Trecho da matéria original
Só nos botequins e na beira de cais se faz câmbio de moedas estrangeiras
Um obstáculo intransponível ao fomento do turismo no país - Dificuldades que
provocam o aviltamento da nossa moeda no estrangeiro - Medidas tardias demais
Fala-se muito em turismo no Brasil, ultimamente.
Fala-se, porém, inutilmente, pois todos sabem que não dispomos de nenhum dos elementos fundamentais para fomentar essa fonte de renda, que é a base
da economia de muitos países, pelo carreamento de robusto caudal de divisas estrangeiras, e pelo movimento extraordinário que imprime a diversos
setores de atividade interna. Os obstáculos que se opõem ao turismo no Brasil são de várias espécies, e no momento, o maior deles depende de medidas
tomadas pelo próprio governo, a começar pelo câmbio.
Atualmente, o turista encontra as maiores dificuldades em adquirir moeda brasileira a
preço razoável, que lhe torne acessível a visita ao nosso país e a sua permanência entre nós por espaço de tempo suficiente para visitar tudo o que
de belo e atraente temos para lhe mostrar.
Só milionários podem dar-se a esse luxo e milionários é casta que escasseia sobre a
Terra. A classe média de outros países não pode visitar o Brasil. O preço oficial de nossa moeda está em pleno desacordo com o custo da vida. Não
nos cabe discutir a razão ou as vantagens resultantes de nossa política cambial, mas a verdade é que todos sabem que quem tem dólares, não vai
vendê-los a Cr$ 18,75, sabendo que pode negociá-los no "câmbio negro" a 30 ou 32. O mesmo se dá com as demais moedas. Por esse motivo, escasseiam as
moedas estrangeiras nas casas de câmbio, porque as mesmas não se atrevem a pagá-las acima da taxa oficial, receosas da aplicação das pesadas sanções
previstas em lei para tais casos.
Somente nos botequins ou na beira de cais
- Há dias, desejamos comprar alguns escudos, para entregar a quatro menores clandestinos que estiveram durante alguns dias detidos na Polícia
Marítima, e que tiveram de ser recambiados para sua terra, S. Vicente de Cabo Verde. Não o conseguimos e, pelas explicações que obtivemos, a
respeito da situação, viemos a deduzir que só se podem comprar moedas estrangeiras, atualmente, no Brasil, nos botequins e entre pessoas suspeitas
da beira de cais.
Só no "mercado negro", excessivamente negro, aliás, é que se podem fazer tais
operações. Podem-se alegar as razões que quiserem, mas ninguém nos poderá convencer de que isto não é uma situação deplorável, vexatória e
prejudicial aos interesses da nação.
Em tais condições, o turista, que não conhece, nem certamente pretende entrar nos
antros onde tais negócios são feitos, nem mesmo deseja assinalar seu contato com a nossa terra por meio de atos ilegais, limita-se a passar em
cidades brasileiras o menor tempo possível.
Ainda recentemente, essa situação ficou devidamente posta a relevo, por ocasião do
Carnaval, quando os turistas que em grande número visitaram o Rio de Janeiro se viram nas maiores dificuldades, por falta de meios para adquirir
moeda nacional.
Isto para quem visita o Brasil. Aqueles, entretanto, que desejam deixar o país, a
negócios ou a passeio, encontram-se ainda em maiores dificuldades e sofrem ainda maior prejuízo. Nas praças estrangeiras, sabendo a nossa situação
em relação ao comércio de moedas, e tendo conhecimento de que nem o próprio Banco do Brasil fornece câmbio, a não ser em casos muito excepcionais,
os que se entregam a esse ramo de negócio procuram tirar o máximo partido possível da situação, pagando preços aviltantes pelo cruzeiro.
Evidentemente, assim procedendo, não estamos defendendo nem a estabilidade da nossa
moeda, nem os créditos do país e muito menos nos cabe o direito de falar em estimular turismo no Brasil.
Eis aqui duas cédulas, das quatro únicas moedas conversíveis. A sua aquisição, no
Brasil, só pode ser feita nos botequins ou com especuladores de beira de cais, pelo dobro da taxa oficial
Fotos e legenda publicadas com a matéria original (cor acrescentada por Novo Milênio)
Qualquer providência tarda muito - Ultimamente, têm-se praticado uma série de
erros, que agora se procura corrigir. Estamos informados de que está sendo elaborado um plano referente ao assunto, para ser apresentado ao
Congresso, e transformado em lei que atenda às necessidades e exigências, dando a maior amplitude possível ao setor câmbio, sem prejudicar os
interesses da nação.
Esperamos confiantes, pois sabemos que técnicos autorizados no assunto estão
empenhados em colaborar na elaboração desse plano. Tudo, entretanto, é feito muito lentamente. Há que considerar ainda a demora, as marchas e
contra-marchas que o projeto sofrerá depois nas duas Câmaras legislativas.
Sem pôr de lado esse plano, que se afirma prever todas as hipóteses e salvaguardar os
interesses gerais, não haveria um processo mais rápido de atenuar as dificuldades presentes?
Por que a verdade é que estamos atravessando um período simplesmente vexatório e
deprimente, sem considerar os prejuízos que ocasiona para o país, enriquecendo um grupo de audaciosos traficantes de "mercado negro" da moeda, a
salvo de qualquer repressão, sem pagarem taxas cambiais, imposto de renda, ou qualquer outro tributo. Verdadeiros privilegiados, favorecidos pela
situação criada pela falta de visão, de energia e de esclarecimento das autoridades competentes. |