Centro e Cubatão-Vila Parisi.

[33] Os estudos da Cetesb em Cubatão colocaram a empresa estatal na vanguarda do conhecimento tecnológico em aspectos ambientais na América Latina. Entre 1983 e 1986, a Cetesb aplicou na cidade soma superior a US$ 1,0 milhão (Cetesb, 1986:03/08).

[34] Entende-se por Material Particulado as partículas em suspensão na atmosfera, ou simplesmente, poeiras e fumaça. Já Hidrocarbonetos são substâncias relativamente simples, formados de átomos de hidrogênio e carbono. São originados da combustão do petróleo, do carvão vegetal ou mineral ou ainda do álcool. Quanto ao Dióxido de Enxofre, de Nitrogênio e Monóxido de Carbono, são todos resultantes da queima de combustíveis (Branco, 1984:67/70).

[35] A bacia hídrica do município de Cubatão compreende o Rio Cubatão e seus afluentes, que deságua no Estuário de Santos: "A relativa abundância de água de boa qualidade foi um dos fatores determinantes na decisão de se industrializar o município (...) Com o advento das indústrias, os corpos d'água receberam cargas poluidoras que praticamente eliminaram a vida aquática e tornaram restritas as atividades recreativas" (Cetesb, 1986:19).

[36] "Pelo exposto, verifica-se que o restante do Programa depende significativamente do empenho da Cosipa em cumprir os prazos estabelecidos para o controle previstos de todas as suas formas de poluição" (Cetesb, 1988:12). Atualmente, a Cosipa vem cumprindo seu cronograma satisfatoriamente.

[37] Em 1991, em razão das inversões térmicas, foi decretado estado de alerta duas vezes e de emergência uma vez na área de Vila Parisi.

[38] A Agência da Cetesb, em Cubatão, data de 1983, quando estourou o problema ambiental na cidade. Está instalada num prédio moderno à margem direta do Rio Cubatão e possui 30 funcionários, entre técnicos e pessoal administrativo.

[39] "O princípio fundamental desse método baseia-se na exposição de saquinhos de náilon com musgo, que servem como acumuladores de poluentes durante um determinado período. Posteriormente o musgo sofre uma análise química para se determinar o conteúdo de poluentes em comparação com amostras não expostas. Com seguidas repetições dos períodos de exposição e uma ampla rede com pontos de medição, pode ser realizado o monitoramento da qualidade do ar e o registro de suas oscilações sazonais e espaciais (...)

"O melhor gênero de musgo para esse tipo de atividade é o sphagnum, pois possui as maiores taxas de acumulação de diversos poluentes atmosféricos (...) Outras vantagens do monitoramento moss bag: requer menos recursos financeiros, independe de energia elétrica, não requer monitoramento, permite análise do corpo da planta, sua análise química é rotineira etc." (Gutberlet, 1996:135).

[40] Foram construídos suportes para fixação dos saquinhos de musgo em forma de cruz, fixando os saquinhos em cada uma das 4 pontas da cruz: dois saquinhos ficaram a 1 metro do solo e, os outros dois, a 2 metros. Os musgos foram coletados numa área pantanosa entre as cidades de Itanhaém e Peruíbe, longe da poluição. Lavado e secado, o musgo foi colocado em pequenas redes de náilon (saquinhos), na forma de pequenas bolinhas com diâmetro de cerca de 6 cm.

Depois de colocados nas Estações, os saquinhos foram retirados depois de 1 mês e substituídos por novos. Os retirados foram secados a 50ºC na estufa e, posteriormente, triturados. O musgo triturado foi levado para a análise química no Instituto de Química Analítica em Piracicaba (Gutberlet, 1996:139/145).

[41] "Devido às condições topográficas da região, os poluentes transportados para dentro do vale do rio Mogi pelos ventos Sul/Sudoeste não se dispersam facilmente. Os ventos na direção oceano/continente e serra/vale causam uma troca vertical do ar ao longo da encosta da Serra do Mar. Principalmente nas condições meteorológicas de inversão, os poluentes atmosféricos congestionam-se nas regiões mais altas da serra" (Gutberlet, 1996:193/194).

Em sua pesquisa, realizada entre janeiro de 1987 e junho de 1990, Hermógenes Leitão Filho constatou que "Os ventos constantes que sopram do mar carregam os poluentes de encontro a Serra do Mar, em uma área restrita, onde existe uma concentração de poluentes muito elevada. Esta poluição permanente manifestou os seus efeitos tóxicos na vegetação, determinando a morte da floresta (...) O perigo de novas tragédias é constante nesta região" (Leitão Filho, 1993:14).