Loja Viva - National Retail Federation
Edmour Saiani (*)
Colaborador
O grande
congresso da National Retail Federation é a referência mundial
do que anda acontecendo em Varejo. Acontece todo janeiro em Nova Iorque.
Caia ou não neve. Estivemos lá Iracema, Bruno, meus sócios
e eu, para entender do que eles iriam falar esse ano. Junto com muitos
brasileiros. E foi fácil entender. Em 1991, pela primeira vez estive
lá e a conversa foi só "produto". Quando voltei lá,
depois de um tempo afastado de Varejo, em 1999, o assunto foi "valores
e cultura de empresa". No ano passado, conforme previ, veio o engodo do
comércio eletrônico. Não o business-to-business,
que vai muito bem obrigado. Mas aquele que dizia que quem nunca trabalhou
em Varejo e que nunca teve loja poderia abrir um site e, depois de gastar
muito dinheiro em propaganda, estaria fadado ao sucesso.
Ledo
engano.
Mas
o pessoal lá é muito inteligente. Mudou de idéia e
confessou que errou. E passou a pregar novos focos estratégicos.
Muito mais relacionados ao fato de que cliente continua e ainda por muito
tempo vai continuar a ser gente. Aí vão os focos estratégicos:
Não
há nova economia – Coisas antigas como ter que dar lucro, ter
que ter gente competente, ter que ter uma certa experiência, contam
muito e ainda vão contar por muito tempo. Quem achou o ouro do e-commerce
ganhou muito dinheiro, mas não vai ganhar por muito tempo ou outras
vezes. Pelo menos não tão cedo. Quem não achou, perdeu
tempo e dinheiro. Mas quem vendeu pá e picareta se deu muito bem.
São as empresas de tecnologia que ganham com o terremoto do e-commerce.
Pelo
menos agora eles estão sendo mais razoáveis. Voltaram para
o Customer Relationship Management (CRM), gerenciamento de relacionamentos
com clientes. Softwares caros que prometem que a sua empresa vai fazer
relacionamentos maravilhosos com os clientes, mesmo só falando com
eles por via digital. Outro engodo. Mas pelo menos mais próximo
da realidade.
Internet
vai fazer o papel da antiga tecnologia – Tudo o que tem sido sucesso
na internet é o que ela pode fazer pelas empresas no sentido de
melhorar processos de relacionamento. Não há milagre. A internet
ajuda as empresas que já faziam Efficient Consumer Response (ECR)
e Electronic Data Interchange (EDI) a melhorar os processos e baratear
custos nestas áreas. Como pano de fundo para negócios com
massa, a Internet só faz sucesso em empresas que subsidiam a venda
de produtos. E os processos de exchange (troca) – que são
grandes fórums de trocas de informação entre fornecedores
e Clientes - são profundamente fomentados pela tecnologia que permite
a rápida comunicação entre parceiros potenciais.
Relacionamento
vem antes, serviços vêm antes ainda – Não há
como negar. Serviços são a base para o sucesso. Conveniência,
design,
atendimento, entretenimento e educação são os passos
que quem quer fazer serviço tem que trilhar para garantir que clientes
que venham à sua loja queiram ficar. Serviços só se
transformam em reputação se forem consistentes e se forem
encontrados sempre e em todas as lojas. Da hora em que a loja abre até
a hora em que a loja fecha.
Depois
que o pacote de serviços está completo, construir relacionamentos
é a grande força do Varejo. Mas não relacionamento
de database marketing. Tudo tem que começar com o olho no
olho, o carinho trocado que é o ato de encontrar a loja, o produto,
o serviço e o vendedor dos seus sonhos. O começo tem que
ser amor verdadeiro. Ninguém escreve uma porção de
cartas para fazer alguém se apaixonar. A pessoa se apaixona pela
outra. E só depois começa a escrever cartas para ajudar a
manter a viva a chama do amor eterno. Relacionamento genuíno!
Turbilhão
controlável - Nada foi mais radical que começar a falar
que comércio eletrônico seria tudo e nada mais radical ainda
que dizer que comércio eletrônico não era bem assim.
As cifras de desperdício nos investimentos em e-commerce
ultrapassam dezenas de bilhões de dólares. A Amazon continua
viva porque alguém tem interesse nisso. Imaginem a Amazon fechar!
Pobre Nasdaq se isso acontecer.
Numa matéria
publicada na revista Exame, Tom Peters disse as seguintes frases:
"Quem é idiota de achar que alguém vai deixar de comprar
em loja para comprar pela Internet?". Continuou: "Quem, no entanto, é
idiota de achar que daqui a quinze anos alguém vai comprar em alguma
loja?" E complementou no seu melhor estilo mal-educado: "E quem é
o idiota que pode dizer com certeza que alguma dessas afirmações
vai realmente acontecer?".
Haja feeling
(N.E.: sensibilidade). Embora digam que a única pessoa que ganhou
dinheiro com feelings foi o Morris Albert e a sua música,
feeling
funciona. Albert Einstein fechou o conceito de teoria da relatividade ao
observar que a roda de um trem que andava para frente parecia que andava
para trás. Puro feeling. Mas ninguém vai negar que
Albert Einstein tinha estudado conceitos e estava pronto para aplicá-los
a qualquer momento em que um toque na cuca refrescasse a sua memória.
Assim vai ser o
Varejo, feeling baseado em conceitos e tecnologias que são
o fundamento de Varejo. E não vai parar de mudar. Mas os fundamentos
continuam os mesmos que Stanley Marcus, o pai da Neiman Marcus, com sua
inteligência definiu: "Varejo é um negócio de vender
produtos que nunca voltam para clientes que sempre voltam".
Mudar pra quê?
- Se você estiver naquela de mudar pra quê?, pense rapidamente.
E siga o conselho que nos dava na Mesbla a competente Marluce Dias da Silva,
hoje cabeça da Rede Globo: ninguém gosta de ser mudado, as
pessoas gostam de ganhar ferramentas e conceitos para poderem mudar por
decisão própria.
Esta roda viva
de sei lá pra onde as coisas vão ainda depende de interesses
mais fortes dos que a cabeça de um varejista pode imaginar. Os em-vez-tidores,
aqueles que vivem do jogo das bolsas, têm forçado tanto a
barra que até presidente de empresa virou técnico de futebol.
Perdeu três jogos ou às vezes o primeiro tempo, está
fora.
O curto prazo passou
a dominar todos os sentidos. Quem já trabalhava em Varejo padece
desse mal há mais tempo, mas agora até as organizações
gigantescas não sabem o que vai acontecer no próximo trimestre.
A primeira palavra
de ordem é flexibilidade. Estar antenado a tudo o que acontece à
sua volta é a melhor maneira de ficar menos atrasado. E aí,
sim, a Internet faz o seu papel principal: conexão. Com o mundo,
com os seus fornecedores, com os seus clientes, com os seus concorrentes.
A segunda e mais
difícil de se admitir é capacitação contínua.
Só quem se formar e informar continuamente vai continuar dando certo.
Cabe ao varejista
se conscientizar de que precisa das duas coisas. A primeira soa a esperteza;
então, todo varejista vai correr atrás. Mas, para admitir
que precisa de capacitação, o ser humano tem que admitir
que o que ele sabe não funciona mais e não gera mais resultados.
Então, fácil, passe na farmácia da esquina e compre
um saquinho daquelas pílulas meio duras de engolir, mas que fazem
um efeito fantástico. Pílulas de humildade.
Principal
- Enfim chegou o ponto mais importante do NRF 2001. Gente! Alguém
pode dizer – Mas de novo? Na minha lápide vai estar escrito: bem
que ele tentou nos avisar - Gente é a única coisa que não
pode faltar no seu negócio. E o NRF deste ano voltou à tônica,
e dá-lhe gente mais uma vez.
Foram muitas palestras
sobre o tema. Algumas meio insanas, com fotos de gente com cara de maluco
perguntando o que você faria se encontrasse pela frente gente com
aquela cara? Rejeição? Apreciação? Amor à
primeira vista? Valia tudo. Esta conta pouco.
Teve Radio Shack
contando histórias não muito convincentes de como conseguir
gente boa. Mas teve o The Container Store falando - com argumentos muito
convincentes - sobre como alguém consegue ser a melhor empresa para
se trabalhar num país cheio de empresas com foco maravilhoso em
qualidade de vida – mesmo sendo de Varejo. E mais, por alguns anos seguidos.
O truque, claro, é a bola da vez: cuidar de gente. O chefão
da The Container Store falou rápida e enfaticamente sobre as duas
coisas que você não pode deixar de ter para ter gente nota
dez: acreditar que vai poder achar as pessoas e ter convicção
de que na sua empresa elas vão se realizar.
Menos longe, aqui
no Brasil minha mulher, a Martha, está tendo uma lição
de como gente pode ser importante. Perdeu a gerente, perdeu o sub-gerente
e há mais de um mês quem está ajudando a que ela faça
tudo o que tem que fazer e mais são os funcionários que estão
lá na loja. Gente da mais pura índole, competência
e esforço surpreendente no que faz.
A melhor, que aborda
de uma maneira muito inteligente o tema vocação para liderança,
foi a palestra - Você trabalharia para você mesmo? Do Sam Geist.
O tom de voz elegante do autor nos lembra de coisas que às vezes
a gente sabe, mas se esquece. De quão importante é sermos
merecedores da nossa própria confiança. Quanto mais pessoas
que não têm o menor compromisso conosco a não ser poderem
ganhar dinheiro conosco trabalhando na nossa empresa.
Comportamento
- Resolvi compilar uma pequena parte do que ele fala - princípios
para compreensão de comportamentos humanos. Se a gente entende esses
princípios, com certeza, vai ser mais paciente com quem nos cerca
e nos ajuda. Quem não conseguir entender, provavelmente, quando
alguém lhe pergunta coisas como: como você lida com gente,
a resposta não passa de um – Aprendi a lidar com elas ou sei lidar
com elas. Nada mais. Espero que você entenda profundamente e goste
do assunto. Senão abra a Exame da quinzena e procure outro
lugar para investir seu dinheiro.
Cada
pessoa enxerga o mundo sob o seu prisma e quase sempre esse prisma é
diferente.
Todo
mundo quer conseguir as coisas que quer conseguir para ficar mais feliz.
As pessoas mudam para ganhar prazer. Elas mudam para evitar dor.
Viver
ou trabalhar em ambientes diferentes leva as pessoas a pensar e agir diferentemente,
porque as suas experiências, e conseqüentemente a sua percepção
da realidade, são diferentes.
Não
importa quão ilógico, estranho ou irracional algum comportamento
se mostra para algum observador, faz sentido à pessoa que age daquela
forma agir daquela forma.
A
verdadeira compreensão vem principalmente de experiência.
Só quem vivencia alguma situação pode compreendê-la
completamente.
Sentimentos
e emoções são freqüentemente mais poderosos que
julgamento racional. Verdadeira cooperação só é
possível dentro uma situação ganha-ganha. Os benefícios
e as recompensas devem ser compartilhados e poder ser atingidos por todos.
Métodos
usados para se conseguir a cooperação podem ser mais importantes
que a própria cooperação.
Sentimentos
e atitudes mudam quando as pessoas se convencerem de que a mudança
é benéfica para elas. Nunca antes.
Gente competente
tem que ser merecida pela nossa empresa e por nós. Liderança
é o vetor de se conseguir gente boa para nossas empresas. E liderança
genuína é ajudar as pessoas a serem elas mesmas, com desafios
que façam com que elas mesmas possam ser melhores que elas, dia
após dia.
(*)
Edmour
Saiani é sócio-diretor da empresa Ponto de Referência.
Artigo divulgado via boletim eletrônico Varejo
Século 21. Esse fórum conta com mais de 1.100 participantes
e o objetivo dos trabalhos é apresentar idéias, tendências,
experiências e opiniões que contribuam para a melhoria do
comércio varejista brasileiro. |