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*Publicado originalmente pelo editor de Novo Milênio no caderno Informática do jornal A Tribuna de Santos, em 16/3/1999.
Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 01/07/00 14:09:47
MÚSICA
Computação permite a qualquer um virar cantor 

Mas os recursos de edição ainda não substituem o profissionalismo

A modelo que desafina mas não perde o rebolado, o jogador de futebol que aproveita o sucesso para colocar em disco as músicas que só cantava no vestiário, e todos os que têm seus 15 minutos de fama (como diria Andy Warhol) e precisam aproveitá-los ocupando espaços na mídia, não precisam mais cursar dez, quinze anos de conservatório musical, aprendendo semitons e empostação de voz: com poucas instruções e algumas horas de edição musical em computador, podem colocar seu disco nas paradas de sucesso, parecendo cantores profissionais com muitos anos de carreira.

Crescem a cada dia os recursos para correção em computador dos defeitos de uma gravação, ao ponto de extrair qualidade de som digital a partir de um velho long-play riscado que estava no baú dos avós. Da mesma forma como podemos pegar um texto no computador, substituir trechos inteiros corrigindo os erros de grafia e depois imprimi-lo como se fosse um original recém-escrito, ou podemos consertar falhas numa fotografia de forma a que não se perceba terem existido, na área sonora o processo é semelhante e pode ser até automatizado. Se analisamos, por exemplo, o freqüência de um ruído de fundo, como o existente nas gravações magnéticas, é só programarmos o sistema para eliminar essa freqüência específica (é mais ou menos assim que funciona o sistema Dolby de supressão de ruídos).

Alexandre Lacerda Peres, do santista Studio 3ª Onda, explica que todas essas mágicas não substituem o profissionalismo, entretanto. Pode-se transformar totalmente uma gravação, corrigindo as falhas do cantor ou de um instrumento, ao ponto do profissional de estúdio se sentir até constrangido por estar "fabricando um cantor", ficando com uma carga de responsabilidade muito grande sobre o resultado final. Mas, quanto mais gabaritado for o cantor ou músico, menos tempo de edição será necessário para as correções. E há coisas que um estúdio ainda não consegue fazer, como obter o timbre característico que diferencia alguém que canta alegre, sorrindo, de outro que apenas canta. Essa emoção ainda não pode ser produzida artificialmente, é preciso que o cantor saiba colocar a voz para obter esse efeito.

Muitos efeitos produzidos em estúdio, não há engenharia reversa que permita descobrir como foram produzidos. É que um estúdio profissional usa diversos equipamentos, e a simples inversão da ordem da passagem do som por eles altera o resultado final. O sax do Kenny G, por exemplo, não é o som natural do instrumento, mas um conjunto de efeitos que só os estúdios utilizados pelo músico conhecem de que forma foram obtidos: são tantas as variáveis possíveis que dificilmente um outro estúdio conseguirá um som ao menos aproximado. Por isso é que faz tanta diferença tanto a capacidade técnica do músico ou cantor como a do estúdio onde é feito o registro sonoro. Por mais sofisticado que seja o instrumental disponível, é a capacidade técnica dos profissionais que definirá a qualidade final da gravação.

Inversão de fases – Um estúdio como o 3ª Onda consegue corrigir muitos defeitos de gravação, mas se o microfone usado for muito ruim, é preferível gravar de novo em condições melhores (de preferência no estúdio, onde o ambiente é acusticamente controlado para evitar distorções e permitir a melhor captação do som). Há microfones mais duros, que captam melhor a potência sonora, e outros chamados de "moles", que captam as mínimas vibrações provocadas pelas cordas de um violão, por exemplo, tendo cada um determinada finalidade. A diferença de qualidade é tanta que alguns microfones podem custar US$ 8 mil, ou mais, e valem esse preço.

Um dos truques de estúdio é suprimir o som indesejado pela simples sobreposição de seu reverso, um efeito tecnicamente chamado de anulação por inversão de fase. A idéia é simples: o som viaja em ondas, com altos e baixos (que são as fases positiva e negativa). Se conseguirmos sobrepor o som com o mesmo sinal em fase invertida, os sinais negativos compensarão os positivos, tal como na soma [-1]+[+1]=0. As ondas desaparecem assim, e portanto o som deixa de existir.

Da mesma forma, um dos defeitos de uma gravação estéreo pode ser a colocação inadequada dos microfones: se um microfone receber certa onda sonora em fase contrária à captada pelo outro, devido à pequena demora para essa onda percorrer a distância entre os microfones, os registros se anularão, é como se não existissem - perde-se assim parte do som a ser gravado, na freqüência em que as fases se anularam. Como o alto-falante vibra para trás com uma onda negativa e para a frente com a positiva, se as duas coincidirem ele não vibra, portanto não produz som. Com isso, um instrumento pode ter seu timbre prejudicado na gravação.

Sendo a gravação feita em canais de som separados, entretanto, o estúdio pode fazer a correção, compensando o retardamento e assim evitando que as fases se anulem. No caso de um ruído de fundo indesejado, com uns poucos cliques do mouse o profissional de estúdio pode copiar a freqüência desse ruído, inverter sua fase e aplicá-la sobre o ruído original, fazendo com que o ruído desapareça.

Da mesma forma como utilizamos o controle de balanço para distribuir o som pelos alto-falantes, criando a sensação estéreo, o estúdio pode organizar harmonicamente a reprodução dos instrumentos, distribuindo-os melhor pelos canais de som, de forma a realçar seus efeitos e evitar aquelas inversões de fase.

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