MÚSICA
Computação permite
a qualquer um virar cantor
Mas os recursos de edição
ainda não substituem o profissionalismo
A modelo
que desafina mas não perde o rebolado, o jogador de futebol que
aproveita o sucesso para colocar em disco as músicas que só
cantava no vestiário, e todos os que têm seus 15 minutos de
fama (como diria Andy Warhol) e precisam aproveitá-los ocupando
espaços na mídia, não precisam mais cursar dez, quinze
anos de conservatório musical, aprendendo semitons e empostação
de voz: com poucas instruções e algumas horas de edição
musical em computador, podem colocar seu disco nas paradas de sucesso,
parecendo cantores profissionais com muitos anos de carreira.
Crescem a cada dia os recursos para
correção em computador dos defeitos de uma gravação,
ao ponto de extrair qualidade de som digital a partir de um velho long-play
riscado que estava no baú dos avós. Da mesma forma como podemos
pegar um texto no computador, substituir trechos inteiros corrigindo os
erros de grafia e depois imprimi-lo como se fosse um original recém-escrito,
ou podemos consertar falhas numa fotografia de forma a que não se
perceba terem existido, na área sonora o processo é semelhante
e pode ser até automatizado. Se analisamos, por exemplo, o freqüência
de um ruído de fundo, como o existente nas gravações
magnéticas, é só programarmos o sistema para eliminar
essa freqüência específica (é mais ou menos assim
que funciona o sistema Dolby de supressão de ruídos).
Alexandre Lacerda Peres, do santista
Studio 3ª Onda, explica que todas essas mágicas não
substituem o profissionalismo, entretanto. Pode-se transformar totalmente
uma gravação, corrigindo as falhas do cantor ou de um instrumento,
ao ponto do profissional de estúdio se sentir até constrangido
por estar "fabricando um cantor", ficando com uma carga de responsabilidade
muito grande sobre o resultado final. Mas, quanto mais gabaritado for o
cantor ou músico, menos tempo de edição será
necessário para as correções. E há coisas que
um estúdio ainda não consegue fazer, como obter o timbre
característico que diferencia alguém que canta alegre, sorrindo,
de outro que apenas canta. Essa emoção ainda não pode
ser produzida artificialmente, é preciso que o cantor saiba colocar
a voz para obter esse efeito.
Muitos efeitos produzidos em estúdio,
não há engenharia reversa que permita descobrir como foram
produzidos. É que um estúdio profissional usa diversos equipamentos,
e a simples inversão da ordem da passagem do som por eles altera
o resultado final. O sax do Kenny G, por exemplo, não é o
som natural do instrumento, mas um conjunto de efeitos que só os
estúdios utilizados pelo músico conhecem de que forma foram
obtidos: são tantas as variáveis possíveis que dificilmente
um outro estúdio conseguirá um som ao menos aproximado. Por
isso é que faz tanta diferença tanto a capacidade técnica
do músico ou cantor como a do estúdio onde é feito
o registro sonoro. Por mais sofisticado que seja o instrumental disponível,
é a capacidade técnica dos profissionais que definirá
a qualidade final da gravação.
Inversão de fases –
Um estúdio como o 3ª Onda consegue corrigir muitos defeitos
de gravação, mas se o microfone usado for muito ruim, é
preferível gravar de novo em condições melhores (de
preferência no estúdio, onde o ambiente é acusticamente
controlado para evitar distorções e permitir a melhor captação
do som). Há microfones mais duros, que captam melhor a potência
sonora, e outros chamados de "moles", que captam as mínimas vibrações
provocadas pelas cordas de um violão, por exemplo, tendo cada um
determinada finalidade. A diferença de qualidade é tanta
que alguns microfones podem custar US$ 8 mil, ou mais, e valem esse preço.
Um dos truques de estúdio
é suprimir o som indesejado pela simples sobreposição
de seu reverso, um efeito tecnicamente chamado de anulação
por inversão de fase. A idéia é simples: o som viaja
em ondas, com altos e baixos (que são as fases positiva e negativa).
Se conseguirmos sobrepor o som com o mesmo sinal em fase invertida, os
sinais negativos compensarão os positivos, tal como na soma [-1]+[+1]=0.
As ondas desaparecem assim, e portanto o som deixa de existir.
Da mesma forma, um dos defeitos de
uma gravação estéreo pode ser a colocação
inadequada dos microfones: se um microfone receber certa onda sonora em
fase contrária à captada pelo outro, devido à pequena
demora para essa onda percorrer a distância entre os microfones,
os registros se anularão, é como se não existissem
- perde-se assim parte do som a ser gravado, na freqüência em
que as fases se anularam. Como o alto-falante vibra para trás com
uma onda negativa e para a frente com a positiva, se as duas coincidirem
ele não vibra, portanto não produz som. Com isso, um instrumento
pode ter seu timbre prejudicado na gravação.
Sendo a gravação feita
em canais de som separados, entretanto, o estúdio pode fazer a correção,
compensando o retardamento e assim evitando que as fases se anulem. No
caso de um ruído de fundo indesejado, com uns poucos cliques do
mouse o profissional de estúdio pode copiar a freqüência
desse ruído, inverter sua fase e aplicá-la sobre o ruído
original, fazendo com que o ruído desapareça.
Da mesma forma como utilizamos o
controle de balanço para distribuir o som pelos alto-falantes, criando
a sensação estéreo, o estúdio pode organizar
harmonicamente a reprodução dos instrumentos, distribuindo-os
melhor pelos canais de som, de forma a realçar seus efeitos e evitar
aquelas inversões de fase.
Veja mais:
MP3
não é tão perfeito como dizem |