Entrada da baía, vista da Tijuca
Foto publicada com o texto, página 481. Clique >>aqui<< ou na
imagem para ampliá-la
A capital federal
anhada
por uma das mais belas baías do mundo e das maiores, a capital do Brasil é, por sua vez, uma cidade de tais belezas naturais que por elas conquistou
renome. E nestes últimos anos, essas belezas se completaram com o empreendimento de uma série de melhoramentos que a tornaram digna do maravilhoso
cenário que a circunda, entre a beleza inigualável de uma baía magnífica e um fundo de paisagens as mais luxuriantes e variegadas, estirando-se
audaciosamente até ao Atlântico. A obra da civilização completou sabiamente o trabalho da natureza.
A baía - Circundada de montanhas e de campos
verdejantes, ora à beira d'água, ora em azulamentos longínquos no horizonte e semeada também de uma infinidade de ilhéus que a flora meridional
transformou em outros tantos jardins, a baía do Rio de Janeiro oferece um maravilhoso espetáculo que constitui o deslumbramento dos passageiros dos
navios que lhe cruzam a barra. É um quadro estupendo que constitui o assombro extasiado de quantos viajantes têm aportado ao Rio e figura como
registro obrigatório entre as impressões de todos os viajantes em cujo itinerário se ache o Rio de Janeiro. Não há quem não se sinta deslumbrado com
esse espetáculo majestoso, com esse quadro magnífico de pujança meridional, embelezado pelos mais caprichosos acidentes de paisagem.
Ao largo, bem em frente à entrada da barra, uma ilha isolada, a Ilha Rasa,
serve de pedestal a um poderoso farol que se ergue 97 metros acima do nível do mar. É um poderoso foco luminoso catóptrico, girante, com duas luzes
brancas e uma vermelha, eclipses de 5 segundos e um alcance de 28 quilômetros.
Monta guarda ao Sul da baía e à esquerda de quem entra, o Pão de Açúcar,
belíssimo penhasco que o olhar descobre de longe, elevando-se a 385 metros sobre o nível do mar, quase inteiramente despido de vegetação, ostentando
no seu cume um mastro de ferro, marco do meridiano do Rio de Janeiro.
O Pão de Açúcar fica na extremidade de um cabo. Daí o terreno reentra, formando
a baía de S. Teodósio; e prolonga-se num outro cabo onde está a fortaleza de S. João. Defronta com esta a fortaleza de Santa Cruz, em território do
estado do Rio de Janeiro. É a barra.
Os dois fortes, o do Imbuí, do lado oriental, e mais umas baterias fora da
barra, são os primeiros postos de defesa do porto, armados de canhões poderosos e modernos. Entre Santa Cruz e S. João, um ilhéu biparte as águas,
formando como que duas entradas à baía, das quais, entretanto, só uma é praticável, entre Santa Cruz e esse ilhéu, onde se ergue outra fortaleza, a
da Laje, feita de cimento armado e fortificada com a maior eficácia de ação. Entre a Laje e S. João, o mar é muito raso, não dando entrada às
embarcações. Entre Santa Cruz e Laje é que o mar oferece uma profundidade suficiente para qualquer calado, formando um canal de 900 metros de
largura, e cerca de 50 de profundidade; a parte impraticável mede 600 metros e é cheia de recifes perigosos.
A profundidade do mar que, à entrada da barra, atinge o máximo de 55 metros,
daí para dentro, até a Ilha do Governador, ao Norte da baía, sobe a níveis variáveis, formando ancoradouros denominados "poços", sítios onde os
navios lançam ferro. O que principalmente torna notável a baía do Rio de Janeiro é a sua vastidão formidável. Voltada para o Sul, ela mede, da
entrada ao seu ponto mais setentrional, o porto da Piedade, 17 milhas; 14, na sua largura máxima, entre o porto da Piedade e o de Irajá; e 45 de
circunferência. Pode, assim, conter todas as esquadras do mundo, ancoradas nas suas águas tranqüilas.
Não se tem, logo à entrada, uma impressão nítida de sua enormidade. É que a
recortam inúmeras enseadas, portos e ancoradouros. Entre as enseadas mais belas contam-se a de Botafogo, na margem ocidental, e as de Jurujuba e
Icaraí, na margem oriental. Enquanto o navio caminha, o espectador vai vendo desdobrar-se, à esquerda, o panorama da cidade do Rio de Janeiro. A
certa altura, a baía se estreita, para depois se alargar francamente, prolongando-se até uma longínqua linha, no horizonte, que mal se percebe, numa
curva ampla. Raramente os temporais a fustigam e esses mesmos de pouca intensidade; a mansidão das suas águas é proverbial. Deságuam nela dezoito
rios.
À baía do Rio de Janeiro foi dado esse nome, porque supuseram os seus
descobridores, em face da entrada estreita da barra, cujo alargamento interior as montanhas lhes vedavam, tratar-se de um rio e, como era isto no
dia 1º de janeiro (1512), escolheram o nome de Rio de Janeiro. Em 1519, outros navegadores a exploraram, dando-lhe o nome de Santa Luzia, nome que
mais tarde se restringiu ao trecho de praia da parte ocidental, onde desembarcaram, subsistindo o nome dado em 1512.
Bairros do Rio: 1) Parte de Botafogo; 2)
Catete e Laranjeiras
Foto publicada com o texto, página 480. Clique >>aqui<< ou na
imagem para ampliá-la
As ilhas - É grande o número de ilhas que enchem a
baía de Guanabara, parte das quais pertencentes ao Distrito Federal e outra ao estado do Rio de Janeiro. Conta-se, entre elas, a de Villegaignon,
onde se construiu uma fortaleza que se liga intimamente à história da fundação da cidade.
Depois da fortaleza de Villegaignon, encontra-se a Ilha Fiscal, sede de um
posto da Alfândega. Pouco adiante, entre esta ilha e a costa ocidental, muito próximo de terra, está a Ilha das Cobras, também fortificada, sede do
Batalhão de Infantaria de Marinha, da Escola de Aprendizes Marinheiros e do Hospital de Marinha. Do lado Norte desta ilha está instalado um grande
dique onde são consertados os navios de guerra. Esta ilha está fortemente assinalada na história do Brasil.
Mais adiante se encontra a Ilha das Enxadas, onde está instalada a Escola
Naval. Ouras ilhas, para o lado de Leste, são de empresas industriais, ocupadas por oficinas e estaleiros, e ainda outras, desabitadas. Para o Norte
encontra-se a Ilha do Governador, a maior da baía, com 20 milhas de circunferência e 31 km² de superfície. Há aí um núcleo de população de cerca de
7.000 habitantes, constituindo a ilha uma das circunscrições administrativas do Distrito Federal. A Ilha do Governador é muito pitoresca e as suas
águas abundantemente piscosas; no litoral, há praias magníficas. Além de outras pequenas ilhas, está-lhe a pouca distância a de Paquetá, célebre
pelas suas belezas e recantos poéticos. A Ilha de Paquetá tem água canalizada do estado do Rio de Janeiro, esgotos e é iluminada a luz elétrica.
Pelos confortos que oferece, constituiu-se num centro balneário muito procurado. Tanto ela como a do Governador estão ligadas à cidade pelo tráfego
de barcas a vapor.
Há a notar ainda: a Ilha da Sapucaia, que serve de depósito do lixo da cidade,
com o qual se faz um aterro que já é enorme e que se aproveita em plantações; a Ilha do Bom Jesus, onde está o Asilo dos Inválidos da Pátria,
destinado a soldados e marinheiros inutilizados no serviço militar; a do Engenho d'Água, Fundão, Boa Viagem e muitas outras, onde se improvisam
excursões e piqueniques.
Pelas belezas de seus panoramas e seus aspectos pitorescos, pela amenidade dos
seus sítios, a baía que os indígenas chamaram de Guanabara (braço de mar) tem inspirado muitas vezes o estro de poetas e feito esquecer na
beatitude da contemplação o engenho observador dos viajantes que a têm visitado. Muito movimentada, a todo o momento sulcam as suas águas lanchas,
botes, em todos os sentidos, principalmente no ancoradouro dos navios mercantes, em torno do qual se agrupam, na faina de receber passageiros e
bagagens, apesar do cais do porto já permitir o desembarque direto de bordo para terra.
A Oeste, estende-se a cidade do Rio de Janeiro, na sua topografia irregular,
com um fundo verdejante de montanhas. Do outro lado, a cidade de Niterói também é constituída em um plano que se estende até à base de montanhas.
FOrma o fundo do quadro a alterosa Serra dos Órgãos, recortando, em azul, o seu alto perfil, cheio de picos pontiagudos. As barcas que fazem o
tráfego regular entre Niterói e a Capital Federal cruzam-se constantemente, transformando, pelo encurtamento da distância, a capital do estado do
Rio de Janeiro num verdadeiro bairro da Capital Federal. Menos freqüentes, outras barcas conduzem passageiros para as ilhas do Governador e de
Paquetá.
À noite, o aspecto muda para um novo encantamento. Os litorais das duas cidades
fronteiras brilham na escuridão com os seus renques de focos elétricos. Os transatlânticos, fortemente iluminados, acendem cintilações nas águas
plácidas. Os navios de guerra erguem-se como massas ainda mais escuras, denunciados pelos faróis. Aqui e além, onde os recifes e bancos de rei
ofereçam risco á circulação, lançam cintilações de fogo fátuo as bóias de luz alternativa, como olhos pestanejando, na sombra. E quando o luar vem
iluminar a baía, o seu aspecto tem alguma coisa de feérico e fantástico, que melhor se goza, contemplando, do que se dá idéia, descrevendo. É uma
apoteose de luz azulada que faz destacarem-se todos os contornos, abre largas estradas prateadas sobre as águas.
Aqui e ali, em encontros freqüentes, saltam sobre a água, às cambalhotas, os
golfinhos, como clowns do mar, tranqüilos pela proteção de que gozam, de peixes intangíveis, como os animais sagrados pelas religiões
orientais, mas por utilidades mais praticamente demonstradas. Com efeito, as posturas municipais proíbem terminantemente a perseguição do golfinho,
denominado boto pelo povo, e isso porque esses animais prestam reais serviços, entre outros o de restituir à terra os cadáveres que encontram
a boiar ou submerso, e que eles empurram até a praia.
Rio de Janeiro
Foto publicada com o texto, páginas 482 e 483. Clique >>aqui<<
ou na imagem para ampliá-la
A cidade - A cidade de S. Sebastião do Rio de
Janeiro, Capital Federal ou Distrito Federal, é a capital do Brasil. Está situada na margem ocidental da baía, e encravada no território do Estado
do Rio de Janeiro. Os seus limites são: ao Norte, a cidade fluminense de Maxambomba, os rios Pavuna, Meriti, Cabral, Guandu-Mirim e morros do Manuel
de Sá, do Guandu, Gericino; ao Sul, o Oceano Atlântico, que banha os distritos da Lagoa, Gávea, Jacarepaguá, Guaratiba e Santa Cruz; a Leste, a baía
de Guanabara; e a Oeste, a enseada de Sepetiba, restinga de Marambaia e parte do Rio Guandu.
Dentro destes limites se estende o Distrito Federal, na parte continental, por
uma superfície de 1.111 km² que, acrescentados da área das ilhas do Governador e Paquetá, que são outras tantas circunscrições da capital, formam o
total de 1.111 km², 277 m² e 352 cm². A parte urbana da capital, compreendida entre a Gávea, ao Sul, e o Engenho Novo, ao Norte, representa uma
superfície de 133 km² 042 m² 350 cm². O restante faz parte da zona suburbana ou rural.
Difícil é apreender, em um golpe de vista, o aspecto geral do Rio de Janeiro,
mesmo n sua parte urbana. Quem quer que venha do Sul, demandando a barra, avista um pedaço da cidade, na formosa praia de Copacabana. Transposta a
barra, uma anfractuosidade profunda, do litoral, à esquerda, lhe esconde outra zona, muito povoada, o bairro de Botafogo, com a sua formosíssima
enseada que, com o penetrar da baía, se oculta atrás do Morro da Viúva e outros acidentes, começando a ser vista daí por diante a belíssima avenida
Beira Mar, com encostas de montanhas a algumas centenas de metros do litoral.
Mais para diante, ainda, se encontra o Morro do Castelo, para dentro do qual um
novo pedaço da cidade é desvendado; a sua parte de planície mais extensa recortada, ainda assim, de morros isolados, como os de Santo Antonio, Santa
Tereza, do Pinto, da Providência e da Favela. Em certos pontos, daí para o recôncavo da cidade, o olhar vai até alcançar, em linha reta, a Serra da
Tijuca, muito ao fundo, a Oeste.
Mais para o Norte do litoral, porém, um paredão formado pelos morros de S.
Bento, da Conceição, Providência, da Favela, do Pinto e outros, oculta outro pedaço enorme da cidade, constituída pelo sítio do litoral ocupado pelo
bairro da Saúde, hoje Cais do Porto, o grande e compacto bairro de S. Cristóvão. A linha de litoral, daquele morro para o Norte, recua
sensivelmente, formando um grande remanso e que só avança em cabo, na Ponta do Caju, além do qual começa a zona Norte suburbana da cidade.
Numa imagem feliz, o grande pianista polaco Paderewsky definiu, num traço
largo, a fisionomia da cidade, quando a visitou em 1911. Comparou-a ele a uma grande mão espalmada sobre o terreno, cujos dedos fossem os morros que
a recordam e entre os quais, em vales agradáveis, vivesse a população, no conforto civilizado da vida urbana e ao mesmo tempo à beira da floresta. A
imagem tem, aliás, a precisão do geral das imagens literárias, mas serve para dar uma impressão de conjunto do Rio de Janeiro.
Montanhas alterosas, isoladas ou em pequenos grupos, ramificando-se na Serra do
Mar, existem no território do Distrito Federal; umas se encontram nas proximidades das planícies dos distritos rurais, outras são de natureza
eruptiva, cheias de encostas escarpadas, sulcos profundos, picos dominantes, todas, porém, revestidas de vegetação.
A baixada, onde assenta uma grande parte urbana da cidade, está compreendida
entre o mar e as montanhas que a circundam, a Oeste, tendo por montes culminantes os picos do Corcovado e Andaraí. Em certa direção, o terreno vai
se erguendo suavemente até Cascadura, a cerca de 20 quilômetros do litoral, atingindo a altura de 33 metros acima do nível do mar. Na baixada,
destacam-se elevações de terreno constituindo os morros isolados da Conceição, Pinto, Providência, Livramento, Santos Rodrigues, Telégrafo, Santo
Antonio, Castelo, Glória, Viúva, Mathias e outros. Em todos esses morros e nas abas e confrafortes das serras do Corcovado, Gávea e Engenho Novo se
desenvolvem habitações mais ou menos condensadas. Até aí se estende e sobe a cidade sem descontinuar, indo a altitudes que chegam a 300 metros acima
do nível do mar.
Grande parte da baixada foi conquistada ao mar por aterro de largas zonas de
mangues e mesmo do mar livre. Nos princípios da cidade, a zona que hoje é urbana, constituiu-se de vastas lagoas e pântanos progressivamente
aterrados e edificados.
É este o panorama em que se desenvolve sem plano algum de conjunto, num largo
espraiamento que nenhum regime sujeita ou sistematiza, e que o espectador tem à vista, sem uma impressão de síntese, devorando aos bocados, à
proporção que ele se desenrola diante dos olhos embriagados de pitoresco e de aspectos inesperados.
De longe, uma só linha geral o impressiona, principalmente, por sobre essa
paisagem orgíaca de cores e acidentes. É uma grande linha de montanhas que se estende de Sul a Leste, desenhando, pela ilusão da distância, o
formidável perfil de um homem deitado. É o Gigante de Pedra, figura cuja conformação resultou do agrupamento caprichoso das serras e
montanhas e do recorte de seus cumes. O rosto é formado pelos morros da Gávea e da Tijuca; o tronco e as pernas são os contrafortes do Corcovado; e
os pés, o Pão de Açúcar.
Entre as várias altitudes dos picos que se encontram na cidade, contam-se:
Andaraí, 1.025 metros; Alto da Tijuca, 1.020; Bico do Papagaio, 900; Corcovado, 704; Sumaré, 680; Gávea, 600; Silvestre, 500; Paineiras, 464; Santa
Tereza, 200; Pão de Açúcar, 385; da Urca, 300; da Babilônia, 209; de S. João, 200; Mathias, 50; Viúva, 70; Glória, 50; Castelo, 50; e muitos outros.
O clima do Rio de Janeiro foi sempre saudável, por si mesmo, pela contingência
de suas condições naturais. Se, durante muito tempo, os coeficientes mortuários e as epidemias da cidade pareceram desacreditá-la, era isso apenas
resultante da falta de higiene. Colaborando a reforma topográfica da cidade, construída em ruas tortuosas e estreitas, e um rigoroso regime
higiênico, transformaram-se as estatísticas que têm registrado, nestes últimos anos, não só o quase total desaparecimento das epidemias, como uma
baixa rápida e progressiva nos números do obituário.
A situação da cidade concorre, com os seus recursos naturais, para o seu clima
salutar. Assim, a temperatura máxima se eleva, às vezes, a 37º, em meses de janeiro e fevereiro, mas aí não se demora, descendo logo, modificado o
calor pela brisa do mar e o arejamento das montanhas. A média das suas temperaturas é de 22 e 23º, descendo, no inverno, a menos de 12º, às vezes. É
de notar-se que, enquanto o termômetro sobre ao máximo, no entro da cidade, em certos bairros, a uma hora de tramway do centro, a temperatura
se conserva muito mais baixa. Um simples passeio por esse sistema da viação, que é muito barato, no Rio, proporciona um refrigério.
Pico do Corcovado
Foto publicada com o texto, página 484. Clique >>aqui<< ou na
imagem para ampliá-la
História - Devido à falta de recursos do
governador geral do Brasil, Martim Afonso de Souza, ficou a baía do Rio de Janeiro abandonada à ambição dos aventureiros, no século XVI. As
preocupações dos portugueses orientavam-se para outros pontos principalmente a Baía, onde era a sede do governo geral.
Disso se aproveitou o francês Nicolau Durand de Villegaignon, que aportou ao
Rio de Janeiro, à frente de uma grande frota, acompanhado de colonos, homens de armas e padres protestantes, com o intuito de fundar a França
Antártica. Nenhum óbice encontrou à sua incursão e apoderou-se da baía, construindo na ilha de Serigipe (segundo os indígenas) um forte que
tomou o seu nome. Habitava as costas da baía do Rio de Janeiro a tribo dos índios tamoios que os esforços dos missionários protestantes (entre os
quais se destaca Jean de Léry, que deixou forte subsídio histórico dessa época em suas memórias) converteram à causa francesa.
Sabedor disso, o governo português tratou de expulsar os intrusos que dominavam
a baía desde 1555. Coube dar a essa tarefa cumprimento decisivo a Estácio de Sá, que desembarcou junto ao Pão de Açúcar, aí assentando um
acampamento militar. Longo tempo se empenharam os portugueses em escaramuças contra os franceses e os tamoios coligados, até que, a 20 de janeiro de
1567, dois combates decisivos determinaram o desbarato absoluto dos invasores. O princípio desses combates deu-se na praia do Uruçumirim, hoje do
Flamengo, e o outro na Ilha de Paranapuã, que é a atual Ilha do Governador, combate este que custou a vida a Estácio de Sá, ferido mortalmente por
uma flecha.
Senhores do domínio absoluto da baía, seguros da dispersão e derrota dos
invasores, fundaram então os portugueses a cidade, transformando em assentamento definitivo dos alicerces da futura capital do Brasil, o acampamento
militar que haviam feito no sopé do Pão de Açúcar.
Procuraram um ponto mais adequado e o local escolhido foi o morro de S.
Januário, hoje do Castelo, considerado como berço da cidade, à qual, em homenagem ao santo sob cuja invocação batalhavam os portugueses, foi dado o
nome de S. Sebastião. No alto desse morro histórico, junto à velha igreja de S. Sebastião do Castelo, antiga Sé da cidade, construída logo após a
sua fundação, está o marco comemorativo desse fato, no mesmo lugar em que foi cravado.
Do Morro do Castelo, pela encosta que olha para o Norte, desceu a povoação,
seguindo até ao morro que lhe fica fronteiro, o de S. Bento, construindo-se ao acaso, ou melhor, com o critério topográfico, em matéria de
arquitetura e higiene, desses remotos tempos. O terreno era alagadiço e cheio de lagoas e pântanos que se foram aterrando aos poucos. Em demanda da
terra firme, os primitivos habitantes da cidade foram procurando o interior, propagando-se primeiramente, nesse sentido, a cidade. Para o Sul e para
o Norte, apenas o litoral era ocupado e ligeiramente, com especialidade o Sul da cidade, razão pela qual essa é a parte mais nova de sua topografia,
constituindo os bairros do Catete, Botafogo e Laranjeiras.
Edificados posteriormente aos primeiros tempos do Rio de Janeiro, livraram-se
desse marco da evolução topográfica, tornando-se naturalmente, por tal razão, bairros de luxo, com um aspecto inteiramente diverso do resto da
cidade. Erguido um forte no alto do Morro do Castelo e tomadas outras disposições de defesa, a cidade começou a evoluir e a povoar-se, sob o governo
de Salvador de Sá, que, como Estácio, era sobrinho de Mem de Sá. Faltava, porém, ainda ao Rio, a importância oficial de um posto elevado, como lhe
convinha, entre as cidades do Brasil; e sofria a concorrência vitoriosa da cidade da Bahia (N.E.: Salvador).
Isso lhe retardou o progresso e a cidade fundada por Estácio de Sá, em meados do século XVII, tinha penas três ruas regularmente definidas. O mais,
eram grupos de habitações dispersas à fantasia dos ocupantes.
A elevação, em 1763, do Rio de Janeiro a capital do vice-reinado, veio
encontrar a cidade com 30.000 habitantes e já bastante internada para o recôncavo. A ambição e o esforço dos colonos, guiados superiormente pela
operosidade dos jesuítas, montavam grandes lavouras, dando-se principalmente ao cultivo da cana-de-açúcar. A terra era ubérrima e só pedia ao arado
e ao braço enxadas que a sulcassem e lhe dessem a semente fecundadora; grandes engenhos se instalaram em vários pontos, em sítios que estão
assinalados pela tradição, nos bairros do Engenho Novo, Engenho Velho, Engenho de Dentro, montados muitos deles pelos jesuítas, concessionários de
fartas e largas terras.
Já o braço negro e escravizado do africano prestava o seu concurso para o
desenvolvimento agrícola da nova terra que, se tinha ainda em estado muito rudimentar a sua organização social e política, representava já uma
enorme extensão de terra plantada e dando produtos valiosos da sua fecundidade.
Havia já um desembarcadouro; a cidade já se abastecia da excelente água da
Carioca, captada pelo monumental aqueduto, e que tinha a virtude, segundo a lenda indígena, de tornar belas todas as mulheres que dela bebessem. Uma
nova energia animou a cidade, com a sua nova investidura: introduziram-se novas culturas, a vida começou a organizar-se, a navegação a tornar-se
mais freqüente e constante, estabelecidas linhas regulares entre a Metrópole e a colônia.
Até no princípio do século XIX, abriram-se novas ruas; evoluiu a organização
municipal; definiu-se em atribuições mais claras e nítidas o serviço de fiscalização e policiamento. No ano de 1808, um fator inesperado decidiu da
evolução rápida da cidade, dando-lhe um impulso ainda mais vigoroso. Napoleão I ameaçava a Europa inteira e Portugal teve a mesma sorte de outros
países, invadido pelo general Junot. A Corte portuguesa, perante a invasão, resolveu transferir-se para o Rio de Janeiro, com o rei que era d. João
VI. A cidade, então, alargara-se para o Sul, chegando ao bairro das Laranjeiras. Além das muitas estradas e caminhos que a punham em contato com os
mais apartados sítios explorados pela lavoura, cortavam-lhe a parte urbana 46 ruas e 19 praças.
Existiam entre os seus principais edifícios: a Capela Real, o Teatro S. João, o
Palácio Episcopal, o Seminário de S. José, o Hospital Militar, os fortes da Conceição e de S. Tiago, a Alfândega e o Arsenal de Marinha. Consoante
ao espírito católico dos colonos e graças à influência dos missionários jesuítas, igrejas e conventos se erguiam, em número de cerca de 34, sob
diversas invocações.
Chegando ao Rio, d. João VI, desesperançado de recuperar o velho reino e
animado pelo desejo de restabelecê-lo no Brasil, aqui instalou a Corte e deu início a uma série de medidas e construções definitivas que deixavam
claro esse seu desígnio. Nesse mesmo ano, entre os meses de abril e novembro, criou o Supremo Tribunal Militar, tribunais civis, a Academia Naval, a
Câmara Comercial, o Banco do Brasil, com um capital de £100.000, a Academia de Medicina, a Escola Nacional de Belas
Artes, a Imprensa Régia; e a 10 de setembro apareceu o primeiro número do primeiro jornal que existiu no Brasil, a Gazeta do Rio de Janeiro.
Durante os 67 anos de Império, foi crescendo a importância do Rio de Janeiro, cada dia dotado de um
melhoramento novo, ao lado do desenvolvimento topográfico, embora sem preceitos necessários de higiene, o que concorreu para tornar a cidade
insalubre e vítima malaferida das epidemias.
Em 1851, inaugurou-se a navegação transatlântica a vapor, entre o Rio e a Europa. Em 1852,
inaugurou-se o telégrafo e em 1875 o cabo submarino. Em 1854, começou a cidade a ser iluminada a gás. Em 1858, inaugurou-se a Estrada de Ferro
Central do Brasil, ligando a cidade aos subúrbios e pouco depois foi ela ligada à de Petrópolis, no estado de Rio de Janeiro, adquirindo a cidade
fluminense, pela amenidade do seu clima, uma grande importância para a preferência que desde logo lhe deram o corpo diplomático e os clubes mais
abastados.
A República trouxe um novo impulso ao Distrito Federal, passados os primeiros meses de
efervescência revolucionária, que trouxeram a cidade em sobressalto. Coube ao Governo Prudente de Morais a pacificação.
Passado o período do governo Campos Salles, todo preocupado com o restabelecimento do equilíbrio
econômico do país, veio o dr. Rodrigues Alves, sob o qual se iniciaram os importantes melhoramentos que transformaram a cidade do duplo ponto de
vista de sua topografia e da sua higiene.
Palácio Monröe
Foto publicada com o texto, página 484. Clique >>aqui<< ou na
imagem para ampliá-la
O velho Rio - Iniciada sobre um alagadiço, ao acaso, como já escrevemos,
a cidade expandiu-se tortuosamente em todos os sentidos, em ruas estreitas, formando cotovelos e zigue-zagues, a colear nas linhas mais caprichosas.
Com o aumento progressivo da população, o progresso topográfico da cidade foi mais de condensação do que de expansão. Esses vícios de construção
acumularam-se à revelia dos poderes públicos até 1903.
Um pouco além de um certo perímetro da cidade, o povoamento e a habitação se instalavam em grandes
chácaras, sem o menor cuidado de economia territorial. A cidade era como um núcleo muito espesso que só se propagava pesada e vagarosamente, como
uma nódoa de óleo grosso, enquanto que a periferia se adelgaçava numa ocupação rala de construções dispersas em meio de terrenos - chácaras -
enormes. A população pobre aninhava-se em cortiços anti-higiênicos, escalava os morros encravados na zona urbana e instalava-se na zona suburbana,
em casebres perdidos e feitos ao acaso de uma arquitetura que buscava o traço na inspiração e nas contingências do momento.
Nesses morros, notadamente os de Santo Antonio, Providência, Conceição, Pinto e Favela, ainda
existem exemplares dessas edificações pitorescas. As casas da planície, até há uns dez anos atrás, eram construídas acaçapadamente, sem preocupação
alguma da beleza de aspecto. É clássico vestígio a loja onde se fazia comércio, com as portas ao rés da rua, e com o assoalho mais baixo que
o nível desta. Como casa de habitação, o tipo normal dessas construções era a rótula, com a sua fachada de uma entrada e uma ou duas janelas
baixas, com as portas de persianas, quase sempre pintadas de verde.
O sobrado, espécie de sobreloja, com varandas de pau e depois de ferro, era um sinal da abastança e
de recursos. A moradia de sobrado era um título altamente representativo. Sobre as platibandas, ostentavam-se vasos com tinhorões e
eucaliptos, motivo ornamental quase exclusivo, que a ironia popular denominou de "compoteiras", receptáculo onde se servem à mesa, no Brasil e em
Portugal, os doces de calda. As casas de mais de um andar, além do térreo, mais tarde construídas, raramente chegavam a três andares. Algum tempo
antes do início dos melhoramentos topográficos, era apontada, como curiosidade e coisa rara, uma casa da Rua Gonçalves Dias, que tinha cinco
andares.
As ruas, geralmente muito estreitas, não davam uma circulação racional à cidade. Além dos paredões
formados pelos morros, ruas havia que, não sendo cortadas por nenhuma outra, impediam as comunicações entre zonas da cidade, aliás vizinhas. Estava
neste caso o bairro da Saúde. Para se ir do centro da cidade até lá, era-se obrigado a mil reviravoltas e grandes desvios, tendo-se de palmilhar
várias ruas e em diversos sentidos.
A cidade assemelhava-se, no tocante à circulação, a um enorme corpo cujas várias partes se não
comunicassem por veias amplas e retas, fazendo-se deficientemente a circulação do sangue por meio de canalículos apertados, estreitos e tortuosos.
Nesse caso especial, uma circulação normal se impunha urgentemente, pois a facilidade de comunicações entre o centro da cidade, o bairro comercial e
a Saúde, zona dos trapiches alfandegados, era uma condição indispensável para as funções comerciais da cidade. O trânsito dos produtos depositados
nos trapiches para os armazéns onde eram entregues à venda, era extraordinariamente dificultado por uma infinidade de acidentes, à falta de ligações
diretas e imediatas.
A impressão do velho cais Pharoux era também penosíssima. Ao lado, a Praça do Mercado, velhíssimo
casarão sujo; por toda a zona do cais, mercadores de frutas, doces, bugigangas, faziam estenderete com os seus produtos ao sol, cercados de uma
multidão de maltrapilhos e vagabundos; homens dormindo sestas intermináveis, mulheres penteando-se ao ar livre, crianças seminuas bombardeando-se
com cascas de laranja. A Saúde era um bairro sinistro, valhacouto do crime, centro dos indivíduos que faziam da valentia e da crueldade profissão,
manejadoras hábeis da faca, da navalha e do revólver. As suas alcunhas figuravam amiúde nos jornais, formando corpos para as mesas do Necrotério.
Outra zona terrível era a que cercava o sopé do morro do Castelo. contra esses indivíduos e esses
costumes em vão lutaram as autoridades policiais. A própria topografia dos teatros de suas proezas como que os justificava, pois ninguém se
espantará de ver baratas e outros animais perniciosos nos buracos e portas das casas velhas e carcomidas.
A viação urbana era morosa, servida por grandes veículos denominados popularmente bondes e puxados
por dois muares. Fora daí só havia o recurso dos tílburis, carros de duas rodas, puxados por um cavalo e abrigando o cocheiro e um só passageiro; e
os carros comuns, victorias, landaus e coupés, com tarifas tão caras que constituíam um luxo e um privilégio dos abastados.
Era, pois, feíssima essa parte da cidade do Rio de Janeiro e, não fora o deslumbramento e o refrigério dos arrabaldes verdejantes, os seus recantos
pitorescos, a pouca distância do centro, tornar-se-ia esta uma cidade intolerável para gente civilizada.
Quem, em 1902, recebesse tais impressões, dificilmente acreditaria que um século de evolução
natural bastasse para a transformação radical de toda a cidade, a menos que incluísse entre as suas previsões a de um terremoto que forçasse a
construção de um nova cidade. Pois o terremoto se deu, não por convulsão vulcânica, mas por iniciativa de um grupo de homens de energia e boa
vontade, que o acaso reuniu à testa dos diferentes ramos do governo. quilo que lentos processos plásticos não conseguiriam, no corpo aleijado da
cidade, obteve-o uma verdadeira operação cirúrgica, quase imediatamente, a golpes audaciosos de bisturi, rasgando, alargando, derrubando, revolvendo
a topografia exótica da capital do Brasil.
Em quatro anos foram dados os golpes decisivos, levadas a cabo as operações mais importantes e
fez-se a obra gigantesca de cirurgia topográfica que, numa mutação mágica, transformaram o Rio, como uma mutação de cenografia faz de uma mansarda
um cena de apoteose.
1) Estátua de dom Pedro I; 2) Monumento
do Marechal Floriano Peixoto
Foto publicada com o texto, página 485. Clique >>aqui<< ou na
imagem para ampliá-la
O novo Rio - Dois elementos capitais determinaram a reforma topográfica
da cidade: a Avenida central e as obras do porto. Todos os demais vieram como conseqüência destas e, ainda mais, tiveram o efeito moral de
transformar a má estética de construção. A Avenida Central, cortando o coração da cidade, pô-lo em comunicação imediata com o sítio destinado ao
cais do porto; e este veio atender a uma necessidade inadiável, com o desembarque de passageiros e descarga de mercadorias diretamente para terra
firme, quando, antes, os vapores ancoravam ao largo do litoral da cidade, desembarcando e descarregando em botes, lanchas, saveiros e barcaças.
Uma e outra obras foram imaginadas pelo dr. Lauro Müller, ministro da Viação do governo Rodrigues
Alves. A construção do porto foi confiada à firma inglesa Walker & Cia. e a abertura da Avenida Central, colocada sob a direção do engenheiro
brasileiro dr. Paulo de Frontin.
O cais do porto, desenvolvendo-se numa extensão de 3.500 metros, do Arsenal de Marinha a S.
Cristóvão, saneou e embelezou a Saúde; e a Avenida Central derrubou quarteirões inteiros de construção colonial. Em 1911 foi resolvido o
prolongamento do cais até a ponta do Caju.
Tudo, na nova artéria, foi objeto de cuidados especiais, desde o calçamento à construção de
prédios, para cujas fachadas se fez um concurso. Multiplicaram-se em belezas de arquitetura as casas de seis e sete andares de que o velho Rio só
tinha um exemplar, apontado como raridade, no já referido prédio da Rua Gonçalves Dias. O contraste do belo e do feio, da agitação e da estagnação,
fez o resto.
Secundando os esforços do governo federal, o governo municipal entrou em atividade. Tendo à frente
um administrador enérgico e notável engenheiro, o dr. Francisco Pereira Passos, a que o Rio deu o nome de Reformador da Cidade, a Municipalidade
executou, no mais curto espaço de tempo, o mais vasto programa de melhoramentos de que há notícia.
Começou pelo alargamento das ruas, promulgando leis reguladoras da construção, quanto ao número de
andares e até quanto ao aspecto das fachadas. Prolongaram-se ruas, para abrir caminho direto entre várias zonas, e uma grande área foi calçada a
asfalto até mesmo nos arrabaldes. Novas avenidas foram abertas, ligando o centro aos arrabaldes, e o canal do Mangue, prolongado e desobstruído até
ao mar, foi ladeado de duas avenidas magníficas.
O serviço de limpeza pública melhorou consideravelmente, passando a fazer-se pelos processos mais
aperfeiçoados. Grande parte do litoral, do centro da cidade para o Sul, foi aformoseada com a construção das avenidas Beira Mar e Atlântica, aquela
ajardinada em toda a sua extensão e semeada de estátuas e monumentos de arte. Surgiram jardins por toda a parte, numa profusão tal que o RIo veio a
merecer o nome de cidade dos jardins.
O cais do Pharoux transformou-se em um dos mais encantadores jardins e deu-se-lhe um magnífico
parapeito, interrompido por escadas dando acesso para o mar. O mercado que o afeava foi transferido para um sítio próximo e instalado em amplo
edifício moderno. como por encanto, a gente suspeita e desagradável, que o freqüentava, desapareceu ou, pelo menos, adaptou-se também à
transformação, adquirindo melhor aspecto.
Operou-se um verdadeiro milagre e, sob a influência dessa transformação, outra se deu, a dos
costumes, assumindo outra fisionomia a vida da cidade. Apareceram os automóveis, cujo número se calcula hoje em cerca de 2.000. A cidade, enfim,
começou a viver outra vida, adequada ao novo cenário onde se enquadrava.
Em outro ramo administrativo não menos importante, outro homem de atividade operava eficazmente,
prestando relevantes serviços à cidade e promovendo a própria imortalidade: o dr. Oswaldo Cruz. Coube-lhe a parte de saneamento por medidas
enérgicas de profilaxia e de higiene que, se a princípio encontraram a resistência de espíritos atrasados, logo depois receberam aplausos calorosos,
diante dos seus resultados contra a febre amarela que assolava a cidade periodicamente, fazendo inúmeras vítimas, e outras epidemias, resultados
então eloqüentemente expressos no decrescimento dos coeficientes de mortalidade. O serviço de higiene modelar estabelecido limpou a cidade, cuja
fama de salubridade é hoje mundial, como também, nos centros científicos, a do célebre higienista brasileiro.
Acompanhando a transformação da cidade e a sugestão dos palácios que o governo levantava para a
instalação de muitos de seus serviços, a reconstrução civil fez prodígios, em edifícios púbicos, como já em residências particulares e nas casas
para o comércio. Tornou-se como ponto de honra que cada comerciante fizesse a sua instalação à altura de sua importância.
O rápido desenvolvimento da cidade é demonstrado pelo fato de que, só durante o ano de 1911, nada
menos de 2.615 casas novas foram construídas. Na primeira metade de 1912, os impostos de transferência de propriedade renderam mais de 1.500:000$ e
o imposto predial cerca de 7.300:000$, o que representa um aumento de 12% em comparação com o mesmo período de 1910. A receita total para o primeiro
semestre de 1912 mostra um aumento de 24,2%.
Como medida complementar, a iluminação pública foi consideravelmente aumentada, sendo o gás
auxiliado pela eletricidade de que há lâmpadas já instaladas numa enorme zona da cidade. A instalação ainda não abrange todo o perímetro urbano, mas
já o Rio de Janeiro passa por ser a cidade mais bem iluminada do mundo. Já estão providos desse sistema de iluminação não só o centro da cidade como
muitos bairros. A iluminação pública em 1911 custou mais de 1.993:000$ para a iluminação a gás e 1.605:000$ para a iluminação elétrica.
Simultaneamente com esses melhoramentos, ficou pronto um grande viaduto que atravessa uma parte da
cidade e passa sobre a Avenida do Mangue. É todo em cimento armado e serve para a passagem dos trens que, outrora, cortando o nível das ruas que
atravancavam o trânsito, o interrompia. Todos os bairros foram beneficiados, ou com a reforma do calçamento a pedra granítica, ou com a aplicação do
asfalto, que constitui juá o calçamento de vastíssima zona da cidade.
Avenida Beira Mar
Foto publicada com o texto, página 485. Clique >>aqui<< ou na
imagem para ampliá-la
Arrabaldes, ruas, praças e sítios pitorescos - Entrando na
descrição detalhada da cidade, convém destacar a rua histórica, por excelência, do Rio de Janeiro, pela sua antiguidade, pelas suas tradições, pela
sua influência na civilização carioca e pelo papel que sempre desempenhou os fatos capitais da vida da cidade. É a Rua do Ouvidor. A sua criação é
contemporânea da fundação da cidade, pois data também do século XVI. A esse tempo, a principal via de comunicação era o caminho naturalmente feito
pela evolução do Rio de Janeiro, que, descendo o Morro do Castelo, tomou a direção do Morro de S. Bento. A esse caminho, foi dado o nome de Rua
Direita, que conservou durante séculos, mudando depois para Primeiro de Março, tomando o nome de Rua da Misericórdia o seu início próximo ao
Castelo. Essa rua atravessa o espaço compreendido entre dois morros, através de alagadiços, a alguns metros do litoral.
Do mar, entre o Mercado e a Alfândega, teve início a Rua do Ouvidor, uma das primeiras, senão a
primeira via de penetração no interior da cidade, cortando, logo ao nascer, em ângulo reto, a Rua Direita. Chamava-se então "Desvio do Mar". O nome
que ainda conserva, apesar de várias tentativas para lh'o mudarem, sem que o povo se habituasse à crisma, é devido à residência, nela, de um ouvidor
(alta autoridade judiciária do tempo) em um sobrado que há poucos ano ainda existia. Nela se instalaram os mais importantes estabelecimentos
comerciais da cidade, hotéis que gozaram de grande fama no seu tempo e cafés, quase todos esses negócios mantidos por franceses que tiveram grande
influência e decisiva colaboração nos primeiros progressos da cidade, pertencendo-lhes, então, a maior porção do comércio carioca.
Em tais circunstâncias, a Rua do Ouvidor se tornou ponto obrigatório de passagem e de encontro dos
habitantes grados, centro das explosões patrióticas e das mais vibrantes emoções cariocas. Estreita como um beco, a valorização do terreno fez
desistir os que tiveram a idéia de a alargar; e atravessou incólume os séculos, até a atualidade, com as mesmas dimensões do seu primitivo traçado.
Como se pode imaginar, o seu trânsito era enorme, como ainda hoje, apesar da concorrência da Avenida Central, o que determinou uma lei municipal
proibindo que passassem veículos por ela, à exceção dos dias do Carnaval, a maior festa carioca, a fim de que por ela transitem os carros alegóricos
e fantásticos das sociedades carnavalescas.
Nela se instalaram as redações dos jornais e não só pela notícia transmitida de ouvido a ouvido, ou
em boletins à porta das redações dos jornais, ali se sabia imediatamente de qualquer fato importante. As elegantes e os rapazes da moda dela faziam
arena para a exibição das suas roupas; os políticos, centro para as suas confabulações; os estudantes, teatro para as suas pilhérias; e até
escândalos em que entravam pessoas notáveis ali iam ter o seu desenlace. As manifestações populares incluíam-na sempre no seu itinerário; e muitas
questões sérias e conflitos memoráveis tiveram nascedouro na Rua do Ouvidor.
Com a abertura da Avenida Central, a Rua do Ouvidor muito sofreu no seu prestígio; hoje, o ato
social de passar pela Rua do Ouvidor é seriamente contrabalançado pelo mais moderno de "fazer a Avenida". No seu meio ostracismo, a velha rua
manteve dignamente os seus traços fisionômicos. O asfalto não substituiu a pedra de cantaria do calçamento, apenas os passeios laterais foram
ladrilhados; e a rua permaneceu com a mesma largura, fiel à tradição.
Avenida do Mangue
Foto publicada com o texto, página 486. Clique >>aqui<< ou na
imagem para ampliá-la
Depois desta referência justa à velha rua decaída, vejamos a Avenida Central, a expressão máxima da
modernização do Rio. É o mais belo logradouro público do Distrito Federal, no que respeita ao luxo. Corta a zona comercial da cidade, mais ou menos
na direção Norte-Sul, orientada pela direção dos ventos frescos, carregados de iodo e sódio, que vêm do alto mar, canalizando-os e distribuindo-os
beneficamente pela cidade, através da rede de ruas que a cortam.
A Avenida Central tem início na Prainha, onde começa o cais do porto e toma o rumo da Praia de
Santa Luzia, de mar a mar, com a extensão de 1.800 metros. Rasga quarteirões e quarteirões compactos, tornando necessária a desapropriação de
131.400 m². dessa área, 59.400 m² correspondem à parte central, 1.080 m² à zona arborizada e 18.000 m² aos passeios largos que a ladeiam, ficando o
resto para as edificações marginais.
Essas edificações são todas altas e majestosas, formando um contraste tocante com o resto da
cidade. Nas fachadas, a fecundidade imaginativa e a arte do arquitetos porfiaram, procurando os traçados mais belos, os estilos mais diversos. É uma
avenida cheia de palácios. Pelo meio, de espaço a espaço, estão instalados refúgios arborizados e ocupados por artísticos lampadários com três focos
de luz elétrica, cada um. Lateralmente, nos passeios, erguem-se lampadários a gás, com cinco bicos incandescentes, sistema geralmente adotado na
iluminação da cidade. A rua é calçada a asfalto e os passeios a pedras de cores várias, formando desenhos caprichosos.
A Avenida Central, que começa na Avenida do Porto e vai acabar na parte da praia de Santa Luzia, de
onde foi iniciada a Avenida Beira Mar, corta as seguintes ruas: Acre, Visconde de Inhaúma, S. Bento, Municipal, Beneditinos, Marechal Floriano,
Teófilo Otoni, S. Pedro, General Câmara, Alfândega, Hospício, Rosário, Ouvidor, Sete de Setembro, Assembléia, S. José, Santo Antonio e do Passeio.
Ladeia, aí, a Rua 13 de Maio, separando-se dela por um jardim em ângulo agudo, cujo vértice está na Rua do Passeio e em frente a cuja base se
levanta o Teatro Municipal, suntuosa construção que é um dos orgulhos dos cariocas.
No ponto de encontro da Avenida Central com a beira mar, ergue-se o palácio Monröe. É um belo
trabalho de arquitetura, reprodução do pavilhão do Brasil na exposição de S. Luiz, Estados Unidos da América do Norte. Sem um destino determinado a
princípio, nele têm funcionado vários congressos e têm-se realizado diversas solenidades. Ultimamente, foi escolhido para sede da Câmara do Comércio
Internacional do Brasil. Na extrema parte da avenida, sobre uma alta coluna, está a estátua de visconde de Mauá, criador da viação férrea no Brasil
e iniciador da iluminação a gás da cidade.
Praça 15 de Novembro
Foto publicada com o texto, página 486. Clique >>aqui<< ou na
imagem para ampliá-la
Na Avenida Central fica também a estação principal das linhas de bondes elétricos que servem aos
bairros de Catete, Laranjeiras, Botafogo, Jardim Botânico, Copacabana, Leme, Gávea e Praia Vermelha.. Nela se encontram também, entre outros, os
palácios do Jornal do Commercio e do O Paiz, a Escola de Belas Artes, Biblioteca Nacional, Supremo Tribunal Federal, os clubes Militar
e Naval, o Grande Hotel Avenida.
Além deste, dois grandes hotéis terá mais a Avenida Central. Um deles, já em adiantada construção,
pertence à firma Guinle & Gaffrée; e o outro será instalado no local do antigo convento da Ajuda. Esse convento, em plena avenida, deita um das
faces para a Rua do Passeio e a outra para a Rua 13 de Maio, na parte em que esta é separada da Avenida Central pelo jardim de que já falamos. A
companhia canadense Light and Power adquiriu-o às freiras que o habitavam pretendendo erguer no seu lugar esse outro grande hotel. Existem na
Avenida uma estação telegráfica e outra postal.
A abertura da Avenida, com o êxito dos trabalhos formidáveis que se tornavam necessários, tudo isso
pronto em vinte e um meses, trouxe à cidade uma febre salutar de remodelação. Enquanto a construção do cais do porto limpava e saneava bairros dos
mais doentios e mal afamados como a Saúde, outros pontos da cidade sofreram os efeitos da reação provocada pelo contraste. O cais do Pharoux
transformou-se na verdadeira sala de recepção do Rio de Janeiro, entrada condigna com as belezas do seu interior.
A enorme praça que o antecede está numerosamente arborizada, opondo aos rigores do sol remansos de
sombra. Canteiros floridos o enfeitam, descrevendo caprichosas curvas. Nele se encontram a Polícia do Porto, a estação das barcas que fazem o
serviço de navegação entre a Capital, Niterói e as ilhas do Governador e Paquetá; o ministério da Viação, os Telégrafos e o Museu Comercial, na
parte da Rua Primeiro de Março que faz fundo à praça.
Um pouco para o Sul, no Largo do Moura, está o novo Mercado,inaugurado recentemente. Próximo ao
cais, duas belas estátuas em mármore simbolizam o Verão e o Inverno. E, um pouco mais longe, levanta-se o monumento ao General Osório.
Outras avenidas nasceram por sugestão da Avenida Central. Em primeiro lugar, citemos a formosíssima
Avenida Beira Mar, extensa via ajardinada que segue o litoral até a enseada de Botafogo, passando pelas praias da Lapa, do Russell, do Flamengo e de
Botafogo, cuja enseada acompanha, numa graciosa curva. Tem 3.920 metros de extensão, consolidada por um cais de cantaria, tendo avançado sobre o
mar, de que conquistou grande zona. Entre as duas aléias que a seguem, há uma série de jardins e estátuas, grupos em mármore, destacando-se dois
monumentos, um na praia do Russell, comemorativo do centenário da abertura dos portos brasileiros ao comércio estrangeiro, e outro, a estátua do
almirante Barroso, notável marinheiro que figurou heroicamente na guerra do Paraguai.
A avenida segue, beirando o cais, até encontrar o Morro da Viúva, que separa a Praia do Flamengo da
de Botafogo, passando pro trás dele, para de novo seguir a linha do litoral na formosa enseada. A Avenida Beira Mar termina em frente à Rua da
Passagem, seguindo o litoral, pelo sopé do Morro do Pasmado, daí por diante até a Fortaleza de S. João, passando pela praia de Saudade, onde existem
o Hospício dos Loucos e o Instituto Benjamin Constant, e contornando a base do Morro da Urca e Pão de Açúcar.
Neste sítio, no vale existente entre os morros da Urca e Pão de Açúcar e da Babilônia, num terreno
que, de um lado, dá para dentro da baía e do outro, pela Praia Vermelho, em pleno Atlântico, esteve instalada a Exposição Nacional de 1908 e agora
está o Ministério da Agricultura.
Avenida Rio Branco, antiga Central
Foto publicada com o texto, página 487. Clique >>aqui<< ou na
imagem para ampliá-la
Mais para o Sul da Praia Vermelha, em seguida ao Morro do Leme, estende-se a Praia de Copacabana,
onde se desenvolve a Avenida Atlântica. É um sítio preferido para banhos de mar e para passeios nas noites de verão. Para este fim, aí se encontram
bares e restaurantes, com serviço ao ar livre. A Avenida Beira Mar foi orçada em Rs. 7.346:364$380. É muito intenso o trânsito de carros a tração
animal e automóveis conduzindo passeantes.
Tem-se, assim, como resultado dessas obras, a cidade ligada por vários pontos e em comunicação
direta, pelo litoral, entre S. Cristóvão, no extremo Norte, o centro da cidade e os bairros do Sul, o que era obra para complicados itinerários, na
antiga cidade.
Além do alargamento das ruas centrais, rasgaram-se, com o mesmo critério de estabelecer linhas
retas entre pontos distantes e fornecer meios de desafogar o trânsito, outras avenidas, entre as quais se destacam: a Gomes Freire, ligando a Rua
Visconde do Rio Branco à do Riachuelo, enorme e velha rua que costeia em toda a sua extensão os morros de Santa Tereza e o de Paula Matos, que é seu
prolongamento; a Mem de Sá, entre o Largo da Lapa, próximo à Beira Mar e à Rua Frei Caneca; Salvador de Sá, entre Frei Caneca e o Largo Estácio de
Sá. Neste largo começam as ruas de S. Cristóvão e de Haddock Lobo.
Assim, por aquela, fica o Largo da Lapa em ligação imediata com o grande bairro de S. Cristóvão, e
pela de Haddock Lobo, que se prolonga com a do Conde de Bomfim, com o bairro da Tijuca. Por sua vez, este longínquo e salubre bairro está
diretamente ligado ao cais do Pharoux por uma linha quase reta, formada pelas ruas Conde de Bomfim, Haddock Lobo, Avenida Mem de Sá e ruas Frei
Caneca, Visconde do Rio Branco, Carioca e Assembléia, umas prolongando-se nas outras. Por meio das ruas laterais fica também feita a ligação pra os
bairros de Catumbi e Rio Comprido, aquele na vertente Sul do Morro de Paula Matos, este confinado pelo Morro de Santa Tereza, através do qual se
comunica com o bairro das Laranjeiras. A linha das ruas que se prolongam até a Tijuca forma uma extensão de 4 quilômetros, no sentido Leste-Oeste.
A Avenida do Mangue é outra extensíssima via de comunicação, entre a Praça Onze de Junho e o
extremo atual do Cais do Porto. A avenida consta de duas aléias que margeiam o canal aí aberto em 1857 e construído recentemente, como um dos
números do programa de embelezamento da Capital.
O canal,que já tinha a bela escolta de uma dupla linha de palmeiras, depois de tratado, limpo,
cortado de pontes elegantes e ladeado das duas ruas que o margeiam, tornou-se um dos passeios mais belos do Rio. Ladeado de palmeiras, ele se
prolonga em linha reta por 1.200 metros, no sentido Oeste-Leste. Ao cabo dessa extensão, dobra à direita e prossegue, numa extensão igual, senão
maior, até o cais do porto, passando sob o viaduto da Estrada de Ferro Central do Brasil. Por esta estrada, uma linha de subúrbios, e pela da
Companhia Leopoldina, liga-se a cidade à zona denominada "subúrbios": por aquela até aos confins do Distrito Federal e por esta até a Penha.
Nesta vasta zona, há grandes estradas e sistemas regionais de viação que ligam entre si as várias
estações suburbanas. Para aí se prolonga a passos rápidos a cidade, constituindo até Cascadura um núcleo de população que se condensa celeremente. A
zona que, mais a rigor, se pode chamar rural estende-se para Leste, de Cascadura, e para o Norte, da linha da Estrada de Ferro Central do Brasil,
onde, ainda assim, há estações da Leopoldina, como Bom Sucesso, de grande população. Para aí se propaga a cidade tanto na direção Leste como Norte,
tapando os espaços em claro, com retalhamento das grandes propriedades agrícolas que a abolição dos escravos deixou desertas.
Abrem-se ruas novas, erguem-se construções rapidamente, de sorte que o perímetro da cidade cresce e
se alarga nessas direções; pelo Sul, entre o centro da cidade e Copacabana, o adensamento já está feito, sendo de esperar que, pela Avenida
Atlântica adiante, beirando o oceano, a cidade prossiga até aos confins de Sepetiba, em tempo que a febre de progresso que anima a cidade põe num
futuro não muito remoto.
Outras grandes artérias recortam a cidade em todos os sentidos, notáveis pela sua extensão, mas não
cabe nos moldes deste trabalho, que pretende dar uma impressão de conjunto e não uma descrição com minuciosidades de planta topográfica.
Vistas da Avenida Rio Branco
Foto publicada com o texto, página 488. Clique >>aqui<< ou na
imagem para ampliá-la
Passamos a tratar agora dos bairros, arrabaldes e sítios pitorescos do Rio de Janeiro, começando
por aquele a que as tradições e os costumes cariocas deram prerrogativas de nobreza. No seu aspecto físico, este bairro ocupa a vertente Sul do
Corcovado, no espaço compreendido entre este morro e a enseada de Botafogo, uma vasta planície amena, entre as lufadas amáveis da mata e a brisa
salubre do mar. A beleza do sítio atraiu-lhe logo habitantes; e monopolizaram-no os abastados. Isto quer dizer que o seu povoamento regular é
posterior aos primeiros tempos de constituição da cidade, graças à preocupação absorvente de instalações a que o pitoresco e o bem estar eram
totalmente estranhos.
O novo bairro começou a se tornar o que é, com a chegada de estrangeiros que o preferiram. Pouco a
pouco se ergueram palacetes e vivendas confortáveis, que lhe deram o ar aristocrático que ainda conserva. Daí as preferências municipais, que não
foram mais do que uma homenagem à sua distinção. Botafogo está distante cerca de 6.000 metros do centro da cidade.
Mais para diante, está o bairro de Copacabana, constituído pela praia desse nome e as ruas novas
que se entrecruzaram nos grandes areais desertos que o constituíam, cobertos de vegetação própria dessas zonas. Está a 11.640 metros do centro.
Penetrando-se, para Leste, pelo bairro de Botafogo, encontra-se a Lagoa Rodrigo de Freitas,
encravada no bairro do Jardim Botânico, que deve o seu nome ao importante jardim aí existente, estabelecimento de estudos desse ramo de História
Natural subordinado ao Ministério da Agricultura. O Jardim Botânico está distante 8.903 metros do centro da cidade e é um recanto delicioso pela
pujança da vegetação. A Lagoa Rodrigo de Freitas está separada do mar por uma estreita faixa de terra que, do lado do oceano, constitui a Praia do
Arpoador.
Contígua a esta praia, está a Praia da Gávea, o bairro mais salubre da cidade. Vem-lhe aquele nome
da conformação do cume de um morro aí existente, que se assemelha a um cesto de gávea. Aí e no Jardim Botânico há trechos de plena mata, onde
serpeiam regatos e riachos, e são abundantes as nascentes d'água. Do centro da cidade à Gávea medeia a distância de 11.863 metros.
Entre o centro da cidade e Botafogo, estende-se o bairro do Catete, onde se acha o palácio
presidencial, na rua daquele nome. A Rua do catete vai terminar no Largo do Machado. Neste largo, começa, no sentido Oeste, a Rua das Laranjeiras,
tronco principal do bairro desse nome, que avança para a Serra da Carioca. É um bairro pitorescamente metido entre montanhas, num vale profundo e
muito ameno. Nele, estão instalados a Maternidade e o Instituto dos Surdo-Mudos. À Rua do Senador Otaviano, que prolonga a das laranjeiras, fica a
estação inicial da estrada de ferro que dá acesso ao Corcovado, um dos passeios mais pitorescos do Rio. É também um bairro geralmente habitado por
gente abastada. Dista 6.000 metros do centro da cidade.
O Corcovado é um dos pontos pitorescos da cidade mais dignos de serem visitados. Do seu alto, 697
metros acima do nível do mar, descortina-se um panorama grandioso, avistando-se de lá grande parte da cidade, a baía, as fortalezas, os navios, o
oceano, dentro de um largo horizonte. A linha férrea que lhe dá acesso desenvolve-se num curioso traçado. A estação inicial está a 37 m acima do
nível do mar. A linha eleva-se gradualmente, atravessa o profundíssimo vale do Rio Silvestre, num viaduto de ferro que tem arcos de 25 m de vão cada
um, com pilares metálicos sobre base de alvenaria. A primeira estação, logo depois do viaduto, é a do Silvestre, no morro de Santa Tereza, e está
208 metros acima do nível do mar. Daí segue a linha até as Paineiras, a 464 metros sobre o nível do mar. Em Paineiras há um hotel confortável. Daí
por diante, a linha sobe numa quase espiral, em curvas de raio uniforme de 120,76 m até 670 metros sobre o nível do mar. Aí está a estação terminal.
O resto do trajeto, até ao cume do Corcovado, faz-se a pé, subindo-se 23 degraus abertos em rocha viva, o cabo dos quais se atinge o cume do monte,
ocupado por um pavilhão de ferro com 13,50 m de diâmetro.
A meio da viagem para o Corcovado, como já se viu, encontra-se o Silvestre, fim de um bairro dos
mais interessantes do Rio, o de Santa Tereza, todo sobre o morro desse nome, alcatifado da flora mais pujante. É um dos sanatórios naturais do Rio
de Janeiro e muito procurado para residência, principalmente por estrangeiros. É uma verdadeira cidade verdejante, pendurada ao alto desse morro,
com todos os recursos próprios a uma cidade. Além do Plano Inclinado, que a ele dá acesso, da Rua do Riachuelo, a Companhia Ferro Carril Carioca
percorre-o em toda a extensão. Ligado ao de Santa Tereza e também servido pela Ferro Carril Carioca, está o bairro de Paula Matos, no morro desse
nome. É mais popular e povoado de habitações mais modestas do que as vivendas comuns no de Santa Tereza.
Praia Vermelha, com os edifícios da
Exposição
Foto publicada com o texto, página 489. Clique >>aqui<< ou na
imagem para ampliá-la
Descendo-se o Morro de Paula Matos cai-se em pleno bairro de Catumbi, muito populoso, habitado por
uma grande massa de proletariado. É um dos mais antigos da cidade e liga-se ao do Rio Comprido pela Rua Itapiru. O bairro do RIo Comprido está
encravado entre os morros de Santa Tereza e de Santos Rodrigues, expandindo-se até encontrar a Rua do Haddock Lobo.
Entre o Largo do Estácio de Sá e a Praça da República está o bairro denominado cidade Nova, cortado
pelo canal do Mangue e metido entre a Rua Frei Caneca, onde estão a Casa de Detenção e a Penitenciária, e a estrada de Ferro Central do Brasil.
Seguindo-se pela Rua Haddock Lobo e pela Conde de Bomfim, que a prolonga, vai-se ter à Tijuca,
sítio encantador da cidade, que se vai elevando gradualmente até 330 metros acima do nível do mar, ligando-se em montanhas a Jacarepaguá e à Gávea.
A Tijuca dista do centro da cidade 10.630 metros. Uma grande parte da Rua Conde de Bomfim se desenvolve no meio de montanhas, escalando a serra por
duas estradas, a Nova e a Velha da Tijuca, que dão acesso às culminâncias desse arrabalde aprazível. Lá, no alto, grandes belezas naturais estão
reunidas - furnas, recantos, uma floresta profunda e cheia de sombra, uma formosa cascata - que fazem do alto da Tijuca um dos mais procurados
pontos pitorescos do Rio.
Ocupando uma baixada do lado do Norte, para o mar, está o bairro de S. Cristóvão, enormíssimo e
populoso, tendo como núcleo de desenvolvimento o campo de S. Cristóvão, formosamente ajardinado. Encravado neste bairro está o parque da Quinta da
Boa Vista, o Bois de Boulogne do Rio de Janeiro, com uma área de 938.899 m². Aí residiu o imperador do Brasil e no palácio imperial está hoje
instalado o Museu Nacional.
Em frente à Quinta da Boa Vista, rasga-se uma grande via pública, a Avenida Pedro Ivo, que a
comunica diretamente com a do Mangue. Apesar de ser uma baixada, o terreno aí forma ainda alguns relevos, que são os morros de Barro Vermelho e do
Telégrafo e de S. Januário, onde se projeta a construção do novo Observatório Astronômico. Uma longa linha de praia limita o bairro do lado do mar,
até a Ponta do Caju. Aí estão instalados a Intendência e o Arsenal de Guerra e três cemitérios.
Pelo lado de terra, o bairro de S. Cristóvão liga-se os subúrbios servidos pela Estrada de Ferro
Central do Brasil e dá passagem para Inhaúma, Irajá, Bom Sucesso e Penha.
Finalmente, mais ou menos contíguos ao de Tijuca, acham-se os arrabaldes do Andaraí e de Vila
Isabel, distantes cerca de 12 quilômetros da cidade. É caminho comum para esses dois bairros a Rua de S. Francisco Xavier, enorme artéria de 3.140
metros, que nasce no ponto onde termina a Rua Haddock Lobo e começa a de Conde Bomfim. Dela partem, para o Andaraí, a Rua Barão de Mesquita, com
3.600 metros, e para Vila Isabel, o Boulevard 28 de Setembro, bela avenida de 1.625 metros, profusamente iluminada, arborizada e ajardinada.
À esquina da Rua S. Francisco Xavier com a de Barão de Mesquita está o Colégio Militar; e no
Boulevard 28 de Setembro, o Instituto Profissional Masculino. Terminando o boulevard, há uma praça ajardinada; e daí por diante segue a Rua
Visconde Santa Izabel, onde está instalado o Jardim Zoológico.
Por esse golpe rápido de vista, se verifica que o Rio está cercado de tonificantes zonas vegetais,
a uma distância do centro que um irradiante sistema de viação encurta extraordinariamente. Mas o que, no coração da cidade, não era tão abundante, a
mão do homem se encarregou de suprir.
Vistas pitorescas: 1) Pico da gávea; 2)
Tijuca; 3) Corcovado
Foto publicada com o texto, página 489. Clique >>aqui<< ou na
imagem para ampliá-la
A cidade dos jardins - Semear a cidade de jardins, melhorando os
existentes e abrindo novos, foi um dos principais números do programa de melhoramentos. Entre os antigos jardins, contam-se: o célebre parque da
Praça da República, numa área total de 198.000 m², a maior parte da qual é ocupada pelo parque; o da Praça Tiradentes, que ocupa 8.600 m² dos seus
22.000 m² de área; e o Passeio Público, no princípio da Avenida Beira Mar, o mais antigo jardim do Rio, datando a sua criação dos tempos coloniais.
Na Praça da República estão situados: a estação inicial da Estrada de Ferro Central do Brasil, em
frente à qual se ergue a estátua de Cristiano Otoni, seu construtor; o quartel general do exército, onde funciona o Ministério da Guerra; a Escola
Normal, a Prefeitura Municipal, o Corpo de Bombeiros, a Casa da Moeda, o Senado Federal e o Posto Central da Assistência Pública, para socorros de
urgência, um dos melhores serviços municipais do Rio. Ao centro do jardim ergue-se um monumento a d. Pedro I, comemorando a independência do Brasil.
Em frente ao Passeio Público, está situado o Club dos Diários, da mais fina sociedade carioca,
célebre desde os tempos da Monarquia, com o nome de Casino Fluminense. Entre os novos jardins, além dos já citados, contam-se: o do Largo do
Machado, onde está a estátua do marechal Duque de Caxias, glorioso soldado do Paraguai; no começo da Rua do Catete, acha-se outro jardim, o da
Glória, circundando outro monumento, comemorativo da Descoberta do Brasil; ao fim da Rua Camerino, via de comunicação com o bairro da Saúde, foi
adaptado ao morro do Valongo um gracioso jardim que domina a rua, transformando o aspecto da cidade. Pelos subúrbios, distribuem-se também vários
jardins. Isso e a abundante arborização das ruas dão bem a impressão concretizada nesta expressão que caracterizou o Rio de Janeiro como a cidade
dos jardins.
Substituindo o calçamento a paralelepípedos, o de asfalto já cobria, em 1906, uma zona de 140 m²
748, 59, tendo conquistado, de então para cá, outras ruas que não gozavam desse melhoramento.
Vista Chinesa, Tijuca
Foto publicada com o texto, página 490. Clique >>aqui<< ou na
imagem para ampliá-la |