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O "Diamante de Porter" em estudo exploratório multicaso no setor pesqueiro exportador de Santos
João Ribeiro Natário Neto
Conclusão
Esta pesquisa tratou da competitividade do setor pesqueiro exportador de Santos, baseada em um estudo exploratório com múltiplos casos, fundamentada no Diamante de Porter (1993), que estabeleceu as quatro determinantes: condições de fatores; condições de demanda; indústrias correlatas e de apoio; estratégia, estrutura e rivalidade entre empresas; e ainda, as variáveis: o acaso e o governo, que são fundamentais para favorecer ou dificultar a criação da vantagem competitiva.
Houve a verificação da relação existente entre a teoria da competitividade global e a realidade dos exportadores de pescados da localidade, representados pelas empresas ou exportadoras "A", "B" e "C", e a validação ou não de cada enunciado da teoria.
A verificação do diamante de Porter foi conduzida através do confronto de 10 enunciados teóricos, em uma única tabela, abrangendo os quatro determinantes bem como o papel do governo no processo de vantagem competitiva da indústria pesqueira exportadora de Santos.
A pesquisa revelou que apesar da globalização do setor pesqueiro, as
empresas "A", "B" e "C", ainda encontram-se distantes da competitividade preconizada pelo Diamante de Porter, e não atendem aos enunciados teóricos inseridos nos quatro determinantes: condições de fatores; condições de demanda; indústrias correlatas e de apoio; estratégia, estrutura e rivalidade entre empresas; por isto, não foram validados.
No entanto, "O papel do Governo - políticas governamentais" - atende parcialmente e foi validado, por dar continuidade ao processo de criação da vantagem competitiva do Setor Pesqueiro Exportador. A política setorial adotada, apesar da lentidão e timidez, criou linhas de crédito, financiamentos, combustível com subsídio, e melhorou a legislação. Contudo, a política cambial, com a atual valorização do Real frente ao Dólar, acompanhado das altas taxas de juros, tornou o mercado menos favorável a exportação.
As três exportadoras analisadas são antigas e seus sócios atuam no segmento há mais de vinte anos, passaram por diversos planos e crises econômicos, são experientes e conhecedores do ramo, atualmente reclamam da valorização do Real frente ao Dólar, da alta taxa de juros, e da tributação dos pescados brasileiros no mercado exterior. Não costumam fazer planejamento estratégico para médio e longo prazo.
A empresa "A" opera com um barco arrendado. A captura de pescados está localizada entre o litoral do Estado do Espírito Santo e a Costa Argentina. Não possuem administração profissionalizada, a gestão e gerência são centralizadas, usam tecnologia tradicional e por consegüinte mais mão-de-obra. O Departamento de Marketing é inadequado ou inexiste. O volume de exportação, em 2005, da empresa "A", atingiu US$ 3.000.000,00; da "B" chegou a US$ 2.000.000,00; e da "C" ultrapassou os US$ 7.000.000,00.
Estas empresas apresentam algumas dificuldades na gestão, tais como:
seus equipamentos aparentam ser pouco adequados do ponto de vista de pesca seletiva;
faltam
dados e informações suficientes e confiáveis acerca dos principais recursos que se encontram em alto-mar;
insuficiência de informação científica acerca das principais espécies;
melhor
capacitação profissional em todos os níveis;
insuficiência de infra-estrutura de armazenamento;
pouco
conhecimento com relação às linhas de crédito e custos BNDES, e demais bancos autorizados em operar em Câmbio e com Crédito Rural;
insuficiente
conhecimento do constante na Consolidação das Normas Cambiais (CNC) do Banco Central do Brasil, e pouca organização no encaminhamento burocrático junto a bancos, Receita Federal e despachantes;
identificação de outros mercados, etiquetas e regulamentos aduaneiros dos países importadores;
concentração de sacados no exterior e de países;
contratação de câmbio exportação, na modalidade de cobrança à vista, pagamento à vista, para embarque marítimo FOB com destinado a país do continente asiático. Prazo máximo, permitido pelo Bacen, para liquidação e pagamento: até 30 dias, após a data do embarque. No entanto, o navio chega ao destino em 45/60 dias, quando o sacado pagará, se a mercadoria estiver de acordo com o pactuado.
entrega de mercadoria e documentos de embarque diretamente e em nome do importador, por via aérea. Efetua assim, a chamada remessa sem saque, corre risco de inadimplência e dificilmente terá amparo legal para acionar judicialmente o sacado.
No período da pesquisa, as empresas "A" e "B" não possuíam web site na Internet, e a exportadora "C" estava desenvolvendo suas primeiras páginas na Rede.
Apesar dos aspectos vistos anteriormente, o setor é globalizado e as empresas participam das principais feiras internacionais, a última foi realizada em maio de 2005, em São Paulo, e contou com a presença de mais de cinco mil profissionais de toda a cadeia produtiva da pesca e da aqüicultura. As principais missões internacionais estiveram presentes, como a da Alemanha, da Grã-Bretanha, da Espanha e do Chile, que participaram das rodadas de negócios.
As empresas exportadoras reclamam da insuficiente capacitação profissional e tecnológica de seus funcionários/colaboradores/pescadores/mestres em todos os níveis e de falta de escolas técnicas e faculdades públicas, voltadas para o setor. As tentativas de parcerias com universidades em Santos não obtiveram sucesso, as empresas recorrem às universidades de São Paulo e a institutos no Rio de Janeiro para análise de metais pesados e histaminas.
Somente "O papel do Governo - políticas governamentais" - foi parcialmente
validado, também, por tomar algumas iniciativas importantes, que vão ao encontro do Diamante de Porter, como, em 2004, quando enviou missões a 7 (sete) países com o objetivo de fechar acordos internacionais e ampliar o potencial de exportações. No ano 2000, passou a controlar melhor a exploração estrangeira em águas profundas brasileiras. Como o país não possui barcos apropriados para este tipo de pesca, espécies com alto valor no mercado europeu, asiático e americano, como o caranguejo real, peixe-sapo e o camarão-caribineiro, estavam sendo amplamente explorados por outros países. Hoje, sessenta barcos estrangeiros arrendados estão em atividade na costa brasileira, sob a observação da Secretaria Especial da Pesca e Aqüicultura.
Em outubro de 2005, foi aprovada pelo Congresso a Medida Provisória 255 - (MP do Bem), com incentivos fiscais amparados pela Lei 11.196/2005, para as empresas que exportarem até 80% de sua produção: estão isentas de recolhimento do PIS - Programa de Integração Social e da Cofins - Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social.
Conforme a SEAP (2004) foram abertas linhas de créditos pelo Pronaf Pesca, pelos Fundos Constitucionais, do Norte, do Nordeste, e do Centro-Oeste disponibilizadas pelo Banco da Amazônia, Banco do Nordeste, Banco do Brasil e BNDES destinadas aos pescadores e aqüicultores. Há, também, o Pró-Frota Pesqueira, crédito subsidiado, que tem como meta crescimento consistente e equilibrado da pesca oceânica, geração de empregos na construção naval e no processamento industrial do pescado. O pescador artesanal conquistou o direito da nova Lei do Seguro Defeso já em vigor. Ainda segundo, a SEAP (2004) o programa de alfabetização de pescadores, Pescando Letras, contava em 2003 com mais de cinco mil pescadores em sala de aula.
Kotler (1997) enfatiza que o sistema educacional é o principal elemento no desenvolvimento do capital humano de um país, para que possa ocorrer a reciclagem de força de trabalho, e tornar a mão-de-obra mais adaptada as mudanças setoriais e em tecnologia. A importação de intelectuais, de mão-de-obra especializada e de talentos gerenciais é de grande importância; e para o desenvolvimento de empreendedores, de pequenas e médias empresas, são necessários, principalmente: o crédito, o treinamento e os serviços reais, que devem ser repassados à informalidade da economia, objetivando a absorção pelo setor formal.
A educação e a qualificação profissional de baixo nível, as insuficiências tecnológicas, as dificuldades para obtenção de crédito/capital, o subdesenvolvimento das instituições, e as políticas públicas, são fatores que retardam o desenvolvimento de aglomerados em países em desenvolvimento, como o Brasil, e não permitem a evolução para uma economia avançada.
O setor pesqueiro não consegue formar aglomerado pesqueiro na RMBS, quer pela escassez de recursos, quer por falta de investimentos, quer pela utilização de tecnologia tradicional e deficiente (que opera com maior número de empregados, cujos níveis educacionais e de qualificação são considerados baixos), quer pela falta de competências, pesquisas, de escolas, institutos e universidades parceiras, quer pela fraca presença de associações e sindicato na vida política da Região, e pela dificuldade e lastro para utilizar de linhas de crédito.
Não há cluster pesqueiro, porém o governo estadual pretende transformar o estuário de Santos no principal pólo da indústria naval Brasileira, instalando dois estaleiros na Região Metropolitana da Baixada Santista, que devem gerar 10 mil empregos.
São Paulo pretende construir parte dos 22 navios de grande porte que a Petrobras vai adquirir nos próximos anos. A expectativa é que estes navios representem um investimento de US$ 1,3 bilhão em circulação na indústria naval brasileira até dezembro/2006. O governo do estado deverá exercer o papel de indutor do negócio, juntando os dois elos dessa cadeia, ou seja, os proprietários de áreas às margens do Estuário e os construtores de navios. O governo está negociando com os grandes construtores de navios do mercado, os coreanos e japoneses.
O segundo estaleiro a ser instalado no estuário deverá se especializar no reparo e manutenção de embarcações de grande porte. O objetivo é transformá-lo em referência no Atlântico Sul, para atender uma demanda por serviços de alta complexidade.
O Governo de São Paulo está disposto a implantar a infra-estrutura de apoio aos estaleiros e assume a responsabilidade de viabilizar eventuais garantias necessárias à liberação dos créditos para os grupos empresariais dispostos a ingressar no negócio. O Estado dará isenção de ICMS.
Para Porter (1999, p.248), a escassez dos aglomerados nos países em desenvolvimento não os impedem de competir, porém os impedem de aumentar a produtividade e o aprimoramento. As exportações crescerão durante algum tempo, com base no baixo custo da mão-de-obra local e na exploração de recursos naturais com tecnologia importada, porém de forma restritiva, porque não será possível aumentar a produtividade e o valor do produto.
Segundo Schmitz (1997), a formação de clusters não garante crescimento e competitividade, ganhos econômicos de forma automática, mas é apenas um facilitador para se atingir esses objetivos, através da divisão do trabalho e especialização entre os pequenos produtores; surgimento de fornecedores de matérias-primas ou componentes, bem como de máquinas novas e usadas; serviços de manutenção; aparecimento de agentes comerciais para o mercado interno e externo; surgimento de prestadores de serviços especializados como contábil, financeiros, técnicos e de mercado; aparecimento de um grupo de trabalhadores com habilidades setoriais específicas; ação conjunta dos produtores locais.
As empresas que fazem parte do cluster possuem menores custos no acesso a informações, maior freqüência e estabilidade nas transações, bem como importantes relações informais, criando um ambiente de menor incerteza nos investimentos em ativos específicos, fundamentais para o aumento da eficiência econômica dos produtores, fazendo com que cada um que pertence ao cluster se beneficie de economias externas de forma mais eficiente do que um produtor semelhante que esteja fora do cluster (SCHMITZ, 1997).
Neves (1999) enfatiza que para Porter (1999), o papel do Governo brasileiro é o de estabelecer um ambiente macroeconômico político estável e previsível, melhorar a disponibilidade, qualidade e eficiência dos insumos genéricos e das instituições, estabelecer regras e incentivos relacionados à competição para estimular o crescimento da produtividade, facilitar a modernização de clusters produtivos e implementar um programa de modernização econômica que seja positivo, distintivo e de longo prazo, mobilizando todos os agentes econômicos.
O diamante fornece às empresas uma base para o desenvolvimento industrial, para torná-las competitivas em sua localidade e globalmente. Está implícita nesse modelo a necessidade de governo e empresas trabalharem conjuntamente para atingirem os resultados desejados (PORTER, 1993, IMD 2001).
Cabe às empresas a tarefa de investir no desenvolvimento dos fatores que têm impacto direto na produção, tais como a capacitação dos recursos humanos e o gerenciamento do conhecimento, fatores estes significativos para a vantagem competitiva; trabalhar de forma sintonizada com as condições de qualidade da demanda interna, no sentido de facilitar o processo de criação de novos mercados; atuar de forma sinérgica no desenvolvimento de seus fornecedores e revendedores, para que os mesmos atinjam a qualidade mundial esperada; desenvolver estratégias de envolvimento e motivação de diretores e empregados para que os caminhos rumo à vantagem nacional sejam alcançados.
Cabe ao governo, através do Ministério do Desenvolvimento da Indústria e Comércio (MDIC) e da Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca (SEAP), sinalizarem e estimularem o mercado a caminhar na direção preconizada pelo diamante. O governo pode e deve ater-se à melhoria das condições de demanda, incentivando a rivalidade interna e criando condições econômicas atrativas para novos investimentos no país.
O modelo de Porter (1993) apesar de toda a crítica que tenha recebido, tornou-se predominante nos trabalhos de análise de competitividade global, e por conseqüência é motivo de discussão em todo o mundo. Mesmo aqueles que o criticam consideram-no como paradigma (AVRICHIR e CALDAS, 2001).
O governo tem um diagnóstico preciso do setor pesqueiro; precisa transformá-lo em ações pontuais, com maior agilidade e melhor controle, cujas principais estratégias vão ao encontro do Diamante de Porter.
O desenvolvimento do segmento pesqueiro exportador no Brasil não foi considerada prioridade dos governos até a década de 90, período em que não se registrou ação pública efetiva para o setor; somente em 1998 foi criado o Departamento de Pesca e Aqüicultura no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, tentando a articulação, entre as esferas governamentais, algumas iniciativas isoladas de fomento
para a pesca e a aqüicultura.
O Brasil não efetuou investimentos estratégicos no setor, e não conseguiu competir com os países asiáticos na exploração da pesca oceânica no próprio Atlântico Sul, e no Atlântico Norte não tem qualquer presença na exploração dos recursos pesqueiros.
Os Governos Federal, Estadual e Municipal relegaram a atividade pesqueira a segundo plano, o empresariado não se capacitou profissionalmente em todos os níveis, não fez planejamento estratégico e não investiu; planos econômicos, taxas de juros elevadas, câmbio desfavorável, globalização e sem uma política setorial, fizeram com que a performance econômica dessa atividade no Brasil fosse inexpressiva, considerando as vantagens comparativas do País para essa atividade. O Brasil produz menos de 1% da produção mundial de pescado, quando poderia estar produzindo, de forma sustentável, cerca de 10% (SEAP, 2003).
Recomenda-se para futuras pesquisas no segmento pesqueiro exportador de Santos, discussões de trabalhos que permitam avaliar as condicionantes necessárias para viabilizar a criação das condições de fatores; de demanda; das indústrias correlatas e de apoio; estratégia, estrutura e rivalidade e a constituição de micro cluster ou local na RMBS, reunindo todos os atores, principalmente a cadeia produtiva; políticos, autoridades, instituições de pesquisa e ensino, nos níveis municipais, estaduais e federais.
Todos esses atores deverão trabalhar com integração e alinhamento, tanto horizontalmente como verticalmente, com metas para curto, médio e longo prazos, considerando-se que nicho de exportações mundiais de pescados é o maior mercado internacional, dentre os produtos do agronegócio (SEAP, 2003).
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