Dr.Guilherme Álvaro
VIII - 1913-1919 (cont.)
(N.E.: não existe no original um capítulo VII, a ordem dos capítulos foi descontinuada)
{1915}
Em 1915, quando o Hospital de Isolamento apenas recebeu 29 doentes, dos quais 1 de peste, 7 de sarampão e os demais de difteria, confirmada, ou não, o número de óbitos ocorridos no território de
Santos subiu a 1.692, elevando-se a 26 a porcentagem dos causados pelas doenças transmissíveis, contra 19,65% no ano anterior. O coeficiente da mortalidade geral aumentou também, indo a 16,92 por mil, quando tinha sido de 16,03 em 1914.
Foi o impaludismo que, produzindo 71 óbitos no município, avolumou o seu obituário; a doença lavrou durante vários meses em sítios distantes, na Bertioga, nas margens dos rios e nas praias da
Ilha de S. Amaro, chegando a vir causar estragos na entrada do canal de Santos, nas proximidades da Ponta da Praia.
Não houve explosão local intensa que chamasse logo a atenção, e só com o correr do tempo a Sanitária teve conhecimento do mal e procurou imediatamente combatê-lo pelos meios ao seu
alcance, o tratamento e a profilaxia pela quinina, já adquirida na Europa e nos Estados Unidos com dificuldades. Além dos referidos meios, de outros não se podia lançar mão, porquanto a topografia das zonas infestadas exigiria longos e custosos
trabalhos de engenharia sanitária, para livrá-las da doença reinante nelas há muito tempo.
Apesar da farta distribuição de quinina às populações contaminadas, este surto do impaludismo só terminou de vez em 1917, inclusive na Ponta da Praia, onde imprudentes se estabeleceram
levados pela crise, em lugares desde muito abandonados por insalubres. Em geral bastaria que os moradores das zonas referidas abandonassem os terrenos baixos, alagadiços, em que por comodidade se fixaram, e procurassem pontos mais altos e distantes
dos brejais, para que escapassem às devastações dos hematosoários.
É verdade que, na Ponta da Praia, a população que ali foi se fixar, contava com os benefícios do canal de drenagem nº 6 ainda este ano, mas a interrupção dos trabalhos da Comissão de
Saneamento, logo no início da guerra européia, veio desfazer-lhes a esperança que nutriam, de poder ficar impunemente no referido ponto do litoral santista. Este fato veio mostrar a necessidade da continuação das obras de saneamento realizadas pelo
Governo do Estado, para bem da grande massa de população, pobre quase toda e que foi procurar aqueles sítios confiada no seu próximo beneficiamento, compensador de sacrifícios motivados pelas dificuldades da vida no centro da cidade.
O caso de peste ocorreu em novembro. Era um caixeiro, português, residente na Rua da Constituição 441, ao lado de cocheira; removido para o Hospital de Isolamento, restabeleceu-se uma
vintena de dias depois. Tomadas as precauções regulamentares, desde o isolamento do doente até a vigilância sanitária de toda a zona circundante do foco, nenhum outro caso de peste apareceu, não se observando mortandade de ratos ali, ou nos
armazéns do cais.
De varíola não houve doentes ou óbitos, quer indígenas, quer importados, e os inspetores sanitários vacinaram e revacinaram 8.344 pessoas na cidade e arrabaldes. A população já vinha
recebendo com mais facilidade o recurso profilático, tornado, aliás, obrigatório desde 1913.
O sarampão reinou em pleno inverno, com pequena epidemia que produziu 4 óbitos, tendo na mesma ocasião lavrado a coqueluche causadora de 10 mortes. A febre tifóide e a disenteria
vitimaram, respectivamente, 5 e 9 pessoas; a gripe e a difteria 34 e 4 cada uma. O tétano dos recém-nascidos figura com cifra alta, 35, no obituário, no cimo do qual continuou a tuberculose, 211. Para esta doença convergiram como sempre as atenções
da Sanitária, prosseguindo-se na campanha remodeladora dos domicílios e dos lugares de trabalho, no expurgo dos aposentos contaminados e das casas em geral, antes da entrada de novos ocupantes. Os cancros mataram 30 pessoas, ou o mesmo número do
ano anterior, sendo notável o aumento desta doença de 1900 em diante, triplicando os casos fatais em 15 anos, quando a população não chega a duplicar.
O policiamento sanitário da cidade e dos arrabaldes foi conduzido com o preciso rigor, sendo feitas 21.758 visitas domiciliares pelos inspetores, que expediram 4.901 intimações para
obras e reformas, resultando delas 166 construções novas e 271 reformas radicais e reconstruções regulamentares, além de um milheiro de prédios melhorados com pinturas, reparos e limpeza geral. Os fiscais sanitários fizeram 79.765 visitas a áreas,
quintais e terrenos, principalmente nos arrabaldes.
Pelo Desinfetório foram expurgados 140 prédios contaminados por contagiosos, dos quais 106 por tuberculosos, e 1.097 vazios, antes da entrada de novos ocupantes; foram desinfetadas
44.202 bocas-de-lobo e fossas fixas.
O colega encarregado das inspeções escolares visitou todos os estabelecimentos de ensino de Santos, quer públicos, quer particulares, procurando corrigir todas as faltas verificadas e
completar a vacinação das crianças, aplicando a vacina a 277.
A Brigada contra mosquitos e moscas, sempre sob a direção do chefe da comissão, limpou e nivelou 187.576 metros de valas e braços de rios, nos arrabaldes, enterrou 94.709 vasilhas
abandonadas, destruiu 109 focos de larvas de mosquitos, petrolizou 19.027 ralos, fossas e alagados, 5.123 bocas-de-lobo com sifão, 4.691 registros de hidrantes e distribuiu veneno em todos os armazéns das Docas.
Pelos visitadores da Brigada, foram feitas 36.230 inspeções em terrenos, chácaras, quintais, estábulos e cocheiras e entregues 812 intimações para asseio geral, remoções de monturos e
supressão de águas estagnadas. Em S. Vicente, a Brigada fez 4.592 visitas a terrenos, chácaras, estábulos e cocheiras, beneficiou 275 terrenos, enterrou 4.997 vasilhas abandonadas, petrolizou 980 bocas-de-lobo e limpou 3.056 metros de valas. Foram
expedidas 186 intimações para asseio geral. Em Guarujá foram visitados 707 terrenos e quintais, beneficiados 29, enterradas 1.250 vasilhas, petrolizados 1.121 metros de valas e valetas e 197 bocas-de-lobo. Foram expedidas 50 intimações para asseio.
A Comissão Sanitária estendeu o seu policiamento sanitário a S. Vicente, fazendo o dr. chefe da Comissão 1.015 visitas e o fiscal sanitário 2.236; vacinou 68 pessoas, fez desinfetar 5
residências de tuberculosos e 92 casas vazias. Expediu 259 intimações, obtendo a construção de 8 prédios, a reconstrução de 2, a reforma de 11 e melhoramentos em 90. Ficaram interditos, por insalubres, 35 prédios.
Fora de Santos a Comissão obteve, pelos seus fiscais, os seguintes resultados: em Iguape 340 vacinações, em S. Sebastião 418, em Ubatuba 18, em Vila Bela 518.
Foi de luto para a Comissão Sanitária o ano de 1915, em que perdemos o dr. Tolentino Filgueiras, um dos nossos melhores companheiros durante mais de vinte anos, e o primeiro chefe da
mesma Comissão. Em 13 de julho faleceu aquele saudoso colega, a quem Santos deve serviços inestimáveis; em 1893 veio para aqui, moço ainda, aqui constituiu família e se fixou, dedicando-se esforçadamente à causa pública, tornando-se providência da
pobreza, como facultativo humanitário e desinteressado que era. Morreu necessariamente pobre, e no arrabalde de Vila Mathias, por determinação da municipalidade, uma rua nova rememora o seu nome, exemplo típico de virtudes cívicas.
"O antigo Hospital de Isolamento, feito em 1892"
Foto publicada com esta legenda no livro A Campanha Sanitária...
{1916}
O ano de 1916 foi, sanitariamente, pior do que o anterior, atingindo a mortalidade geral a cifra de 1.833; entretanto, a porcentagem das vítimas das doenças transmissíveis, em relação
àquele total, foi de 24,4%, quando havia sido de 26,6% em 1915, mostrando não terem sido explosões epidêmicas as causas do aumento referido. Ele proveio da vida difícil nos tempos que atravessamos, em que as classes pobres, e nestas as crianças
principalmente, pagam tributos pesados às doenças do aparelho digestivo, como conseqüência da alimentação insuficiente ou imprópria a que estão sujeitas.
Basta referirmos que dos 609 óbitos de crianças até 1 ano, ou 33% do obituário geral, foram causados pelas enterites 247, por debilidade congênita 71, por doenças do aparelho
respiratório 132 e por doenças transmissíveis 83, das quais o tétano vitimou 32, a gripe 9, o sarampão 4.
Torna-se indispensável, ao lado de campanha tenaz para educação das mães, corrigir-se as idéias populares a respeito da quantidade e da qualidade da alimentação das crianças, na primeira
infância. A instalação de dispensários para lactantes, e educadores de nutrizes e gestantes, é uma necessidade premente em Santos. A "Gota de Leite" existente aqui dispõe de recursos limitados e não pode fazer mais do que faz, o que é muito pouco
para o vasto campo onde exercita a sua ação humanitária e patriótica.
Das doenças contagiosas, a tuberculose foi a que maior número de óbitos causou, 216; tem-se conseguido alguma coisa no combate a esta doença porquanto no mesmo período em que a população
santista dobrou, o número de mortes produzidas por ela tem o aumento de 20 por cento. Os estragos da tísica em Santos ainda são elevados e a Sanitária precisa continuar com o mesmo cuidado, com o mesmo rigor, a campanha encetada desde o começo dos
seus trabalhos, reformando os domicílios insalubres, expurgando os contaminados e popularizando os hábitos de asseio, a vida ao ar livre e o horror ao álcool.
Depois da tuberculose vem o impaludismo, com 54 óbitos, seguindo-se-lhe o tétano dos recém-nascidos com 35. O sarampão fez 16 mortes, contra 4 em 1915, a coqueluche foi causa de 1
apenas, contra 10 naquele mesmo ano, a disenteria causou 4 óbitos e difteria 8, ou o duplo dos do ano anterior. Houve, de fato, aumento dos casos da doença, mas também os diagnósticos foram feitos com mais cuidado, notificando-se mais, diminuindo
os óbitos por bronquite capilar.
A ancilostomose continua a aparecer no obituário santista com cifra elevada, muito alta mesmo para os nossos tempos, e ficou resolvido para o ano de 1917 o início duma campanha contra o
nemátode devastador, no grande foco dos morros de S. Bento e do Pacheco. A febre amarela e a varíola continuaram ausentes de Santos. A peste deu-nos um caso, terminado pela cura. Entrou para o Isolamento, em 30 de março, o doente, trabalhador do
cais e residente no morro do Pacheco. Saiu em 30 de abril, nenhum outro pestoso tendo aparecido, já no referido morro, já entre os empregados da Companhia Docas, em cujos armazéns continuou a ser feita a distribuição de veneno para ratos.
Nos cinco distritos sanitários da cidade e arrabaldes, foram feitas pelos inspetores 14.949 visitas domiciliares, expedindo-se 2.944 intimações, donde resultaram 289 construções, 347
reformas regulamentares e 150 condenações de prédios por insalubres. Foram feitas 2.187 vacinações e 3.999 revacinações contra a varíola. Os fiscais sanitários fizeram 37.094 visitas. Em S. Vicente foram visitados 625 prédios, expedidas 507
intimações e feitas 120 vacinações; o fiscal sanitário visitou ali 3.155 quintais, chácaras e cocheiras.
Pelo pessoal do Desinfetório foram expurgados 1.620 prédios vazios, 169 contaminados por contagiosos e montados 6 isolamentos domiciliares. Para o Hospital de Isolamento foram removidos
75 doentes e dali retirados 10 cadáveres; da S. Casa foram removidos 278 cadáveres e de vários pontos da cidade, a pedido policial, 78. Pelas estufas passaram 2.419 peças de roupa de doentes contagiosos, removidos e isolados. Foram desinfetadas
44.450 bocas-de-lobo na cidade e nos arrabaldes e desinfetadas semanalmente as instalações sanitárias dos quartéis e edifícios públicos.
No Hospital de Isolamento estiveram em tratamento 74 doentes, dos quais 26 suspeitos, ou confirmados, de difteria, falecendo 8, todos de bronco-pneumonia, 37 de sarampão, quase todos
imigrantes, falecendo 8, de varicela 2 que saíram curados, além de 8 para observação, em que as doenças não se confirmaram. Para o ano de 1917 passou 1 doente de varicela. Os pavilhões do Hospital foram conservados rigorosamente, sendo mantidos a
capricho, ultimando-se a arborização do parque.
A Brigada contra mosquitos e moscas cumpriu a sua missão com a maior regularidade, repassando a extensa rede de valas dos arrabaldes, continuando a campanha de construção de fossas nas
zonas não possuidoras de esgotos, levando os seus serviços aos morros de S. Bento, do Fontana e do Pacheco e aos núcleos povoados da Bocaina, do Itapema e do Guarujá.
Em Santos foram visitados 38.407 chácaras, quintais e terrenos, 967 cocheiras e estábulos, destruindo-se 142 focos de larvas de mosquitos. Foram enterrados 81.038 recipientes
abandonados, beneficiados 1.481 terrenos, petrolizados 17.494 ralos de áreas e quintais, 43.289 bocas-de-lobo e 6.016 caixas de hidrantes do cais. Foram distribuídas 1.513 intimações para asseio e supressão de águas estagnadas e limpos 225.354
metros de valas e valetas escoadoras de águas pluviais. Em Guarujá foram limpos 5 quilômetros de valas, petrolizados 354 bueiros e bocas-de-lobo, enterrados 586 recipientes abandonados, beneficiados 15 terrenos e expedidas 52 intimações.
Em S. Vicente foram inspecionados 6.500 terrenos e chácaras, beneficiados 273, limpos 11.030 metros de valas, enterrados 6.656 recipientes abandonados, destruídos 11 focos de larvas,
petrolizados 1.454 bueiros e bocas-de-lobo e visitados 120 cocheiras e estábulos. Aqui, como em Santos, a campanha contra as cocheiras irregulares foi continuada, reformando-se 2, sendo outras tantas fechadas. Em Santos 5 foram fechadas e 10
reformadas regularmente.
Na Bocaina foram feitas 619 visitas em prédios e expedidas 519 intimações para asseio; no Cubatão as visitas foram 808, com 130 intimações.
Em 7 de junho, tendo o dr. Guilherme Álvaro deixado a Diretoria Geral, voltou a ocupar o cargo de chefe da Comissão Sanitária de Santos, indo para S. Paulo o dr. Siqueira Zamith, que o
substituíra aqui desde agosto de 1913. Prestou o dr. Zamith excelentes serviços a Santos, em época difícil, em plena evolução da guerra européia, conseguindo com tato e inteligência manter o andamento dos serviços, ainda que conduzindo-os com a
eqüidade referente ao momento.
Apesar das dificuldades da vida, das incertezas da ocasião, foi sensível o desenvolvimento de Santos no ano de 1916, em que a valorização dos terrenos da parte nova da cidade atestou o
interesse e a procura dos compradores, confiantes no futuro desta terra, hoje salubre e buscada pelos banhistas provindos dos pontos os mais afastados de S. Paulo.
Foram registrados 487 casamentos em 1916, quando o número dos nascimentos subiu 2.912, o dos óbitos a 1.833, excluídos os 209 natimortos.
"Hospital de Isolamento, feito em 1892"
Foto publicada com esta legenda no livro A Campanha Sanitária...
{1917}
O ano de 1917 foi melhor, tendo havido 1.553 óbitos, excluídos os 199 natimortos. Em compensação baixaram os casamentos e os nascimentos, tendo sido registrados 399 dos primeiros e 2.736
dos segundos. É verdade que todos os óbitos são levados a cartório para obtenção da guia exigida pelos cemitérios, não sucedendo o mesmo com os casamentos e os nascimentos, em que algumas vezes ainda a cerimônia religiosa substitui a exigência
legal.
Em todo o caso, a vida de Santos continuava perturbada pela guerra, sofrendo privações a massa da população, em grande parte desprovida dos necessários recursos pelo fechamento de grande
número de oficinas, de negócios, de lugares onde outrora o trabalho assegurava a subsistência com relativa fartura.
Acreditamos bem que, cessadas as causas da perturbação universal existente, melhorarão as cifras demógrafo-sanitárias santistas, a começar pelo obituário da tuberculose, que atingiu a
252, coisa nunca sucedida. A campanha movida pela Sanitária contra esta doença foi prosseguida da melhor maneira, apesar das falhas que reconhecemos existir nela, a maior das quais é a falta da notificação precoce do mal e a nenhuma educação dos
doentes. Os domicílios ocupados por tuberculosos, falecidos ou mudados, continuaram a sofrer as desinfecções regulamentares, persistindo-se na desinfecção sistemática das casas vazias. Seria produtiva também para o combate à doença a campanha
contra o álcool, que tantas portas abre para a entrada da tuberculose nas classes operárias.
Depois da tuberculose, avultam no obituário santista os tumores malignos, causando 36 mortes. Este crescimento de mortalidade pelos cancros pode até certo pondo ser explicado pela
precisão dos diagnósticos em relação às localizações viscerais, mas não basta e continuamos às cegas neste capítulo sanitário, enigmático ainda em toda a parte.
A ancilostomose vitimou 36 pessoas, ou mais 2 do que 1916. Foi iniciada a campanha nos morros, com os recursos próprios da Comissão, que apoiou-se na Brigada contra moscas e mosquitos
para executá-la. Ao mesmo tempo que se fazia o tratamento dos doentes, anteriormente cadastrados, promovia-se a reforma dos prédios, assegurando-se o escoamento dos despejos, a dessecação do solo e a construção de fossas latrinas.
A duração da campanha naquela zona foi calculada em três anos e em fins de 1919 o colega encarregado dos serviços, o dr. Aurélio de Carvalho, apresentará o relatório dos resultados
obtidos. O tratamento tem sido feito com Naphtol B e o aspecto dos moradores e dos locais já é outro, chegando a se conhecer os recém-chegados das zonas infestadas pelo nemátode, contrastantes com o aspecto sadio da quase totalidade dos moradores
antigos, cadastrados e tratados. Os proprietários dos prédios, honra lhes seja feita, têm prestado todos os auxílios à Delegacia de Saúde nesta campanha sanitária, destacando-se os senhores Augusto Marinangeli e M. Ferramenta, cujos prédios e
terrenos têm sido reformados e saneados da melhor maneira.
Terminada a campanha nos morros, em fins de 1919, será iniciada idêntica em Vila Macuco, onde se promove desde já a construção de fossas latrinas em todos os prédios situados fora da
zona servida pelos esgotos. É interessante o fato do público aceitar todos os conselhos, praticar todas as medidas recomendadas pela Sanitária, menos o porte do calçado.
O impaludismo causou 31 óbitos, dos quais 20 determinados por formas agudas da doença. Foram menos 23 mortes do que em 1916 e por certo diminuirão daqui por diante, principalmente na
Ponta da Praia, onde o canal com que contavam em breve, começou a prestar serviços, dessecando grande extensão de terrenos, nas proximidades dos lugares infestados pelo menatosoário.
Ao mesmo tempo, o Código Sanitário Rural, por que nos batíamos desde 1909, sendo realidade, a Delegacia de Saúde ficará armada para providenciar sobre focos de anofelinos, de que venha a
ter conhecimento. A gripe vem em seguida no obituário com 19 casos mortais, ou menos 28 que em 1916; em Santos é em geral doença benigna com que o público facilita, decorrendo daí acidentes com certa freqüência e, pedíamos no relatório de 1917,
conviria que fosse de notificação compulsória.
A coqueluche reinou no inverno, em epidemia extensa, que fez 23 mortes. A sífilis, companheira do alcoolismo, matou 20 pessoas e este fato está pedindo providências para a sua
profilaxia. Além da popularização dos dispensários para os contaminados pelos males venéreos, julgamos que a regulamentação da prostituição, ainda mesmo sob a forma inicial de polícia dos costumes, viria trazer vantagens sociais, porquanto é
repugnante o aspecto de Santos neste capítulo.
Em nenhum país civilizado existem as ruas de Itororó e Martim Afonso e em nenhum outro também se dá o fato anômalo e paradoxal de, nos domingos e dias festivos, fechar-se todo o
comércio, a principiar pelo de gêneros alimentícios, ficando abertos até o dia seguinte os lugares de venda de álcool e os prostíbulos, mais ou menos disfarçados. Naqueles dias, em Santos, ninguém pode trabalhar, adquirir alimentos ou quaisquer
objetos indispensáveis, mas usar álcool isso pode, desde as 6 horas da manhã, até o dia seguinte, porque tais negócios só fecham às 2 e 3 horas.
A febre tifóide, a disenteria e a difteria ocasionaram, respectivamente, 7, 3 e 2 óbitos. Deixamos intencionalmente para o fim o tétano dos recém-nascidos, com 29 óbitos; é doença que
sempre causou estragos de monta em Santos e que não tem diminuído. Será preciso que evoluam usos e costumes arraigados no povo, desaparecendo as legendárias comadres, aparadeiras perigosas, e as parteiras de última hora, desconhecedoras do
mais elementar asseio, propagadoras do mal.
A febre amarela continuou ausente de Santos, que ainda ameaça por existir em vários pontos do Norte do país, com quem temos relações freqüentes. Confiamos, porém, na eficácia da Brigada,
para impedir o desembarque da doença que tantos males causou a esta terra.
A varíola, em três casos estranhos à cidade e ao Estado, produziu 1 óbito. O primeiro bexiguento veio do Rio de Janeiro, entrando para o Isolamento dois dias depois de aqui chegar, à Rua
Conselheiro Nébias; o segundo desembarcou já adoentado do vapor que o trouxe do Rio Grande do Sul, sendo removido do hotel em que se hospedara; o terceiro, tripulante do paquete francês Liger, estava no porto havia três dias. O óbito foi do
segundo doente.
A peste, em caso esporádico, ocorrido em julho, na Rua da Constituição, causou 1 óbito, tendo a doença a forma bubônica, crural. O falecimento deu-se no domicílio, por ser a notificação
tardia, em conseqüência do médico ter sido chamado para ver um agonizante, tratado até então pelo farmacêutico vizinho, que foi punido regularmente. A remoção do cadáver foi realizada com as cautelas devidas, ficando toda a zona, considerada
suspeita, sob severa vigilância sanitária, nada tendo havido entretanto, de anormal, mesmo porque a doença havia sido adquirida no litoral, onde o doente trabalhava.
A Sanitária prosseguiu a sua campanha de sempre contra os ratos, direta e indiretamente, fazendo distribuir freqüentemente veneno pelos armazéns das Docas, vigiando e melhorando as
cocheiras, suprimindo todos os lugares onde aqueles perigosos roedores podem fazer galerias e ninhos e conseqüentemente proliferar.
O policiamento sanitário foi alvo de cuidado diário, fazendo os inspetores 13.656 visitas domiciliares, expedindo 2.552 intimações para melhoramentos, obras e reformas,
fechando 361 prédios por insalubres. Dos trabalhos dos inspetores resultaram 99 construções e reconstruções, 254 reformas regulamentares de prédios viciosos, e melhoramentos em 1.923 irregulares ainda, tendo ficado condenados 68. Em 1917, Santos
continha 8.038 habitações, das quais 443 casebres, alojando a população, calculada, de 95.365 almas, ou, na média, 11 pessoas por moradia.
Contra a varíola foram feitas, na cidade e nos arrabaldes, 4.855 vacinações e 5.083 revacinações, somando ao todo 9.938 imunizações. Os fiscais sanitários, dispensados no fim do ano, em
conseqüência da reforma do Serviço Sanitário, fizeram 39.548 visitas em áreas, pátios, porões, quintais e terrenos. Em S. Vicente foram visitados 4.902 prédios, interditados para reforma 63, construídos 6, reformados regulamentarmente 26,
melhorados 102, tendo ficado fechados 19. Foram feitas 325 vacinações e 125 revacinações contra a varíola.
Em Santos foram desinfetadas e visitadas as 1.525 casas que vagaram e em S. Vicente 78 nas mesmas condições. Ali, como aqui, todos os prédios antes da entrada de novos locatários
sofreram, pelo menos, limpeza geral, além das desinfecções.
Os serviços da Brigada contra moscas e mosquitos foram desenvolvidos na medida do possível, prestando o seu pessoal o melhor auxílio a todos os departamentos da Comissão Sanitária.
Em Santos, foram beneficiados e limpos 272.358 metros de valas, visitados 23.657 terrenos e quintais, enterradas 28.746 vasilhas abandonadas, destruídos 338 focos de larvas de mosquitos,
desfeitos 334 monturos e distribuídos 16 quilos de veneno nos armazéns do cais. Foram visitadas 1.423 cocheiras e estábulos, petrolizadas 22.612 bocas-de-lobo na cidade, 5.307 na faixa do cais e 4.136 caixas de registros de hidrantes neste mesmo
local. Para asseio, roçagens, nivelamentos e aterros de terrenos, foram expedidas 808 intimações e 169 notificações de multas.
Em S. Vicente a Brigada visitou 5.885 terrenos e quintais, beneficiou 275, removeu e enterrou 10.342 vasilhas abandonadas, petrolizou 1.266 bocas-de-lobo, limpou 31.013 metros de valas e
entregou 486 intimações para asseio, limpeza de terrenos e aterros de alagados.
Em Itapema e Bocaina foram visitados 1.559 quintais e terrenos, entregues 256 intimações para asseio, vacinadas 395 e revacinadas 98 pessoas, contra a varíola. Em Cubatão foram visitados
189 terrenos e quintais, vacinadas 22 e revacinadas 32 pessoas. Em Guarujá os terrenos e quintais visitados foram 852, as vacinações feitas 26, as revacinações 37 e as intimações expedidas, para asseio, 52.
O Desinfetório fez o expurgo de 229 habitações de contagiosos, 269 visitas de vigilância sanitária, 35 remoções de contagiosos para o Isolamento e 4 remoções de cadáveres do mesmo
hospital para o cemitério. Além desses serviços, desinfetou 32.682 bocas-de-lobo na cidade e arrabaldes, com soluto de sulfato de ferro e de cobre, desinfetou semanalmente a Cadeia, os postos policiais e o Quartel e diariamente as instalações
sanitárias desses estabelecimentos; fez passar pelas estufas 3.101 objetos contaminados, e incinerou 328, removeu 304 cadáveres do Hospital da S. Casa e 48 de vários pontos da cidade, a pedido das autoridades policiais.
No Hospital de Isolamento estiveram recolhidos 35 doentes, dos quais 3 de varíola, 3 de sarampão, 7 de varicela, 5 de difteria e os demais suspeitos destas e de outras doenças, que não
se confirmaram. Faleceram 1 doente de varíola e 4 de bronco-pneumonia, dos quais 2 diftéricos. Passou para 1918 o tripulante do Liger, entrado com varíola.
Executando o programa traçado no começo do ano, foi iniciada a campanha contra a ancilostomose nos morros S. Bento, Fontana, Pacheco e Penha, lugares onde a doença se havia radicado,
formando focos extensos, infestando a quase totalidade dos moradores, 95% segundo exame clínico.
O dr. Aurélio de Carvalho, encarregado deste serviço, procedeu com o maior método, preferindo despender três anos na cruzada que empreendera, deixando, porém, perfeitamente garantido o
terreno conquistado. Para isso, cadastrou em primeiro lugar o primeiro dos morros, modificando os domicílios, protegendo fontes, estabelecendo sarjetas esgotantes, forçando a construção de fossas, ao mesmo tempo que fazia o tratamento neste setor,
de modo que só passará para adiante depois de executados aqueles trabalhos, coroados pelo exame clínico e microscópico das fezes, dos moradores do setor beneficiado.
Assim, terá de ir o colega de setor em setor, de morro em morro, conquistando terreno com lentidão mas com segurança, deixando sempre a retaguarda protegida contra novas infestações do
nemátode traiçoeiro. Não só o aspecto da população do morro de S. Bento já é outro, como também a mortalidade pela doença vai baixando na região. Aquele colega, dentro de pouco tempo, em trabalho apresentado à Diretoria, tratará do assunto
detalhadamente.
A inspeção das escolas e dos escolares foi realizada com a conveniente regularidade, tendo sido melhoradas diversas instalações em estabelecimentos oficiais e particulares. Freqüentaram
as escolas santistas 7.609 crianças, das quais 2.661 matriculadas nas estaduais, 2.384 nas municipais e 2.524 nas particulares, faltando escolas ainda para cerca de 2.600 pessoas em idade de aprender.
Santos precisa de mais dois grandes grupos escolares, pelo menos, ficando um localizado no centro dos quarteirões da Penha e S. Leopoldo, e outro entre as duas avenidas, perto da praia.
Todas as crianças matriculadas nas escolas estão vacinadas e revacinadas contra a varíola, tendo sido feitas durante o ano 966 vacinações e 315 revacinações.
Com a reforma do Serviço Sanitário, a Comissão Sanitária de Santos foi transformada em Delegacia de Saúde, de 1ª Classe, como as da Capital, ficando com 6 inspetores sanitários e com
atribuições estendidas a todo o litoral, desde Ubatuba até Cananéia.
Em 1917 o número de casamentos registrados no município de Santos foi de 399, tendo sido notados 2.843 nascimentos e 1.533 falecimentos, excluídos os 199 natimortos. Aceitando-se a
população de 100.000 almas, o coeficiente de mortalidade foi de 15,33 por mil, subindo a 16,37 se reduzirmos a população do município a 94.841, conforme os cálculos da Prefeitura local, publicados pela Seção Demógrafo-Sanitária.
"Entrada do parque do Hospital de Isolamento atual"
Foto publicada com esta legenda no livro A Campanha Sanitária...
{1918}
Até meados de outubro de 1918 foi bem satisfatório o estado sanitário de Santos; na segunda quinzena daquele mês, porém, a gripe, que havia surgido no Rio de Janeiro em violenta epidemia,
começou a se desenvolver na nossa cidade, grassando intensamente, em forte rajada, do dia 16 do mês em diante. Desde o dia 15 que a bordo dos navios de guerra Floriano e Carlos Gomes, atracados ao cais, a doença principiara a lavrar,
determinando a vinda de grande número de tripulantes e de oficiais para o Hospital de Isolamento, aparelhado às pressas para aquela superlotação, por ordem do Governo de S. Paulo.
De fato, no dia 18 já estavam no Isolamento uma dúzia de oficiais de marinha e o décuplo de suboficiais, de marinheiros e de soldados navais, quando na cidade o número dos gripados
orçava por dez mil. Benigna a princípio, a doença prosseguiu no seu rápido alastramento, ganhando ao mesmo tempo gravidade maior, com mais de dois mil casos novos por dia, de modo que em meados do terceiro decêndio do mês de outubro, havia com
segurança trinta milheiros de santistas com gripe.
No dia 21, quando todos os serviços da cidade estavam desorganizados, tendo cessado os trabalhos das Docas e das oficinas, providenciando-se para o fechamento das últimas escolas e das
casas de diversões, o número dos óbitos causados pela infecção espanhola foi de 3, subindo a 10 no dia 22, aumentando sempre em cada 24 horas, para chegar a 34 no dia 28, atingindo a culminância com a cifra dolorosa de 61, no último dia do mês.
Felizmente, novembro começou com o decrescimento brusco da morbilidade e da mortalidade, aliás por falta de combustível, quando dois terços da população do município tinham sido
tocados pela epidemia, no curto espaço de três semanas e pouco. Em 14 de novembro o obituário da gripe espanhola havia baixado a 10, igualando o de 22 de outubro, descendo ainda sensivelmente na semana seguinte, para pontuar apenas as estatística
mortuária no fim do mês, indicando que a onda havia passado, causando estragos profundos, mas inevitáveis por quaisquer meios conhecidos.
Por certo, no Município de Santos 80.000 pessoas tiveram a doença, sob todas as suas variadas formas, e chegando a 853 o número de óbitos causados por ela, a mortalidade foi das menores
em cidade de população elevada. É verdade que tivemos apenas uma onda epidêmica, quando na Europa, na Ásia, na Austrália e na América do Norte, houve duas e mesmo três, mas as formas da doença não foram em geral muito graves, não sendo também muito
freqüentes as pneumonias específicas.
Em Santos, como em todas as grandes cidades, foram os quarteirões populares aqueles que mais sofreram com a doença, pagando mais pesado tributo de vidas o Macuco, o Campo Grande e os
morros, principalmente o primeiro destes arrabaldes. Se forem ajuntados, àqueles 853 óbitos causados pela gripe espanhola, o excesso dos decorrentes da tuberculose, em relação ao desta no ano anterior, 61, positivamente influenciados pela epidemia,
teremos o total de 914 óbitos, fornecedor da porcentagem de 1,1%, cifra relativamente baixa e consoladora, comparada com as de outras localidades do Brasil e do estrangeiro.
Lisboa, por exemplo, com seis vezes a população santista, perdeu 9.000 habitantes em cinco semanas, segundo refere o dr. Ricardo Jorge; na Índia inglesa, no primeiro trimestre de 1919, a
gripe matou 5 milhões de pessoas, em 238 milhões de habitantes, ou quase metade dos suprimidos pela peste durante 22 anos.
Assistimos o rápido alastramento da gripe em Santos, a partir de 21 de outubro, quando regressamos gripado também, do Rio de Janeiro, para onde havíamos seguido a 11, representando o
Serviço Sanitário no Congresso Médico. O nosso substituto na Delegacia de Saúde de Santos, o dr. Pereira da Cunha, ao ter conhecimento, no dia 15, dos primeiros casos da doença na cidade, tratou de organizar a defesa local, tomando e aconselhando
as medidas usuais, a começar pela calma. No caso, ele bem pouco podia fazer para evitar o alastramento do mal, como não pudemos nós, em seguida, como ninguém poderia, tratando-se de doença sobre cuja difusão os nossos conhecimentos ainda são
imprecisos.
No Rio de Janeiro houve o que se viu e na Capital deste Estado o Serviço Sanitário, cujos esforços hercúleos, subordinados à alta capacidade do dr. Arthur Neiva, foram levados à extrema
previsão, lutou com a onda epidêmica, sem conseguir desfazê-la afortunadamente. O público ali deixou vazia a metade dos oito mil leitos preparados pela previdência e providência do Serviço Sanitário, preferindo os doentes fazer o tratamento em seus
domicílios, ainda que sofrendo todos os inconvenientes da falta de médicos e de remédios, decorrentes da situação cheia de dificuldades que se atravessava.
Conhecedor dos usos e costumes santistas, tendo assistido ao incêndio do Rio de Janeiro e prevendo a rapidez da onda em marcha, julgamos preferível ir em auxílio da população sofredora,
fornecendo-lhe recursos levados aos domicílios, ao invés de começar a montagem de hospitais, cujo funcionamento chegaria tarde e pouca gente atenderiam.
Os fatos vieram confirmar as nossas previsões, porquanto no Hospital da Santa Casa de Misericórdia de Santos entraram 740 doentes de 14 a 31 de outubro e 682 durante o mês de novembro;
que nove décimos deles fossem de gripe, e sejam somados aos que estiveram em tratamento nas enfermarias provisórias, instaladas pela mesma Irmandade, com auxílio da Associação Comercial e nas da Beneficência Portuguesa, ainda assim não excederá
muito de duas mil, o número das pessoas daquele modo socorridas. A própria sala do Banco da Santa Casa teve o número dos consultantes diminuído durante a epidemia; tendo sido 2.279 consultantes em setembro, o número deles subiu apenas a 2.805 em
setembro (N.E.: SIC - deve ser entendido aqui o mês de outubro), baixando a 1.905 em novembro, para ascender a 2.605 em dezembro.
Enquanto completávamos o armazenamento dos recursos de remédios para distribuição, fazíamos prosseguir o expurgo dos grandes focos de gripe, a começar pelos navios fornecedores de
doentes em massa, e distribuíamos, pelos lugares mais flagelados, os colegas disponíveis.
A 23 de outubro, metade do nosso pessoal subalterno estava doente, quer do Desinfetório quer do Isolamento, o mesmo sucedendo em todas as repartições públicas de Santos. Tínhamos dois
colegas gravemente tocados pela gripe, os doutores Aurélio de Carvalho e Guedes Coelho, adoecendo pouco depois, ainda que mais levemente, o dr. Horácio Brandão. O dr. Antonio Ribeiro ficou encarregado das desinfecções dos navios de guerra,
rigorosamente beneficiados com o pulverizador a vapor, e, à tarde, dum posto médico na Companhia Tecelagem Santista, onde pela manhã trabalhava o dr. Pereira da Cunha.
O dr. Martins Fontes dirigia de manhã o posto médico do Campo Grande e depois socorria o Macuco, auxiliando a Sociedade Beneficente dos Empregados da Cia. Docas, que muito fez pela
população daquele bairro; o dr. Ulysses Barbuda, contratado pela Delegacia de Saúde, auxiliava o dr. Fontes no Campo Grande e no Macuco, revezando-se com ele no serviço da clínica exaustiva em zonas de habitações disseminadas. O delegado de Saúde
superintendia os serviços dos vários departamentos da repartição, e dirigia o serviço médico do Isolamento, auxiliado pelo dr. Horacio Brandão nos primeiros dias.
Logo no dia 24 a gripe explodiu em S. Vicente e começamos a fornecer ao prefeito, sr. João Bensdorp, os necessários recursos de remédios e de material, para montagem de duas enfermarias,
de que ficou encarregado e onde trabalhou com a maior dedicação o dr. Cajado de Lemos, apesar da sua avançada idade.
Para S. Vicente foi, em seguida ao seu restabelecimento, o dr. Horácio Brandão, que desde o dia 28 ficou também responsável pela direção da enfermaria, criada no Cubatão com auxílios
fornecidos pela Delegacia de Saúde e onde foi tratada uma centena de pessoas, residentes em sítios afastados. Crescendo ainda os estragos da gripe em S. Vicente, para lá seguiu também, no fim do mês, o dr. Lyra Porto, vindo de S. Paulo para nos
auxiliar, ficando ali com a direção do posto médico e as visitas aos enfermos pobres, trabalhando até o fim da epidemia.
A 22 de outubro o Hospital de Isolamento recebeu a honrosa visita dos excelentíssimos senhores doutores Altino Arantes, presidente do Estado, e Oscar Rodrigues Alves, secretário do
Interior, acompanhados do digno prefeito municipal de Santos, o sr. coronel Montenegro, e de alguns vereadores, os quais percorreram detalhadamente todas as dependências hospitalares, verificando a lotação dobrada das enfermarias, reinando,
entretanto, asseio rigoroso, conforto consolador e boa ordem irrepreensível por toda a parte, conforme impressão que no momento expenderam.
Tiveram ocasião também de verificar que, em pavilhão à parte, estavam reservados 16 leitos não só para contagiosos de outras doenças que pudessem aparecer, como para médicos, estudantes
e outros auxiliares em campanha contra a gripe e que, estranhos à cidade, não dispusessem de recursos para tratamento em domicílio. Daí a quatro dias estes leitos aproveitaram a cinco estudantes de medicina, que estavam trabalhando na Santa Casa,
onde adquiriram a gripe; felizmente restabelecidos, deixaram o nosso hospital, uma dúzia de dias depois.
A 24 de outubro a gripe tinha perturbado toda a vida de Santos, sendo quase impossível obter-se pessoal para qualquer serviço; visitamos nesse dia o Hospital da Santa Casa de Santos,
onde eram internados numerosos doentes, dando-se perigoso acúmulo de todas as formas da doença em todas as dependências do estabelecimento.
Ao seu administrador, nosso companheiro na visita oficial, oferecemos os recursos de que pudéssemos dispor na difícil emergência, e chegando-nos de S. Paulo, no dia seguinte, o dr. Cata
Preta, apresentamos este colega ao dr. diretor da Santa Casa para auxiliá-lo, oferta não aceita em virtude de estar completo o quadro dos profissionais, com a chegada dos estudantes da Faculdade de Medicina Paulista.
Foi então o dr. Cata Preta trabalhar, com outro colega vindo também de S. Paulo, o dr. Ugolino Penteado, na Cruz Vermelha Santista, cujo posto médico e centro de socorros a gripados
tinha sido aberto em 19 de outubro, prestando desde aí relevantes serviços à pobreza local. Mais dois médicos da Delegacia de Saúde serviam o público necessitado e em seguida a eles se juntaram, também, na Cruz Vermelha, o dr. Aurélio de Carvalho,
apenas restabelecido, e o dr. delegado de Saúde que o substituía nas suas ausências, quando fora da cidade, em campanha contra a doença.
Quando a 25 de outubro começamos, com pessoal auxiliar, bisonho e reduzido, a distribuição de remédios à pobreza, nos seus domicílios, encontramos percorrendo a mesma estrada o prefeito
municipal coronel Joaquim Montenegro, que dispunha de farto recurso de mensageiros inteligentes e dedicados, mas que estava pouco provido dos remédios que nos sobravam. Naturalmente nos unimos, e de mãos dadas com outro companheiro da mesma
jornada, a Cruz Vermelha Santista, prosseguimos na execução do programa salvador de muitos milheiros de pessoas.
Tinha o coronel Montenegro à sua disposição os bravos e humanitários moços do Tiro Naval, contava a Cruz Vermelha com os seus colegas do Tiro 11; não sabemos, no concurso de dedicações
que foi toda aquela campanha altruística, a qual dos Tiros locais, inclusive o 598, dos rapazes da Cia. Docas, coube a primazia de esforços e de abnegação. Santos deve ao coronel Montenegro e àqueles moços relevantes serviços; foram eles os
salvadores de situações desesperadas, ligando os centros fornecedores de recursos, levando remédios e alimentos até os pontos os mais afastados, a todas as horas, com qualquer tempo. Um daqueles bravos caiu vítima da gripe, foi o cabo Adalberto
Laranja, do Tiro 11, sendo ato de mera justiça relembrarmos o nome daquele patriota, ao mesmo tempo que o do dr. Alamir Martins, jovem e humanitário clínico, também vítima da epidemia.
Os voluntários dos tiros santista distribuíram pelos domicílios dos doentes, nos lugares os mais afastados, cerca de doze quilos de comprimidos de quinina, alguns de aspirina, em
cápsulas e comprimidos, quase quatrocentos de xaropes peitorais, e mais de vinte mil doses de outros medicamentos adequados ao tratamento da doença, além de vários milhares de fórmulas prescritas pelos médicos visitadores, e aviadas na farmácia do
Hospital de Isolamento, de 25 de outubro a 15 de novembro.
Foi graças à dedicação e ao esforço dos farmacêuticos do mesmo Hospital, senhores Aristóteles de Menezes, e Sebastião Fernandes, do seu administrador João Costa e do farmacêutico civil
sr. Alfredo Leal, em cujo laboratório elevada quantidade de remédios foi adquirida, ou dosada, dividida e empacotada, que a Delegacia de Saúde pôde em tão curto espaço de tempo, sem ruído, sem interrupção, armazenar e dispor dos referidos recursos,
em época tão difícil.
Saindo curados do Hospital do Isolamento, em 31 de outubro, vários pelotões de marinheiros, fizemos desinfetar, limpar e aparelhar regulamentarmente duas enfermarias, disponíveis então,
para receber civis que necessitassem de hospitalização, portadores de casos graves da doença, ainda reinante.
Lutando ainda com dificuldades de pessoal, pois os próprios jardineiros e serventes estavam arvorados em auxiliares de enfermarias, começamos a receber novos doentes em 3 de novembro,
chegando o número deles a 50 até o dia 11. Durante o tempo da epidemia, de 18 de outubro a 11 de novembro, o nosso hospital recebeu 221 gripados, dos quais 160 militares. Faleceram 6 militares, marinheiros e navais, e 3 civis.
Em 10 de novembro foi iniciado o expurgo, com o pulverizador a vapor, de todas as escolas e lugares tendo servido para alojar doentes, assim como das casas de diversões e outras
freqüentadas pelo público. Ao mesmo tempo eram desinfetados os domicílios onde haviam ocorrido casos de óbitos, de formas pneumônicas da gripe, serviços terminados antes do fim do mês.
Fora de Santos, a Delegacia de Saúde socorreu numerosas localidades, além das referidas já. O dr. Aurélio de Carvalho, logo após o seu restabelecimento, percorreu, com voluntários do
Tiro Naval, as margens do canal da Bertioga, a Bertioga e os núcleos de povoação aos lados da linha da estrada de ferro inglesa, desde o Cubatão até o Alto da Serra, visitando doentes e distribuindo remédios.
O dr. Martins Fontes seguiu para Iguape, com pessoal adequado e recursos fartos, montando ali serviços hospitalares, socorrendo a população, com remédios e gêneros; o dr. Almeida Couto,
contratado pela Delegacia de Saúde, amparou no mesmo modo as populações de Juquiá e de Prainha, onde também esteve o delegado de Saúde. Para Xiririca partiu em princípio de dezembro o dr. Aurélio de Carvalho, e para Itanhaém, Peruíbe, Itariri,
Ana Dias e outros pontos marginais da estrada de ferro Sul de S. Paulo, foram remetidos recursos vários. Para S. Sebastião, a princípio, foram mandados medicamentos, e logo que o dr. Guedes Coelho se restabeleceu foi para lá comissionado,
estendendo os seus serviços a Vila Bela, a Caraguatatuba e a Ubatuba.
No começo de dezembro a situação estava perfeitamente normalizada em Santos, S. Vicente, e na maioria das localidades subordinadas à Delegacia de Saúde, e se o Estado de S. Paulo não
regateou recursos de toda a ordem à população desta, como de outras zonas do seu território, aqueles a quem os vinha confiando corresponderam à expectativa.
As semanas durante as quais a gripe espanhola aqui explodiu, lavrou, devastou e desapareceu, foram de dura provação, provocando honroso movimento de solidariedade em todas as classes
sociais, destacando-se o comércio santista, pela liberalidade com que atendeu às necessidades dos desprotegidos da fortuna. Houve, entretanto, no meio de tantas preocupações, notas dissonantes, de humorismo, quais as acusações à Delegacia de Saúde
de não ter impedido a explosão e disseminação da gripe, de não ter, para combatê-la, queimado piche e alcatrão nas ruas, petrolizando valas, ou deitado creolina nos bueiros e bocas-de-lobo, ou descoberto qualquer outro meio específico, para livrar
Santos de tal flagelo.
Interrompido durante a epidemia gripal, o policiamento sanitário da cidade e seus arrabaldes prosseguiu até o fim do ano com cuidado costumeiro, tendo os inspetores sanitários feito
11.775 visitas domiciliares, expedindo 2.966 intimações para reformas e melhoramentos completivos. Deste trabalho resultaram 288 construções e reconstruções, e 170 reformas regulamentares, ficando todos aqueles prédios dotados de rede e de
instalação de esgotos modelares.
Foram inspecionadas, depois da desinfecção regulamentar, as 1.364 casas que se esvaziaram durante o ano, e todas sofreram, pelo menos, limpeza geral antes da entrada de novos locatários.
As vacinações contra a varíola atingiram o número de 4.843 e as revacinações 2.876; este serviço básico preocupou sempre os inspetores sanitários, dada a exposição da cidade aos assaltos da doença, que lavra nos portos do Norte e do Sul da
República, principalmente no inverno, quando Santos recebe numerosos forasteiros.
As habitações coletivas viciosas e os últimos cortiços foram alvo de atenção contínua; muitos foram suprimidos pela construção de novos prédios nos arrabaldes, em zonas desafogadas. A
ação da Delegacia de Saúde foi até os morros, onde numerosas moradias sofreram reformas e melhoramentos, desaparecendo cocheiras irregulares, principalmente estábulos, e pocilgas contaminadoras de mananciais.
Pedimos à Municipalidade o arruamento dos morros do Fontana e de S. Bento, a fim de se completar o abastecimento deles por água canalizada, e ser terminada a instalação de fossas para
combater a ancilostomose. Premiando o esforço do colega dr. Aurélio de Carvalho, o aspecto da população do morro de S. Bento já é outro, contrastando com o de tempos passados.
No Campo Grande, a campanha contra a opilação ficou a cargo do Serviço de Profilaxia Geral, e no Macuco o inspetor do distrito, dr. Horácio Brandão, prossegue na faina de promover a
instalação de fossas em todas as habitações, preparando o terreno para a futura cruzada nesta zona de Santos. Assim, dentro de pouco tempo a ancilostomose desaparecerá do obituário local.
Do centro da cidade já saíram as cocheiras, continuando-se a correção das irregulares, existentes nos arrabaldes onde a população começa a ficar densa. Apesar dos tempos difíceis
atravessados, foram fechadas 15, reconstruídas 6, ficando as demais, ainda irregulares, com prazo definitivo para reforma regulamentar ou remoção.
Um mau capítulo sanitário de Santos é o dos estábulos; situados quase todos nas zonas extremas dos arrabaldes, em lugares distantes e despovoados, são de difícil fiscalização, e todos
precisam de reformas radicais. Fornecemos à Prefeitura Municipal, a quem está subordinado o comércio do leite, a lista daqueles estábulos irregulares, pedindo o não licenciamento deles para o ano de 1919, e contamos até 1920 obter a solução
definitiva do problema, que tanta ligação tem com a saúde pública.
Os lugares onde o leite é manipulado e exposto à venda, assim como o serviço de distribuição deste alimento, vêm sendo fiscalizados pela Delegacia de Saúde e muito se tem obtido para
regularização do assunto. O tipo dos carros de venda e de entrega do leite é aprovado pela Prefeitura, e o material é mantido limpo.
As casas de negócio e de preparo dos gêneros alimentícios, padarias, confeitarias, restaurantes, botequins, cafés etc., estão na quase totalidade aparelhadas regulamentarmente, desde o
centro urbano aos arrabaldes, e sofrem periódica fiscalização. Os hotéis, casas de pensão e casas de alugar quartos vão sendo adaptados às disposições mais detalhadas do Código Sanitário; as fábricas e oficinas, em geral, além do aparelhamento
regulamentar, têm os maquinismos protegidos na quase totalidade, e um ou outro recalcitrante vai sendo obrigado a cumprir a lei. Os trabalhadores e operários estão revacinados contra a varíola.
A inspeção e fiscalização das escolas públicas e particulares continuou a cargo do dr. Pereira da Cunha, e foi regulamentarmente feita, melhorando-se todas, reformando-se muitas delas e
fechando-se sete, por impropriedade de local. As sete mil e tantas crianças, freqüentadoras das escolas santistas, estão vacinadas, ou revacinadas contra a varíola, imunizando-se 117, em que as cicatrizes eram duvidosas. Devido à epidemia de gripe
espanhola, os trabalhos escolares cessaram em outubro, sendo de meados de novembro em diante desinfetados todos os prédios escolares, oficiais ou particulares, quer do centro urbano, quer dos arrabaldes.
O serviço da Delegacia continuou levado a S. Vicente, onde foram feitas 2.850 visitas domiciliares, produzindo a reforma de 16 prédios, a reconstrução de 10 e melhoramentos em 90. As
casas que se esvaziaram, em número de 80, foram desinfetadas e limpas, antes da entrada de novos inquilinos, tendo sido rigorosamente beneficiadas 4 moradias de tuberculosos falecidos. Contra a varíola, foram feitas 259 vacinações e 103
revacinações. Fora de Santos foram ainda vacinadas, em Cubatão, 182 pessoas e revacinadas 27; em Guarujá 49 vacinadas e 40 revacinadas; em Itapema 115 vacinadas e 27 revacinadas.
O Desinfetório teve serviços excessivos em virtude da epidemia de gripe; o seu pessoal, apesar de doente e reduzido a menos de metade em certo momento, trabalhou com a maior dedicação,
dia e noite, principalmente fazendo a remoção dos cadáveres dos hospitais da S. Casa, da pobreza e dos requisitados pela polícia. Dos 689 cadáveres, durante o ano transportados para o cemitério, cerca de dois terços foram removidos durante as
semanas da gripe, de 25 de outubro a 15 de novembro.
Além dos serviços ordinários, foram feitas mais 179 desinfecções por tuberculose e 203 por gripe epidêmica, bronco-pneumônica, e as desinfecções em todas as escolas, enfermarias,
fábricas, oficinas, casas de diversões etc., requisitadas pela Delegacia de Saúde, e quase todas com o pulverizador a vapor. Pelas estufas passaram 12.553 peças de roupa, montando-se 160 câmaras de formol e 21 de enxofre.
Estiveram no Hospital de Isolamento 280 doentes, sendo 2 de varíola, estranhos a Santos, 8 de difteria, ou suspeitos dela, 1 suspeito de escarlatina, 2 de sarampão, 1 de septicemia, 1 de
febre tifóide, 3 de bronco-pneumonia infantil, 42 marinheiros com beribéri e os demais de gripe, marinheiros, civis e empregados da Delegacia de Saúde. Faleceram 9 de gripe, 1 de febre tifóide, 2 de bronco-pneumonia, 1 de difteria, 1 de nefrite
aguda, 1 de septicemia, 1 de infecção intestinal. Em domicílio faleceu 1 diftérico, isolado.
A gripe causou 853 óbitos no município de Santos e aumentou a mortalidade da tuberculose, que subiu a 291, contra 252 em 1917. A peste não figura no obituário santista, em cujo
território nenhum caso surgiu; dois variolosos desembarcaram na cidade, mas removidos logo para o Isolamento, nenhum mal chegaram a fazer à sua população, aliás bem vacinada já. O sarampão e a coqueluche reinaram durante o inverno, causando cada
uma das doenças 5 mortes, sendo 3 as decorrentes da difteria, todas por bronco-pneumonia.
O impaludismo, que lavrou ainda nas zonas rurais e na Ponta da Praia, foi causa de 11 falecimentos e a disenteria, o tétano e os cancros, o foram, respectivamente, de 7, 10 e 55. A febre
tifóide causou 2 mortes e a ancilostomose 35; esta doença está exigindo o desenvolvimento da campanha contra o nematode devastador, coisa que tem sido tomada em consideração, desde o Campo Grande, até os morros.
Por causa dos 853 óbitos da gripe, a mortalidade do ano, em Santos, subiu a 2.607, elevando o coeficiente mortuário a 26 por mil, cifra havia muito tempo não atingida; felizmente, a
natalidade manteve-se elevada, acima de 30 por mil, de sorte que dentro de pouco Santos se restabelecerá do duro golpe que sofreu. O número de casamentos registrados foi de 311.
A Brigada contra mosquitos e moscas trabalhou não só na cidade e arrabaldes, como em zonas mais afastadas, fazendo 49.352 visitas a terrenos, chácaras, quintais e áreas, limpando e
roçando 320 terrenos, com 156.400 metros quadrados, removendo 11.780 vasilhas abandonadas, destruindo 276 monturos e 272 focos de larvas de mosquitos. Limpou e nivelou 180 quilômetros de valas, valetas e 825 metros de braços de rios; abriu 144
fossas latrinas em terrenos ocupados por população pobre, que foi intimada a completá-las, e aterrou 64 alagados e 8 poços irregulares. Petrolizou 171 vasos funerários nos cemitérios, 65.655 bocas-de-lobo e 2.468 registros e bacias de hidrantes no
cais das Docas. Fez 1.083 visitas a cocheiras e estábulos, fechou 15 irregulares e entregou 342 intimações para construção de fossas latrinas e 2.237 para limpeza e asseio de terrenos e chácaras.
Em S. Vicente fez 2.850 visitas, em terrenos e quintais, beneficiou 229, enterrou 2.034 recipientes abandonados, petrolizou 738 bocas-de-lobo, destruiu 24 focos de mosquitos, fez 229
visitas a cocheiras e estábulos, fechou 2 irregulares e limpou 9.390 metros de valas e riachos.
Na Bocaina visitou 859 terrenos e quintais e entregou 149 intimações para asseio e construção de fossas; em Guarujá as visitas foram 661 e as intimações, também para asseio e fossas,
foram 34; em Cubatão 330 quintais e terrenos foram visitados e 97 intimações para asseio e fossas foram entregues.
Durante a segunda quinzena de outubro e a primeira de novembro, os serviços da Brigada estiveram desorganizados em virtude da epidemia de gripe, e o pessoal foi aproveitado para auxiliar
o Desinfetório e a Cocheira, assim como para reforçar os empregados externos do Isolamento, desfalcados pela doença. A esses modestos trabalhadores da Brigada muito deveu a Delegacia de Saúde, para poder realizar o seu programa.
"Vista do parque do Hospital de Isolamento"
Foto publicada com esta legenda no livro A Campanha Sanitária...
{1919}
Bem satisfatórias têm sido as condições sanitárias de Santos, durante os nove meses vencidos do ano corrente de 1919, e ninguém pode contestar que a sua população se eleva presentemente à
cifra de cem mil almas. Assim sendo, o coeficiente da mortalidade geral santista, durante o período referido, é de 11,05 por mil, em que foram registrados 1.105 óbitos, inclusive 170 causados pela tuberculose, influenciados muitos, ainda, pela
gripe reinante em 1918. A gripe matou de janeiro a 30 de setembro 30 pessoas, mostrando que ela não criou raízes em Santos, quando ainda figura com cifra muito mais elevada em outros centros populosos do Estado.
Refeito completamente do golpe que sofreu no ano passado, Santos retomou o impulso anterior, e o seu crescimento progride, aumentando a sua população, crescendo o número das edificações,
intensificando-se a vida urbana, tendo sido freqüentadas as suas praias por muitos milhares de forasteiros, na estação hibernal já passada.
O sarampão e a coqueluche não figuram até agora no obituário local, e dois casos de escarlatina, ocorridos em agosto, em crianças, não tiveram seqüência, não se manifestando a doença em
outros prédios, vizinhos ou não. A febre tifóide forneceu 2 óbitos até fim de setembro, tendo a difteria causado 2, o tétano dos recém-nascidos 15, o impaludismo 10 e os cancros duas dúzias.
Apesar da campanha movida contra ela, no Campo Grande, nos morros e em outros arrabaldes, a ancilostomose matou 16 pessoas até 5 de outubro, até quando também a lepra e a sífilis
vitimaram, respectivamente, 3 e 9. A varíola forneceu 1 caso ao obituário, mas não foi da cidade ou do município o doente, removido de bordo do cruzador Barroso, que teve logo a sua guarnição vacinada e revacinada. Um outro bexiguento
restabeleceu-se no Isolamento, para onde veio da Santa Casa, onde estava em tratamento, sendo marinheiro de vapor mercante. O cruzador Deodoro forneceu-nos 1 caso de variolóide e uma dúzia de varicela; vacinada também toda a guarnição, a
doença não se repetiu.
Em 25 de agosto a Delegacia de Saúde recebeu notificação dum caso suspeito de peste, num hotel do centro urbano; era passageiro desembarcado na véspera do vapor italiano Tomaso de
Savoia, vindo da Europa via Dakar. Removido o doente para o Isolamento, confirmou-se a doença, de forma septicêmica, falecendo ele quatro dias depois. Tomadas todas as medidas regulamentares, desde o isolamento no nosso hospital, para
observação, das pessoas que acompanhavam o doente, até a vigilância rigorosa do hotel, nada de anormal sucedeu depois, preocupando-se a Delegacia, como sempre, com a profilaxia da peste em toda a cidade, fazendo guerra contínua aos ratos, por todos
os meios diretos e indiretos, ao seu alcance.
A impermeabilização do solo dos armazéns, das áreas e dos porões já é geral em Santos e as cocheiras, removidas todas do centro urbano, são alvo de especial vigilância, reformando-se as
que ainda são irregulares. Esta remodelação das cocheiras estaria terminada, sem a guerra que durante quase cinco anos perturbou profundamente a vida santista, fazendo escassear recursos e mesmo materiais de construção. Os estábulos são aqui muito
piores do que as cocheiras, e, de acordo com a Prefeitura, estão sendo alvo de medidas severas para remodelação completa ou fechamento. Este ano cerca de três dúzias deles, dos piores, não foram licenciados já e para o ano o seu número aumentará.
O policiamento sanitário da cidade e de seus arrabaldes tem sido executado com o mesmo escrúpulo de sempre, elevando-se a 10.157 o número das visitas domiciliares, até 30 de setembro.
Deste trabalho resultaram 94 construções e reconstruções, 181 reformas regulamentares e melhoramentos em 388 prédios, tendo sido fechadas 93 por insalubres, e expedidas 2.026 intimações para obras. As 844 casas de aluguel que se esvaziaram foram
desinfetadas e visitadas pelos inspetores sanitários, e só voltaram a ser habitadas depois de limpeza geral, recebendo melhoramentos, reparos ou reformas, as que necessitavam deles. Foram vacinadas contra a varíola 2.975 pessoas e revacinadas
4.206.
As escolas, assim como os escolares, mereceram a atenção constante do colega encarregado deste grupo sanitário; foram visitadas 154, em que várias falhas foram corrigidas, inclusive as
decorrentes de falta de vacinação e de revacinação, evidentes, contra a varíola. O desdobramento do Grupo Escolar Cesário Bastos veio permitir a matrícula de mais 600 crianças nas aulas, mas ainda se torna necessária a criação de dois grandes
grupos escolares em Santos, em zonas já referidas, porquanto ainda há duas mil crianças em idade escolar, à espera de classes para freqüentar.
Em S. Vicente, a Delegacia de Saúde fez 1.685 visitas domiciliares, fechando 11 prédios insalubres, desinfetando 94 que se esvaziaram. Expediu 82 intimações para obras, obtendo 4
reconstruções e 9 reformas regulamentares, além de limpeza e melhoramentos em todos os prédios desinfetados. Foram ali vacinadas contra a varíola 93 crianças e revacinados 153 adultos.
O Desinfetório de Santos removeu 54 contagiosos para o Hospital de Isolamento, desinfetou 161 domicílios de contagiosos, inclusive 126 de tuberculose, fez 102 visitas de vigilância
sanitária, montou 3 isolamentos domiciliares, beneficiou 850 casas que se esvaziaram, desinfetou diariamente as instalações sanitárias da Cadeia, dos postos policiais e outros edifícios públicos, e desinfetou 2.835 bocas-de-lobo. Foram passadas
pela estufa 2.168 peças de roupa e 398 pelas câmaras de formol. Da Santa Casa de Misericórdia removeu 228 cadáveres, do Hospital de Isolamento 5, e de vários pontos da cidade 35, a pedido de autoridades policiais.
Até 15 de julho, quando passou a trabalhar sob a direção da Inspetoria de Profilaxia, a Brigada contra mosquitos e moscas, até então dependente da Delegacia de Saúde, fez os seguintes
serviços: visitas em áreas, quintais, terrenos e chácaras, 29.653; visitas em cocheiras e estábulos, 826; recipientes abandonados, enterrados 3.952; monturos desfeitos e enterrados 127; focos de larvas de mosquitos, destruídos 554; ralos, bueiros e
bocas-de-lobo petrolizados, 66.659; bacias de hidrantes, petrolizadas, 1.827; valas e valetas limpas e niveladas, 189.672 metros; valas e valetas abertas, 2.383 metros; pantanais aterrados, 19 com 10.000 metros quadrados; terrenos roçados 198;
vasos petrolizados, nos cemitérios, 4.112; intimações expedidas 1.397; avisos de multas, expedidos, 242.
No mesmo período, a Brigada visitou em S. Vicente, 1.517 terrenos e quintais, roçou 195 terrenos baldios, limpou 2.900 metros de valas, enterrou 1.029 vasilhas abandonadas, visitou 291
cocheiras e estábulos, petrolizou 780 bocas-de-lobo e expediu 113 intimações.
Na Bocaina, visitou 456 terrenos e quintais, vacinou contra a varíola 23, e revacinou 16 pessoas. Em Guarujá visitou 693 terrenos, limpou 254 metros de valas, petrolizou 29 bocas-de-lobo
e visitou 12 cocheiras. Em Itapema visitou 92 terrenos e quintais e em Cubatão visitou 220 terrenos, vacinou 25 e revacinou 42 pessoas contra a varíola. Nestes arrabaldes foram feitas 342 intimações para a construção de fossas latrinas, ficando
quase concluídas as de Cubatão e Bocaina.
No Hospital de Isolamento estiveram em tratamento 54 doentes, dos quais 12 de sarampão, 12 de varicela, 13 de gripe, 6 de difteria, 2 de varíola, 2 de variolóide, 1 de peste, além de 4
suspeitos de difteria e 2 de escarlatina, em que as doenças não se confirmaram.
Todos os edifícios, dependências e aparelhos da Delegacia estão conservados com cuidado e constam da sede da Delegacia de Saúde, no centro da cidade, na Rua S. Antonio 40, do
Desinfetório, dispondo de cocheira e depósito de material sanitário e do Hospital de Isolamento.
A sede da Delegacia é edifício próprio, mobiliado e aparelhado convenientemente, onde os inspetores sanitários fazem plantão diário, das 8 às 18 horas, atendendo o expediente. O
Desinfetório, com as dependências referidas, está na Rua Luiza Macuco, instalado também em edifício próprio e construído em 1913. Dispõe de 2 estufas fixas, grande modelo de câmaras para formol e enxofre, de pulverizadores a vapor e de aparelhos de
Clayton, além dos carros para transporte de desinfetadores, para remoção de doentes contagiosos e de objetos contaminados, assim como para conseqüente entrega de material desinfetado. Depois das 21 horas os serviços são atendidos pelo Desinfetório,
diretamente.
O Hospital de Isolamento foi construído em 1913 na Rua Oswaldo Cruz, antigo Caminho Velho da Barra, ocupando vasto parque arborizado e ajardinado, onde existem seis pavilhões, dos quais
três para contagiosos confirmados e um para doentes em observação. Dispõe de 80 leitos, dos quais 20 em quartos individuais e os restantes em pequenas enfermarias de 6 camas. Todos os compartimentos dos vários pavilhões são rigorosamente
aparelhados, com móveis metálicos, solo, paredes e forros impermeabilizados, tendo ângulos arredondados.
As janelas de todos os pavilhões são providas de venezianas e de telas metálicas, móveis, garantindo a defesa contra as moscas e os mosquitos, aliás muito raros no estabelecimento, que
dispõe também de farmácia, de lavanderia e de desinfetório regulamentares, além de necrotério afastado e discretamente situado no fundo do parque. É um estabelecimento modelar, sob o ponto de vista sanitário, e julgamos que não tem igual em terras
brasileiras.
A conservação de todas as dependências do Isolamento é feita com o maior capricho, funcionando os seus vários departamentos com a regularidade indispensável para a consecução do programa
sanitário em vista. E o público de Santos bem reconhece o fato, tendo cessado a antiga repulsa para a entrada no Isolamento, procurado hoje de boa vontade, mesmo pelas classes as menos educadas.
"Vista do parque do Hospital de Isolamento"
Detalhes de foto publicada com esta legenda no livro A Campanha Sanitária...
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