Monumento retrata o heroísmo dos
combatentes paulista
Foto: Roberto Konda, publicada com a matéria
Cidade festeja o 60º aniversário da Revolução
de 32
Da Editoria Local
O 60º aniversário da Revolução Constitucionalista de 32 será comemorado hoje pela
Prefeitura, Câmara, Associação de Combatentes de 32 de Santos, Movimento de Arregimentação Feminina (MAF) e Polícia Militar, a partir das 8h30,
junto ao Monumento do Soldado Constitucionalista, na Praça José Bonifácio.
Constam da programação festiva homenagens aos ex-combatentes, por intermédio de
pronunciamento do veterano Oswaldo Franco Domingues, orador da Associação de Combatentes e do ex-delegado Renato Leite Sant'Anna, que falará pelo
MAF, após o hasteamento das bandeiras Nacional, Paulista e Santista.
O desfile dos veteranos de 32 está previsto para as 9 horas, com acompanhamento da
Banda Militar do 6º BPMI. A missa solene será realizada às 9h30, na Catedral, e a entrega de placa de Mérito à Associação dos Combatentes de 32 de
Santos, pela Câmara Municipal, acontecerá às 10 horas. O vereador Matsutaro Uehara fará o discurso de saudação.
Após a sessão solene que será realizada na Câmara Municipal, autoridades,
ex-combatentes e amigos dos veteranos de 32 seguem para o Cemitério da Areia Branca, para a deposição de coroa de flores junto ao Mausoléu do
Soldado Constitucionalista. Às 18 horas, os Escoteiros de Santos executam o arriamento das bandeiras.
São Vicente - Na Praça Heróis de 32, no Gonzaguinha, às 8 horas, haverá
hasteamento de bandeiras em comemoração ao movimento constitucionalista e às 9 horas será celebrada missa na Igreja Nossa Senhora do Amparo, na
Avenida Capitão-mor Aguiar.
Conforme programação da Secretaria de Cultura, Esportes e Turismo da Prefeitura de
São Vicente, às 10 horas será feito o traslado dos restos mortais do soldado Mário Augusto dos Santos Lopes para o Mausoléu dos Heróis de 32, no
Cemitério Municipal.
Na Capital - Em São Paulo, o governador Luiz Antônio Fleury participa das
festividades em memória aos que tombaram no conflito de 32, pela democratização do País, que inclui desfile cívico-militar, às 10 horas, no
Ibirapuera.
Deputado pede pensão para ex-combatentes
Hoje, no 60º aniversário da Revolução Constitucionalista de 32, vale lembrar que
tramita na Assembléia Legislativa o Projeto de Lei nº 1.069, de novembro de 91, de autoria do deputado Erasmo Dias, que fixa a pensão especial aos
veteranos de 32 em valor correspondente à de segundo tenente da Polícia Militar.
Em seu projeto, o deputado salienta que os ex-combatentes da Segunda Guerra Mundial,
pela Constituição Federal de 88 (Artigo 53 do Ato das Disposições Transitórias) têm como pensão o correspondente à deixada por segundo-tenente da
Forças Armadas.
Em fevereiro desse ano, Erasmo Dias apresentou requerimento solicitando a tramitação
do Projeto 1.069 em regime de urgência, por acreditar que a medida pleiteada ao Governo Estadual terá aprovação unânime da Assembléia.
Em junho, ele apresentou a indicação nº 1.020, lembrando o aniversário da Revolução.
E novamente pediu a pensão especial para os ex-combatentes de 32, lembrando que os poucos que ainda estão vivos "já beiram os 80 anos".
Herói santista deixa depoimento
A Revolução de 32 marcou tão profundamente o ex-combatente santista Antônio de
Andrade que antes de falecer, em 14 de março de 89, ele deixou seu depoimento sobre a epopéia paulista (o documento foi fornecido a A Tribuna
por seus familiares).
Antônio Andrade nasceu em Santos em 1913 e participou da Revolução, apresentando-se
como voluntário. No dia 30 de julho embarcou para Cachoeira, de onde seguiu para as linhas de frente fazendo toda a campanha. Regressou, no dia 2 de
outubro, após o término da revolução, segundo consta do certificado de desincorporação do Batalhão do Tiro Naval de Santos.
Antônio Andrade integrou a Associação dos Combatentes de 32 e recebeu medalhas por
sua participação no conflito entre São Paulo e a União. Foi casado com Celestina Fernandes de Andrade, tendo dois filhos, Wilma Therezinha e Wilson.
Em 47, Antônio Andrade constituiu sua firma com o ramo de papelaria e material de escritório, administrada atualmente por seu filho Wilson.
Tiro naval era considerado tropa de 1ª linha
"Organizaram-se vários batalhões - Acadêmico - Operário - Legião Negra, e o Tiro
Naval do Estado de São Paulo, o qual, nas linhas de frente, foi considerado tropa de 1ª linha. Também saíram outros batalhões, os B.C.R. (Batalhões
de Caçadores da Reserva).
"Do Tiro Naval morreram em combate, entre outros, os saudosos heróis santistas.
Ivampa Lisboa, Alfredo Albertini e Thiago Ferreira, que tiveram seus nomes perpetuados em algumas ruas de nossa Cidade.
"A camaradagem da tropa era magnífica, todos se ajudavam, animando-se uns aos outros.
Vivíamos como irmãos. A alimentação não faltava, pois a retaguarda, muito bem organizada, se esforçava para que nada faltasse aos soldados, nas
linhas de frente.
"Em campanha, a higiene é conforme as circunstâncias; eu, por exemplo, passei cerca
de dois meses sem banho! Parece incrível, mas, todos têm de se adaptar às contingências de uma campanha.
"Saímos de Santos, numa tarde de julho, tendo antes passado alguns dias em Praia
Grande, em defesa do litoral. Chegamos à Capital à noite, jantamos no quartel da Força Pública em Santana, se não me falha a memória, desfilamos
pelas ruas da cidade e, às 24 horas, embarcamos na Estação do Norte rumo a Cachoeira Paulista, onde amanhecemos. Nesta cidade se achava instalado o
Q.G. da revolução, pois a frente Norte era importantíssima.
"Montamos guarda nessa cidade, pouco menos de um mês, ficando sob nossa
responsabilidade a guarda da cidade e do Estado Maior. Muitas vezes velei o sono de nossos comandantes. Mantinha profunda admiração e respeito pela
figura do então coronel Euclydes Figueiredo, figura austera e de uma personalidade marcante.
"Uma noite fomos convocados para seguirmos para a frente de Queluz; formamos dois
pelotões de mais ou menos 150 homens, cientificados de que iríamos "agüentar uma debandada de nossas valorosas forças em Engenheiro Bianor, um pouco
adiante de Queluz. À nossa frente, seguia o trem blindado a que me referi.
"Descemos em Queluz passando a noite inteira debaixo de uma garoa fria e fina, onde
aguardamos ordens.
"Durante toda a noite, presenciamos nossos soldados chegando das trincheiras que
foram forçados a abandonar, pois, esses bravos não resistiram, por falta de munição, víveres e ante o maior número de forças e equipamentos do
inimigo. Nessa debandada, morreu o soldado João Pinho, cujo nome foi dado a uma das ruas de nossa Cidade. Imaginem nós assistindo a tudo isso, como
não estaria nosso moral? Assim mesmo, pela manhã recebemos ordens para partir para frente.
"Dividimo-nos em dois grupos de mais ou menos 75 homens cada um: um grupo foi tomar
posição em determinado setor e outro, do qual eu era integrante, seguiu rumo ao desconhecido.
"Considerando não termos um oficial que conhecesse bem o terreno inimigo, já
abandonado por nossos companheiros, éramos comandados pelo bravo e saudoso sargento Armando Erbisti, mais tarde promovido ao oficialato por
merecimento e que desconhecia as posições que deveríamos ocupar. O que poderíamos fazer nessas circunstâncias?
"Lembro-me que chegamos a atravessar uma ponte existente adiante de Queluz, sob o Rio
Paraíba (na minha opinião já em terreno inimigo), quando fomos metralhados e bombardeados; era o nosso batismo de fogo.
"Tivemos um princípio de pânico, o que era natural, devido à surpresa, e parecia
termos caído numa verdadeira ratoeira. Passados os primeiros momentos em que nos jogamos uns sobre os outros dentro do trem, o maquinista, por sua
própria iniciativa, e graças à Providência Divina, retornou a toda velocidade para Queluz; creio devermos a isso não termos perdido nossas vidas.
"Durante o dia, correu o boato de que a revolução tinha terminado (boatos é que não
faltavam), e foi uma euforia geral: a soldadesca disparava suas armas para o ar, o que constituía mais um perigo, mas, fora tudo um boato, e aí
começou a retirada das tropas desse setor.
"O Tiro Naval foi a última tropa a ser retirada, por falta de transporte, e somente à
tardinha, quando nos parecia iminente a entrada dos inimigos nessa cidade.
"Posteriormente, voltamos para Cachoeira Paulista e logo em seguida fomos destacados
para a frente de Silveiras, pequeno município à margem da estrada de rodagem. Aí permanecemos até o final da revolução, ou melhor, quando mais tarde
houve nova retirada de nossas forças, pois, já não havia mais condições de resistência ante o maior número de homens do inimigo, e também porque o
Governo que combatíamos tivera tempo de transportar tropas do Norte e Nordeste, comandadas pelo general Góis Monteiro.
"Em Silveiras, éramos bombardeados diariamente pela aviação inimiga, pelos chamados
vermelhinhos, por serem seus aviões pintados de vermelho. Num desses bombardeios, uma bomba feriu alguns de nossos companheiros, felizmente
levemente.
"No setor de Silveiras, tombaram em combate os bravos e saudosos companheiros Ivampa
Lisboa, Alfredo Albertini e Thiago Ferreira, camaradas maravilhosos, que deram suas vidas pela causa de São Paulo. O setor de Silveiras era
comandado pelo coronel Andrade, de Belo Horizonte, um dos poucos que viera de Minas para juntar-se a nós.
"Nessas ocasiões, a tristeza se apossava de nós, o moral ficava um tanto abalado,
porém reagíamos, cantando a canção do marinheiro, Cisne Branco, ao rufar dos tambores de nossa banda marcial. As reações de cada combatente,
nas horas amargas, são diferentes, alguns se descontrolam momentaneamente, mas a maioria, depois de breves momentos, consegue dominar-se. Depende da
natureza de cada um, é o instinto de sobrevivência.
"Não sou nenhum estrategista militar, mas penso que se nossas forças tivessem
avançado na madrugada de 9 de julho, talvez tivéssemos vencido a revolução, pois as guarnições do Rio de Janeiro teriam sido pegas de surpresa.
"Para se ter uma idéia do que penso, as tropas paulistas chegaram na madrugada de 9
de julho às portas de Rezende, dentro do Estado do Rio, onde pararam esperando que Minas, governada por Olegário Maciel e que estava comprometida
conosco, fizesse sua parte: entretanto, foi o contrário, pois vieram contra nós. Tínhamos também o comprometimento do Estado do Rio Grande do Sul,
que falhou, combatendo-nos na frente Sul.
"Talvez o critério de nosso alto comando, em não avançar além de Rezende, tenha sido
para evitar derramamento de sangue, contando com o apoio desses dois estados.
"Assim, São Paulo ficou isolado do resto da Federação, lutando e cercado por todos
lados, inclusive, tendo o Porto de Santos bloqueado pela Marinha de Guerra.
"Dest'arte, tivemos que nos arrumar com o que tínhamos e, ante o número superior de
nossos inimigos em homens e armas, fomos vencidos.
"São Paulo foi vencido pelas armas, mas vitorioso moralmente
e serviu de exemplo para o resto do Brasil, e, se hoje temos Legislativo e uma Constituição, estes nada mais foram que os frutos e sacrifícios
daquele movimento histórico e que foi, aos poucos, mudando a mentalidade de nosso povo"
(depoimento do ex-combatente Antônio Andrade).
Documentação fotografada por Carlos Pimentel Mendes em
16/12/2007
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