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Publicado originalmente pelo editor de Novo Milênio no caderno Informática
do jornal A Tribuna de Santos/SP, em 2 de dezembro de 1997
Última modificação em (mês/dia/ano/horário): 12/04/00 04:34:26

HISTÓRIA DO COMPUTADOR - 24 - O futuro que vem aí
Vários filmes ao mesmo tempo

(e na mesma tela)

Imagine um cinema em que cada grupo de pessoas vê um filme diferente – na mesma tela! Isso é uma das idéias em estudo. Em vez do projetor único, o cinema teria vários, cada um encarregado de um "pedaço" da imagem, e todos controlados por um computador responsável pela unidade do contexto global em relação às escolhas feitas pelos espectadores.

Quem chega ao cinema, vê uma imagem única, coordenada, mas conforme firma sua atenção sobre um personagem, por exemplo, um dos projetores passa a mostrar – ainda dentro da mesma imagem geral – uma história específica nesse ponto da tela. Assim, embora reunidos na mesma sala, diversos grupos de espectadores estarão vendo filmes bastante diferentes – apesar da imagem global ser a mesma para todos.

Exemplo de como focar a atenção para mudar o roteiro do filme projetado, com sensores de movimento ocular

É como na vida real: numa rua, vemos diversas pessoas, cada uma com uma história pessoal. Podemos fixar nossa atenção no barbeiro da esquina que debate futebol com o cliente, ou no bêbado afogando suas mágoas no balcão do botequim, na madame que desfila com o cachorrinho, no grafiteiro que está marcando sua presença no muro do prédio, ou no gingado da mulata. Podemos acompanhar o que acontece na barbearia e ignorar tudo o mais que acontece em volta. Ao mesmo tempo, uma pessoa ao lado pode estar mais atenta aos movimentos corporais da mulata. Um amigo do alheio talvez prefira fazer uma avaliação prévia das jóias da madame que passa. Percepções diferentes de uma mesma cena, essa é a idéia.

Dificuldades – Parece complicado – e é. Por várias razões, a mais óbvia das quais é a necessidade de se escrever e filmar diversas histórias coordenadas. É preciso que todas elas tenham a mesma duração. É preciso determinar se uma história pode comportar um flash-back do episódio que ocorre em outro ponto da tela. E, sobretudo, há o problema do som. Embora possamos montar várias imagens numa tela, não há como dirigir o som específico de cada história para o grupo de pessoas interessado nessa parte da cena, a não ser com fones de ouvido, o que isolaria os espectadores, eliminando a interação que existe entre as pessoas durante a projeção do filme e dando a elas a sensação de espectadores solitários.

Poderia haver um som geral de fundo, com os fones de ouvido usados apenas para destacar o som referente à história enfocada pela pessoa - da mesma forma como, na rua, apuramos o ouvido para prestar atenção à conversa do barbeiro ou à resposta da mulata que passa na outra calçada. Mas, imagine como ficaria estranho (caso não se otimize a coordenação do timming das diversas histórias) um grupo de espectadores gargalhar com uma piada, enquanto o outro chora com a morte de um personagem e um terceiro grita de terror...

Uma vantagem da técnica das múltiplas cenas seria os autores do filme poderem apresentar várias formas de se ver uma cena, para que os espectadores de cada segmento possam debater com os demais. Por exemplo, alguns poderiam ver um crime acompanhando o criminoso, enquanto outro grupo estaria acompanhando a vítima (no mesmo filme), um terceiro seguiria os passos do detetive, alguém estaria atento ao comportamento do mordomo etc.

Interferências – Detalhe importante: conforme a ação, os focos de interesse podem se cruzar e mudar de lugar na tela, como as pessoas que observamos numa rua. Mas, como fica o espectador que não encontra motivação forte para se manter atento a um dos pontos da tela? E o que esteja acompanhando uma história em particular que não interesse à maioria, não se sentiria irritado com os outros sons, que entenderia como ruídos de fundo a perturbarem sua atenção?

Registro em vídeo da posição do olho

Se um desses ruídos desviar sua atenção para outro ponto da tela, como o script do filme fará satisfatoriamente essa mudança de foco, sem prejuízo à compreensão da história? Até que ponto é desejável que os espectadores controlem de forma consciente ou subjetiva o filme assistido (ao sentirem como se estivessem jogando um game, não teriam reações artificiais indesejadas)?

Para completar, imagine uma família vendo um filme. O interesse dos adultos por uma cena de sexo ou violência faria com que ela fosse exibida, mas então as crianças presentes acabariam desviando a atenção de uma história paralela inocente para as cenas vistas pelos adultos, sem que haja como impedir isso (já que a cena global é a mesma). Há portanto problemas éticos a serem analisados, além dos de ordem prática...