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HISTÓRIAS E LENDAS DE CUBATÃO - ESTRADAS
O maior engavetamento na Via Anchieta (2)

Foram 15 mortos, 300 feridos e 140 veículos destruídos, em junho de 1977
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Um denso nevoeiro, numa época em que era pouca a sinalização e não tinham sido desenvolvidas iluminação e pintura específicas para reduzir os efeitos da neblina, foi o principal motivo para uma seqüência de 3 km de acidentes na Via Anchieta, em 28 de junho de 1977, caracterizando um dos maiores acidentes automobilísticos da história mundial. Os fatos foram assim registrados no dia seguinte, 29/6/1977, pelo antigo jornal santista Cidade de Santos:
 

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3 KM DE ENGAVETAMENTOS E 15 MORTOS

A Via Anchieta viveu ontem de manhã os momentos de maior dramaticidade desde a sua inauguração em abril de 1947. Cento e quarenta veículos, num trecho de aproximadamente três quilômetros de extensão, sofreram engavetamento, resultando num saldo de 15 mortos e mais de trezentas pessoas feridas, na sua maioria trabalhadores que se dirigiam para o Parque Industrial de Cubatão. Todos os veículos envolvidos no trágico acidente, incluindo-se ônibus, caminhões, carros particulares, automóveis de lotação e peruas que circulavam nas duas pistas no trecho compreendido entre a ponte sobre o rio Casqueiro e uma passarela de pedestres situada na altura do bairro do Casqueiro, no município de Cubatão.

As causas da pavorosa tragédia - que desde cedo chamou a atenção das cidades de Santos, São Vicente e Cubatão, onde foram mobilizados enormes contingentes de policiais e médicos operadores - não foram ainda determinadas com precisão, apesar de duas versões circularem com insistência, logo cedo, no local do acidente. De um lado, falou-se que o excesso de velocidade de um ônibus que transportava trabalhadores para o Parque Industrial de Cubatão teria sido o responsável pelo início da seqüência de acidentes. De outro, mencionou-se, sem detalhes entretanto, um veículo de placa oficial do município de Cubatão.

Forte nevoeiro - Desde cedo, toda a Baixada Santista amanheceu coberta por forte e denso nevoeiro, impossibilitando a visibilidade a mais de 5 metros, o que teria provocado o retardamento de alguns ônibus de transporte de operários para o Parque Industrial de Cubatão.

Daí a concluir-se também que a indicação de um responsável pelo acidente é temerária, porque dificilmente qualquer que fosse a testemunha teria condições de definir bem o quadro que resultou no engarrafamento dos 140 veículos, alguns dos quais, prensados entre outros mais pesados - ônibus e caminhões - praticamente desapareceram, transformando-se apenas num enorme bloco de ferros retorcidos. Alguns dos carros sofreram princípio de incêndio e outros foram inteiramente destruídos pelas chamas, sem que nada pudessem fazer equipes de socorros, em razão da dificuldade de acesso ao local, só desobstruído quase quatro horas depois do acidente, quando já não havia mais neblina.

O tumulto provocado pelos contínuos desastres provocou também impecílios (N.E.: SIC = empecilhos) à prestação de socorros aos feridos e à remoção dos cadáveres, alguns deles com difícil disponibilidade para serem identificados.

Apesar da sinalização fluorescente na rodovia, pela manhã, no instante em que se iniciou a seqüência de acidentes, às 7h15, eles tornaram-se praticamente inúteis. E, mesmo os motoristas que - entendendo o risco da pouca visibilidade - circulavam com cuidado e vagarosamente, acabaram sendo envolvidos no engarrafamento monstro, sem terem recursos de saírem fora dele.

O acostamento da estrada no trecho entre a ponte do rio Casqueiro até a passarela de pedestres - distância de aproximadamente 3 quilômetros - ficou inútil para os veículos que tentaram procurá-lo na esperança de escaparem ao pavoroso engarrafamento. Alguns veículos desgovernados invadiram o acostamento e outros atravessaram da pista Santos-Cubatão-São Paulo, para o leito de tráfego no sentido inverso, indo também atingir o outro acostamento, onde chegavam a apanhar alguns veículos.

Um ônibus do Expresso Zefir, por exemplo, que descia em destino a Santos, segundo revelações de pessoas que assistiram o acidente, foi apanhado por um pesado veículo que transpôs as defensas divisórias da pista e o alcançou no acostamento, para onde o motorista tentara jogar o coletivo visando livrar-se da confusa situação criada em todo aquele trecho da rodovia.

Críticas - Durante a operação de socorros aos feridos e ao transporte dos cadáveres, da qual participaram dezenas de policiais, médicos e até mesmo gente do povo que, movida pelo espírito de solidariedade, locomoveu-se até a estrada, surgiram as primeiras críticas à Desenvolvimento Rodoviário Sociedade Anônima, a Dersa e as empresas responsáveis pelo transporte dos trabalhadores para o Parque Industrial de Cubatão.

Sobre a Dersa, as observações eram mais em torno da falta de sinalização para período de neblina, especialmente a partir do raciocínio de que a empresa mantém um sofisticado serviço de meteorologia, que com absoluta segurança informa com um dia de antecedência as condições das estradas no complexo Imigrantes-Anchieta, mas, no entanto, não tem tido o cuidado de, valendo-se da previsão, preparar esquemas apropriados para prevenção de acidentes durante o período de baixa visibilidade.

A respeito das empresas de transporte de trabalhadores, as observações feitas referem-se ao abuso na velocidade, havendo até reclamações dos próprios usuários destes veículos, sem contudo serem atendidos em seus apelos, para que seja exigida a moderação na velocidade, em especial nos dias de menor visibilidade.

Interdição - Durante quase quatro horas seguidas, a Via Anchieta esteve paralisada nos dois sentidos. O tráfego intenso de todos os setores de socorros da Dersa - guinchos, ambulâncias, carros de emergência etc., foram mobilizados, além de um contingente reforçado da Polícia Rodoviária, que procurou cercar de cuidados os feridos e remover os destroços dos 140 veículos espalhados em diferentes pontos das pistas.

Todos os médicos operadores do Instituto Nacional de Previdência Social, o INPS, a partir das 8 horas de ontem, momento em que se noticiou pela primeira vez a extensão do acidente, foram deslocados para os hospitais da Santa Casa de Santos, Cubatão, Beneficência Portuguesa de Santos e Hospital São José, em São Vicente, com a finalidade de ajudarem nas intervenções de salvamento dos feridos, alguns - grande maioria - em estado bastante grave.

Guinchos particulares que costumam operar no eixo das estradas Anchieta-Imigrantes também foram solicitados para procederem a uma composição de ajuda para remover destroços de veículos.

Em Cubatão, no dia de ontem, algumas empresas foram sensivelmente afetadas com a falta de seu pessoal ao trabalho, surpreendidos pelos acidentes. E, no Sindicato dos Metalúrgicos de Santos, instalou-se um plantão permanente para atendimento dos pedidos de informações sobre os empregados do Parque Industrial, envolvidos nos acidentes. O mesmo sindicato mobilizou uma equipe de doadores de sangue espontâneos, para encaminhá-la aos hospitais, mantendo ainda um circuito de comunicação para dar atendimento aos internados.

Soldados do Exército e da Polícia Militar também foram destacados por seus comandos para atenderem ao pedido de doação de sangue e, em pouco tempo, nas portas dos hospitais se formaram imensas filas de pessoas que procuravam saber de seus parentes ou voluntários que pretendiam prestar ajuda no transporte de feridos e nos atendimentos, como preenchimento de fichas, cadastramento e informações genéricas sobre a situação real do acidente.

Um culpado, mas sem provas - No primeiro levantamento efetuado pelos policiais da Rodoviária, na tentativa de apurar a responsabilidade do acidente, surgiram versões de que o causador da tragédia seria a imperícia de um motorista oficial de Cubatão - fato, no entanto, não comprovado e logo desfeito - e o informe de que o ônibus da Breda Turismo, prefixo 678, que levava funcionários para a Companhia Siderúrgica Paulista, a Cosipa, seria o único responsável por tudo.

Nesta versão, falou-se que o veículo desenvolvia excessiva velocidade, apesar da falta de segurança e algumas advertências que teriam sido feitas ao motorista, os ocupantes do coletivo, temerosos com a condição de visibilidade precária em que se encontrava aquele trecho da rodovia. O argumento do  excesso de velocidade teria sido contestado, com a informação de que o ônibus estava fora de seu horário habitual e não podia chegar à indústria com atraso. Este coletivo teria sido o principal envolvido no acidente, apesar da Polícia de Cubatão, até agora, não ter conseguido detectar com segurança a responsabilidade do causador do trágico engarrafamento que envolveu 140 veículos.

Um dos ocupantes de um ônibus, que se dirigia com grupo de trabalhadores para indústria de Cubatão, afirmou, entretanto, que a falta de visibilidade era tão grande que apenas percebeu o acidente quando ele já havia ocorrido. O que percebeu, conforme contou, foram estrondos seqüentes e depois gritos de desesperos e choros contínuos de pessoas presas às ferragens retorcidas.

Na Via Anchieta, quilômetros de veículos permaneceram 4 horas parados
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Sobrecarga prejudicou linhas telefônicas

A preocupação de familiares, amigos e conhecidos dos empregados nas indústrias do Parque Industrial de Cubatão, que acompanhavam o noticiário através das emissoras de rádio e pela televisão, relatando os lances do enorme desastre ocorrido na Anchieta, provocou uma tremenda correria ao Centro Telefônico de Cubatão. E, durante quase toda a tarde, o sistema de comunicações entre as cidades da Baixada e aquele município acabou sendo sobrecarregado de forma a não suportar os chamados. Para se conseguir uma linha para ligações, até mesmo dentro do perímetro urbano de Cubatão, tinha-se que permanecer durante horas com o gancho fora do aparelho, aguardando linha, que nem sempre aparecia. Tudo dependeu muito da sorte.

Algumas queixas feitas à central telefônica foram respondidas com muita segurança por um funcionário da empresa, com o argumento de que houve uma sobrecarga, mas não havia, até então, nenhuma denúncia de cabos quebrados. Para se ter uma idéia, a agência telefônica de Cubatão, que em média por dia é solicitada para ligações por 40 a 50 pessoas no máximo, ontem atendeu, a partir das 15 horas, cerca de 240 pessoas, em sua maioria tentando falar com hospitais e pronto-socorros de Santos.

No período da manhã, ainda conforme informações da Telesp, a demora para uma ligação era de até 20 minutos. À tarde, no entanto, este tempo foi quase que triplicado em alguns casos. Só depois das 16h30, o movimento começou a atingir níveis normais, mas mesmo assim os telefones da cidade tinham dificuldades de linha.

Prefeito atrasou - O prefeito Carlos Frederico Soares Campos perdeu mais de uma hora no congestionamento da rodovia interditada até, pelo menos, 10 horas da manhã, quando foi possível tirar de uma das pistas os veículos ou restos deles que estavam atirados sobre o leito de tráfego. O sr. Frederico Campos tinha encontro marcado com o diretor-presidente da Sabesp - Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo, engenheiro Reinaldo Emídio de Barros, na Capital, às 15 horas, e se atrasou.

O prefeito cubatense só conseguiu sair do município às 14h30. Ele foi para São Paulo em companhia de Luís Carlos de Oliveira Matos, seu chefe de Gabinete, e Paulo Cordeiro, coordenador dos Assuntos Jurídicos e Administrativos do município, mas saiu preocupado com a situação, em especial com os recursos oficiais capazes de dar atendimento aos feridos no grave acidente.

Ciesp reunida - Os conselheiros da Delegacia Regional do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo, que tinham marcado para ontem reunião para tratar de importantes assuntos, viram sua reunião diminuída em número de participantes em conseqüência do acidente na estrada. E entenderam, os nove dos vinte e três conselheiros que deviam participar, que a reunião poderia ser convertida também numa importante posição contra a atual situação em que se encontra a via, que se denominava Bandeirantes (avenida Nove de Abril).

O que ficou acertado é que, entre os pedidos a serem dirigidos às autoridades, ficasse anotado também o que se refere ao pedido de duplicação daquela importante via como sendo uma segunda opção para chegar à sede do município de Cubatão.

E, ao mesmo tempo, os conselheiros da Fiesp alertaram da necessidade urgente de entrarem em contato com as empresas responsáveis pelo transporte dos operários para o Parque Industrial de Cubatão, no sentido de que limitem e observem com rigor as velocidades permitidas nas rodovias, mantendo assim maior segurança aos trabalhadores.

O diretor do Senai, sr. Antonio Carlos Rodrigues, deu sugestão para que seja oferecido o curso de direção ofensiva (N.E.: SIC = defensiva), no sentido de transferir conhecimentos necessários a dirigir de maneira mais eficiente e enfrentar imprevistos com problemas climáticos, más condições das estradas e dos veículos. Ele se referia à necessidade da preparação dos motoristas, integrados também aos problemas produtivos das indústrias.

Estradas - O mau estado em que se encontram os caminhos que levam aos principais centros de produção do município de Cubatão poderá ser também objeto de análise dos empresários, uma vez que a rodovia Piaçaguera-Guarujá, considerada como a espinha dorsal do escoamento do Parque Industrial de Cubatão, há muito aguarda melhores atenções do Estado, sem, contudo, até agora ser atendida.

Nesta rodovia, a falta de sinalização é uma constante e com a aproximação - segundo dados oficiais do serviço de meteorologia da Dersa, dos períodos de grande incidência de serração (N.E.: SIC = cerração), a estrada vai se transformar num perigoso caminho capaz de provocar prejuízos até aos pólos produtores da única cidade industrial da Baixada Santista.

Trabalharam nesta cobertura: Abissair Rocha, Vera Lúcia Correa, Francisco Aloise, Jorge Reed, Ercília Pouças Feitosa, Nivair Neves, Itamar Miranda, Mário Tadei e Flávio Roberto Alves.
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