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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - SANTOS EM...
1967 - pelo jornal Cidade de Santos

"Santos terá 857.010 habitantes no ano 2000..."

Em sua primeira edição, no dia 1º de julho de 1967, o jornal Cidade de Santos (grupo Folha de São Paulo - exemplar no acervo do historiador Waldir Rueda -), publicou esta matéria:


Foto publicada com a matéria

Santos, para seu governo

João da Silva desce o morro do Saboó, vai para o trabalho no porto. Como ele, à mesma hora, muita gente desce o seu morro. Ao todo, são 35, alguns com nomes assim: do Bufo, do Tatu, do Gabriel.

José de Sousa esteve por aqui na última temporada de verão, com mulher e filhos num apartamento alugado no José Menino. Voltou para São Paulo sem saber que a família faz parte do milhão de turistas que visitaram Santos na mesma época.

O santista e o turista (em maior parte da capital, mas também há muitos estrangeiros) vêem 7 km de praia, pisam o asfalto dos 32 km da área urbana. Mas Santos é muito mais, os 753 km² do Município têm pormenores que nem todos conhecem (N.E.: Bertioga só deixou de fazer parte do território municipal 25 anos depois desta matéria ser publicada).

A Baixada se explica - Isto quase todos sabem: o Município é uma faixa continental, mais a maior parte da ilha de São Vicente. O oceano é o Atlântico, a posição geográfica em relação à Capital é Sul-Leste. A Baixada se chama Santista. Explicar como é a Baixada já fica um pouco mais difícil: ela é formada pelo recuo da Serra do Mar e confinada pelas serras do Quilombo (a Leste), do Morrão, de Moji e do Meio (ao Norte) e de Cubatão (a Oeste). Limitada por Bertioga e Mongaguá, em sua parte voltada para o mar, ela separa o Litoral Norte do Litoral Sul.

Dentro da Baixada, o Município de Santos limita-se ao Norte com Santo André, Moji das Cruzes e Salesópolis; a Leste com São Sebastião; a Oeste, com São Vicente e Cubatão; ao Sul com Guarujá; que está na ilha de Santo Amaro, outra resposta fácil.

Morros: um é do Tatu - Exatamente 35 morros ocupam 6,7 km² da área urbana, com uma altitude média de 200 m. Os nomes são curiosos, às vezes escondem um pedaço da história da cidade, suas crenças: Santa Teresinha, Serrat, do Pacheco, do Saboó, da Caneleira, de São Bento, do Bufo, dos Monos, do Catupé, do Guarepá, do Caeté, da Enseada, da Senhorinha, de São Lourenço, da Volta, Diana, do Tatu, da Boa Vista, Gaiubura, Bananal, do Gabriel, da Furna Grande, dos Três Morrotes, do Fontana, do Itaguá, do Perequê Mirim, das Neves, da Nova Cintra, do Marapé, Monte Cabrão, do Cedro, da Fornalha, do José Menino, de Santa Maria e da Penha.

Podia ser maior - Esses morros e sua terra entraram na vida da cidade, fazem parte dela. Mas daí para a frente, o solo trata de impor ele próprio os limites da área urbana, não permite expansão maior. Com isso, surgem restrições ao desenvolvimento agrícola e industrial do Município.

Como pinças, escarpas de serra, os vales estreitos e longos que caracterizam o relevo em território santista. Na divisa de Santo André e Moji das Cruzes, ergue-se a serra de Paranapiacaba, enquanto a serra do Mar se estende de Norte a Leste, separando o município de Salesópolis e São Sebastião. O pico de Jaguareguava é o mais alto, com seus 1.275 m, na serra de Quilombo. Mas ainda há as serras de Jurubatuba, Cambuçu e Quatinga.


Foto publicada com a matéria

Areia fina e compacta ocupa de 6 a 12 metros do solo santista. Embaixo, uma camada de argila marítima que aparece em alguns pontos. O lençol de água (chamado freático) é quase superficial, está apenas a metro e meio de profundidade.

Um rio doce e salgado - O Casqueiro é rio conhecido do paulistano que vem chegando a Santos, no retão da Anchieta. Mas há o pormenor: o chamado rio Casqueiro é um braço de mar que separa a ilha do continente, vindo do estuário para desembocar no oceano. Ali, água salgada se mistura à doce, trazida pelos afluentes.

Dos Alhos, dos Monos, são outros rios da Baixada, como o Soledade (a retificação de seu curso permitiu a construção do canal Um), Quilombo, Jaguareguava, Itatinga, Cabuçu, Itapanhaú, Diana, Trindade, Perequê-Mirim, Iriri, Fama, Vermelho, Guaratuba, Vermelho de Cima, São Jorge.

Serra e mar - a sorte - Serra e mar estão juntos para garantir variações menos bruscas de temperatura. Não fosse a brisa de cada um, a se alternarem constantemente, o termômetro registraria todo o golpe das mudanças provocadas pela umidade excessiva: 80%. Essa é uma característica do clima em Santos, explicado genericamente como quente e úmido. Para completar a definição, há a temperatura que varia entre 10 e 38 graus centígrados (média de 22) e os 2.541 mm de chuva, em média, por ano. Em agosto começa a época de chover menos, que vai até setembro. Entre fevereiro e março, caem as chuvas de verão, abundantes e mais freqüentes.

Porto chamou gente - Na temporada de verão, o santista tem que dividir o seu chão com milhares de turistas. Gente e mais gente, que não custa a somar o milhão e tanto com o pessoal da terra, já acostumado com essa época de correria para disputar lugar na praia. Termina a temporada, Santos volta a ser uma cidade como as outras, cuja população poderia ser recenseada sem risco de erro maior. Por enquanto, a projeção dos números encontrados pelo Censo Escolar de 64 indica que moram aqui entre 300 e 350 mil pessoas, para 271.267 na ocasião daquele levantamento. Isso significa um aumento de 500% desde o início do século (N.E.: século XX).

A expansão demográfica santista tem um bom motivo: o porto. Antes dele, a população crescia, mas devagar. Por exemplo: 13.012 habitantes em 1772 e mais 4,4%, apenas, em 1890, ou dois anos antes da inauguração do porto.

O comércio do café, estimulado no começo do século, assegurou a continuidade do crescimento da população em bom ritmo nos vinte anos subseqüentes a 1900. Em 1920, a população dobrava com relação à que existia em fins do século passado (N.E.: XIX), para atingir a casa dos 102.589 habitantes.

A evolução está nestes números:

Anos

Habitantes

1900

  50.389

1920

102.589

1940

158.998

1950

203.562

1960

265.753

1965

280.000

Hoje, 350.000. Mas julho está aqui. Mês de férias. O número vai aumentar bastante, outra vez.


Foto publicada com a matéria

Preocupação de hoje: ano 2000

Com mais 33 anos, Santos terá 875.010 habitantes (N.E.: a projeção correta seria 857.010, conforme a tabela abaixo, publicada pelo mesmo jornal), o dobro e outro tanto da população atual. Será o ano 2000 na base da explosão demográfica, o mesmo ritmo dos 3% ao ano (ou pouco mais) de aumento populacional que assusta grande parte do mundo, que não sabe o que fazer com tanta gente e problemas sempre maiores.

Santos cresce, precisa de um Plano Diretor. A firma encarregada pela Prodesan de fazer um projeto desse programa conseguiu pintar um retrato da cidade no futuro, calculou a projeção do aumento da população e desceu a pormenores que, a um só tempo, entusiasmam e preocupam.

Boqueirão será o maior - Santos, ano 2000: o bairro mais populoso será o Boqueirão, com 161.700 habitantes. Em segundo lugar, o Macuco, com 111.200. No Boqueirão e no Embaré não poderá morar mais ninguém, a capacidade de receber novos moradores estará saturada.

De outras áreas da cidade o estudo afirma: "Os bairros da Areia Branca e Santa Maria, aos quais se atribui um índice de crescimento demográfico de 5% ao ano, formam, ao lado das vilas próximas, a área de maior desenvolvimento da cidade. Para eles converge grande número de pessoas desalojadas dos bairros da zona Leste e que imigram para Santos". Um dos motivos apontados para essa explosão demográfica na Zona Noroeste são as obras de drenagem e pavimentação ali esperadas, explicação que vale também para a Ponta da Praia. Lá, "o índice poderá ultrapassar os 3,5% programados e chegar a 5%, em vista das obras de saneamento projetadas e algumas já em execução".

Os autores do levantamento sugerem a divisão da cidade em 29 bairros, entre eles 4 novos - Alexandre Martins, Encruzilhada, Bandeirantes e São Francisco - além de alguns núcleos populacionais. E argumentam que assim a administração poderia ser racionalizada, todas as áreas receberiam a assistência necessária.

Por enquanto, para preocupar há estes números:

Bairros

Taxa cresc.
anual

1960

1965

1970

1980

2000

A. Branca

5,0

10.943
14.040
17.920
29.200
77.400
Santa Maria

5,0

3.154
4.050
5.150
8.360
22.200
Alemoa

2,6

598
690
790
1.000
1.680
Saboó

4,5

3.400
4.240
5.280
8.200
19.780
Valongo

2,6

1.463
1.660
1.900
2.450
4.090
Centro

1,0

7.870
8.270
8.690
9.600
11.710
Paquetá

1,0

4.019
4.460
5.510
5.760
7.020
Vila Nova

1,0

8.171
8.590
9.000
9.920
12.160
Jabaquara

2,6

2.719
3.090
3.520
4.540
7.600
V. Matias

1,6

23.226
25.150
27.220
31.820
43.800
Macuco

2,4

43.058
48.480
54.580
69.200
111.200
Estuário

2,1

14.115
15.650
17.380
21.400
32.430
P. Praia

3,5

18.828
22.360
26.560
37.470
74.550
Embaré

4,6

14.404
18.050
22.580
35.400
87.030
Boqueirão

5,6

18.291
24.020
31.140
54.380
161.700
Gonzaga

2,6

14.740
16.760
19.050
24.630
41.160
José Menino

1,2

7.982
8.470
8.990
10.300
12.860
Campo Gde.

1,7

17.556
19.100
20.780
24.600
34.460
V. Belmiro

1,4

10.054
10.780
11.550
13.270
17.530
Marapé

1,9

16.141
17.730
19.480
23.520
34.280
Morros

2,0

19.185
21.180
23.390
28.510
42.370
TOTAL
 
260.617
297.320
340.160
453.530
857.010

Um retrato para o futuro

Quem fizer o Plano Diretor também precisa saber como a cidade é atualmente, se a intenção é traçar normas administrativas que acompanhem seu crescimento.

Em 1964, no governo do prefeito Fernando Ridel, o Grupo Executivo de Planejamento dividiu Santos em 19 bairros e centro. Todos eles distribuídos por três regiões: Zona Leste dos Morros, sem a parte da praia; Orla Praiana; Zona Oeste dos Morros, também chamada Zona Noroeste.

Sol nasce para os velhos - Do lado do sol nascente, onze bairros mais o Centro fazem a Zona Leste dos Morros: Vila Matias, Vila Nova, Paquetá, Vila Belmiro, Jabaquara, Macuco, Estuário, Campo Grande, Marapé e Valongo. É a parte mais velha da cidade, o núcleo de onde o progresso se expandiu e aos poucos foi-se irradiando em novas direções. Superfície, 1.159,7 hectares, lugar em que viviam 145.629 habitantes em 1963, ou mais da metade (54,3%) da população do Município.

Onde o comércio vive - Do café ao par de meias, o comércio está no Centro, espalhado pelas ruas XV e do Comércio, Senador Feijó, General Câmara, João Pessoa, Augusto Severo, D. Pedro e tantas outras.

As lojas e as casas de corretagem abrem as portas para a maior parte dos monumentos históricos. Estão por ali o Panteão dos Andradas, com os restos mortais dos "Irmãos da Independência Nacional" e a igreja e convento do Carmo, construção iniciada em 1599.

Nos 91,5 hectares do centro da cidade também ficam a Prefeitura, a Câmara, a Biblioteca, um cinema e o cine-teatro Coliseu (inaugurado em 1924, com 1.692 lugares).

População em 1963: 7.870 habitantes, ou 86 por hectare.

Matias, dono de um bairro - De um gesto de Matias Costa se fez a Av. Ana Costa: em 1890, o rico português, dono de quase todas as terras onde hoje é a Vila Matias, doou ao Município a área necessária à abertura daquela avenida, que ganhou o nome de sua esposa, mais a Júlio Conceição, Rangel Pestana, Comendador Martins, Júlio de Mesquita e Lucas Fortunato. Com sua ajuda também foi possível inaugurar a primeira linha de bondes (puxados a burro) de Santos. Morreu aqui mesmo, assassinado por questões de terra.

Vila Matias é o segundo bairro mais populoso da cidade, com 23.326 habitantes que vivem numa área de 181 hectares (128 por hectare). É zona comercial e residencial, no sopé do Monte Serrat, ao lado do Jabaquara.

Esta é a mais nova - A Vila se chama Nova, mas tem sua história: uma versão diz que os antigos habitantes da cidade lhe deram o nome para designar a parte então mais nova do Município. Ali também se misturam lojas e residências, estas crescendo em número à medida que se aproximam dos bairros mais afastados do Centro.

Limitada pelos bairros do Macuco, Vila Matias, Paquetá e Centro, a Vila Nova se estende por 46 hectares, os habitantes são 8.171 (178 por hectare).

Entre o Centro e Vila Nova, Paquetá é o bairro mais oriental da cidade. Alcança uma parte da faixa do cais. Quando passavam por ali, os índios diziam paã-ique-tá, ou "pantanal mais duro" (paã: atolar; ique: lado; : sujo, forte). Em sua História da Cidade, Francisco Martins dos Santos diz que "os velhos santistas ainda se lembram do pântano do Paquetá e são testemunhas, principalmente, de que ficava na região do mercado e daí para cima, junto ao cemitério dos ingleses".

O Mercado Municipal continua nesse bairro mais comercial que residencial. Área de 54,5 hectares, 4.790 habitantes (86 por hectare).

De Belmiro, o prefeito - Vizinha do Marapé, Vila Belmiro ocupa a parte mais central do bairro do Campo Grande. Seu nome é homenagem a Belmiro Ribeiro de Moraes e Silva, importante na política e no comércio do café no começo do século, prefeito da cidade de 1910 a 1920.

Hoje, a Vila é conhecida no país inteiro (e em boa parte do mundo) por causa de Santos e Pelé. Mas em 1900, segundo Francisco Martins dos Santos, "era um vasto lençol de matas e brejais, onde se refugiava gente da pior espécie e a própria polícia tinha receio de entrar. Belmiro Ribeiro comprou e mandou aterrar as terras centrais, abrindo valas e ruas e vendendo lotes".

São 71 hectares, 10.054 pessoas (142 por hectare).


Gonzaga: no canto esquerdo, parte do Atlântico Hotel, na esquina das avenidas da praia com a Ana Costa; do outro lado da Ana Costa, ao centro, o arvoredo do antigo Parque Balneário Hotel
Foto publicada na mesma edição nº 1 do jornal Cidade de Santos

Jabaquara, riozinho ligeiro

Hoje o rio desapareceu, mas o nome ficou: Jabaquara, filete de água que saía dos morros do Fontana, Nova Cintra e São Bento, passava pelo atual bairro do Marapé e desaguava na praia do José Menino. Explicando o Tupi, I-A-baquara significa "o corredor, ligeiro" ou então "o buraquento", como era o riozinho.

O bairro está junto à saída do túnel do Monte Serrat, entre Vila Matias, Vila Belmiro, Marapé e os morros.

Vicente de Carvalho canta o famoso quilombo do Jabaquara, que existiu na região, em seu poema Fugindo ao Cativeiro. O refúgio de escravos ficava atrás do morro da Santa Casa, uma ramificação do Monte Serrat. Entre 1882 e 1888 foi, segundo a História, "a mais alta expressão do abolicionismo no Brasil".

Para quem acha que há confusão na explicação da origem do nome, Francisco Martins dos Santos faz a advertência: "É preciso não confundir esta denominação com jabaquara de jaba (fujão) e quara (paradeiro, refúgio, abrigo), significando refúgio de fujões. Tal etimologia, aplicada a denominações idênticas de outros lugares, não se aplica, absolutamente, a esse caso, porque Jabaquara é denominação multi-secular do riozinho antigo da região".

Área de 72 hectares, população de 2.179 habitantes (38 por hectare). Uma parte vive no núcleo residencial chamado Casa Branca.

Macuco, alvo de Francisco - Com 43.058 habitantes em 1963 (16,5% da população santista), o Macuco é o bairro mais populoso. Na área de 300,7 hectares, a densidade demográfica é de 143 habitantes por hectare. Ali mora grande parte do operariado santista. São núcleos residenciais as Casas Populares, a Bacia e Outeirinhos.

Macuco, pássaro negro que o português Francisco Manoel do Sacramento gostava de caçar em sua chácara. Depois ficou sendo o nome da família que no fim do século passado (N.E.: século XIX) ainda possuía quase todas as terras hoje ocupadas pelo bairro: o princípio era onde está a Rua Braz Cubas, junto à Campos Sales, continuavam até a região da "Encruzilhada", atual Rodrigues Alves, e tomavam o rumo do porto.

O Macuco limita-se coma Vila Nova, Vila Matias, Boqueirão, Embaré, Estuário e grande parte da faixa do cais. Tem uma vantagem sobre a grande maioria dos bairros: quase toda sua área é drenada, não falta água nem luz.

Entre o Macuco e a Ponta da Praia, ocupando também uma parte da faixa do cais, o Estuário. Superfície de 108 hectares, população de 14.115 habitantes (131 por hectare).

Estuário, ali mesmo - Aqui não há dúvida: o bairro tem o nome porque está na faixa do estuário. Também é zona residencial, principalmente dos operários do porto, que enfrentam este grande problema: a maior parte da área não é drenada, nem pavimentada.

O campo é grande - O antigo sítio do Campo Grande, localizado em região com as características de um grande campo, deu nome ao bairro que ocupa o quarto lugar, em população. Campo Grande está entre os bairros do Marapé, José Menino, Vila Matias, Vila Belmiro e Gonzaga.

A classe média faz maioria entre seus habitantes: 17.556 ao todo (área de 114 hectares, 154 pessoas por hectare).

Marapé, só a trilha - A Sociedade Melhoramentos do Marapé reclama canal limpo, posto policial, ambulatório médico, posto de saúde, melhor iluminação e pavimentação para algumas ruas.

Séculos atrás, era só Pera (mar) e (caminho), provavelmente uma alusão ao primitivo caminho dos índios, o único que existiu durante centenas de anos para ligar a parte da ilha que deita para o estuário e a outra, voltada para o mar grosso.

"O caminho do Marapé ou Perapé - diz Francisco Martins dos Santos - era o mesmo tão citado nos compêndios históricos como sendo o caminho aberto por Pascoal Fernandes e Domingos Pires, fundadores de Santos, os quais, no entanto, nada mais fizeram do que melhorar o que já existia para que, por ele, se fizesse comunicações com São Vicente".

O caminho era assim: partia de junto do porto, perto da Alfândega atual, passava junto a Itororó (Monte Serrat), subia a lombada existente junto à Santa Casa, descia a várzea do Jabaquara e daí, sempre costeando os morros, chegava ao atual Marapé e, finalmente, à praia, num ponto próximo ao morro do Catupé. Com a abertura do caminho do Saboó, no século XVIII, a trilha antiga foi caindo em desuso.

O Marapé estende seus 121 hectares pela encosta do morro de nome igual, entre os bairros do Jabaquara, Vila Belmiro, Campo Grande e José Menino. É zona residencial, também da classe média. Vila Enedina, Vila Atlântica e Contorno são núcleos populacionais. Em cerca de 30% de sua área não houve drenagem, nem pavimentação (é a parte próxima ao morro).

Segundo pesquisa realizada em maio último, pela assessoria universitária do vice-prefeito Francisco Prado, a renda mensal das famílias do Marapé oscila entre NCr$ 150 e NCr$ 600, o que dá a média de NCr$ 288 (N.E.: o salário mínimo mensal era de NCr$ 105, nesse período). Cerca de 40% residem em casa própria. Televisor, geladeira, rádio e ferro elétrico é o que praticamente não falta, pois 90% das famílias têm. Enceradeira e liquidificador estão em 80% das casas.

A pesquisa revelou ainda que não existe problema quanto à educação, coleta de lixo e transportes. O índice de analfabetismo é de 10%. Possuem instrução primária 60% dos moradores; secundária, 20%; superior, 10%.

Ao todo, 16.141 habitantes (133 por hectare).

O caminho que vai ao longo - É o Valongo, entre o Saboó e o centro da cidade, vindo do Estuário. Seu nome também se origina de um caminho antigamente existente "ao longo" do Estuário: o caminho que "vai ao longo" do Estuário. Daí a abreviação para Valongo.

É o menor bairro santista, com seus 13,5 hectares, e a menor população, 1.463 habitantes (13 por hectare).


Foto publicada na mesma edição da matéria

Embaré de ponta a ponta

O nome da praia de Santos, desde a Ponta da Praia até o José Menino (onde passa a chamar-se Itararé) é Embaré. Diz Francisco Martins dos Santos: "Hoje, a praia do Embaré está dividida em quatro bairros, cujos nomes prevalecem também para sua própria designação local: Ponta da Praia, Boqueirão, Gonzaga e José Menino (na época o historiador não considerou o próprio bairro do Embaré). É nosso dever, porém, conservar a tradição, mantendo a primitiva denominação para a praia histórica onde desceu Martim Afonso de Sousa".

O nome é originário do tupi: Mbaraa (enfermidade) e (comodidade, conforto). Seria uma referência às qualidades medicinais das areias da praia, reconhecidas pelos índios.

Nos cinco bairros da Orla da Praia residiam, em 1963, 74.245 pessoas, ou 28,4% da população santista. É zona residencial e turística, onde estão os melhores hotéis, bares, restaurantes, as mais belas casas da cidade. A área total é de 737,5 hectares. Apenas o José Menino tem população inferior a 10 mil habitantes.

Na Ponta, o futuro - Em cerca de 50% do bairro da Ponta da Praia não há drenagem, esgotos e pavimentação. É a zona mais atrasada da Orla, mas há quem a considere em condições de expandir-se mais que qualquer outra, seria o "bairro do futuro".

Este ano, a Prodesan iniciou as obras de drenagem da região e para a conclusão o prefeito pediu empréstimo à Aliança para o Progresso. Melhoramento que a importância do bairro, eminentemente residencial, justifica: em 1963 era o terceiro mais povoado e o segundo em superfície, com 282 hectares (67 habitantes por hectare).

Na Ponta da Praia estão o Aquário, o Museu de Pesca, o Instituto de Pesca e o Instituto Oceanográfico. É região de contrastes: humildes chalés de pescadores ao lado de luxuosas residências de veranistas e altos edifícios à beira-mar; desde simples barracas de madeira, para a venda de peixe, até os restaurantes de categoria.

Limita-se com o Estuário, Macuco e Embaré.

A chácara do visconde - A praia deu o nome ao visconde do Embaré e assim também foi batizado o bairro onde ele tinha uma chácara no lugar em que está a basílica menor de Santo Antonio do Embaré.

O Embaré estará superlotado dentro de alguns anos, ninguém mais poderá morar lá. Hoje, já são 136 habitantes em cada um dos seus 106 hectares, ou uma população de 14.404.

O núcleo de Vila Hayden, recentemente drenado e pavimentado, faz parte do Embaré. Os limites do bairro: Ponta da Praia, Estuário, Macuco e Boqueirão.

Boqueirão, outro explosivo - No Boqueirão, o mesmo problema do Embaré - a explosão demográfica - tornará seus 141 hectares muito pequenos para receber outras pessoas além das 18.291 que já tem (129 por hectare). Faz limite com Vila Matias, Macuco, Embaré e Gonzaga.

Francisco Martins dos Santos conta assim a história do bairro: "Antes de ser aberta a avenida Ana Costa, era a única saída existente para a barra, formando o boqueirão ou aberta para a praia. Essa denominação procede do século passado, entre 1840 e 1845, quando da construção das primeiras chácaras, o que profocou a utilização constante da passagem, quando se fez o chamado Caminho Velho ou Caminho Velho da Barra, o primeiro que, tendo início na atual Rua Braz Cubas, proximidades da Vila Matias, seguia o traçado da Rua Luís de Camões, atravessava a Conselheiro Nébias, formando a conhecida Encruzilhada, na esquina da Rodrigues Alves, seguindo, então, por dentro do mato, até o Boqueirão, pelo traçado da atual Rua Oswaldo Cruz".

Gonzaga, uma dúvida - Homem gordo e de estatura média, chamado Antonio Luís Gonzaga. Até aí não há divergência entre Costa e Silva Sobrinho e Francisco Martins dos Santos, dois historiadores que o reconhecem como aquele que deu nome ao bairro. Só não concordam quanto à atividade de Antonio Luís.

O primeiro diz que ele possuía um armazém de secos e molhados onde hoje está o Clube XV (N.E.: a matéria se refere ao palacete da Av. Presidente Wilson, 134, esquina da Rua Marcílio Dias, onde o clube tinha sua sede social, desde 1934 e até 1969), terras de sua propriedade; o segundo defende a tese de que no mesmo local Gonzaga era dono de um boteco "com três portas e uma janela, o lugar mais importante em toda a praia do Oeste". Diz ainda que o estabelecimento comercial de Antonio Luís Gonzaga ficou importante depois da inauguração da linha de bondes da cidade para a praia, pois ali eram deixadas encomendas de passageiros, recados para os poucos moradores da região etc.

Atualmente, o bairro do Gonzaga tem área de 118 hectares. Em 1963, sua população era de 14.740 habitantes (135 por hectare). Limita-se com José Menino, Vila Matias, Campo Grande e Boqueirão.

José Menino, o grandalhão - Com população de 7.892 habitantes e área de 90,5 hectares (88 habitantes por hectare), o José Menino já foi quase inteiro de José Honório Bueno, homem de grande estatura e corpulência. O apelido, evidentemente, era irônico. José Honório foi despachante da Alfândega e teria nascido entre 1818 e 1820.

Há uma outra versão sobre a origem do nome do bairro, refutada por renomados historiadores, segundo a qual José Menino era um escravo, assim chamado por sua pequena estatura.

O bairro do Orquidário faz limites com Marapé, Gonzaga, Campo Grande e Município de São Vicente.


Centro, entre os edifícios Sulacap (Rua XV de Novembro) e Lar Brasileiro (R. General Câmara, esquina das ruas do Comércio e Frei Gaspar e da Praça Rui Barbosa), tendo o porto ao fundo
Foto publicada na mesma edição nº 1 do jornal Cidade de Santos

Poucos moram onde falta muito

Isto acontece na zona Noroeste, que fica a oeste dos morros, é a mais nova da cidade e também a mais atrasada. Os bairros da Areia Branca, Santa Maria, Alamoa e Saboó são os seus e cobrem uma superfície de 1.237 hectares. População de 18.095 habitantes, ou 69% da população santista.

Quase toda a zona não possui serviços de drenagem, esgotos e pavimentação. Em algumas partes não há água, nem luz. São deficientes os serviços de transporte e abastecimento. O correio praticamente não funciona. As Sociedades de Melhoramentos dos bairros reclamam melhor policiamento e assistência médica, urgentemente.

Em breve a Prodesan abrirá concorrência para a elaboração de um plano de drenagem que cubra toda a zona Noroeste, que os técnicos consideram "um dos maiores, senão o maior empreendimento urbanístico já realizado em Santos".

Onde a areia é branca - Vila São Jorge, Jardim Rádio Clube e Jardim Bom Retiro fazem parte do bairro da Areia Branca, assim chamado por causa das características de seu solo. É o único bairro da zona Noroeste que tem mais de 10 mil habitantes (10.943, em 1963), espalhados por seus 262 hectares (42 por hectare).

Em muitos lugares da Areia Branca não há água ou luz. Quase nenhuma é pavimentada. São deficientes os sistemas de esgotos, transportes, assistência médica, abastecimento e comunicações.

O presidente da Sociedade Melhoramentos do Jardim Bom Retiro disse aos universitários que ali foram fazer pesquisa que as ambulâncias não podem entrar no bairro para socorrer doentes, "porque as ruas foram abertas e nunca receberam aterro".

Nos dois outros núcleos a situação é a mesma.

Aqui há enchentes - Numa área de 245 hectares, entre Areia Branca, os morros e a Alamoa, está a Vila Santa Maria, seus 3.154 habitantes tão espalhados que a densidade demográfica é a menor de Santos: 13 por hectare.

A pesquisa dos universitários mostrou que no bairro a renda mensal por família está na faixa entre NCr$ 207 e NCr$ 400 (média de NCr$ 306,75). Metade dos moradores diz que os serviços de correio são eficientes, a outra metade acha que não. Unanimidade para reclamar que nas ruas sem pavimentação as águas que não se escoam provocam enchentes.

Não há posto de saúde e quem precisa de socorro ou assistência tem que ir até o bairro Chico de Paula.

Aproximadamente metade dos moradores têm televisor e quase todos, geladeiras.


Foto publicada na mesma edição nº 1 do jornal Cidade de Santos

Alamoa era viúva - Em 1963, o bairro da Alamoa tinha 646 habitantes. É o menos populoso do Noroeste santista. A maior parte da área não é pavimentada, ou drenada, e falta de luz é coisa comum. De modo geral, é igual aos demais bairros a Oeste dos morros. A Vila Industrial e o Jardim São Manuel estão na Alamoa.

Uma mulher que ficou só, quando morreu o marido, deu nome ao bairro. Os primeiros imigrantes alemães, mandados por Nicolau Vergueiro, instalaram-se em Santo Amaro. Como falhassem seus planos naquela região, alguns vieram para Santos. E começou a história: "Indo um casal se estabelecer na região isolada do resto do Município, servida de igarapés, trabalhando, ao que parece, nas ostreiras do Casqueiro ou nos sambaquis que, outrora, forneciam cal para as construções da cidade. Mais tarde, desaparecendo o marido, ficou só a mulher, chamando a atenção dos portugueses, que a chamavam de alemã, ou, à moda dos ilhéus, alamoa. Não se tem mais notícia da viúva desde 1890".

Saboó, em madeira - O Saboó se reconhece de longe: 90% das construções são de madeira. Por hectare, 40 pessoas, ou 3.400 no total de 84 hectares.

Também é um bairro de vida difícil, pois não há quem não se queixe de ser obrigado a percorrer longas distâncias para fazer compras. O correio não fica atrás, tem a unanimidade das queixas. A maior parte das ruas não é asfaltada, drenagem e rede de esgotos praticamente não há. Os moradores disseram aos universitários que a escola primária funciona bem. Mas assistência médica é outro problema.

Segundo o etimologista João Mendes de Almeida, Saboó vem de um morro que os índios chamavam çab-og (cabelo, vegetação e tiras, arrancar). Explica-se: o morro era só granito, sem nenhuma vegetação.


Foto publicada com a matéria