Parada é uma palavra que tem duas conotações
contraditórias. Parada, sem movimento, e parada, desfile. A explicação do segundo sentido da palavra é que no desfile existem movimentos feitos sem a
pessoa sair do lugar. Neste caso, valem os dois sentidos, até em função da marcha tocada pela banda nessa festa. Um desfile para o 3º aniversário de
gestão de um general que, exatos 987 dias depois, pararia a machadadas a movimentação dos bondes em Santos. Algo inimaginável
naquele domingo, 16 de junho de 1968, quando o jornal santista A Tribuna publicou
esta matéria, em sua página 3 do 1º caderno:
Imagem: reprodução
parcial da matéria original
Banda e bondes fazem a alegria do general
Uma
bandinha no bonde da frente; o general e o seu staff no bonde de trás e mais 10 veículos vazios fechando o cortejo: é o desfile
comemorativo do 3º aniversário do superintendente do SMTC, Aldévio Barbosa de Lemos. A "parada" começou na Vila Matias e foi até a Ponta da Praia,
com muita gente parando para ver o bonde passar. "Sílvio Melhora os Transportes Coletivos", uma faixa enorme pintada nas laterais de todos os
veículos, mostra ao povo que de fato os transportes santistas estão melhorando. O general Aldévio sorri satisfeito com a entrega de mais 12 bondes
reformados, com bancos estofados, venezianas para melhor circulação do ar e exaustores. Na frente, a banda do 6º BP toca marchinhas alegres,
bisando trechos na base do "estava à toa na vida"[*].
Muita festa - A festa começou na sede do SMTC, no
Jabaquara, com a inauguração da galeria dos ex-superintendentes e a cerimônia de efetivação de 40 novos funcionários,
que até aqui trabalhavam em regime de experiência.
O general Aldévio explicava a sua satisfação pela data
dizendo: "Ao mesmo tempo em que homenageamos os novos funcionários com este ato de efetivação, também nos lembramos de homens que empenharam parte
de sua existência no desenvolvimento desta autarquia municipal".
Depois foi a vez do presidente do Sindicato dos Carris
Urbanos elogiar a gestão do general que "pegou o SMTC praticamente à beira da falência e soube transformá-lo numa empresa realmente grande,
prestando enormes serviços ao povo e dando bastante satisfação a todos os seus funcionários".
Depois, um passeio - Saindo do Jabaquara, a caravana
partiu para a Vila Matias, onde deveria estar o prefeito Sílvio Fernandes Lopes para iniciar
o passeio dos bondes reformados.
Mas o prefeito não pôde ir e o desfile saiu com o seu
representante, o secretário Sílvio Fortunato.
Muita gente falava de sua alegria em dar uma voltinha de
bonde, "matando a saudade, pois há muito tempo não utilizava esse veículo".
Chegando à Ponta da Praia, todos
desceram, o general falou um pouco de seus planos até o fim da gestão e os bondes voltaram, 11 deles já para se integrar às linhas definitivas e
um trazendo de volta a turma de visitantes.
Monopólio - "A questão do monopólio e a Viação
Santos-São Vicente ainda são uma espinha atravessada na minha garganta", dizia o general. "Sou obrigado a reconhecer que a Viação é uma potência e
sua força oculta é suficientemente grande para impedir que eu acabe com ela. Mas, não tem importância; da noite para o dia, o chapéu vira bacia e
até o fim do mandato do prefeito muitas novidades ainda podem vir".
Depois o general falava de seus planos de até o fim do ano,
no máximo, acabar com os bondes abertos, deixando apenas os fechados e todos já reformados, num total de 50 veículos.
Alguns poucos bondes abertos serão mantidos, mas apenas
para funcionar nos domingos e feriados, servindo como curiosidade para os turistas e como alegria para os saudosistas. Haveria então apenas uma
linha, que iria da Divisa até a Ponta da Praia, com alguns poucos veículos.
Mais ônibus - Ainda nesses 8 ou 10 meses que restam
de sua gestão, o general Aldévio pretende adquirir mais 10 ônibus diesel, "o que colocaria a frota no ponto exato".
Finalizando, o superintendente do SMTC lembrou o que foi
feito durante esses 3 anos de administração: 125 ônibus Mercedes novos, modernização dos velhos bondes, ampliação da rede de trólebus e muita
coisa mais. Tudo num total superior a seis milhões de cruzeiros novos aplicados nos três sistemas de transporte".
Os
bondes foram em fila até a Ponta da Praia e depois cada qual seguiu a sua linha
Foto publicada com a
matéria
[*]
"Estava
à toa na vida/O meu amor me chamou/Pra ver a banda passar/Cantando coisas de amor"
- Estrofe inicial de "A Banda", composição de Chico Buarque de Hollanda, que dividiu em 1966 com "Disparada" (de Théo de Barros e
Geraldo Vandré), o primeiro lugar no II Festival de Música Popular Brasileira, promovido pela TV Record: