Dr.Guilherme Álvaro
V - 1892-1900
Começou muito mal o ano de 1892, em que a cidade ia ser devastada pela febre amarela e pela varíola, evoluindo as duas doenças quase ao mesmo tempo, com grandes explosões mortíferas.
Em janeiro a febre amarela, que vinha grassando desde o ano anterior, assolou toda a cidade, fazendo para mais de 608 vítimas, tendo a varíola nesse mesmo mês causado 33. Premida pelas
circunstâncias, a Municipalidade pediu auxílios ao Governo do Estado, reorganizou o seu serviço de higiene, dividindo a cidade em seis distritos, a cargo de outros tantos médicos encarregados do policiamento sanitário; abriu enfermarias nos
mosteiros do Carmo e de S. Bento e criou um lazareto para variolosos no Pae Cará, em frente à cidade, do outro lado do porto, na ilha de S. Amaro.
Em fevereiro, quando se clamava pela inauguração do novo Cemitério da Filosofia, a febre amarela causou mais de 400 óbitos, tendo a varíola causado 32. Em março diminuíram as vítimas das
duas doenças, que ainda assim produziram, a febre 252 e a varíola 29, tendo sido dispensados os médicos, sob o pretexto de que haviam melhorado as condições sanitárias locais. Em abril, maio e junho, a varíola e a febre amarela fizeram,
respectivamente, 168 e 29, 107 e 33, 57 e 73 vítimas, rompendo com violência a varíola que, em julho, agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro, causou sucessivamente 114, 131, 163, 90, 54 e 63 mortes.
A febre amarela em julho ainda suprimiu 20 vidas, em agosto 7 e em setembro 4; em outubro a doença aumentou com a mortalidade de 21 pessoas, subindo a 41 em novembro e 53 em dezembro.
Assim, durante o ano faleceram de febre amarela, em Santos, 1.742 pessoas e de varíola 823.
Reconhecendo que a cidade precisava de cuidados, a Câmara Municipal tentou durante o ano, por várias vezes, abordar o problema do saneamento local, mas nota-se que tudo se fazia sem
programa, sem orientação segura, tomando-se uma resolução às vezes radical, para se voltar atrás logo em seguida; decretava-se uma medida, para ser revogada pouco depois tal resolução. Foram condenadas várias cocheiras e todas intimadas para saírem
da cidade, intimação revogada depois; foram de novo proibidos os cortiços, tendo sido alguns fechados, mas a maioria permaneceu, para só mais tarde serem desfeitos os piores.
A única medida salutar que permaneceu foi, além da encampação do contrato da limpeza pública, melhorada de junho em diante, a organização do serviço de remoção de contagiosos, em
outubro, com material exclusivamente destinado a esse fim.
A mortalidade pelas outras doenças transmissíveis foi a seguinte: de tuberculose 130 óbitos, de impaludismo 66, de tétano dos recém-nascidos 57, de febre tifóide 19, de disenteria 12, de
sarampão 2, de coqueluche 3, de disenteria 3, de cancros 3. O obituário por todas as doenças, em 1892, elevou-se a 4.173 e sendo a população igual à do ano anterior, porquanto para substituir os habitantes desaparecidos chegaram outros imigrantes,
o coeficiente da mortalidade foi de 16,6% (N.E.: no impresso original, a casa decimal foi indicada incorretamente, constando o valor 166%), cifra dolorosa sob qualquer ponto de vista, que
felizmente nunca mais surgiu nas estatísticas locais!
O Estado de S. Paulo estava pagando bem caro, com o seu interior invadido pela febre amarela, o modo de ver estreito por que era encarada a autonomia municipal, decorrente do regime
inaugurado em 15 de novembro de 1889; reconhecendo isso, resolveu fazer por sua conta o indispensável aparelhamento sanitário para a defesa da saúde pública, por todos os lados comprometida.
Em fevereiro de 1892 entrara para a Secretaria do Interior um santista ilustre, o dr. Vicente de Carvalho, que tomou o encargo de organizar o serviço sanitário estadual em novos moldes,
de acordo com a orientação a mais adiantada. Concebido o plano desse serviço, foi enviado à Europa, para comprar o necessário material, o dr. Annibal Lima, vice-diretor da higiene do Estado, e que se desempenhou brilhantemente da incumbência
aceita.
Por outro lado, o Governo do Estado pensou nos nomes mais ilustres para dirigir as novas seções do seu serviço de saúde, sendo Pasteur instado para estudar a febre amarela e organizar e
dirigir o Instituto Bacteriológico. Não aceitando o convite, o sábio francês indicou o seu discípulo Le Dantec, que veio para S. Paulo, vindo também para dirigir o laboratório de análises e de bromatologia o professor Lachaud. Para estudar
especialmente o saneamento de Santos foi convidado o engenheiro sanitário americano Fuertes, de Cornwal, que no ano seguinte começou a desempenhar a missão que havia aceitado.
Tendo o dr. Vicente de Carvalho deixado a Secretaria do Interior em setembro de 1892, veio substituí-lo o saudoso dr. Cesário Motta, que montou a Repartição Sanitária, de modo a começar
a prestar serviços sistemáticos no ano seguinte, quer em Santos, quer no interior do Estado, quer na Capital.
"Rua 15 de Novembro em 1903"
Foto publicada com esta legenda no livro A Campanha Sanitária...
{1893}
Ao começar o ano de 1893 Santos via-se a braços com a febre amarela, em continuação à epidemia do ano anterior e só no mês de janeiro a doença vitimou 191 habitantes. Resolveu o Governo do
Estado chamar a si a defesa sanitária da cidade e no mês seguinte chegava a Santos a primeira "Comissão de Desinfecções", que iniciou os seus trabalhos no dia 24, encontrando tudo por se fazer.
O hospital de isolamento do Macuco, o barracão construído no ano anterior pela Municipalidade por conta do Governo Estadual, estava cheio de doentes de febre amarela, estando do mesmo
modo cheios a enfermaria "Almeida Moraes" e a Beneficência Portuguesa. Nos domicílios estavam em tratamento numerosos febrentos e os serviços de remoção de doentes contagiosos eram imperfeitos e insuficientes.
Com muito trabalho e constância, a Comissão do Estado conseguiu numa quinzena a melhoria geral de todos os serviços sanitários locais, que havia chamado a si, sendo instituída a
notificação sistemática dos casos de doenças contagiosas, pelos médicos assistentes dos doentes, a remoção dos contagiosos para os isolamentos e o conseqüente expurgo dos domicílios pelas turmas de desinfectadores, dirigidos pelos inspetores
sanitários.
Ao par destas medidas foi ativada a limpeza pública, assim como a dos terrenos e quintais, com intimações para entupimentos de poços e de fossas latrinas, ainda numerosas então.
Bem se pode calcular as dificuldades, os obstáculos de toda a sorte que surgiram logo, para execução de tais medidas, pela primeira vez postas em prática em terra onde até então leis e
regulamentos sanitários haviam sido letra morta, havendo oposição até às desinfecções domiciliares, consideradas medidas de violência extrema por muita gente.
Em fevereiro, os óbitos por febre amarela subiram a 471, baixando a 358 no mês seguinte, descendo ainda a 258 em abril. Em maio a doença causou mais 260 mortes, em junho 68 e só veio a
cessar em agosto, tendo sido causa de 12 óbitos neste mês e de 24 no de julho. Ao todo faleceram 1.642 pessoas de febre amarela, que começou como de costume pelas tripulações das embarcações fundeadas no porto, devastando-as de tal modo que
necessitaram algumas de marinhagem nova para a viagem de retorno.
A varíola apareceu em fevereiro, com 26 óbitos, reinando até agosto, tendo causado ao todo 59 mortes; ainda este ano a população santista recusava a vacinação que lhe era trazida pelos
médicos da comissão do Estado. Em julho foi começado o expurgo sistemático dos prédios que haviam fornecido doentes contagiosos, fazendo-se o beneficiamento dos aposentos com soluto de sublimado a um por mil e depois o enxoframento farto. Até
dezembro foram feitas 482 dessas desinfecções, das quais 45 determinadas pela varíola, não constando o número dos objetos desinfectados nas estufas já existentes então.
A tuberculose, apesar de passar despercebida, causou 135 óbitos, sendo a seguinte a cifra mortuária das outras doenças transmissíveis: impaludismo 78, febre tifóide 33, tétano dos
recém-nascidos 57, disenteria 45, sarampão 26, coqueluche 3, difteria 1, cancros 3.
A mortalidade geral de Santos em 1893 foi de 3.561, tendo sido registrados 182 casamentos e 1.032 nascimentos. Segundo os estudos do professor Fuertes, Santos contava em
1893 menos de 30.000 habitantes, alojados em 3.234 casas e casebres, incluídos os famigerados cortiços, que davam a nota triste à cidade e, assim sendo, o coeficiente da mortalidade geral subiu a 14,2%, quando o da natalidade era apenas de 3,44%
(N.E.: a versão impressa original apresentava as casas decimais em posição errônea, registrando 142% e 34,4%)!
A crise de transportes devida à insuficiência de material da E. de Ferro, a perturbação de toda a vida da cidade decorrentes, primeiro das epidemias reinantes, e depois da revolta da
esquadra em setembro, determinaram o acúmulo de mercadorias por toda a parte, na pequena faixa do cais então construído, nos trapiches, nos armazéns da alfândega e até nas praias, sujeitos os volumes às depredações dos mais ousados. A
desorganização dos serviços imperava por toda a parte, os salários subiam a preços fabulosos, fazendo-se fortunas com rapidez que assombrava.
"Rua 15 de Novembro em 1908"
Foto publicada com esta legenda no livro A Campanha Sanitária...
{1894}
Tendo sido completada a organização do Serviço Sanitário do Estado em setembro de 1893, em princípio de 1894 a Comissão de Desinfecções foi transformada em Comissão Sanitária, a cargo do
dr. Tolentino Filgueiras, que para Santos viera naquele ano com o dr. Cotrim, chefe dos serviços de desinfecções.
A Comissão Sanitária ficou encarregada da execução de todas as medidas referentes à higiene local, sendo a cidade dividida em distritos, cada um sob a responsabilidade de um inspetor
sanitário. O porto de Santos constituía o 4º distrito sanitário, que compreendia também o litoral da cidade, do Valongo à entrada da barra.
Em janeiro de 1894 chegaram a Santos vapores conduzindo amarelentos; foram fundeados longe do litoral, operando a carga e a descarga em quarentena e os doentes removidos para um hospital
provisório no Itapema, por estar o Isolamento do Macuco servindo de quartel às forças legais defensoras da cidade, e que nele permaneceram até junho.
A princípio foi muito difícil a execução do policiamento sanitário da cidade e arrabaldes, cujos habitantes recebiam mal os médicos, furtando-se, sob todos os pretextos, à franquia das
suas moradias à visita sanitária.
As intimações feitas pelos médicos aos proprietários dos prédios por eles visitados eram freqüentemente extraviadas de caso pensado pelos locatários, e quando aqueles as recebiam pouco
caso faziam, não acreditando que a Comissão Sanitária quisesse ou pudesse fazê-las cumprir, estando todos acostumados desde anos a sofismar, ostensivamente ou não, as determinações dos agentes municipais, sem que disso lhes resultasse punição
qualquer.
Só depois da cobrança executiva das primeiras multas sanitárias é que se reconheceu a decisão dos médicos do Estado de fazer cumprir a lei, surgindo então clamor ruidoso contra o novo
despotismo. Mais uma vez, em nome da autonomia municipal, acusou-se o Governo de atentar contra os direitos do município.
Amparada pelo prestígio que lhe dava o Governo, a Comissão Sanitária prosseguiu na campanha iniciada de promover, logo, o asseio dos prédios, passando em seguida a outras exigências
regulamentares relativas aos vícios de construção, quase todos graves. Só num distrito, em pouco tempo, foram demolidos trinta cortiços, dos feitos de tábuas, cobertos com folhas de Flandres, verdadeiras furnas, onde numerosa população se aninhava
em condições deploráveis.
Pode-se compreender que a miséria faça com que, em certos lugares, as populações se abriguem em locais idênticos aos antigos cortiços de Santos; aqui, porém, os ocupantes de tais
habitações faziam férias diárias sempre superiores a vinte mil réis cada um, que era a média do ganho dum trabalhador naquele tempo. Aqui, os proprietários de tais cortiços não eram aldeões miseráveis cuja única fortuna consistisse em tais
amontoados de tábuas e folhas de zinco, mas capitalistas, argentários desumanos, vivendo em boas chácaras dos arrabaldes, ou na capital do Estado, quando não residiam, já retirados dos negócios, em cidades de além mar.
O corpo médico de Santos não auxiliou nos primeiros tempos, como devia, a Comissão Sanitária, porquanto as notificações das doenças contagiosas eram feitas quase sempre tardiamente e
algumas vezes esquecidas.
O povo santista temia a remoção para os hospitais de isolamento e, mais ainda, as conseqüentes desinfecções, bordando, por isso, legendas (N.E.: SIC - o
autor usa em toda a obra as palavras legendas/legendárias no lugar de lendas/lendárias) desagradáveis a respeito e comumente se pedia ao médico assistente que não notificasse o fato à Sanitária, comprometendo-se a
família a pagar as multas em que o referido assistente viesse a incorrer.
Por isso, não era raro encontrarem os inspetores sanitários, por ocasião das visitas domiciliares, doentes contagiosos, que faziam remover para o hospital, mas tardiamente, quando todo o
mal estava feito.
Outro capítulo, em que a Comissão Sanitária teve que agir, foi quanto ao serviço de assistência pública, feito até então sumariamente pela Municipalidade, disciplinando os trabalhos das
remoções dos doentes, em que se empregavam bondes impróprios, sujeitos a freqüentes paradas, determinadas pelas fileiras enormes de carroças, atravancadoras dos trilhos, guiadas por pessoal grosseiro e indisciplinado, tradicionalmente desordeiro,
dominador das vias públicas.
Em seguida às lavanderias públicas, locais cobertos, de solo lamacento, onde em muitas tinas, com pouca água, toda a sorte de roupas era lavada, a Comissão Sanitária passou a agir contra
as cocheiras, verdadeiros baluartes de resistência às prescrições sanitárias as mais elementares. Foram intimadas as piores para remoção imediata para pontos adequados, e as restantes para execução de medidas capazes de, pelo menos, atenuarem o mal
que causavam à saúde pública, com a falta de asseio, com a falta d'água, com o solo desaparelhado convenientemente.
A maioria dessas cocheiras eram, de fato, também habitações coletivas, nelas vivendo em palanques construídos sobre as baias, cocheiros, palafreneiros e muitas vezes as respectivas
famílias. Essas cocheiras-cortiços tinham sido condenadas várias vezes já pelas Câmaras Municipais, e em épocas de epidemia forneciam dez e mais doentes de febre amarela.
Em fevereiro surgiram casos de febre amarela nas tripulações dos navios atracados no cais, que chegava às imediações do Arsenal de Marinha, em frente ao Convento do Carmo; no mês
seguinte a doença lavrou em terra, causando 32 mortes, continuando a aumentar em abril, quando o número de óbitos subiu a 60. Em maio a mortalidade de febrentos baixou um pouco, 58, diminuindo em junho para 22, em julho para 9, cessando em agosto
com 1 óbito.
Em novembro voltou a doença, causando uma morte, tendo continuado a reinar em dezembro, quando causou 5. Durante o ano foram removidos para o Hospital de Isolamento 267 doentes de febre
amarela, dos quais 92 provenientes dos navios surtos no porto, tendo havido 172 óbitos. A Comissão Sanitária fez o expurgo de todas as casas donde saíram contagiosos, inclusive variolosos, em número de 39, sendo para notar que os primeiros
bexiguentos vieram de fora, de portos nacionais ou estrangeiros, tendo sido hospitalizados com as cautelas regulamentares.
A população continuou a não aceitar a vacinação que, apesar de ser obrigatória desde 1892, pela lei de novembro deste ano, não estava popularizada devidamente.
O impaludismo continuou a figurar com cifra elevada, 104, no obituário em que a tuberculose entra com 173, a febre tifóide com 25, a disenteria com 15, o tétano dos recém-nascidos
com 39, a coqueluche com 2, o sarampão com 1, a difteria com 1 e os cancros com 3. Ao todo faleceram em 1894, em Santos, 1.440 pessoas, tendo sido feitos 137 casamentos e registrados 1.255 nascimentos. Em referência ao ano de 1894, cumpre notar-se
ainda que durante o primeiro semestre o serviço de saúde do porto foi feito pela Comissão Sanitária, que por várias vezes expurgou 46 embarcações fornecedoras de casos de febre amarela e de varíola.
"Rua 15 de Novembro em 1919"
Foto publicada com esta legenda no livro A Campanha Sanitária...
{1895}
Em 18 de janeiro de 1895 chegou de Buenos Aires a Santos o vapor inglês Portuguese Prince, com carregamento de gado. Esta embarcação havia tocado na Ilha Grande, onde havia feito
quarentena de 12 dias e sofrido desinfecção por proceder de porto considerado sujo.
Às 11 horas da noite daquele dia, o dr. Tolentino Filgueiras, chefe da Comissão Sanitária, foi informado de que a bordo do referido vapor havia um doente de moléstia suspeita e em estado
muito grave. Dirigindo-se para bordo, o dr. Filgueiras encontrou ali, moribundo já e atacado de cólera asiática, o peão argentino Atilio Lima, que veio a falecer no dia seguinte às 8 horas, quando isolado convenientemente.
De bordo, o cadáver foi conduzido com as mesmas cautelas para o cemitério e ali autopsiado pelos inspetores sanitários que, reconhecendo a moléstia, recolheram entretanto material,
enviado em seguida para o Instituto Bacteriológico. O vapor inglês foi levado para o largo, com um ou outro alemão que junto dele estava, e beneficiado com o máximo rigor, nenhum outro caso da doença tendo aparecido no porto, ou entre a população
terrestre.
O Instituto Bacteriológico confirmou o diagnóstico de cólera asiática, doença que veio em seguida a se desenvolver no Vale do Paraíba, nos Estados do Rio, de Minas e de S. Paulo, tendo
entrado pelo porto do Rio.
No mesmo mês de janeiro, a febre amarela apareceu em Santos, sendo a primeira vítima um italiano residente antigo na cidade, e por maiores que fossem os esforços da Sanitária, aumentando
o policiamento das zonas fornecedoras de doentes, removendo-os logo que os conhecia, a doença se alastrou causando 22 óbitos, que subiram a 125 em fevereiro, quando o mal tomou conta da zona urbana.
Esta epidemia chegou ao auge em abril, com 381 vítimas, tendo causado em março 245. Em maio o número de óbitos de febre amarela diminuiu para 194, descendo em junho a 67 e em julho a 8.
De agosto a dezembro a doença matou ainda 13 pessoas, das quais a última neste mês.
Em 1895 a febre amarela causou 1.085 mortes, das quais 622 no Hospital de Isolamento, onde foram tratados 1.411 amarelentos, em que apenas 30 eram brasileiros. No total dos óbitos por
febre amarela neste ano de 1895, os estrangeiros entram com a percentagem de 53%.
Em fevereiro a varíola apareceu causando 1 óbito, que se repetiu no mês seguinte. A Sanitária lançou mão dos meios adequados para prevenir a erupção de uma epidemia, conseguindo vacinar
e revacinar 1.031 pessoas depois de muitos esforços, cifra entretanto muito inferior à da população necessitada daquela medida profilática. Em setembro a varíola voltou a ameaçar a cidade, continuando também os esforços do Serviço Sanitário para
combater o mal, que causou até o fim do ano mais 6 óbitos, em uma vintena de casos, isolados todos, com remoção conseqüente para o Isolamento.
Sepultaram-se em 1895, em Santos, 2.574 pessoas, das quais 1.085 vitimadas pela febre amarela, 6 pela varíola, 148 pela tuberculose, 141 pelo impaludismo, 9 pela febre tifóide, 17 pelo
sarampão, 16 pela coqueluche, 13 pelo tétano dos recém-nascidos, 1 pela difteria, 5 pela disenteria e pelos cancros. Foram feitos 127 casamentos e registrados 1.242 nascimentos.
A Comissão Sanitária fez 17.160 visitas domiciliares, expedindo 1.650 intimações para asseio e para obras; fez 1.056 desinfecções, com sublimado e com enxofre, em navios e prédios
fornecedores de casos de febre amarela, além das desinfecções praticadas nas bocas-de-lobo, nos esgotos, nas carroças condutoras de lixo e no material da limpeza pública.
Os esgotos então, apesar da rede geral não estar concluída, já funcionavam mal e no meio do ano a empresa particular que os explorava interrompeu os serviços, obrigando o governo do
Estado a encampá-la. A água era insuficiente, faltando durante várias horas por dia, resultando daí não ser feita a lavagem das galerias de esgoto, cuja existência se manifestava à distância pelas exalações partidas dos tampões de inspeção.
"Rua 15 de Novembro em 1919"
Foto publicada com esta legenda no livro A Campanha Sanitária...
{1896}
A 2 de janeiro de 1896 a Comissão Sanitária fez remover um doente de febre amarela do centro da cidade, sendo o caso evidentemente indígena (N.E.: isto é,
gerado localmente). A este, outros casos se seguiram de modo que ao obituário do mês a doença já forneceu 14 vítimas.
Em fevereiro os casos da febre aumentaram, tendo causado 42 mortes, cujo número subiu a 115 em março, quando toda a cidade estava contaminada. Em abril o número de óbitos chegou a 139,
baixando a 71 em maio, extinguindo-se a epidemia em agosto, com 2 óbitos, depois de ter causado 40 em junho e 5 em julho. Com mais um óbito em dezembro, a febre amarela vitimou neste ano 435 pessoas, das quais 300 no Hospital de Isolamento, onde
foram tratados 622 amarelentos, sendo 88 provenientes dos navios ancorados no porto, para onde 57 regressaram curados.
Como sempre, a Sanitária lutou com freqüentes faltas de notificação dos casos da febre e como sempre também foram os cortiços e as cocheiras os lugares donde saíram mais doentes.
A varíola produziu 11 óbitos em 1896, mas a grande maioria dos casos proveio do interior e mesmo do estrangeiro, sendo todos os bexiguentos removidos para o hospital destinado a esta
doença, montado aliás em prédio velho e impróprio. Dos óbitos, 2 ocorreram em junho, 2 em setembro, 3 em novembro e 4 em dezembro. A varíola já era notificada sistematicamente à Sanitária, por temê-la também já a população depois de 1892; não se
compreende porque a mesma população era tão refratária à vacina, sendo necessário proceder-se a verdadeiro recrutamento para se poder aplicá-la sistematicamente, nos quarteirões mais ameaçados.
A Comissão Sanitária fez desinfectar 49 vapores que deram doentes de febre amarela e de varíola e nesse ano de 1896 já se notou que as casas em condições de sofrerem beneficiamento
rigoroso e onde o mesmo foi feito com soluto de sublimado e seqüente queima de enxofre nos aposentos previamente calafetados, a doença não voltou a atacar mais residentes, ao contrário do que se dava nos cortiços, onde não se podia fazer semelhante
expurgo e que por isso mesmo se transformavam em viveiros de amarelentos. Para esses cortiços voltaram-se desde logo as vistas da Comissão Sanitária, que tudo fazia para melhorá-los, quando não podia derrubá-los.
Os grandes focos de febre amarela em Santos, naquele tempo, eram as habitações coletivas e os cortiços situados nas ruas Marquês de Herval, S. Bento, General Câmara, Amador Bueno,
Rosário, Martim Afonso, Xavier da Silveira, Jabaquara, antigo quilombo e Morro do Fontana, por trás da Santa Casa, onde já não eram tratados amarelentos, depois de reconhecidos como tais.
Grande foi a luta que teve a Comissão Sanitária de travar para conseguir a demolição ou, pelo menos, a melhoria de tais cortiços, cujos proprietários, muitas vezes bem relacionados,
lançavam mão de todos os recursos para garantir a sua propriedade, indo mesmo até a intriga política. Honra, entretanto, lhe seja feita, o Governo do Estado prestigiou sempre a repartição sanitária local, fornecendo-lhe mesmo o auxílio da força
pública para o cumprimento da lei.
Pelo seu lado, a Sanitária nunca se preocupou com as personalidades políticas dos intimados, agindo contra gregos e troianos, sem ter em conta simpatias ou antipatias eleitorais.
Os 4 inspetores sanitários fizeram 19.126 visitas domiciliares, expediram 1.148 intimações para obras e reformas em prédios; 749 casas fornecedoras de doentes de febre amarela foram
beneficiadas do melhor modo possível, porquanto muitas habitações eram dependências irregulares de cortiços, impossíveis de sofrerem expurgo regulamentar, tendo sido também desinfectadas 14 moradias de variolosos.
Além dos serviços de remoção de contagiosos, a Sanitária fez os de assistência pública, transportando 1.045 doentes para os hospitais da Santa Casa e Beneficência Portuguesa.
Para os 1.780 óbitos verificados em 1896, em Santos, além dos 435 fornecidos pela febre amarela e 11 pela varíola, concorreram a tuberculose com 161, a febre tifóide com 8, o impaludismo
com 143, a disenteria com 10, o sarampão com 18, a coqueluche com 2 e difteria com 2, o tétano dos recém-nascidos com 62 e os cancros com 7. Foram feitos 244 casamentos e registrados 1.785 nascimentos, dos quais 232 ilegítimos.
Calculando-se a população daquele ano em 35.000 habitantes, alojados em 3.600 casas e casebres e a densidade da população reconhecida pelos inspetores sanitários, o
coeficiente da mortalidade geral foi de 50%, cifra ainda muito pouco consoladora, mas bem inferior já à dos anos anteriores.
Em agosto de 1896 o Serviço Sanitário do Estado foi reorganizado, sob a Presidência Campos Salles, ampliando-se e harmonizando-se o seu funcionamento, sendo incorporada à Diretoria
Geral, como uma seção, a Comissão Sanitária de Santos, autônoma até então.
Os serviços desta Comissão foram metodizados, com melhoria do seu aparelhamento e nomeação de mais dois inspetores sanitários, continuando a direção a cargo do dr. Tolentino Filgueiras.
Como resultado dessa remodelação, melhoraram seguidamente as condições sanitárias de Santos, cujos usos e costumes se foram modificando também, graças à ação contínua do policiamento
sanitário. As faltas de notificação das doenças contagiosas foram rareando, perdendo a população, gradativamente, o horror que tinha aos hospitais de isolamento, melhores sempre do que a quase totalidade das habitações santistas fornecedoras de
contagiosos.
"Praça da República em 1900"
Foto publicada com esta legenda no livro A Campanha Sanitária...
{1897}
O ano de 1897 foi melhor do que qualquer dos anteriores, até 1889; a febre amarela e a varíola surgiram em pequenas epidemias, que fizeram respectivamente 37 e 6 óbitos. A primeira apareceu
logo em fevereiro, trazida do Rio e de Campinas, grassando depois até agosto, quando cessou, tendo sido removidos para o isolamento 70 contagiados, dos quais se curaram 45. A varíola manifestou-se em agosto, sendo os primeiros casos estranhos à
cidade, vindos também de fora, até do estrangeiro, com a imigração.
A Sanitária, achando-se com os seus serviços mais folgados, empreendeu ainda uma vez o expurgo sistemático das zonas onde a febre amarela costumava lavrar, as zonas das cocheiras e dos
cortiços, aproveitando a oportunidade para corrigir muitas irregularidades, fazendo com o auxílio do intendente municipal várias demolições de casebres do centro urbano, conseguindo mesmo a remoção de várias cocheiras para longe dos centros
populosos.
Já então Santos possuía mais de 3.700 prédios, em que funcionavam 1.592 negócios, dos quais 141 fora do perímetro urbano, que findava na Rua Luíza Macuco e seu prolongamento para a Rua
Lucas Fortunato, em Vila Mathias.
As casas construídas recentemente já possuíam alguns melhoramentos, com a maioria dos aposentos bem iluminados, mas os porões continuavam sem impermeabilização do solo, as áreas eram na
grande maioria úmidas e lamacentas e as instalações sanitárias abaixo da crítica, contando-se as que não se denunciavam ao olfato menos apurado, sendo geral a ausência dos banheiros.
O Estado lutava para conseguir um funcionamento satisfatório da rede de esgotos, irregularmente construída sem água para as necessárias descargas nos coletores e que os despejava na
ponta do Paquetá, em zona possuidora de habitações próximas. A água faltava em toda a cidade, não bastando para os usos mais elementares, existindo em todas as casas caixas e vasilhas numerosas para armazená-la, recorrendo-se às bombas para que
viesse em maior quantidade, o que raramente sucedia depois das 10 horas.
Levado por essa circunstância, o Governo do Estado renovou e reformou o contrato de abastecimento de água potável de Santos com a Companhia City of Santos Improvements, garantindo para
cada prédio o mínimo de 1.500 litros diários, fato que se realizou dois anos depois, de quando datam as decisivas melhoras sanitárias locais. Bem mereceu mais uma vez de Santos o presidente Campos Salles, a quem se deve aquela reforma de contrato
tão salutarmente decisiva para a vida sanitária.
A Câmara Municipal, reconhecendo a falta sensível dum Código de Posturas para substituir o absoluto em uso até então, que permitia quaisquer construções, à vontade dos proprietários dos
terrenos, "desde que não fossem vistas da rua", e à sombra do qual nasceram e prosperaram os cortiços e as cocheiras causadores da devastação da cidade pelas epidemias surgidas depois de 1889, resolveu organizar um outro, encarregando pessoas
capazes de confeccioná-lo.
À testa dos organizadores desse Código, ainda hoje modelo no gênero e que tem resistido vitorioso ao prurido de reformas propostas por legisladores de momento, foi colocado o engenheiro
dr. Brant de Carvalho, que o entregou à Municipalidade no segundo trimestre de 1896, tendo sido promulgado em 22 de junho.
Ainda que muito mal aplicado e observado nos primeiros tempos, esse Código de Posturas foi o ponto de partida da remodelação da cidade e a que sempre se apegou a Sanitária para
conseguir, com a prata de casa, a maioria dos resultados apreciáveis hoje. Serão sempre pequenos os louvores ao trabalho do dr. Brant de Carvalho, a quem Santos ainda não materializou o seu reconhecimento de modo algum, pois mesmo uma das novas
ruas não tem o nome daquele benemérito cidadão.
Naquela época a Câmara Municipal, cuja receita anual já ia perto de 2 mil contos, começou a passar a sua ação para terreno prático, deixando as discussões estéreis, buscando de fato a
melhoria do tipo da cidade. Foram contratadas as obras das duas avenidas, Conselheiro Nébias e Ana Costa, feitos vários arruamentos no Macuco e em Vila Mathias, projetado o novo mercado no Paquetá, feitos alguns calçamentos e melhorados os serviços
da limpeza pública, para cujo complemento o Governo tencionava construir forno incineratório. A assistência pública municipal foi reorganizada, funcionando regularmente um consultório para a pobreza, onde foram dadas 11.647 consultas e feitas 16
vacinações. A Sanitária conseguiu vacinar e revacinar um milheiro de pessoas, nos domicílios inspecionados.
Durante o ano de 1897 os inspetores sanitários fizeram 19.000 visitas domiciliares, desinfectando preventivamente 500 prédios nas zonas onde a febre amarela costumava a surgir. O
obituário daquele ano foi melhor do que o do anterior e das 1.331 mortes registradas a tuberculose causou 154, seguindo-se-lhe o impaludismo com 110, a febre tifóide com 18, a disenteria com 14, o tétano dos recém-nascidos com 33, sarampão com 16,
a difteria com 1, a coqueluche com 1, os cancros com 2, além dos referidos para a febre amarela e para a varíola. O número dos nascimentos registrados foi de 1.371, com 217 de ilegítimos; os casamentos foram em número de 261.
"Praça da República em 1908"
Foto publicada com esta legenda no livro A Campanha Sanitária...
{1898}
Em janeiro de 1898 a febre amarela apareceu em Santos, causando 1 óbito; por mais que a Comissão Sanitária fizesse, a doença aumentou no mês seguinte com 4 óbitos, continuando a se
desenvolver para causar 14 mortes em março e 97 em abril. Os navios atracados ao cais, que chegava já à embocadura da Rua da Constituição, forneciam numerosos amarelentos, desmentindo desse modo o preconceito nascente de que as obras do porto
estavam extinguindo a doença.
Em maio toda a cidade estava contaminada pela febre amarela, que matou 137 pessoas; em junho a epidemia começou a decrescer, baixando a mortalidade a 64 e em julho declinou francamente.
Aos 25 óbitos de julho seguiram-se 18 em agosto, cessando a febre em setembro, quando matou 2 pessoas, ou 362 no ano. No Isolamento foram recolhidos 372 amarelentos, dos quais saíram curados 142.
No começo do inverno, a varíola apareceu em pequena epidemia, que fez 7 vítimas. A Sanitária conseguiu vacinar 6.400 pessoas, com resultado satisfatório e fez mais de 20.000 visitas
domiciliares, promovendo, além do expurgo das casas donde saíram os doentes, mais de 400 desinfecções preventivas em prédios das zonas preferidas pela doença. Algumas cocheiras foram removidas do centro da cidade, destacando-se uma grande que
ocupava o quarteirão em frente ao quartel de polícia na Rua do Rosário; foram ainda demolidos vários cortiços, os últimos irregularíssimos de tábuas e telhas de zinco.
Em meados do ano, tendo adoecido o dr. Tolentino Filgueiras, foi nomeado para substituí-lo o dr. Militão Pacheco; prestou também este colega relevantes serviços a Santos, aproveitando o
interregno da epidemia para a sistematização das reformas domiciliares, que tomaram impulso devido à crise que permitiu haver casas disponíveis na cidade.
O dr. Chaves Ribeiro, inspetor sanitário, realizou a trabalhosa tarefa de desinfectar com sublimado e enxofre queimado, do melhor modo possível, todas as casas do Morro do Fontana, por
trás da Santa Casa e onde se havia formado extenso foco de febre amarela, que desapareceu em seguida àquele árduo trabalho, compensando os esforços do referido inspetor. Os médicos da Comissão Sanitária fizeram na cidade e arrabaldes 21.000 visitas
domiciliares, mandando aterrar as últimas fossas existentes dentro do perímetro urbano, obrigando a construção de esgotos e de gabinetes sanitários regulamentares.
Não estando ainda terminado o novo abastecimento, continuava a água a faltar e tolerava-se, por isso, a permanência de grandes quantidades de tinas e de vasilhas destinadas a armazená-la
nos pátios e quintais, existindo também ainda as lavanderias públicas, se bem que melhoradas já. O número das casas beneficiadas preventivamente elevou-se a 680, só na zona urbana, gastando-se muito sublimado e muito ácido fênico, mas o
enxoframento dos prédios, como final medida, ao lado da limpeza dos terrenos e dos quintais, aproveitava sem se saber porque.
Dos 1.625 falecimentos ocorridos em 1898, em Santos, 176 foram determinados pela tuberculose, 17 pela febre tifóide, 4 pelo sarampão, 3 pela coqueluche, 14 pela disenteria, 128 pelo
impaludismo, 38 pelo tétano dos recém-nascidos e 7 pelos cancros, não tendo havido óbitos por difteria.
Foram registrados 1.796 nascimentos e 297 casamentos.
Tendo adoecido e se licenciado em outubro o dr. Militão Pacheco, veio substituí-lo na Chefia da Comissão Sanitária o dr. Eduardo Lopes da Silva, que assumiu a direção dos serviços no
mesmo mês.
"Praça da República em 1919"
Foto publicada com esta legenda no livro A Campanha Sanitária...
{1899}
No primeiro trimestre de 1899 uma dúzia de casos de febre amarela apareceu na cidade, causando 2 óbitos, surgindo depois outros tantos casos de varíola, de maio a julho, com 3 casos fatais.
As medidas tomadas pela C. Sanitária conseguiram fazer cessar as duas epidemias, e tudo levava a se pensar que o ano referido seria dos mais satisfatórios para Santos, quando em fins de agosto começaram a aparecer casos da moléstia, que em outubro
se impôs dolorosamente, com geral surpresa, como sendo a peste oriental.
Em começo de agosto o Governo Português notificava a existência daquela doença na cidade do Porto e a notícia foi recebida em toda a parte com sobressalto, e entre nós também com pesar,
dadas as estreitas relações entre os dois países.
O Governo Brasileiro fez logo sujeitar, às praxes sanitárias de rigor, as embarcações que tivessem tocado naquele porto lusitano depois de 31 de julho, apesar do "andaço da Fonte
Taurina", doença que veio a ser capitulada de peste depois, lavrar desde o começo de junho. Quando soube da notificação da doença pelo Governo Lusitano, o do Estado de S. Paulo pensou logo em organizar a defesa do seu território, começando
naturalmente por Santos, cujo aparelhamento sanitário foi cedo reforçado, aumentando-se o número dos médicos da C. Sanitária, para a intensificação do policiamento sanitário local.
No dia 22 de agosto chegou a Santos, tendo tocado antes no Rio, o vapor lusitano Rei de Portugal, que obteve livre prática, atracando no cais, em frente ao armazém nº 8, apesar do
protesto do chefe da Comissão, dr. Eduardo Lopes. Em começo de setembro, vários médicos santistas impressionaram-se com casos freqüentes de adenites sub-maxilares, aparecidos em crianças, algumas freqüentadoras do Posto Médico Municipal, e a pedido
do dr. Eduardo Lopes veio a Santos estudar o assunto o dr. Vital Brasil, do Instituto Bacteriológico, que nada encontrou de anormal ou suspeito, verificando tratar-se de ingurgitamentos banais, de adolescentes linfáticos.
Em 17 de setembro foi notificado à Sanitária um caso de febre amarela em rua próxima ao litoral, estando o doente no segundo dia da moléstia e já moribundo. O inspetor sanitário,
encarregado de dirigir a remoção do doente e a conseqüente desinfecção do domicílio, estranhou não só a rápida evolução da doença, como também o aspecto do cadáver, que então o era, nada se parecendo com o de um amarelento. Examinando-o, verificou
que era portador dum tumor na região inguinal direita e, por isso, pediu a presença dos médicos assistentes.
Comparecendo o dr. Assis Correia, que havia feito a notificação e visto o doente em conferência, manifestou as dúvidas que tivera a respeito do diagnóstico formulado de febre amarela,
chegando a suspeitar tratar-se dum caso de peste, se ela existisse na cidade, modo de ver de que discordara outro colega.
Foi feita com as devidas precauções a remoção do cadáver, sendo rigorosamente beneficiado o domicílio, ficando a zona sujeita a rigorosa vigilância sanitária. Alguns dias depois constou
à Comissão Sanitária que haviam aparecido ratos mortos em alguns pontos do litoral, sendo avisada do fato a Diretoria Geral e aberta sindicância a respeito, para se colher material e enviá-lo ao I. Bacteriológico de S. Paulo.
Por fim, soube-se que o maior número de ratos mortos havia aparecido perto do domicílio do doente, nas imediações do armazém de Cia. Docas destinado a receber bagagens dos passageiros
marítimos, nada podendo informar a mesma Companhia Docas, por não ter tido conhecimento do fato. Em 28 de setembro chegou a Santos o dr. Ad. Lutz, do I. Bacteriológico, que vinha colher material capaz de orientar o Serviço Sanitário a respeito da
referida mortalidade de ratos, conseguindo, além de alguns cadáveres de roedores, um rato ainda vivo, mas com sinais evidentes de moléstia. Desta colheita o dr. Lutz tirou o material julgado necessário à apuração da verdade, mas não pôde chegar a
resultados seguros, que autorizassem a solução do problema.
Ao mesmo tempo fazia-se seguir devidamente acondicionados, para o Laboratório de Análises, alguns ratos mortos, para exame toxicológico, porquanto se afirmava na cidade que vários
comerciantes estavam distribuindo veneno para matá-los. Os ratos eram então abundantíssimos em Santos, vendo-se durante a noite verdadeiros bandos destes animais daninhos e perigosos percorrerem as ruas próximas ao litoral.
Era comum também ver-se pela manhã, atirados à rua, numerosos ratos mortos, caçados pelos vendeiros pela madrugada, e que permaneciam ali por muito tempo, em aspecto repugnante.
Tendo o Laboratório de Análises declarado não ter encontrado tóxicos nos ratos examinados, o Serviço Sanitário mandou distribuir veneno, já pelos armazéns particulares, avisando a
população, já pelos armazéns das Docas, onde eles eram também abundantes.
Ao mesmo tempo, os inspetores sanitários aumentavam a vigilância, principalmente nos quarteirões próximos ao litoral, e aconselhavam aos moradores de cada prédio visitado as medidas
referentes à profilaxia da peste, desde o máximo asseio, até a guerra sistemática aos ratos e aos parasitas sugadores de sangue.
O mês de setembro havia findado sem que outro alarme se produzisse, e começara nas mesmas condições o de outubro, quando no dia 4, pela manhã, a Sanitária recebeu notificação dum óbito
por febre amarela, ocorrido quase subitamente, na véspera à noite, na Rua de S. Bento, próximo à Estação da E. de Ferro.
O médico autor da notificação informava que tinha visto o doente na manhã de 3, hesitando em fazer o diagnóstico, à espera de melhores elementos, dada a anormalidade da doença, começada
na véspera.
Tratava-se de uma lavadeira, havia meses residente em Santos, e que ao falecer apresentava um bubão inguinal esquerdo; o enterramento foi feito com as precisas cautelas, tendo sido o
prédio expurgado rigorosamente e ficado os moradores sujeitos à vigilância regulamentar.
A 6 de outubro o dr. Vital Brasil, do I. Bacteriológico de S. Paulo, veio ficar fazendo parte da C. Sanitária para as pesquisas especiais que se tornassem necessárias.
Em 7 de outubro a Sanitária foi avisada de que na S. Casa havia falecido, pouco tempo depois de dar ali entrada, um doente que, ao lado de sintomas de violentíssima infecção, apresentava
ingurgitamento dos gânglios da virilha. Verificando o caso, apurou-se que o doente residia na Rua 24 de Maio, litoral, quase em frente à casa onde se dera o óbito de febre amarela de setembro.
Ainda aqui foram tomadas as medidas sanitárias habituais, reforçando-se o policiamento do foco e aconselhando-se adequadamente os moradores, que aliás não acreditavam na bubonica,
como chamavam à doença. A 14, da casa de bebidas nº 39 da Rua 15 de Novembro, prédio velho, cujos fundos davam para a Rua 24 de Maio, foi removida para o Isolamento uma mulher, criada da família do proprietário do negócio. A princípio os sintomas
foram capitulados como de febre amarela, mas do segundo dia em diante fizeram firmar-se outro diagnóstico, aparecendo em seguida ingurgitamento ganglionar da virilha esquerda, de onde o dr. Vital Brasil retirou material para estudo.
No dia seguinte, na mesma casa, adoecia um empregado do negócio, com sintomas iguais aos da criada Rosa Caseiro, sendo removido logo para o Isolamento, onde veio a falecer. À tarde
adoecia também, com febre alta e delírio, sendo notificado como portador de febre amarela, um morador da Rua Amador Bueno, sendo removido logo para o hospital, onde o dr. Vital Brasil tinha assim material suficiente para os seus estudos.
Havendo adoecido mais uma pessoa da família moradora no prédio nº 39 da Rua 15 de Novembro, foi a mesma família removida para o Hospital de Isolamento, para observação, sendo o prédio
beneficiado rigorosamente, e fechado para novo expurgo.
Desta vez a Sanitária estendeu as desinfecções com creolina a todo o quarteirão, composto de casas velhas, de tipo ultra-vicioso, com o solo desprotegido, cheias de cubículos escuros,
onde os ratos eram abundantes.
As pesquisas do dr. Vital Brasil deram em resultado o seguro conhecimento de ser a peste a doença causadora da mortandade dos ratos, e dos óbitos rotulados de febre amarela e ocorridos
desde setembro, sendo informado disso o Governo do Estado pela Diretoria do Serviço Sanitário.
Em 17 de outubro foi o Governo Federal notificado da existência da peste em Santos, para os devidos fins, e a Comissão Sanitária local aparelhada convenientemente e reforçada com pessoal
em número suficiente. Vieram para Santos mais seis inspetores sanitários, ficando a cidade dividida em 12 distritos, de modo a cada prédio ser visitado de cinco em cinco dias, sendo inspecionados diariamente os moradores das zonas que haviam
fornecido doentes suspeitos.
As zonas suspeitas foram desinfetadas sistematicamente com pulverizações a vapor, montando-se junto da Estação da E. de Ferro um desinfetório para beneficiamento de bagagens e de cargas
destinadas ao interior do Estado. Ficaram tais serviços a cargo dos inspetores sanitários doutores Vieira de Mello, Paula Souza e Luiz Vianna, que bons serviços prestaram, auxiliados sempre pela Companhia Docas de Santos, em cujo armazém foram
instalados os maquinários de expurgo.
Ao mesmo tempo, foi criado o serviço de passaportes sanitários para os passageiros saídos de Santos, que eram examinados e observados durante uma semana nos lugares de destino.
Ultimou-se a defesa da cidade perseguindo-se por todos os modos os ratos, distribuindo-se veneno, aconselhando-se o uso de ratoeiras, instruindo-se o povo dos perigos que ofereciam tais
animais, do perigo das pulgas, para cuja perseguição, além de conselhos relativos à perfeita limpeza domiciliar, era também feita gratuitamente ao povo distribuição de creolina.
As cocheiras e lugares onde os cereais abundavam e por isso mesmo eram preferidos pelos ratos, foram alvo de especiais cuidados, fazendo-se repetidas desinfecções com soluto forte de
creolina, com os pulverizadores a vapor, de Geneste.
A Câmara Municipal de Santos, para acalmar o povo, desorientado com os conselhos de alguns médicos e de muitos entendidos, que não acreditavam na peste, e depois que o
Governo do Estado havia tomado todas as providências, resolveu mandar vir do Rio de Janeiro, ganhando quantia elevada, um bacteriologista para estudar a doença reinante na cidade. Esse experimentador, depois de ter começado os seus estudos no
Grande Hotel da Europa, casa velha e ninho de ratos, de onde se mudou por intervenção da Sanitária que não julgou tal lugar apropriado, foi terminá-los em uma casa modesta, menos habitada e central, quase isolada.
Em alguns dias os seus estudos estavam feitos e em conferência sensacional, porquanto resultado oposto era esperado pelos entendidos, concordou com o veredicto do Instituto
Bacteriológico de S. Paulo, apontando ser necessário tomar-se medidas radicais contra o mal, inclusive o expurgo pelo fogo, de todas as casas contaminadas.
Desse dia em diante a Municipalidade apoiou decididamente a Comissão Sanitária, a que seis médicos por aquela subsidiados prestaram muito bons serviços, sendo aumentada a zona de
policiamento sanitário rigoroso.
Ao mesmo tempo a Câmara aumentava o pessoal da limpeza pública, que ficou perfeitamente organizada, realizando um serviço irrepreensível durante todo o tempo em que durou a doença. Nessa
época, o lixo era conduzido para o canal da Bertioga, em cujas margens se amontoava, a muitos quilômetros da cidade, sendo o transporte feito em chatas pela Comissão de Saneamento, depois de desinfetado rigorosamente, assim como as carroças
coletadoras, pela Comissão Sanitária.
A 18 de outubro chegamos a Santos, tendo sido testemunha de tudo quanto se passou daí em diante, podendo avaliar o esforço por todos empregado para livrar a cidade do novo mal que a
ameaçava. Tendo ficado encarregado de dirigir o expurgo das casas que tivessem fornecido doentes de peste, e das autópsias dos cadáveres duvidosos, presenciamos todos os serviços dali por diante e nos lembraremos sempre do que vimos no prédio nº 39
da Rua 15 de Novembro, cujos fundos davam para a Rua 24 de Maio, sob o número 60.
Daquela casa haviam saído com peste, para o Isolamento, do dia 14 ao dia 20, sucessivamente a criada Rosa Caseiro, o servente Joaquim Chaves, quatro pessoas da família Milone, e por fim
o resto da mesma, para ficar de observação.
Ao abrirmos as portas do armazém onde funcionara o bar, deparamos com mais de 40 ratões mortos espalhados pelo solo, muitos já em decomposição, jazendo alguns sobre os balcões. No
andar superior ainda havia ratos mortos, vários existindo na cozinha e na pequena despensa ao lado. Fizemos incinerar logo para mais de 60 ratos encontrados em todo o prédio, e dada a presença de pulgas que nos atacaram e aos desinfetadores, não
compreendemos ainda hoje porque não fomos vitimados pela doença, que na véspera havia prostrado o dr. Vital Brasil, no Isolamento, onde trabalhava.
A 21 de outubro tinha sido removido um pestoso da Rua Martim Afonso 58, dono da farmácia, falecido no dia seguinte; a 22 outro pestoso subiu da Rua Xavier da Silveira e no dia 24 a casa
nº 254 da Rua General Câmara fornecia ainda outro. Do dia 25 até o fim do mês foram removidos para o Isolamento mais 6 doentes de peste, saídos da Avenida Ana Costa 36, da Rua Guerra 18, da Rua S. Bento 3, da Rua S. Leopoldo 58, da Rua Constituição
116, da Rua José Ricardo, Hotel Bologna, e da Guardamoria. Como se vê, o mal havia se alastrado por toda a cidade, desde o litoral, onde começara, até Vila Mathias e Vila Macuco.
Já então toda a gente acreditava na bubônica e não havia mais hesitações por parte dos clínicos para a notificação dos casos de peste.
Em 3 de novembro foi removido um pestoso da Rua Marquês do Herval nº 121; daí a dois dias um outro saía da casa nº 37 da Rua S. Antonio. No dia 6 foram removidos dois doentes, um da Rua
Xavier da Silveira 38, outro da Rua Bittencourt 37. Na segunda quinzena de novembro o número das notificações de pestosos aumentou, subindo a 9, todos removidos para o Isolamento, como para lá foi um italiano, engraxate, também pestoso, tratado às
ocultas na Rua Constituição 76, e ali encontrado sob uma grande ruma de colchões, pelo colega visitante do prédio.
Até o dia 4 de novembro esteve o dr. Vital Brasil encarregado da direção do Isolamento; tendo, porém, este colega adoecido com peste, veio substituí-lo o dr. Victor Godinho, que ali
permaneceu até o começo de 1900, quando foi chamado para dirigir a Comissão contra a febre amarela, em Sorocaba.
A última remoção de pestoso para o Isolamento foi feita em 28 de novembro, sendo este o último caso da doença do ano, ficando extinta a epidemia e declarado limpo o porto de Santos em
fins de dezembro. No Isolamento foram tratados 35 pestosos, com o soro obtido no Instituto Pasteur, dificilmente aliás, pois entre nós o seu preparo ainda não era feito; a forma predominante da doença foi a bubônica, com maior freqüência dos bubões
crurais.
Foi uma vitória do Serviço Sanitário do Estado a extinção da peste em Santos, trabalho por ele exclusivamente executado, sem auxílio estranho e que veio pôr à prova a capacidade da sua
diretoria, a cargo então do dr. Emílio Ribas.
Como e quando entrou a peste em Santos? O dr. Eduardo Lopes, chefe da Comissão Sanitária, adotou o parecer de terem sido cargas e bagagens contaminadas, provindas de Portugal, a causa da
implantação da doença em Santos. Pensamos poder antes atribuir o mal à descida à terra de ratos doentes de bordo, ou à contaminação, a bordo, de ratos de terra.
Podem ser vistos à noite, indo de terra para bordo dos navios e deles vindos para terra, numerosos ratos que transpõem com agilidade admirável os cabos fixadores das embarcações às
muralhas do cais; deste modo as doenças desses animais, reinantes a bordo ou em terra, são facilmente conduzidas dum para outro lugar.
Em 21 de agosto chegou a Santos o vapor português Rei de Portugal, saído do Porto quando a doença ali reinante desde o começo de junho sob o nome de andaço da Fonte Taurina,
e depois capitulada peste bubônica, já lavrava com certa intensidade. Apesar dos protestos do dr. Eduardo Lopes, chefe da C. Sanitária, o Rei de Portugal teve livre prática, como tiveram também os vapores Severn, Paraguassú e
Béarn, todos três saídos também de portos portugueses no mês de junho.
Nenhuma doença parecida com a peste constava dos registros de bordo daqueles navios onde, segundo se afirmou, não foi notada mortandade de ratos. Também nenhum dos trabalhadores da Cia.
Docas, que lidou com as cargas e as bagagens trazidas por tais embarcações, adoeceu, ou faleceu, de modo a levantar suspeitas; entretanto, começaram a aparecer ratos mortos no mês seguinte, precedendo os primeiros casos de peste bubônica, ocorridos
na cidade na primeira quinzena de outubro.
Os fatos vieram posteriormente mostrar que quando o Rei de Portugal chegou a Santos, a peste já havia surgido no Rio da Prata, subindo até o Paraguai, e em seguida se verificou
que adoeciam de peste os que lidavam com alfafa platina, ou residiam nas proximidades de depósitos dela.
Durante o ano de 1899 a C. Sanitária fez mais de quarenta mil visitas de policiamento sanitário e 1.500 desinfecções de prédios da zona urbana, removendo para o Isolamento 35 pestosos, 6
amarelentos, em fevereiro e março, e 22 variolosos em maio, junho e julho. Além dos 14 óbitos por peste bubônica, dos 2 por febre amarela e dos 3 por varíola, concorreram para os 1.366 falecimentos do ano, a tuberculose com 172, a febre tifóide com
30, o impaludismo com 121, o sarampão com 21, a disenteria com 19, a coqueluche com 23, o tétano dos recém-nascidos com 26, a difteria com 1 e os cancros com 7. Foram feitos 298 casamentos e registrados 1.922 nascimentos.
"Praça da República em 1919"
Foto publicada com esta legenda no livro A Campanha Sanitária...
{1900}
Em 1900, o primeiro caso de febre amarela removido para o Isolamento saiu do vapor italiano S. Gothardo, vindo do Rio, e doze dias depois começaram as embarcações atracadas no cais a
fornecer outros doentes, destacando-se os da barca alemã Atlantic, do brigue russo Equator e da barca Gustavo Adolfo, que chegaram a 36 até o fim do mês, tendo a cidade contribuído apenas com um, do Morro do Fontana.
Em fevereiro, mais dez marítimos foram removidos com a doença, juntando-se-lhes 38 doentes da cidade; em março foram recebidas 135 notificações, com 130 remoções, que se elevaram a 150
em abril, baixando a 80 em maio. Em junho, os amarelentos removidos foram em número de 30, tendo a epidemia cessado em julho em que foram internados 11 no Isolamento. O número dos óbitos causados por esta epidemia foi de 260. A varíola no
inverno apareceu, vinda com imigrantes, causando 1 morte.
Aquela epidemia de febre amarela veio mostrar, indiscutivelmente, o fato interessante de que era sempre preciso a vinda dos primeiros casos de fora, para a doença explodir, começando
sempre pela marinhagem das embarcações surtas no porto e atracadas no cais. Veio também tirar a limpo as dúvidas que muita gente ainda tinha sobre a eficácia dos serviços da C. Sanitária, porquanto se afirmava que o cais faria desaparecer a doença
de Santos, sem necessidade das torturas praticadas pela higiene do Estado.
Tendo a peste aparecido no Rio de Janeiro, foram instituídos pelo Governo Federal os passaportes sanitários para Santos, que estava limpo desde dezembro de 1899, e foram observadas 459
pessoas vindas da Capital Federal, nada tendo apresentado elas de anormal.
A Sanitária continuou a comprar ratos durante todo o ano, para autopsiá-los, e somando-se os adquiridos, aos 21.000 comprados pela S. Casa para o mesmo fim, foram ao todo incinerados
67.500.
Durante todo o ano a C. Sanitária prosseguiu com grande zelo na guerra aos cortiços e aos armazéns de solo desprotegido, tendo sido reformados muitas dezenas deles, com piso melhorado
contra os ratos. Todas as casas que forneceram doentes de febre amarela foram desinfetadas com sublimado e limpas, sendo os aposentos, ocupados pelos febrentos, enxofrados e fechados por 24 horas.
Parecia que a peste havia deixado Santos, quando a 21 de dezembro são descobertos dois casos do mal levantino na Rua General Câmara, casos gravíssimos terminados pela morte, no
Isolamento, para onde haviam sido removidos. Os quarteirões respectivos foram desinfetadas rigorosamente e rigorosa vigilância sanitária neles foi instituída. Nenhum outro caso surgiu ali, ou em ponto diferente da cidade.
A varíola apareceu trazida por imigrante, que faleceu, não tendo se repetido mais casos; a C. Sanitária esforçou-se por vacinar a população, que ainda refugava este recurso profilático,
de modo que não chegou a dois milheiros o número dos vacinados e revacinados.
Os domicílios já haviam melhorado sensivelmente em Santos, graças aos esforços dos colegas da C. Sanitária, tendo melhorado também as fábricas e oficinas, funcionando anteriormente em
quaisquer telheiros úmidos e escuros, em quaisquer lugares, em geral os mais impróprios.
Foram feitas durante o ano 38.574 visitas sanitárias e expedidas 3.400 intimações para obras e reforma de prédios, inclusive impermeabilizações de solo, de pavimentos e porões. Foram
feitas 1.530 desinfecções, das quais 472 conseqüentes a casos de doenças transmissíveis.
O número de óbitos em 1900 foi de 1.369, tendo sido registrados 214 casamentos e 1.758 nascimentos. Depois da febre amarela, a doença que mais óbitos causou foi a tuberculose, 165,
seguindo-se-lhe o impaludismo com 119,a febre tifóide com 22, o tétano dos recém-nascidos com 25, a disenteria com 12, o sarampão com 1, a coqueluche com 2, a disenteria com 2, a varíola com 1, os cancros com 8.
Sendo a população de Santos, em 1900, avaliada pela C. Sanitária em 45.000 habitantes, o coeficiente da mortalidade geral foi de 30%, cifra ainda
dolorosa, mas distante já dos que figuravam em estatísticas anteriores, de tempos que felizmente não mais voltaram.
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