NOTÍCIAS 2002
Seqüestros autorais
Mário Persona (*)
Colaborador
"JAPONÊS É SEQÜESTRADO COM MERCEARIA E TUDO! O comerciante
Toshiro, 49 anos, foi seqüestrado junto com sua mercearia na tarde de ontem. Toshiro ficou famoso em seu bairro por ter inventado a
CRM, uma Caderneta de Registro Mensal onde registrava as preferências de seus clientes. Junto
com Toshiro, foram seqüestrados o Pepe do açougue, o Manoel da padaria e o Alcebíades do boteco. Além da mercearia."
Fique tranqüilo. Toshiro, que aparece em meu livro "Receitas de Grandes Negócios"
numa bem-humorada crônica explicando o conceito de CRM, ou Customer Relatioship Management, já foi localizado. O cativeiro foi
descoberto numa revista de tecnologia da informação onde Toshiro estava encarcerado entre dois ou três parágrafos de um artigo
maior, assinado por outro autor. Ali, o nipônico Toshiro teve sua identidade mudada para um português "Joaquim". Para despistar.
Seqüestrado pela segunda vez, Toshiro foi levado para as páginas de uma revista de
publicidade e trancafiado num artigo assinado por uma terceira pessoa. Mais uma vez, foi descoberto pela CIA, a Comunidade dos
Internautas Articulados, que me avisou. É difícil passar despercebido do "Little Brother", esse vigilante paralelo que a Internet
criou ao dar poder de mídia ao povo comum.
Prefiro pensar que a atração fatal que Toshiro exerce sobre as pessoas tenha sido a causa do
equívoco. Sei que é prática comum na rede os artigos voarem de lá para cá e de cá para lá. Ou alguns trechos e idéias serem
incorporados a artigos sem que o autor perceba o que fez. Porém, copiar tim-tim por tim-tim e assinar, só pode ser descuido de quem
copia. Ou ingenuidade minha. Conversei com o suposto autor e ele declarou ter sido um equívoco da revista, que o teria colocado como
autor sem a sua autorização. Ou a minha.
Sucesso - A dupla "Copiar & Colar" tem feito sucesso nesta Internet sem porteiras e
até me beneficio disto. Sempre incentivei a livre distribuição de minhas crônicas, hoje publicadas com os devidos créditos por
dúzias de sites, jornais e revistas. Isto não inibe as vendas de meus livros, ao contrário, aumenta. Não só ajuda a vender mais
livros, palestras e serviços de consultoria ou redação publicitária, como também traz um certo prestígio. Alguém contou que seu
professor utiliza o Toshiro para explicar CRM em um curso de pós-graduação na FGV.
Isto acontece também em outros cantos. A dupla Bruno & Marrone alcançou a fama depois que
uma gravação feita num estúdio de rádio virou CD pirata. Pela primeira vez um CD pirata já vinha até com apologia, caso fosse
apreendido: "Seu guarda, eu não sou vagabundo/ Eu não sou delinqüente/ Sou um cara carente/ Eu dormi na praça/ Pensando nela...."
Será que isto limpava a barra do camelô?
Já consagrada, a dupla inovou com uma estratégia no mínimo curiosa. O normal é um CD de
sucesso ser pirateado e atrapalhar as vendas do oficial. A dupla decidiu dar o troco pirateando o pirata. Ou seja, formalizou o
informal. Apesar do receio de que as vendas pudessem ir mal ao concorrer com o clone bastardo, o filho legítimo estourou nas
paradas. Agora é a vez da dupla nada caipira "Aurélio & Houaiss" atualizar seus dicionários e incluir o verbo "despiratear".
Aproveitar o moto de vendas criado pela contravenção não é novidade. Já vi lojas armando
banca na calçada para garantir seu ponto entre os camelôs que vendem em sua porta. O caso Bruno & Marrone pode ser uma idéia para
quem quiser sair da marginalidade e abrir uma pirataria legal. Vai ter fila de artistas desconhecidos implorando, "Me pirateia que
eu gosto".
Se acha que estou brincando é porque não entendeu como funciona a publicidade que pega
carona na maré contrária. O seqüestro autoral sofrido por Toshiro criou uma oportunidade para divulgar meu livro e meus serviços.
Percebeu? Meu único receio é que algum dia um pirata ganhe uma ação contra o autor por violação dos direitos autorais da cópia e
lançar a cópia oficial da cópia pirata vire crime. Aí corro o risco de acabar na cadeia por plagiar a mim mesmo.
(*)
Mário Persona é consultor, escritor e
palestrante, além de autor dos livros Crônicas de uma Internet de verão,
Receitas de grandes negócios e Gestão de mudanças em tempos de oportunidades. Esta crônica faz parte dos temas
apresentados em suas palestras. Edita o boletim eletrônico Crônicas de Negócios e mantém
endereço próprio na Web, onde seus textos estão disponíveis.
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