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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - BIOGRAFIAS
Galeria dos santistas ilustres (12)

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Na sua edição especial de 26 de janeiro de 1939, comemorativa do centenário da elevação de Santos à categoria de cidade (exemplar no arquivo do historiador Waldir Rueda), o jornal santista A Tribuna publicou esta matéria (grafia atualizada nesta transcrição):
 


Imagem: reprodução parcial da matéria original

Galeria biográfica dos santistas ilustres

Grandes vultos que se destacaram pela sua atuação notável na história de Santos e do Brasil

[...]


Xavier da Silveira (Dr. Joaquim Xavier da Silveira) - Nasceu em Santos, a 7 de outubro de 1840, como filho do capitão de milícias Francisco Xavier da Silveira e de d. Leocádia dos Reis Xavier da Silveira.

Aos cinco anos, sem nada haver aprendido ainda, pôs-se a ler um jornal diante da família, em voz alta, orgulhosamente, para que seus irmãos o ouvissem. Foi aí que, entusiasmado, viu seu pai que o filho "daria alguma coisa", e entregou-o imediatamente aos cuidados do professor Thomás Rufino de Saes, em cuja escola, dentro de pouco tempo, era o primeiro aluno e conquistava a alcunha de Doutor Tintim.

Passou, depois, para os cuidados do padre Joaquim José de Sant'Anna, sacerdote de excepcionais virtudes e ilustração, que lhe deu um excelente preparo, deixando-o em poucos anos em condições de se apresentar ao curso de uma Academia de Direito, que era o ideal de Xavier da Silveira.

Seu pai, entretanto, chefe de uma família bastante numerosa, não tinha recursos para mantê-lo na Faculdade de São Paulo e, assim, fê-lo ingressar no comércio local, na casa Vergueiro e Cia.

Desviado de sua verdadeira carreira, sofrendo intimamente com a situação, dentro de pouco tempo, entretanto, era Xavier da Silveira o mais benquisto dos caixeiros do comércio santista, despertando em todos a mais sincera admiração por sua inteligência e dotes oratórios. Fez-se então uma subscrição, de que participou o visconde de Vergueiro, e o Silveirinha, como o chamavam, pouco depois seguia para São Paulo, a fim de freqüentar a famosa universidade.

Ao fim dos dois primeiros anos de estudo, Xavier da Silveira, envergonhado de continuar pesando aos seus amigos de Santos, deu-lhes a entender que já podia ganhar o suficiente para manter-se em São Paulo, agradecendo-lhes o favor feito e dispensando-os de sua continuação. Fez-se guarda-livros de pequenas casas, e, mais tarde, entrou como auxiliar do escritório de advocacia do velho dr. Falcão, mestre de Direito e lente da Faculdade, o qual se entusiasmou pelo seu talento e dispensou-lhe paternal dedicação. Aí produziu as suas primeiras provas forenses, e de tal modo foram feitas que o ilustre jurisconsulto não desdenhava assiná-las. Xavier da Silveira tinha então apenas 21 anos.

Nessa idade, freqüentando o 3º ano, foi-lhe entregue o patrocínio de vários réus envolvidos num processo de homicídio, entre os quais o do banqueiro Pereira Pinto, e aí, lutando muito embora com o seu próprio lente, o dr. Clemente Falcão de Sousa Filho, e mais o dr. Benevides, encarregados da acusação, obteve completo triunfo, merecendo de seus dois exímios contendores os mais francos elogios.

Pode-se dizer que daí começou a vida pública de Xavier da Silveira, consagrado como o primeiro orador do seu tempo, representante da Academia em todas as festas, solenidades e comemorações, organizadas pela mocidade ou pela própria congregação.

Veio a guerra do Paraguai e Xavier da Silveira tornou-se obrigatório na praça pública, proclamando a necessidade do alistamento, conclamando o povo para esse dever. O Rio de Janeiro também ouviu a sua palavra nessa ocasião, inflamada, arrebatadora, levantando o povo contra o Paraguai.

Aureolou-se Xavier da Silveira de uma extraordinária fama. Figura expressiva e romântica, pela presença varonil, pelo trato, que era fidalgo, pela cultura, que era opulenta, pela inteligência, que era soberba. Disputado por homens e mulheres, o moço santista, de 25 anos, era a figura obrigatória das festas cívicas, religiosas, sociais, artísticas e populares. Contam-se coisas verdadeiramente lendárias do Silveirinha, lendárias na aparência, porque o testemunho da época confirmou-as todas como verídicas.

Liberal, foi o verdadeiro iniciador do Partido Liberal Radical, de São Paulo, em 1868. Abolicionista, foi o primeiro advogado de São Paulo a pôr-se ao serviço dos cativos, acoutando-os, aconselhando-lhes a fuga e a reação contra os senhores, e defendendo-os na barra do Tribunal, realizando os primeiros comícios públicos em favor da libertação, enfrentando as iras do visconde de Itaúna e de seu chefe de polícia, o dr. Sebastião Pereira, cujos erros profligava destemerosamente. Nada lhe impedia os discursos, nem baionetas, nem ameaças de bala. Marcava a hora de falar e falava, porque os próprios soldados o admiravam e deixavam que as suas mãos lhes abaixassem as baionetas, cruzadas à sua passagem.

A política tentou envolvê-lo, acenando-lhe com um lugar de deputado, e a sua resposta foi categórica: "era altivo demais para sujeitar-se às exigências de um compromisso partidário e, se algum dia fosse deputado, queria estar preso apenas à opinião pública da sua província, por delegação direta do eleitorado livre".

Poeta, orador, jornalista, jurista, patriota, pugnou violentamente por todas as causas coletivas; pela liberdade de consciência, na famosa questão Ganganelli, pela reforma judiciária, pela libertação dos escravos, pela moralidade política e, finalmente, pela construção do cais de Santos, escrevendo séries inteiras de artigos em todos os jornais de São Paulo e no Diário de Santos, subordinados ao mesmo título "Caes de Santos", em que, preconizando o regime da lei de 13 de outubro de 1869, insistia com ardor pelo grande melhoramento, verberando as vacilações e a inércia do poder central, em face do importante problema, que tanto interessava às indústrias, ao comércio e à expansão de toda a província.

Por força dessa campanha é que foi feito o primeiro contrato de 1870, com o conde da Estrela e o dr. Andrade Pertence, insinuada ao governo imperial pelo governo provincial a necessidade de se tomar uma iniciativa no assunto. Tal contrato, entretanto, não foi cumprido, como não o foi, também, a concessão dada ao governo provincial, em 1882.

Era tal a convicção com que Xavier da Silveira defendia seus ideais que, no dia em que ele perdeu o primeiro julgamento de um escravo, apaixonou-se de tal forma pela injustiça, que bradou em público: "Eu nunca mais voltarei ao Júri de São Paulo", e cumpriu seu juramento, apesar das instâncias gerais; ele, que era o ponto alto daquela tribuna, aponto de serem obrigados a transferir o local das sessões do Júri para a sala da Assembléia Provincial, por falta de espaço para receber a massa popular que acorria a ouvir as suas extraordinárias defesas.

Os depoimentos sobre a grande figura de Xavier da Silveira são inúmeros. Luís Gama, o apóstolo da Abolição, dele declarou: "Enquanto Xavier da Silveira viveu, a luz vinha de Santos, porque ele era o porta-bandeira da abolição na província de São Paulo, e nós todos esperávamos sempre a palavra de ordem, que vinha dele". Ninguém poderia consagrar melhor o abolicionista do que Luís Gama.

José Bonifácio "o moço", que na opinião comum foi o maior orador parlamentar do Brasil, disse dele: "Xavier da Silveira, numa tribuna, não era um orador, era um fenômeno".

Martim Francisco, Campos Salles, Martinho Prado, Saldanha Marinho, José Bonifácio, Quirino dos Santos, Américo de Campos, Joaquim Nabuco, Eduardo Prado, Rodrigues Alves, Luís Gama, Theóphilo Ottoni, João Mendes, Clemente Falcão e tantos outros vultos deixaram depoimentos escritos sobre Xavier da Silveira, consagrando-o um homem extraordinário, como orador popular e judiciário.

Estabelecido definitivamente em Santos, em 1870, depois de ter sido redator-chefe do Diário de Santos, montou seu matutino A Imprensa, e nela estaduou sua capacidade e defendeu seus ideais, por quatro anos, falecendo em plena mocidade, vitimado pela varíola, a 30 de agosto de 1874, sob o pranto geral da província e o luto sentido do povo de sua terra.


Xavier da Silveira
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