"APAGÃO"
Os dois pólos da mesma tomada
Além
de retomar a questão da vazão necessária
nos rios, esta mensagem postada em 19/5/2001 por César Boschetti,
na lista de debates sobre negócios Widebiz
aborda a questão dos horários de maior consumo versus
os comentários das autoridades sobre como seriam os apagões
a partir de 1º/6/2001 - temporariamente descartados depois, mas que
poderão ser definidos a qualquer momento:
Os dois pólos da mesma
tomada
Tecnicamente não faz muito
sentido falarmos em polaridade para a energia doméstica ou industrial.
Esta forma de eletricidade alterna sua polaridade 60 vezes por segundo,
daí seu nome: corrente alternada de 60 Hertz. Todavia, do ponto
de vista político e econômico, a estória tem dois pólos
bastante evidentes. Mesmo que as divergências e os tradicionais apagões
de memória se alternem em meio às autoridades "despolarizadas",
a frequência não chega a ocultar os dois pólos igualmente
negativos dessa bateria de estórias mal contadas.
Em primeiro lugar, o descaso para
com a infra-estrutura do setor elétrico, sobretudo com a transmissão
de energia é, lamentavelmente, um fato incontestável e injustificável.
Não importa muito se o problema vem de longe. Isto não altera
em nada a responsabilidade dos tecnocratas de plantão. Nenhum governo,
mesmo sem muita luz própria, poderia, ou pelo menos não deveria,
falar em crescimento econômico sem investimentos paralelos permanentes
e proporcionais no setor de geração e distribuição
de energia.
De outro lado, a opinião pública
precisa ser melhor esclarecida sobre essa crise emergencial causada pelas
travessuras de São Pedro. Se neste País a roubalheira já
não é pouca à luz do dia, imaginem no escuro como
é que vai ser! Não! Não me venham dizer que estou
fazendo calúnias, querendo pôr fogo no circo ou virei partidário
fanático da teoria da conspiração. Não fui
eu quem fez das falcatruas uma moda de sucesso e da impunidade uma regra.
É apenas por conta disto que tenho minhas dúvidas quanto
à real dimensão da crise.
Seguindo a tradição
brasileira, é perfeitamente possível que a incompetência
para gerir o problema seja bem maior que o próprio problema. Ou,
quem sabe, tudo não passe de uma "providencial" coincidência
de pretextos para aumentar o preço da energia. De um modo ou de
outro, está difícil de engolir este sapo. Como que uma situação,
facilmente previsível e evitável, pode pegar um governo de
surpresa? Mais ainda, porque ameaçar cortes
longos de energia se o horário de pico de consumo residencial fica
por conta do banho entre 18:00 e 22:00 horas. Por que deixar logradouros
e monumentos públicos às escuras entre 22:00 e 6:00 horas
da manhã? Nesse período, mesmo considerando o baixo nível
das represas, a demanda residencial e industrial, seguramente, está
bem abaixo da capacidade geradora.
Admitamos que estejam querendo poupar
água já que a energia gerada não dá para armazenar.
Ocorre que não se pode fechar completamente as comportas de uma
represa. Será que a vazão mínima já não
é suficiente para satisfazer a demanda energética da madrugada?
Com relação ao consumo, que critérios foram utilizados
para definir as faixas? Qualquer aprendiz de eletricista sabe que uma casa
de 5 pessoas com 1 chuveiro, uma geladeira e meia dúzia de lâmpadas
deve gastar mais que 200 kWh por mês.
É óbvio que, mais uma
vez, estão querendo que a sociedade como um todo pague o pato e
não apenas os esbanjadores. Acho que o mínimo que se pode
esperar é uma explicação decente para isso tudo. É
como diz o velho dito popular, gato escaldado tem medo de água fria.
Que em meio a toda essa secura de idéias e de vergonha tem muita
água suja correndo. Ah isso tem!
César
Boschetti
Tecnologista
INPE-Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais
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