Segredos de bastidores
Mário Persona (*)
Colaborador
"Ri com
a história da Panificadora Francesa em Alto Paraíso - desta
eu fui testemunha", escreveu um antigo colega de faculdade, reencontrado
graças a uma crônica minha na Web. "Me faz acreditar na história
da corajosa de Angra", completou, referindo-se à crônica "Empreender
sem dor".
É comum indagarem se as histórias
que conto são verdadeiras. Todas são. A menos que eu as identifique
como anedota. Talvez sejam até menos interessantes do que as vividas
por outras pessoas. O segredo é saber contá-las, para extrair
do banal o extraordinário. E enxergar pepitas na bateia do dia-a-dia,
onde só parece haver cascalho.
Comunicação é
o foguete propulsor do marketing. Sua empresa sempre irá
precisar de alguém que separe o ouro do chumbo, mesmo no cadinho
do mais tedioso produto. E revele seu brilho aos olhos do cliente. Será
muita ousadia eu sugerir que este alguém possa ser eu?
Conhecer o comportamento das pessoas
é essencial. E o que decora o cenário com matizes que surpreendem,
acrescentando uma eufonia que cativa até os mais peludos ouvidos,
são as velhas e conhecidas palavras.
Ou uma calculada omissão das
mesmas, gerando a ansiedade de um vácuo de expectativa, onde o cliente
esperava ouvir algum som. Técnica cuja excelência foi descrita
por quem elogiava um vendedor de sucesso: "Ele usava frases de efeito e
as sublinhava com o silêncio".
Comunicar é também
saber o que não dizer. É a arte de não revelar os
bastidores, onde acontece a ação de produzir. E deixar vir
à tona somente a emoção de seduzir. Como fazem os
parques Disney com seus coadjuvantes subterrâneos.
O fim? - Será que no
cinema alguém assiste a lista após o "The End"? São
nomes conhecidos apenas das costas do público. Longe dos holofotes,
amargam ter de competir com as luzes pecocemente acesas na sala que se
esvazia. Nunca aparecem no início. Evita-se expor o que não
agrega valor.
Mas evitar expor não é
o mesmo que esconder. Há empresas que escondem porque não
durariam um dia se a transparência chegasse à produção.
A padaria onde eu costumava brincar na minha infância era assim.
Nos bastidores, apenas funcionários
e anônimos amigos dos filhos do dono. Circulando entre tabuleiros
de inertes pãezinhos em crescimento, e outros de não tão
inertes verminhos em fase de engorda. Formavam a criação
de bichos da seda de meus amigos. O cliente que visse aquelas massinhas
gosmentas roendo folhas de amoreira sujas de pó de trigo, jamais
comeria seus pães companheiros.
Por mais repulsivas que fossem as
lagartas vomitando fios prateados, produziam a matéria prima do
mais excepcional tecido já criado. Tão grande foi sua influência
nos negócios da humanidade, que a mais célebre rota comercial
da história leva o seu nome.
Mas pela Rota da Seda não
circulavam as lagartas, segredo que os chineses conseguiram trancar por
dois mil anos. Cada mercador chinês só transportava e revelava
o que interessava. A sublimidade do tecido.
Diferente - Porém seda
vomitada por bichinhos não era o que os clientes da padaria procuravam.
Eles queriam pão. Igual ao que agasalhava a lingüiça
surrupiada do balcão nas noites frias de solidão estomacal.
Porque o único padeiro era movido a pão, lingüiça
e pinga. Muita pinga. Tanta seda lhe dava sede.
Numa daquelas noitadas panificantes,
o padeiro usou de uma dose extra de energia etil-calabresa para sovar a
massa. Talvez visse nela o patrão. E a massa cresceu. Cresceu como
nunca. Para os clientes, o segredo estava no vigor do padeiro ou no fermento.
Para os meninos dos bastidores, o padeiro apenas usara a técnica
dos bichos de seda para produzir fio.
O dia amanheceu como outro qualquer.
Com clientes se enfileirando no balcão para comprar pão.
E leite, que vinha em garrafas de vidro de goela larga. Tudo parecia normal,
até o dono ser surpreendido por clientes que começavam a
voltar. Para buscar mais daquele delicioso pão de lingüiça.
(*) Mário
Persona é consultor, escritor e palestrante. Esta crônica
faz parte dos temas apresentados em suas palestras. Edita o boletim eletrônico
Crônicas
de Negócios e mantém endereço
próprio na Web, onde seus textos estão disponíveis. |