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TRILHOS (46)
O tramway dos Emmerich

Werner Vana (*)
Colaborador

Em 1873, Jacob Emmerich e seu genro Henrique Ablas (alemães da Bavária)   obtiveram permissão do Governo da Província para estabelecer uma linha de  bondes (tração animal) sobre trilhos de ferro, entre a cidade de Santos e a Vila de São Vicente. A concessão foi firmada a 10 de novembro de 1873, perante o presidente da Província, Dr. João Theodoro Xavier, sendo procurador dos concessionários João António de Borba Cujo.

Ilustração contida em Vultos Vicentinos, de Edison Telles de Azevedo

O contrato, em uma das 35 cláusulas, ressalva os direitos da Empresa Domingos Moutinho, garantidos pela Lei Provincial nº. 67 de 10/4/1870, nos termos da Lei nº. 42, de 3/4/1873. A ressalva era necessária, pois Domingos Moutinho havia recebido, em 27/5/1870, uma concessão (prazo de 50 anos), para operar uma linha de bondes. Mais tarde, esta concessão foi transferida para a Cia. Melhoramentos de Santos e, em 10/5/1887, transferida para Mathias Casimiro da Costa e Dr. João Éboli, por 35 anos.

O bonde (tração animal) dos Emmerich foi inaugurado em 24/10/1875, com bitola de 1.350 mm e 9 quilômetros de extensão; seu trajeto era idêntico à futura linha elétrica de número 1.

Os escritórios e oficinas da Empresa Carril de Ferro de São Vicente ficavam ao lado da Estação de São Vicente, atual Praça Barão do Rio Branco. Onde a família Emmerich tocava a ferrovia: Henrique, José, António, João, Adão e Tiago - que chefiava a equipe, e foi este que encomendou na Alemanha as locomotivas a vapor que entraram em operação em 1886.

Bonde construído por volta de 1870 pela Metropolitan Railway Carriage & Wagon Company, em Birmingham, na Inglaterra

Percurso - O traçado do tramway seguia pelo aterrado do mangue, o trem saía da Estação de São Vicente, atravessava a Praça Coronel Lopes (na época não existiam o jardim, o coreto e a escola), e seguia pela atual Avenida Emmerich, passando pelo Matadouro, até a Estação Emmerich (em frente à Igreja Nossa Senhora de Fátima era a divisa-secção), seguia o trem em direção a Chico de Paula, Saboó, Rua Visconde de São Leopoldo, Largo do Rosário (atual Praça Rui Barbosa), Rua do Rosário (atual João Pessoa) e Rua Itororó esquina de Rua Amador Bueno (Ponto final, estação de cargas).

A Carril de Ferro de São Vicente teve seis locomotivas, sendo três de quatro rodas, do tipo fechado, e três locomotivas com caldeira e chaminé expostas. As locomotivas foram batizadas como: nº. 1 Santos, nº. 2 Democrata, nº. 3 São Vicente, nº. 4 1º de Outubro, nº. 5 Santa Maria, nº. 6 Janacopoulos. Todas queimavam carvão de pedra. Cada locomotiva puxava duas gôndolas para passageiros e um reboque do tipo Caradura, no qual os passageiros podiam transportar galinhas, cabritos e leitões.

Os condutores e fiscais usavam fardamento azul marinho com quepe, e botões amarelos na túnica. Os chefes de estação eram Bento Vieira Neto e Joaquim Vilas Boas. Os maquinistas: Rafael Frezelone, Joaquim Machado, João Proost, Jordão, Mário de Oliveira, António Silva, António Torquato, Barnabé, e Alexandre Sedin que pilotava o Trem da Carne, puxado pela locomotiva nº. 5 Santa Maria. Os foguistas: José Tomás Pereira, Noé Constâncio Ferreira, Eloi dos Passos e outros. Os cobradores: Isaac Xavier dos Passos, João Venceslau Emmerich, Noronha e José Santos Amorim.

O chefe da oficina onde eram feitos reparos das locomotivas era o José Gustavo Bruncken, seu contramestre era o Nicola Antonietti. Profissionais que, com a eletrificação da linha em 1909, foram contratados para cuidar das locomotivas a vapor da Estrada de Ferro Guarujá-Itapema.

Carril de Ferro de São Vicente em 1901

Imagem: Lembrança do Trem de Ferro de P.M.Bardi

Horários - O primeiro trem saía de São Vicente às 5 horas da manhã, e depois de hora em hora até a última viagem São Vicente/Santos às 21h30 nos dias úteis, e às 22 horas aos sábados e domingos. Cinco minutos antes da partida, a locomotiva dava um apito longo, e no horário - ao toque do sino da estação - o comboio partia. O preço da passagem era de 200 Réis por seção ou 400 Réis todo o percurso.

As mercadorias despachadas de Santos, Itororó, ou qualquer outra estação do percurso, pagavam 100 Réis o pacote, e chegavam ao destino no mesmo dia. Soldados viajavam de pé nas plataformas das gôndolas.

No primeiro sábado de cada mês, o tramway trazia  a Banda Municipal (depois Corpo de Bombeiros), de Santos, sob a regência do maestro Aurélio Prado, para as retretas no coreto da Praça Coronel Lopes em São Vicente.

Em 1890, a Carril de Ferro de São Vicente foi adquirida pelo Conselheiro Francisco de Paula Mayrink, que a englobou em um consórcio, com as demais linhas de bondes existentes na cidade de Santos, formando a Companhia Viação Paulista, gerenciada pelo grego João Constantino Janacopulos. O consórcio começou a sentir dificuldades em 1897, chegando à insolvência em 6/5/1901. Sendo então adquirido pela Companhia Ferro Carril Santista, que desmembrou as linhas e planejou eletrificar a Carril de Ferro de São Vicente - fato que somente ocorreu em 1909. Um ano depois, cessaram as atividades da ferrovia e as locomotivas foram adquiridas pela Cia. Docas de Santos.

(*) Werner Vana é também colaborador do Museu do Transporte Público Gaetano Ferolla, da capital paulista. Imagens cedidas pelo autor e pelo especialista Allen Morrison, de New York (EUA).

Veja também o texto "Os bondes em São Vicente", com outros detalhes e fotos históricas dos primeiros bondes e lugares citados.

E agora, conheça o curioso funicular que existiu no morro da Nova Cintra.

Carlos Pimentel Mendes