Pormenor do Mapa da Capitania de São Vicente e
Adjacências - 1553-1597,
que destaca as tribos indígenas da região litorânea paulista
Bertioga
Arrabalde histórico e pitoresco, atualmente
(N.E.: 1986) primeira Subprefeitura do Município de Santos (o
prefeito José Gomes criou mais duas Subprefeituras: a de Jurubatuba e a de Itatinga), situado à boca externa ou
Leste, do canal do mesmo nome, à sua saída no oceano, e em frente ao ponto extremo da ilha de Santo Amaro, hoje município de Guarujá.
O nome do lugar, objeto de versões e controvérsias, segundo uma escritura de 1580,
passada em favor de Domingos Garocho, era a denominação do pequeno morro local, situado na terra firme, chamado pelos indígenas de Buriquioca,
"morada dos monos buriquis - pouso dos monos", porque a ele se recolhiam ao fim do dia quantidades enormes de tais macacos, em vista de ser o mesmo
morro a única elevação de aquém rio Itapanhaú, em muitos quilômetros de várzea florestada. Hans Staden, o famoso viajante e artilheiro alemão, que
serviu no Forte de S. Felipe (em frente) e ali foi aprisionado pelos Tamoios, muitos anos antes daquela
escritura, já escrevera Brikioca - numa antecipada confirmação ao documento.
A grande diferença morfológica entre Buriquioca e Bertioga, ainda maior
do que a prosódica, deu causa às versões e controvérsias verificadas entre os nossos tupinólogos, geógrafos e outros, que atribuíram ao topônimo o
significado de "lugar ou morada dos paratis - das tainhas", sem outras considerações, como se não houvesse, aí, uma questão histórica a observar.
É que, em verdade, e isso não foi estudado por eles, as novas populações do lugar,
quase sempre de povoadores, mateiros, gente simples, ignorante, totalmente alheia à história inicial, nada sabendo dos antigos monos ou macacos
grandes, que existiram outrora no morrinho - já então chamado de São Lino, e mais tarde ainda, de Morro da Senhorinha (que até hoje
conserva), e não mais existiam nos séculos XVIII e XIX -, impressionadas pelas quantidades incríveis de paratis e tainhas, existentes em redor, nas
águas do rio (canal) e nas águas do mar, substituíram, talvez sem querer, o radical buriquí, pelo radical parati, que se corromperia e
deformaria rapidamente, passando a barati, brati, breti e berti, criando, insensível e involuntariamente, um novo
vocábulo e topônimo, com sentido completamente diferente do inicial e histórico, do documento de 1580 e do depoimento de Hans Staden (de 1549-1550).
De fato, só assim teria sido fácil às populações, sucedidas naqueles duzentos e
trezentos anos, produzirem, sem violência fonética ou prosódica e morfológica, o vocábulo definitivo e atual: Bertioga.
Era muito mais compreensível a essas novas populações, tão distantes do século
inicial, que Bertioga fosse uma transformação de Paratíoga (passando por Paratíoga, Báratióga e Bertioga), porque
paratis e tainhas existiam ali, em seu redor, e à sua vista, aos milhões, nascendo nas águas interiores (do rio e do chamado largo do Crumaú
ou Curumã-ú "água ou rio das tainhas") e passando em seguida ao mar; porque os monos não mais existiam nem eles os haviam visto ali em todo o
seu tempo.
Dois aspectos pois se oferecem nesta questão histórica e toponímica. O do nome antigo,
inicial, original, que era Buriquioca, com um significado justificável e básico em sua época (para os dominadores indígenas - tamoios e
outros), "morada dos monos buriquis" - e o nome final, atual, trocado ou inventado pelos novos povoadores, processado pela mudança do radical antigo
(de Buriquí para Parati), mais compreensível e mais justificável na nova época, tão distante da primeira, e tão separadas ambas pela
ignorância e pelo analfabetismo, mais do que pelo tempo.
Bertioga não é pois uma corruptela ou transformação de Buriquióca, e sim
o resultado de uma troca natural de radicais de um mesmo vocábulo, produzindo o retrato de um novo fenômeno local (a abundância dos paratis), como o
anterior representava o retrato de um fenômeno de então (a abundância dos monos). Assim compreendemos hoje esta questão histórica, geográfica e
lingüística, sugerida pelo topônimo.
Os fundadores de Bertioga, ou antiga Buriquióca, foram os famosos
Bragas, o português Diogo de Braga e seus cinco filhos: João, Diogo, Domingos, Francisco e André de Braga, já brasileiros, e considerados, hoje,
os primeiros santistas nominalmente conhecidos, heróis e mártires do povoamento vicentino, notando-se que Diogo (o filho) foi um dos fundadores do
Rio de Janeiro, ao lado de Estácio de Sá, e vereador à primeira Câmara da cidade (N.E.: ...do Rio de Janeiro)
em 1567.
Mapa do Litoral Sudeste, cerca de 1600, no acervo
do códice da Biblioteca da Ajuda (Lisboa/Portugal), já cita o nome Bertioga
Reproduzido da Enciclopédia Mirador Internacional, 1980 (página 10.218),
Encyclopaedia Britannica do Brasil Publicações Ltda., São Paulo/SP
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