Agenda
21 Local de Santos: Elaboração e Ações
Silvia de
Castro Bacellar do Carmo, Luiz Antonio Nigro Falcoski
Resumo
- Este trabalho aborda as fases de construção
da Agenda 21 Local de Santos. Apesar do apoio internacional recebido
e do pioneirismo em termos de Brasil, houve várias fases de descontinuidades
e paralisações.
A pesquisa
mostrou a fragilidade das organizações, a necessidade de
maior conscientização, a essencialidade da integração
das correntes partidárias, e a falta de engajamento da população,
concluindo na certeza que o resgate da cidadania é peça fundamental,
assim como o incentivo à participação de movimentos
sociais na organização da esfera pública.
Apontou para
a necessária descentralização dos processos decisórios,
com implantação de fóruns intersetoriais e aumento
da democratização.
Palavras
Chaves - Política Pública
e Ambiental, Agenda 21 Local, Cidade Sustentável, Desenvolvimento
Sustentável.
I – INTRODUÇÃO
A degradação
do Meio-Ambiente nas últimas décadas devido aos impactos
das atividades antrópicas, causados pelo crescimento vertiginoso
da ocupação humana sem planejamento e preocupações
ambientais, finalmente levantou questões sobre a sobrevivência
do planeta.
A busca de
soluções para os problemas que o atingem levou à união
da maioria dos países do globo terrestre, com a realização
de várias conferências, acordos e declarações.
Atualmente o documento que melhor expressa as intenções mundiais
é a Agenda 21, principal documento produzido pela Conferência
das Nações Unidas sobre Meio-Ambiente e Desenvolvimento -
CNUMAD, realizada no Rio de Janeiro em 1992.
Contém
recomendações e referências sobre como alcançar
o desenvolvimento sustentável, e possui desdobramentos em nível
de cada nação, com suas peculiaridades e características,
e também em nível de cada região e município.
O conceito
de Agenda Local surgiu como uma estrutura de trabalho que viabilizasse
o engajamento dos governos locais nas decisões da ECO 92, e foi
definido durante a fase preparatória para a citada Conferência,
devido a proposituras do ICLEI - International Council for Local Environmental
Initiatives, propiciando sua integração ao documento final
denominado Agenda 21.
Segundo o
Ministério do Meio-Ambiente - MMA [3],
é um processo de desenvolvimento de políticas para o alcance
da sustentabilidade, cuja implementação depende diretamente,
da construção de parcerias entre autoridades locais e outros
setores da sociedade. Através de uma metodologia participativa deve
produzir um plano de ações para alcançar objetivos
desejáveis pela comunidade local, levando em conta as vulnerabilidades
e potencialidades da base econômica,social, cultural e ambiental
do local.
O "Programa
de Comunidades Modelo" do ICLEI, que promoveu assessoria em 14 municípios
dos cinco continentes para a elaboração da Agenda 21 Local,
identificou algumas características nos processos de construção
das Agendas, tais como:
1) começo
com parcerias multi setoriais que incluem todo os setores; 2) identificação
de recursos logo no início do processo; 3) comprometimento
com recursos da municipalidade; 4) estratégia
explícita de troca de informações com os cidadãos locais; 5) respeito
do município pelas necessidades; 6) prioridades
e decisões dos cidadãos; 7) envolvimento
de líderes políticos e da equipe no processo; 8) alinhamento
municipal das políticas e programas com a Agenda 21 Local durante
a evolução do processo; 9) não
dar início à Agenda 21 Local próximo a eleições.
No Brasil as
Agendas 21 Locais estão se transformando em pré-requisitos
para o financiamento de obras, tanto por parte dos governos estadual e
federal, quanto por parte de bancos internacionais. Portanto, a existência
ou não da Agenda está influenciando na obtenção
de recursos financeiros em muitas cidades.
Segundo as
recomendações do MMA [3a],
o documento final elaborado pelo processo de construção da
Agenda
21 Local deverá refletir uma estratégia particular, definida
a partir dos parâmetros e problemas locais, buscando o desenvolvimento
sustentável, com as seguintes características:
1) ser claro
e preciso; 2) identificar
as principais questões e metas a serem alcançadas, com estratégias
de ação de cada tema, de acordo com os entraves identificados
no diagnóstico elaborado durante o processo de construção
da Agenda; 3) relacionar
organizações e setores envolvidos; 4) definir
as responsabilidades de cada um; 5) estabelecer
prazos para as ações; e 6) registrar
as formas de acompanhamento das ações e avaliações
de desempenho.
O objetivo
deste trabalho se propõe a pesquisar o gerenciamento municipal
em relação às questões ambientais, a partir
da construção de uma Agenda 21 Local, tendo sido definido
o município de Santos como campo sócio-espacial de investigação.
II – CARACTERIZAÇÃO
DO MUNICÍPIO
A cidade de
Santos está localizada no litoral do Estado de São Paulo.
Possui uma extensão territorial total de 271 km², dividida
em Área Insular e Área Continental. Divide a ocupação
da Ilha de São Vicente com o município de mesmo nome, ocupando
39,4 km²; o restante, 231,6 km² refere-se à área
localizada no continente. Situa-se a 70 km da capital, São Paulo,
e apresenta um clima litorâneo de transição, com pluviosidade
elevada, prevalência do clima quente e úmido, e temperaturas
médias de 22º C. Encontra-se a 2 metros acima do mar, numa
planície litorânea circundada por morros, e solo formado por
areia e granito.
Pelo último
Censo do IBGE, ano de 2000, a cidade possui uma população
fixa de 417.983 habitantes, sendo 415.747 hab. da área urbana e
2.236 hab. da área rural. Na época de temporada, meses de
julho, dezembro e janeiro, devido às suas atividades turísticas,
recebe um grande contingente de turistas, considerado como população
flutuante e calculado em torno de 137.000 pessoas.
Faz parte da
Região Metropolitana da Baixada Santista, a qual é composta
por nove municípios, a saber: Peruíbe, Itanhaém, Mongaguá,
Praia Grande, São Vicente, Cubatão, Guarujá, Bertioga,
e Santos.
O histórico
de ocupação de Santos mostra que o desenvolvimento da cidade
deu-se em ondas sucessivas: primeiro em função do desenvolvimento
das atividades portuárias; depois, pela demanda por áreas
de lazer e turismo da população do planalto e, finalmente,
pela implantação do pólo industrial de Cubatão.
Santos acabou se tornando o pólo regional da RMBS, e constitui uma
força econômica própria.
Os problemas
ambientais de Santos começam com o saneamento básico na parte
insular. Com exceção de uma área relativamente pequena
ocupada pelos morros, o restante dos 39,4 km² do território
insular é baixo e plano, com os lençóis freáticos
situados a menos de 2 metros de profundidade, o que significa que qualquer
poluição das águas superficiais ou do solo repercute
sobre a qualidade de água de toda ilha e praias.
No início
do século, o engenheiro sanitarista Saturnino Brito desenvolveu
um programa de saneamento baseado no princípio de separar as águas
de rios e córregos das do esgoto, projetando e construindo nove
canais superficiais. No final da década de 60 foi construído
um sistema coletor que destina todo o esgoto coletado na ilha para um único
emissário submarino e mais três canais, dois subterrâneos
e um superficial.
A partir de
1990, iniciou-se uma parceria entre o governo municipal e estadual para
um programa de recuperação da balneabilidade das praias:
numa primeira etapa, em curto prazo, impediu-se, através da reabilitação
das comportas existentes, a contaminação do mar pelos canais,
admitindo suas águas poluídas na rede coletora de esgoto;
em médio prazo foram realizados trabalhos para detectar e eliminar
os lançamentos de esgotos domésticos no sistema de drenagem.
Nos últimos anos a SABESP ampliou a rede coletora de esgoto da cidade,
atingindo o percentual de 94 % de população atendida.
III – AGENDA
21 DE SANTOS
O processo
de construção da Agenda 21 Local de Santos iniciou-se
a partir do Programa Comunidades Modelo, promovido pelo ICLEI [4].
Este foi criado em 1990 como uma organização internacional
dos governos locais para o meio-ambiente. Contou com o apoio do PNUMA -
Programa das Nações Unidas, e da IULA - União Internacional
das Autoridades Locais, e tornou-se um órgão de consulta
das Nações Unidas para assuntos sobre o meio-ambiente.
Desenvolve
campanhas internacionais na busca do desenvolvimento de consciência
para decisões sobre políticas ambientais, e no estabelecimento
de compromissos formais de ação sobre prioridades identificadas
por seus membros. Possui atualmente mais de 350 cidades, países
e organizações internacionais como membros registrados. Prioriza
os interesses de governos locais em contraponto aos interesses de outras
organizações [1].
Santos filiou-se
ao ICLEI em 1993, como resultado da política ambiental que o governo
municipal em exercício seguia [2].
Santos tem um histórico de organização e participação
da comunidade nos processos de decisão, de acordo com o perfil traçado
pelo ICLEI.
Para o "Programa
Comunidades Modelo" - PCM, que teve duração de 30 meses,
foram selecionadas um total de 14 cidades em todo o mundo, sendo que Santos
foi a única cidade brasileira escolhida. O objetivo primordial era
testar a metodologia para a implantação de Agenda 21 Local
através da ação conjunta do governo e sociedade.
Santos se inscreveu
no processo de seleção do programa no início de 1994,
através da elaboração de documento onde estavam caracterizados
os aspectos físicos, econômicos, sociais, ambientais, o potencial
de desenvolvimento, e também registrados vários programas
implementados na época. Em maio do mesmo ano, a cidade foi visitada
por auditores do ICLEI: conheceram, através de visitas ao local,
as obras de urbanização do Dique de Vila Gilda e as obras
das comportas dos canais que visavam resolver o problema da balneabilidade
das praias; mantiveram encontros com algumas ONGs e entrevistaram alguns
setores da administração municipal.
Foi pré-selecionada
junto com a cidade de São Paulo, tendo sido a cidade brasileira
escolhida para compor o trio latino americano, ao lado de Buga, Colômbia,
e Quito, Equador.
No final de
agosto de 1994, as três cidades latino-americanas participaram de
um workshop promovido pela ICLEI na cidade de Buga, com a finalidade
de trocarem experiências e discutirem as formas de planejamento participativo
a serem implantadas.
Nesta ocasião
Santos apresentou um estudo sobre a formação dos Núcleos
de Defesa Civil dos Morros de Santos, demonstrando que a criação
destes Núcleos proporcionou uma diminuição dos acidentes
geológicos na cidade, e provando o resultado positivo da ação
cooperativa entre a população dos morros e o poder público
municipal.
O primeiro
seminário para o Programa Comunidades Modelo aconteceu em novembro
de 1994. Contou com a participação de técnicos da
administração municipal, ONGs, ambientalistas, conselhos
municipais, universidades, cooperativistas, movimentos populares e outros
setores da sociedade civil. O objetivo deste seminário foi o de
dar início ao envolvimento da sociedade civil na discussão
da Agenda 21 de Santos e iniciar a formação do Grupo de Sustentação.
A finalidade
deste Grupo era a de acompanhar as diversas etapas do Programa, facilitando
os processos de planejamento e servindo de intermediário entre o
governo municipal e os diversos setores da comunidade; de caráter
consultivo, deveria garantir a continuidade do processo, definir as linhas
mestras do planejamento e realizar reuniões periódicas para
avaliar o andamento dos projetos.
Teve sua criação
oficializada por um mandato expedito pelo Prefeito em exercício
em junho de 1996, apesar de na prática ter iniciado suas atividades
logo após a realização do primeiro seminário.
Também foi definida uma Equipe de Projeto, com a finalidade de dar
apoio técnico ao planejamento dos projetos e ações,
não tendo sido oficializada através de um instrumento normativo
ou administrativo governamental.
Foi designada
como pesquisadora local do Programa a oceanógrafa Dra Sílvia
Sartor, com o objetivo de acompanhar o processo de perto e relatar as reuniões
e andamentos dos projetos e ações ao ICLEI, tendo iniciado
suas atividades em dezembro de 1995.
Durante o ano
de 1995 foram realizados sete seminários com a comunidade. O primeiro
teve como finalidade discutir como seria desenvolvido o processo de discussão
da Agenda, e o segundo dedicado à escolha dos temas a serem discutidos.
Deste segundo evento resultou a estrutura temática dos cinco seminários
seguintes: 1) Geração de emprego; 2) Transporte; 3) Educação;
4) Plano diretor; e 5) Recursos Naturais e Saneamento.
Como resultados
dos citados seminários surgiram 56 projetos, sendo 41 apresentados
pela administração municipal e 15 pela comunidade. Devido
à grande diversidade de projetos, o ICLEI promoveu uma intervenção
no processo, impondo limites às discussões, devido ao fato
de precisar que todo o processo de discussões fosse documentado
para atingir aos objetivos originais, o que não seria possível
com a pluralidade. Houve uma paralisação do processo de envolvimento
da comunidade entre outubro e dezembro de 1995, com a retomada do PCM em
janeiro de 1996.
Em reunião
realizada em fevereiro de 1996 a Diretora Internacional do Programa, destacou
a importância da documentação ser gerada concomitantemente
ao desenvolvimento do Programa, viabilizando avaliações periódicas
que podem alterar o rumo dos trabalhos e tornando possível a comparação
com processos desenvolvidos em outras municipalidades. Esta recomendação
só foi feita após os seminários e as primeiras reuniões,
não existindo nenhum tipo de documentação sobre a
realização dos mesmos e as decisões tomadas.
Dentre os 56
projetos citados, a Secretaria do Meio-Ambiente escolheu 3 para serem colocados
em votação, a saber: resíduos sólidos urbanos,
balneabilidade das praias e deslizamento dos morros. Tendo como princípio
básico a participação de todos os segmentos da comunidade
santista, o tema Resíduos Sólidos foi selecionado,
pois foi considerado o mais abrangente em termos de mobilização.
A decisão
foi tomada a partir de votação realizada com a Equipe de
Projeto, em meados de março de 96, onde estavam presentes somente
nove pessoas das vinte e cinco cadastradas. Esta mesma equipe decidiu pela
documentação dos demais projetos, seguindo o formato padrão
do ICLEI para Estudos de Casos, porém, tal atividade não
foi concretizada.
No final do
mês de junho foi organizada uma equipe, a partir de adesões
espontâneas de componentes do Grupo de Sustentação,
para elaborar um diagnóstico sobre a questão dos Resíduos
Sólidos Urbanos na cidade de Santos.
Ficou formado
o chamado Grupo de Trabalho que realizou várias pesquisas
considerando as características do município, conceituação
de resíduos, hábitos domiciliares, os diversos tipos de coleta,
a destinação final dos resíduos, e sobre os Programas
ditos especiais, como o Programa Lixo Limpo.
Porém,
este diagnóstico não foi completado por este primeiro grupo
devido às articulações políticas no ano de
1996, quando a assessoria da Secretaria do Meio-Ambiente deu prioridade
ao processo político de eleição do novo prefeito,
em detrimento do processo em curso da elaboração da Agenda
21. Em relação à documentação oficial
disponível, o último registro de reuniões é
do início de setembro de 1996.
Devido à
lentidão do processo de produção das pesquisas, e
do desligamento de vários atores, tanto da esfera governamental,
quanto da comunidade, provocando uma descontinuidade e atraso no planejamento
do projeto, a pesquisadora do ICLEI pronunciou-se desfavorável à
vinda programada de uma equipe do ICLEI. O mal estar gerado ocasionou então,
o seu afastamento e a paralisação dos trabalhos oficiais-em
setembro de 1996.
As eleições
municipais de 1996 culminaram com a vitória de outro partido político,
com comprometimentos totalmente diversos do antecessor, ocasionando uma
troca de funcionários do primeiro e segundo escalão do governo
e das diretrizes a serem observadas.
A nova administração,
que não tinha em sua plataforma de governo comprometimentos com
a Agenda 21, foi pressionada por membros remanescentes do Grupo
de Sustentação para dar continuidade ao processo. Com a preparação
da Conferência Rio+5, a pressão aumentou, ocorrendo uma demanda
muito grande por informações, já que Santos era uma
das 14 Cidades-Modelo do mundo. A comunidade internacional presente ao
evento perguntava pelo estágio de implantação da Agenda
21 e seus resultados. [5]
A pesquisadora
que representou o ICLEI no PCM foi então contratada pelo Prefeito,
pelo período de sete meses, para a função de Coordenadora
da Agenda 21, contando com o apoio do Secretário do Meio-Ambiente
da época. Deu-se início a um novo Grupo de Sustentação
para a continuidade do projeto de Resíduos Sólidos e à
preparação de um seminário sobre o Meio-Ambiente.
Elaborou-se um livreto denominado Saiba Mais Sobre a Agenda 21 Santos-SP,
e obteve-se apoio para sua impressão.
Neste mesmo
período, meados de 1997, foi lançado pelo ICLEI um concurso
para as cidades brasileiras, onde seriam premiadas as três cidades
que apresentassem os melhores projetos na busca do desenvolvimento sustentável.
Foi sugerido à administração municipal a participação
da cidade de Santos, com a apresentação do Projeto dos
Carrinheiros, o qual fazia parte do Projeto de Resíduos Sólidos
Domésticos Recicláveis.
Os principais
pontos do Projeto dos Carrinheiros, que se encontrava em estágio
avançado de desenvolvimento, eram:
existência
de 300 carrinheiros cadastrados; ajuda na formação de cooperativa; organização
de escala de trabalho; existência
de usina de separação de recicláveis; redução
do custo de coleta seletiva em relação à realizada
pela Prefeitura; desenvolvimento
de um veículo especial para a coleta, por alunos da Faculdade de
Engenharia da UNISANTA, com locomoção a base de propulsão
humana ao invés da tração humana; organização
de oficinas para trabalhar o material reciclável; resgate
da auto-estima do pessoal envolvido, com geração de renda.
[5a]
Santos foi
classificada entre as cinco primeiras cidades na primeira fase de seleção,
que constou da apresentação documental do projeto, pois este
apresentava, além dos parâmetros ambientais, vantagens sociais
e econômicas.
Para a segunda
fase, quando seriam escolhidas as três cidades vencedoras, foram
realizadas visitas por equipes do ICLEI, com o intuito de verificar a prática
das ações descritas e propostas. O despreparo da equipe administrativa
que recepcionou os representantes do ICLEI, e a ausência dos carrinheiros
e demais organizações da sociedade civil que efetivamente
participavam do projeto, mostrou a falta de integração e
conhecimento dos administradores da cidade em relação ao
projeto, causando sua desclassificação.
O contrato
da pesquisadora terminou em novembro de 1997 e não foi renovado,
com a justificativa de falta de verbas, tendo sido substituída por
servidores efetivos da administração.
Neste espaço
de tempo houve a primeira reforma administrativa do governo municipal,
quando a Secretaria do Meio-Ambiente foi extinta, sendo criado um Departamento
de Meio-Ambiente na nova Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano
e Ambiental, com a decorrente mudança das pessoas que exerciam os
cargos de comando.
Entre 1997
a 2000 foi organizado outro Grupo de Sustentação com o desenvolvimento
de novos projetos, além de ter sido dado continuidade à gestão
de resíduos sólidos urbanos. Porém, não existem
documentos oficiais disponíveis sobre estes projetos, que propiciem
uma análise mais aprofundada de sua elaboração e resultados.
Em 2001, com
o início do segundo mandato do Prefeito, criou-se novamente a Secretaria
de Meio-Ambiente, tendo sido designado novo coordenador para a construção
da Agenda. Também não foi disponibilizado nenhum tipo
de documento referente a este período sobre as ações
ou projetos diretamente relacionados à Agenda 21, e não
foram elaboradas atas de reuniões que comprovem suas atividades
e deliberações.
Segundo a Secretaria
de Meio-Ambiente a Agenda 21 continua em construção,
porém num ritmo lento. Alega-se que só houve uma desaceleração
do processo; porém, a realidade mostra que está paralisada
enquanto processo estratégico e participativo.
IV – ANÁLISE
DA EXPERIÊNCIA SANTISTA
O desenvolvimento
deste trabalho apresenta uma preocupação em diagnosticar
e identificar alguns problemas no processo de construção
da Agenda 21 Local. Em primeiro lugar, a dificuldade de se reunir
grupos ou pessoas diversas, com interesses específicos, em torno
de um objetivo comum, de uma forma assídua e com um comprometimento
sócio-ambiental.
Ao se engajar
no PCM, a Prefeitura de Santos, atendendo às diretrizes do capítulo
28 da Agenda 21 Global - Iniciativas das Autoridades Locais em Apoio
à Agenda 21, desenvolveu uma ampla consulta à sociedade,
buscando para participar das discussões tanto os grupos majoritários
e tradicionais, como também os grupos normalmente marginalizados
em processos de decisões.
Houve a preocupação
de agendar os eventos em datas, horários e locais que propiciassem
a presença de todos. Procurou-se o apoio da imprensa para a divulgação
inicial dos encontros e debates. Estes fatos podem ser considerados positivos
dentro do contexto geral do processo.
A análise
dos componentes do Grupo de Sustentação e da Equipe de Projeto
aponta alguns aspectos analíticos e características importantes
do processo. Quanto a Equipe
de Projeto e estrutura de seu funcionamento, que tinha um caráter
deliberativo só foram chamados funcionários das Secretarias
Municipais, mais especificamente, os coordenadores de projetos que tivessem
sido apresentados nos seminários da primeira fase do processo.
Posteriormente,
por recomendação da coordenação geral do ICLEI,
foram convocados representantes das demais Secretarias e autarquias. Representantes
da sociedade civil só receberam convites para participação
em reuniões esporádicas. Trata-se de uma posição
antidemocrática, excluindo efetivamente a sociedade civil de atuar
na finalização do processo decisório.
Este dado foi
constatado pela coordenação do ICLEI através dos relatórios
de análise enviados pela pesquisadora local, e resultou na recomendação
de inclusão de participantes do Grupo de Sustentação.
Quando convidados para compor a equipe, de maneira voluntária, somente
três pessoas se apresentaram, demonstrando a falta de interesse ou
o deslocamento na atividade devido a desvantagem em termos quantitativos.
Em relação
ao Grupo de Sustentação, deu-se a oportunidade de inserção,
a todos os participantes dos seminários. Obteve-se o interesse de
11 organizações, que totalizaram a adesão de 76 munícipes.
Considerando uma população de aproximadamente 415.000 habitantes,
este número é considerado extremamente baixo, demonstrando
ausência de interesse real, por parte da comunidade, em atuar
nos programas municipais participativos.
Apesar do grupo
ser heterogêneo, faltaram representantes de comunidades específicas
e importantes dentro das características da cidade, como atores
do setor portuário, turístico e pesqueiro. O comparecimento
às reuniões evidenciou que o comprometimento era ainda em
menor grau, pois em nenhuma das reuniões houve a presença
de mais de 50% dos componentes.
Quanto a questão
temporal e publicização dos documentos, a descontinuidade
do processo pode ser atribuída, em parte, à falta de organização
da equipe coordenadora que iniciou o PCM, no que se refere em elaborar
um cadastro das organizações existentes no município,
assim como em atentar ao retorno de interesse da comunidade durante a elaboração
dos trabalhos. A falta de divulgação na mídia, escrita
e falada, sobre a evolução dos trabalhos, com esclarecimentos
quanto às metas propostas e o efetivamente alcançado, pode
ser também considerada como um dos fatores que faltou na composição.
Outro aspecto
importante é a relação e articulação
dos agentes políticos participantes do processo. Observa-se que
a troca de partido da administração devido às eleições,
que afetou o andamento geral das atividades. As respostas oficiais do ICLEI
quando indagados a respeito do assunto, na fase anterior às eleições,
esclareceu que o compromisso do órgão era com a cidade, transcendendo
a administração da época. Porém, quando
a nova equipe gestora assumiu o governo, o ICLEI não atuava mais
na Agenda 21 Local.
A dissociação
ocorreu ainda na época das campanhas, quando os participantes que
também faziam parte do quadro político se desinteressaram
pelo andamento do projeto e não aceitaram o relatório apresentado
sobre a realidade dos acontecimentos. Porém, o comportamento da
cidade, em relação a todos os segmentos da sociedade, consistia
num dado importante para a documentação almejada.
A desarticulação
era apontada como característica do país, podendo ser estendida
para outras localidades brasileiras. A nova representação
política, não demonstrou interesse pela continuidade da produção
da Agenda, como um documento de elaboração contínua,
que traduz planos de ações para o alcance de metas esperadas
pela comunidade.
Constatou-se
que o papel do governo local é imprescindível como indutor
e facilitador do processo. A ausência de comprometimento orgânico
por parte do Poder Municipal inibe a formulação da Agenda
21 Local, mesmo quando há interesse por parte da comunidade.
Outro aspecto
a considerar na análise é a participação da
Câmara Legislativa. A pesquisa mostrou que em nenhuma das fases
houve a presença ou a demonstração de interesse por
parte do órgão legislativo. Considera-se que poderia ser
um fator importante, no momento que viabilizasse a divulgação
dos interesses da sociedade a partir de discussões na mídia
e junto aos demais vereadores, aventando-se até a possibilidade
da apresentação de projetos de lei sobre algumas das propostas
a serem implantadas.
Em relação
ao aspecto da participação das ONGs também constatou-se
uma fragilidade de composição interna das mesmas, e de integração
com as demais organizações, governamentais e não governamentais.
Quando ficou determinada a opção pela questão dos
Resíduos Sólidos, assunto que tratava de um interesse de
toda a cidade, houve um esvaziamento na participação da sociedade
civil, com o afastamento de grupos que não se integraram por considerar
que o assunto estava desvinculado de seus objetivos primordiais.
Quanto a interação
intermunicipal, apesar de ter sido discutido em algumas reuniões,
a vinculação dos demais municípios ao processo, a
questão não foi levada adiante. Tratando-se de uma Região
Metropolitana, onde algumas divisas territoriais se confundem, e o exercício
de atividades específicas tem reflexo nas demais, como é
o caso do parque industrial de Cubatão, ou o Porto de Santos, ou
ainda o enorme apelo turístico do Guarujá, seria fundamental,
que as Agendas 21 Locais de cada cidade tivessem uma integração
específica sofre as causas e conseqüências dos problemas
vizinhos, que de alguma maneira podem afetar positivamente ou negativamente
o trabalho ambiental próprio.
E finalmente,
quanto ao aspecto da produção de banco de dados e documentação,
todo o processo de publicização de informações
é fundamental para a continuidade do programa e para a troca de
experiências entre os diversos agentes envolvidos, na busca de seu
aperfeiçoamento. É justificada a posição do
ICLEI em focalizar os esforços da documentação para
um só projeto, porque visava a um objetivo específico do
Programa Comunidades Modelo, que envolvia um universo muito maior. Porém,
deveria ter havido por parte da municipalidade e da comunidade um interesse
próprio no registro das ações e decisões, o
que teria evitado que muitos fatos e idéias se perdessem no tempo,
com enormes dificuldades para o resgate das mesmas.
V – CONCLUSÃO
A Agenda
21 Local da cidade de Santos teve sucesso quando conseguiu movimentar
uma parcela da sociedade e implantar ações, mesmo que parciais,
em relação à questão dos Resíduos Sólidos.
Porém fracassou quando não conseguiu dar continuidade ao
processo, e transparência às ações. Mesmo assim,
pode e deve ser considerada como experiência para outras cidades
que iniciam suas movimentações para a implantação
das Agendas 21 Locais específicas, principalmente para as
demais integrantes da Região Metropolitana da Baixada Santista.
A busca da
sustentabilidade das cidades passa pelo comprometimento geral da sociedade,
tanto civil quanto institucional. Este comprometimento só pode ser
alcançado mediante a real conscientização da população,
em todos os seus aspectos; e, esta conscientização, deve
transcender a educação ambiental, promovendo-se uma
integração com o resgate da cidadania, ausente do cenário
nacional por várias décadas, a qual pressupõe direitos,
mas também obrigações, e possibilita que os interesses
pessoais ou de grupos dominantes, públicos ou privados, sejam esquecidas
em favor de metas e ações estratégicas.
O processo
de construção da Agenda 21 Local deve ser suprapartidária,
deixando de lado o imediatismo ou interesses particulares, e proclamando
como objetivo principal de suas ações a qualidade de vida
dos cidadãos e futuras gerações, contribuindo para
a continuidade almejada e necessária ao sucesso de implementação
dos objetivos da Agenda 21.
REFERÊNCIAS:
[1]
ICLEI – Internacional Council for Local Environmental Iniatives. About
ICLEI. Disponível na
Internet. Acesso em: 20 fev. 2002.
[2]
_____. Model Communities Programme – Programme Summary. ICLEI. Canadá,
1998, 53p.
[3]
[3a] MMA – Ministério
do Meio-Ambiente. Construindo a Agenda 21 Local. Brasília:
MMA, 2000. 90p.
[4]_____. Agendas 21 Locais. Disponível
na Internet. Acesso em: 20 maio 2002.
[5][5a]
REIS,
V.R. A Agenda 21 Local: uma Abordagem Crítica. 1999. 129p.
Dissertação de Mestrado em Saneamento Ambiental. Universidade
Presbiteriana Mackenzie, São Paulo. |