Werner Vana (*)
Colaborador
Em 1873, Jacob Emmerich e seu genro Henrique Ablas
(alemães da Bavária) obtiveram permissão do Governo da Província para estabelecer uma linha de bondes (tração animal) sobre
trilhos de ferro, entre a cidade de Santos e a Vila de São Vicente. A concessão foi firmada a 10 de novembro de 1873, perante o presidente da
Província, Dr. João Theodoro Xavier, sendo procurador dos concessionários João António de Borba Cujo.
Ilustração contida em Vultos Vicentinos, de Edison
Telles de Azevedo
O contrato, em uma das 35 cláusulas, ressalva os direitos da Empresa Domingos Moutinho,
garantidos pela Lei Provincial nº. 67 de 10/4/1870, nos termos da Lei nº. 42, de 3/4/1873. A ressalva era necessária, pois Domingos Moutinho havia
recebido, em 27/5/1870, uma concessão (prazo de 50 anos), para operar uma linha de bondes. Mais tarde, esta concessão foi transferida para a Cia.
Melhoramentos de Santos e, em 10/5/1887, transferida para Mathias Casimiro da Costa e Dr. João Éboli, por 35 anos.
O bonde (tração animal) dos Emmerich foi inaugurado em 24/10/1875, com bitola de 1.350
mm e 9 quilômetros de extensão; seu trajeto era idêntico à futura linha elétrica de número 1.
Os escritórios e oficinas da Empresa Carril de Ferro de São Vicente ficavam ao lado da
Estação de São Vicente, atual Praça Barão do Rio Branco. Onde a família Emmerich tocava a ferrovia: Henrique, José, António, João, Adão e Tiago -
que chefiava a equipe, e foi este que encomendou na Alemanha as locomotivas a vapor que entraram em operação em 1886.
Bonde construído por volta de 1870 pela Metropolitan
Railway Carriage & Wagon Company, em Birmingham, na Inglaterra
Percurso - O traçado do tramway seguia pelo aterrado do mangue, o trem
saía da Estação de São Vicente, atravessava a Praça Coronel Lopes (na época não existiam o jardim, o coreto e a escola), e seguia pela atual Avenida
Emmerich, passando pelo Matadouro, até a Estação Emmerich (em frente à Igreja Nossa Senhora de Fátima era a divisa-secção), seguia o trem em direção
a Chico de Paula, Saboó, Rua Visconde de São Leopoldo, Largo do Rosário (atual Praça Rui Barbosa), Rua do Rosário (atual João Pessoa) e Rua Itororó
esquina de Rua Amador Bueno (Ponto final, estação de cargas).
A Carril de Ferro de São Vicente teve seis locomotivas, sendo três de quatro rodas, do
tipo fechado, e três locomotivas com caldeira e chaminé expostas. As locomotivas foram batizadas como: nº. 1 Santos, nº. 2 Democrata,
nº. 3 São Vicente, nº. 4 1º de Outubro, nº. 5 Santa Maria, nº. 6 Janacopoulos. Todas queimavam carvão de pedra. Cada
locomotiva puxava duas gôndolas para passageiros e um reboque do tipo Caradura, no qual os passageiros podiam transportar galinhas, cabritos
e leitões.
Os condutores e fiscais usavam fardamento azul marinho com quepe, e botões amarelos na
túnica. Os chefes de estação eram Bento Vieira Neto e Joaquim Vilas Boas. Os maquinistas: Rafael Frezelone, Joaquim Machado, João Proost, Jordão,
Mário de Oliveira, António Silva, António Torquato, Barnabé, e Alexandre Sedin que pilotava o Trem da Carne, puxado pela locomotiva nº. 5
Santa Maria. Os foguistas: José Tomás Pereira, Noé Constâncio Ferreira, Eloi dos Passos e outros. Os cobradores: Isaac Xavier dos Passos, João
Venceslau Emmerich, Noronha e José Santos Amorim.
O chefe da oficina onde eram feitos reparos das locomotivas era o José Gustavo
Bruncken, seu contramestre era o Nicola Antonietti. Profissionais que, com a eletrificação da linha em 1909, foram contratados para cuidar das
locomotivas a vapor da Estrada de Ferro Guarujá-Itapema.
Carril de Ferro de São Vicente em 1901
Imagem: Lembrança do Trem de Ferro de P.M.Bardi
Horários - O primeiro trem saía de São Vicente às 5 horas da manhã, e depois de
hora em hora até a última viagem São Vicente/Santos às 21h30 nos dias úteis, e às 22 horas aos sábados e domingos. Cinco minutos antes da partida, a
locomotiva dava um apito longo, e no horário - ao toque do sino da estação - o comboio partia. O preço da passagem era de 200 Réis por seção ou 400
Réis todo o percurso.
As mercadorias despachadas de Santos, Itororó, ou qualquer outra estação do percurso,
pagavam 100 Réis o pacote, e chegavam ao destino no mesmo dia. Soldados viajavam de pé nas plataformas das gôndolas.
No primeiro sábado de cada mês, o tramway trazia a Banda Municipal
(depois Corpo de Bombeiros), de Santos, sob a regência do maestro Aurélio Prado, para as retretas no coreto da Praça Coronel Lopes em São Vicente.
Em 1890, a Carril de Ferro de São Vicente foi adquirida pelo Conselheiro Francisco de
Paula Mayrink, que a englobou em um consórcio, com as demais linhas de bondes existentes na cidade de Santos, formando a Companhia Viação Paulista,
gerenciada pelo grego João Constantino Janacopulos. O consórcio começou a sentir dificuldades em 1897, chegando à insolvência em 6/5/1901. Sendo
então adquirido pela Companhia Ferro Carril Santista, que desmembrou as linhas e planejou eletrificar a Carril de Ferro de São Vicente - fato que
somente ocorreu em 1909. Um ano depois, cessaram as atividades da ferrovia e as locomotivas foram adquiridas pela Cia. Docas de Santos.
(*) Werner Vana é também colaborador do Museu do
Transporte Público Gaetano Ferolla, da capital paulista. Imagens cedidas pelo autor e pelo especialista Allen Morrison, de New York (EUA).
Veja também o texto "Os bondes em São Vicente", com
outros detalhes e fotos históricas dos primeiros bondes e lugares citados.
E agora, conheça o curioso funicular que existiu no
morro da Nova Cintra. |