PRIMEIRA PARTE - PRELÚDIOS DA INDEPENDÊNCIA
Capítulo V - O Fico
Síntese das cartas de d. Pedro a seu pai
s
cartas escritas, com a mais rota sinceridade, por d. Pedro a seu augusto pai, clareiam de abundante luz os principais episódios da tormentosa quadra
política que ora vamos descrever e apreciar. Sem lê-las, sem estudá-las, sem comentá-las devidamente, nenhum escritor pode compreender nitidamente a
história desse período fértil de agitações e sucessos.
É fato que o príncipe, assoberbado com as perturbadoras dificuldades financeiras, que lhe
embaraçavam a gestão administrativa desde seu início; molestado com a atitude das províncias que só reconheciam e acatavam a autoridade das Cortes
soberanas, menosprezando a da Regência; premido pelas desconfianças crescentes de que se via cercado na própria sede de seu governo, já por parte
das tropas, já por parte da população - insatisfeitas e inquietas - tinha, de si para si, resolvido abandonar o duro encargo que lhe deixara o rei e
regressar para a pátria natal tão depressa lho permitissem as apertadas circunstâncias com que lutava então.
É fato ainda que, por esses e outros motivos que depois foram surgindo pouco a pouco, não lhe
passara ainda pelo pensamento fraudar a confiança que nele depositara d. João e criar empecilhos à projetada reorganização constitucional do Reino
Unido.
Não lhe acudira à mente a monstruosa probabilidade de entenderem as Cortes - eleitas em nome dos
princípios liberais triunfantes na Península - que a liberdade era somente para elas e para o país onde se achavam assentadas, e nunca para a outra
parte da realeza, menos grandiosa, é certo, quanto às tradições históricas e às refulgentes glórias do passado, porém superior à seção portuguesa,
pela extensão intérmina de suas costas e sertões imensos; pela diversidade de seus climas, variáveis conforme as regiões; pela cultura e singular
talento de suas classes letradas; pelas inesgotáveis riquezas de seu chão prodigiosamente uberdoso; pela natural atividade de seus laboriosos
habitantes; pelas condições privilegiadas que a fadavam a transfigurar-se, no transcurso das idades, em um dos impérios mais vastos, mais poderosos
e mais florescentes de que com razão se teria de ufanar a América.
Breve, porém, os sucessivos atos da Constituinte Lusa levariam ao espírito de d. Pedro convicções
diametralmente contrárias ao seu primitivo parecer nesta matéria, e as queixas e recriminações dos povos daqui, as exortações dos mais ilustres
homens públicos do país, os protestos que de todos os pontos lhe chegavam contra os criminosos intentos reescravizadores por parte da ex-metrópole,
nada mais fizeram senão robustecer e consolidar as lentas modificações que, na sua consciência honesta e proba, se iam elaborando relativamente ao
papel que lhe competia desempenhar na regência provisória que lhe fora confiada, em momento crítico, pelo próprio monarca fundador do novo reino.
Aqui se deslizara um trecho de sua infância e todo o período de sua tumultuosa adolescência; aqui
sua pujante individualidade começara a revestir-se das primeiras galas e dos primeiros fulgores da juventude, a ensaiar os seus primeiros impulsos,
a palpitar no frêmito e no anseio das primeiras aspirações mal esboçadas ainda...
Nada mais natural, portanto, que seu galhardo coração votasse espontâneo e dedicado afeto à terra
gentil em que de fato não nascera, mas que era o berço amorável e ditoso, onde seus melhores sentimentos se tinham formado e desatado para a vida,
sob a influência multíplice dos mais diversos fatores.
Era o festivo raiar destas manhãs cheirosas; o noturno esplendor destes astros distantes, fulgindo
na amplidão destes recurvos céus; o ondejar destes mares lascivos, beijando os alvos contornos destas praias; a sombra espessa dos floridos bosques;
o estrugir das cataratas no ermo, rolando de salto em salto, dos altos píncaros à planície rasa; o gorjeio dos pássaros vibrantes; o sorriso das
damas brasileiras; a lealdade dos homens; as simpatias da população, que de tanto respeito e venerante amor cercara sempre o trono de seu pai...
A essas tantas poderosas razões de ordem afetiva, acrescentem-se agora as suas justas ambições de
mando, o desejo vanglorioso de tornar-se herói, a fátua vaidade de distinguir-se e de brilhar, própria de um príncipe afeito e inclinado a cortejar
o sexo; a leviandade com que as Cortes Lusitanas ousam referir-se publicamente á sua pouca idade e fracas luzes...
A 8 de junho, dando ao rei contas dos sucessos de 5, narra-lhe os tropeços em que a toda hora se
esbarra no desempenho de seus deveres; a 17 do mês seguinte, surpreende-se de que não dependam do Rio todas as províncias e lhe não mandem fundos
para custear as despesas gerais da nação, como, por exemplo, as que se referem à manutenção e funcionamento regular dos tribunais criados para
utilidade de todas elas. É isso uma anomalia que o reduz de regente de um vasto reino a mero capitão-general de uma só capitania.
Na longa carta de 21 de setembro, faz-lhe ver que mandou cumprir os decretos aprovados pelas
Cortes, entre os quais o que dispunha que as províncias ficassem diretamente sujeitas à obediência de Lisboa; espera que não tardem as ordens para
seu regresso à pátria e repete que as condições financeiras que a administração atravessa são realmente más, devido principalmente ao estado de
insolvência do Banco do Brasil, que não tem mais dinheiro nem crédito, graças à dilapidação criminosa que de seus haveres sofreu por parte de seus
inescrupulosos diretores. E termina insistindo por que Sua Majestade o dispense daquele emprego, cujos árduos encargos forçosamente o matarão.
A 4 de outubro fala-lhe pela primeira vez nos rumores que circulavam a respeito de um projetado
movimento independencista, que pretende contar com ele e com a tropa, para aclamá-lo imperador. Protesta, porém, com a maior energia, que nunca será
perjuro ao rei, a Portugal e à Constituição; e os que querem praticar semelhante loucura terão primeiro de reduzi-lo a postas, a ele e a todos os
portugueses. Para chamá-los à razão de que fugiram, lança um manifesto aos desvairados fluminenses.
Nas cartas seguintes, de 5, 6 e 9, detalha alguns pormenores do denunciado movimento, reclama a
necessidade de um reforço de tropas para conter os conspiradores, e declara-se disposto a adotar medidas extremas para manter a ordem, a supremacia
do poder e o regime constitucional.
Nada, até então, deixa perceber a mudança que não tardará a pronunciar-se brevemente nas suas
disposições para com o governo do rei e a ação das Cortes em relação ao Brasil. Na carta de 9 de novembro, já se vislumbram rápidos reflexos de
simpatia pela nossa causa. Em Pernambuco - relata ele - já não querem portugueses europeus, e o seu exemplo pode alastrar-se pelas outras
províncias, que a hão de acompanhar por necessidade ou vergonha. Pede ao Soberano Congresso que dê a devida atenção aos deputados americanos,
"porque a América, apesar de ter sido colônia, diz hoje pelos seus representantes que quer uma mútua reciprocidade; quer dizer (diz António
Carlos, como me disse hoje em audiência) igual representação nacional".
Por onde se vê que as suas primeiras manifestações de ainda hesitante simpatia pelos direitos do
Brasil resultaram da conferência que teve com o ardoroso campeão paulista, dias antes de partir este para o velho reino.
Carta de d. Pedro a António Carlos
E tamanha foi a impressão - repetimo-lo - que a figura, a palavra vivaz e
resoluta, os gestos decididos de António Carlos lhe causaram duradouramente que, a 30 de abril, dizia em carta que lhe escreveu para Lisboa: "Eu o
conheço como o mais digno deputado americano [1]".
Chega, porém, ao Rio, na tarde de 9 de dezembro, a bordo do brigue Infante Dom Sebastião, o
decreto nº 124 das Cortes, mandando que o príncipe dê as providências necessárias para que a 10 de fevereiro de 1822 seja eleita a Junta que tem de
assumir a governação da província fluminense. No dias seguinte comunica ao pai que está agindo de conformidade com tais ordens; e declara-lhe que,
no mesmo dia em que for organizada a Junta Constitucional, partirá para Portugal, pr ter cessado completamente a sua autoridade, e dever submeter-se
às determinações recebidas.
Não mais os ardentes protestos de fidelidade das cartas anteriores: apenas o cumprimento seco das
instruções recebidas, e a promessa de que, "enquanto tiver forças", conte com ele Sua Majestade e a Nação. Não se incluem nesta promessa as
Cortes Soberanas.
Quatro dias depois, pondo-o ao fato das mais ocorrências supervenientes, previne-o de que foi
muito grande o choque sofrido pelos brasileiros e por muitos europeus com a divulgação dos últimos decretos. A linguagem usada geralmente pelo povo
é que se mande para o diabo a tal Constituição votada contra os interesses do País; que se trabalhe para o príncipe não sair, sob pena de tornar-se
responsável pela perda do Brasil para Portugal; que se não cumpram os referidos decretos e que todas as províncias reunidas representem a d. Pedro
nesse sentido.
Não obstante essas manifestações por demais significativas, declara o regente ao rei que se vai
aprontando com toda a pressa e tranqüilidade para ver se pode, como lhe cumpre, obedecer às ordens recebidas. Está pronto, para isso, a perder a
própria vida mas não com sacrifício de milhares de vidas alheias; e muito sensível lhe será se for obrigado pelo povo a desobedecer as referidas
ordens.
No dia imediato, participa a d. João que a representação dos fluminenses fora adiada até que
chegassem as de S. Paulo e Minas, e protesta novamente que só a força será capaz de levá-lo a faltar aos seus deveres de filho obedientíssimo e
súdito fiel.
A 2 de janeiro envia-lhe a representação que na véspera recebera de S. Paulo, por mãos de um
próprio, e anuncia-lhe que as outras representações, já esperadas, ser-lhe-ão entregues no dia 9; e continua a afirmar-lhe que fará toda a
diligência para executar os decretos que o Brasil repele; mas parece-lhe impossível conseguir esse desiderato, diante das públicas manifestações da
opinião.
A 9 conta-lhe que recebeu em audiência especial o Senado da Corte, acompanhado de grande multidão
que o aclamava entusiasticamente; e que, correspondendo ao apelo que lhe fez o presidente da Municipalidade em nome do povo, resolvera ficar no
Brasil. Era o formal desacato às ordens expedidas pelas Cortes e sancionadas pelo soberano; era a adesão à causa do Brasil; era o primeiro passo
para a desintegração, muito embora nos discursos então pronunciados, e no auto que dos sucessos se lavrou, ainda se rendam homenagens à união
luso-brasileira e às excelências da Constituição.
As cartas de d. Pedro são uma admirável síntese eloqüente da evolução por que passamos, desde a
partida d'El-Rei até a memorável declaração do Fico. Resumindo os seus trechos principais, demos uma sumária notícia dos acontecimentos mais
notáveis ligados àquele feito decisivo. Entretanto, como temos que entrar na apreciação do papel que coube em tais sucessos aos paulistas em geral e
a José Bonifácio em especial, vamos descer miudamente a pormenores para a sustentação da tese que se procura combater em vão - de que a José
Bonifácio em especial e aos valorosos paulistas em geral se deve o movimento cívico que determinou o príncipe a permanecer no Brasil, com flagrante
desrespeito às soberanas decisões das Cortes.
Esperamos que a análise dos documentos e a crítica dos
fatos demonstrarão irrefutavelmente que a prioridade do Fico é um florão de glórias da política andradina e um dos beneméritos serviços
prestados ao Brasil pelos paulistas da geração da Independência, antes que qualquer outro povo tivesse cogitado de tão séria e frutuosa tentativa.
***
Atitude prudente
Depois dos episódios havidos em 5 de junho, d. Pedro guardava natural ressentimento das tropas da
Divisão Auxiliar Portuguesa, pela irreverência com que se tinham portado para com ele, desconfiando de sua lealdade e desrespeitando o seu poder.
Esse ressentimento, porém, não o conservou por muito tempo; nem era próprio de sua índole versátil
manter firmeza em seus impulsos ou opiniões quaisquer. Na esperança, aliás, de regressar em breve para o seu país, conforme reiteradamente pedia ao
pai em suas cartas, pensou que não valeria a pena entrar em luta com as tropas da Divisão Portuguesa, por motivos que logo cessariam com a sua
partida, pondo termo àquela situação precária e deprimente de seu prestígio e autoridade.
Para enfrentá-las, se o quisesse, contava ele com a Força Pública do país, que chegou mesmo,
segundo boatos insistentes que a 16 de junho circularam nos quartéis e pela cidade alarmada, a preparar-se para uma eventualidade armada contra a
Divisão Portuguesa. O príncipe entendeu, entretanto, que devia obstar qualquer choque entre os dois exércitos e convocou para o dia seguinte em
palácio uma reunião de todos os oficiais de ambos os lados, exortando-os, em discreta fala, a que se unissem e depositassem nele inteira confiança.
Querendo tornar patente ao público a sinceridade de seus conciliatórios propósitos, fez inserir na
Gazeta Extraordinária, de 19, não só a fala proferida na reunião de 16, mas também um artigo da redação, abundando em considerações do mesmo
gênero e visando o mesmo objetivo pacificador.
Querendo contemporizar até as proximidades de seu regresso, que supunha
inevitável, d. Pedro tratou de reconquistar a abalada confiança da oficialidade lusa, para evitar que novos pronunciamentos viessem comprometer
ainda mais a delicada situação do país, alterando a ordem no Rio ou nas províncias, e aumentando os aborrecimentos e contrariedades que ele e a
princesa dona Leopoldina vinham suportando com paciência e resignação [2].
Bródios e funçanatas militares
Para conseguir seu fim, apareceu um dia, de súbito, à mesa de um jantar campestre que a
oficialidade promovera num dos arrabaldes do Rio, a 13 de junho, e nele tomou parte como espontâneo conviva, o que produziu entusiástica impressão
no espírito dos militares reunidos alegremente naquele bródio camarário e fraternal.
Em sinal de reconhecimento pela amável surpresa que lhes fizera, convidaram-no
para, em companhia da princesa, comparecer a outro jantar que, em honra de ambos, dariam a 19, na Praia Grande, jantar a que os príncipes não
faltaram no dia e lugar aprazado. No decorrer do ágape festivo, projetou-se a organização de um grande baile no Teatro de S. João, com a presença de
Suas Altezas, para comemorar-se condignamente o primeiro aniversário da Revolução Constitucionalista do Porto, a 24 de agosto de 1820, dia que o
príncipe declarou de grande gala em todo o País [3].
A esse baile, que foi um dos maiores acontecimentos sociais do
tempo [4],
estiveram presentes, além dos príncipes, os elementos principais dentre a numerosa população portuguesa, mas abstiveram-se de comparecer as mais
distintas famílias brasileiras [5],
já porque o antagonismo entre os dois elementos pronunciava-se cada vez mais acentuadamente, como também porque eram bem conhecidos no Rio os
hábitos de intemperança peculiares aos oficiais da lusa guarnição, os quais, em semelhante lastimável estado, tornavam-se grosseiros, insolentes e
avalentados sobretudo contra os filhos do País.
Efetivamente, nessa noite de 24 de agosto, a bebedeira
generalizou-se entre militares e paisanos, dando lugar a cenas altamente escandalosas
[6]. Não obstante, d. Pedro e dona Leopoldina, que
tinham chegado às 9 horas da noite, só se retiraram às 6 horas da manhã seguinte [7].
Fora realmente uma festa suntuosa, sem igual até então, quanto ao seu aparato,
magnificência e lustre. As danças realizaram-se "num tablado corrido por cima da platéia até o camarote real"
[8]. No
palco se instalou a mesa do banquete, à qual se sentaram 100 senhoras de cada vez, servindo de ingresso uma medalha de prata dourada com a
respectiva numeração. As convivas de 1 a 100 tomaram lugar na 1ª mesa; as de 101 a 200, na 2ª; e assim por diante.
Iniciou o baile o tenente-general Jorge de Avilez, que teve como par a condessa
de Belmonte, numa contradança inglesa. Seguiu-se-lhe uma contradança francesa, depois uma espanhola, intercaladas de uma valsa, ordem esta em que se
manteve inalterável até o fim a parte do programa consagrada a Terpsícore. A função custou a soma de 53:000$000 fortes - realmente colossal para
aquela época [9].
Ação dos patriotas. A Maçonaria. Os clubes políticos. O jornalismo. O
clero
Confraternizando destarte com os oficiais, geralmente grosseiros e insubordinados, que comandavam
as tropas da Divisão Auxiliadora de Portugal, pensava d. Pedro poder esperar tranqüilamente que de Lisboa viessem as necessárias ordens para a sua
volta.
Mas os acontecimentos não lhe permitiram que por logo tempo se mantivesse em tal expectativa,
porquanto o elemento genuinamente nacional, que trabalhava para subtrair o País à dominação do elemento reinol, opressivo e retrógrado, entendeu que
era chegada talvez a ocasião de atrair para seus arraiais o jovem príncipe, que a guarnição portuguesa fiscalizava e dominava com a sua onipotência
incontrastável, apenas baseada na força material das armas - nas baionetas, nas espingardas e nas metralhadoras.
Ao antagonismo entre d. Pedro e a tropa lusa juntava-se o antagonismo entre a população portuguesa
e a brasileira - fenômeno que se tornou bem patente na demonstração que a tal respeito deram as famílias nacionais mais acatadas, não comparecendo
ao pomposo baile de 24 de agosto, apesar de convidadas pela comissão promotora e instadas pelas amáveis reiterações do próprio regente.
É agora que se cogita de aproveitar essas favoráveis divergências em prol da causa brasileira.
Começa a intensificar-se o trabalho secreto da Maçonaria e dos clubes políticos, mas dos documentos vindos até nós não se sabe de forma positiva a
que orientação doutrinal obedecia a atividade dos patriotas.
Depreende-se, entretanto, dos fatos ocorridos então, e que a crônica registra de modo muito
confuso, que se tratava de separar o Brasil, proclamando-se a d. Pedro para imperador da nova pátria.
O Clube da Resistência, cujos membros, em sua maioria, eram também maçons, e
costumavam reunir-se na casa particular de qualquer deles, concentrou debaixo de sua bandeira a direção de todo o movimento projetado, segundo narra
minuciosamente ROCHA POMBO [10].
Todos os fatores sociais de maior preponderância entraram conjuntamente em ação nesse instante
solene e decisivo, reunindo-se às Lojas Maçônicas e aos clubes secretos o jornalismo e o clero.
Nos periódicos que então se publicavam, e nos eloqüentes sermões proferidos do alto dos púlpitos
católicos, pregava-se abertamente a necessidade de se emancipar da tutela portuguesa a opulenta ex-colônia, cansada de uma escravização que lhe
tolhia todos os impulsos para as conquistas do progresso político e social.
Já durante uma representação havida no Teatro de S. João, na noite de 16 de setembro, vivas
da mais alta significação partiram da platéia, composta de patriotas brasileiros e portugueses adeptos de nossa causa, aclamando com delirante
entusiasmo liberal o simpático príncipe regente. Dias depois, corriam pela cidade insistentes rumores de que a independência era coisa resolvida e
que a respectiva proclamação se faria no dia 12 de outubro, em comemoração do natalício de d. Pedro.
Não dispunha o governo da força policial indispensável para reprimir quaisquer manifestações
patrióticas que se fizessem; e entendia-se que o intendente de polícia António Luís Pereira da Cunha, por simpatia para com o movimento
nacionalista, e o ministro do Reino Pedro Álvares Dinis, por seu temperamento indeciso e nada enérgico, seriam incapazes de opor uma resistência
eficaz a qualquer levante sério que ocorresse.
Intimação às tropas
Os portugueses não podiam, pois, contar que o governo tomasse providências assecuratórias da ordem
pública e do respeito ao regime constitucional vigente. Em vista das circunstâncias, a oficialidade da Divisão Auxiliadora, reunida em conselho
secreto a 4 de outubro, sob a presidência do general Avilez, resolveu tomar as medidas que julgava oportunas, começando por enviar a d. Pedro uma
mensagem na qual, depois de previamente lhe assegurar a fidelidade da tropa unânime, requeria-lhe uma demonstração categórica de inteira confiança
de sua parte na aludida tropa, sob pena de proceder a mesma, sem condescendência alguma, contra os inimigos da união dos dois reinos, para manter
ilesas as Bases Constitucionais que Lisboa decretara e que o Brasil tinha jurado.
D. Pedro, que só era arrogante e decidido conforme as circunstâncias em que se via, mais uma vez
se curvou à injuriosa intimativa dos seus companheiros de libações e noturnas patuscadas na Praia Grande de Niterói; e demitiu o intendente de
polícia e o ministro do Reino, suspeitos de simpatia pelas aspirações brasileiras ou excessivamente timoratos no desempenho das funções de seus
cargos, substituindo-os respectivamente por João Ignácio da Cunha e Francisco José Vieira.
Proclamação aos fluminenses
Ainda para atender à intimação das forças, que consubstanciavam o pensamento do
chamado Partido Português, d. Pedro teve que dirigir aos fluminenses uma enfática proclamação, verberando o seu delírio, e fazendo ostentação de
fidelidade aos princípios constitucionais e às Cortes [11].
Em carta da mesma data (4 de outubro) narra ao pai os episódios acontecidos nesse dia,
afirmando-lhe que os brasileiros queriam aclamá-lo imperador; mas que ele nunca seria perjuro e considerava sua honra maior que todo o Brasil.
Na referida carta há uma
frase, que o signatário diz tê-la escrito com seu próprio sangue, mas "que os maliciosos querem o tenha sido a tinta vermelha"
[12]. A
frase é esta: "Juro ser sempre fiel a V. M., à Nação e à Constituinte Portuguesa" [13].
Pretendem alguns, como por exemplo ARMITAGE [14]
e ROCHA POMBO [15],
que d. Pedro já por esse tempo estivesse comprometido com os promotores da independência e só para contemporizar, ganhar tempo e afastar a vigilante
suspeita da Divisão Auxiliadora, é que dirigira à população da Província Fluminense aquela enérgica proclama.
Objeta, porém, com bastante razão, um competente cultor de nosso passado
histórico [16],
que ainda reina a respeito deste episódio um cerrado mistério, que os Arquivos não conseguiram por enquanto esclarecer satisfatoriamente.
Teria havido de fato esse projeto conspiratório para fazer a independência com d. Pedro como
imperador? No caso afirmativo, até que ponto teria ido sua aquiescência ou solidariedade com os conjurados? Por quê teria ele tomado a atitude
decisiva de que nos fala altamente sua proclamação e sua carta ao rei? Medo da Divisão Auxiliadora ou identidade de pontos de vista? Como poderia
ele conduzir-se numa delicada situação daquelas, no meio de paixões tão vivas e de sentimentos tão desencontrados?
De um lado, os constitucionalistas extremados, fiéis às Cortes e apoiados na
lealdade inabalável das tropas comandadas por Avilez; e estes compunham a maioria da população genuinamente portuguesa domiciliada no Rio; de outro
lado, os brasileiros, frementes de anelos separatistas, empenhados em satisfazer suas aspirações com sacrifício embora de suas posições, de suas
riquezas e mesmo de sua vida; e de outro ainda, finalmente, os realistas puros, os intransigentes campeões do absolutismo autoritário, que
observavam atentos as divergências reinantes, na esperança de que chegasse porventura o momento em que as coisas seriam repostas de novo em seu
estado anterior [17].
Além de que, por essa época, o entusiasmo constitucionalista era ainda bastante intenso em todas
as províncias, e a causa da união política do Brasil com Portugal era a que reunia o maior número de prosélitos entre portugueses e brasileiros de
todas as classes e condições.
Esse geral entusiasmo público só começou a arrefecer depois que os decretos de 29 de setembro,
organizando as Juntas Provinciais do Brasil e chamando com urgência d. Pedro a Portugal, para completar sua deficiente ou quase nenhuma instrução -
desvendaram aos olhos de todos os liberais os ardilosos projetos recolonizadores da ex-metrópole.
Estamos, por semelhantes razões, inclinados a supor que a agitação emancipadora que provocou o
pronunciamento da oficialidade lusitana a 4 de outubro não teria passado de uma frustrânea tentativa platônica; de um plano surgido no segredo das
Lojas e dos Clubes de propaganda; da passageira exaltação de um punhado de patriotas menos discretos na emissão verbal de seus pensamentos, o que
deu em resultado circular cá fora, como coisa definitivamente assentada, aquilo que não teria certamente passado de simples confabulações entre
partidários do mesmo ideal, que se limitavam a sugerir hipóteses, a estudar possibilidades, a trocar impressões, a reunir elementos e a coordenar
esforços.
O levante suposto não teria sido mais que uma tendência generalizada dos espíritos, mas que nunca
saiu da esfera conjetural para o terreno prático das realizações. Daí os vagos rumores que correram a respeito, dos quais nos fala ROCHA
POMBO, rumores, entretanto, que bastaram à desconfiada Divisão Portuguesa para assumir perante o príncipe a atitude que sem hesitações assumiu.
Ao mesmo tempo que a Corte era teatro forçado de tais acontecimentos, nas
províncias, mesmo naquelas que tinham jurado obediência a Portugal, com desconhecimento absoluto da autoridade outorgada por d. João ao regente, um
movimento de reação contrária se ia vigorosamente intensificando, sobretudo em Pernambuco e na Bahia
[18].
Na primeira, a anarquia era completa, o elemento nacional não suportava mais os
portugueses da Europa, e o Batalhão 2 dos Algarves esperava a cada momento ser atacado pelo povo, e por isso mantinha-se entrincheirado no
respectivo quartel [19];
e na segunda formava-se um numeroso partido que pugnava ela desobediência ao governo e às Cortes de Lisboa, o qual tomou grande incremento,
principalmente por causa das arbitrariedades, violências e excessos de poder praticados pela Junta Provisória.
Na noite de 2 de novembro, espalharam-se proclamações incendiárias pela cidade,
concitando o povo e as tropas a fazerem àquela Junta uma demonstração pública de desapreço formal. Acusavam-na de concussionária e tirânica. Pela
manhã de 3 deu-se o toque combinado para explosão do movimento; e um reduzido número de trinta patriotas, comandados por Felisberto Gomes Caldeira
[20]
e pelo tenente-coronel José Egydio de Gordilho, mais tarde visconde de Camamu, convocou o Senado d Câmara a confraternizar com os amotinados,
concorrendo para que fosse eleita uma nova Junta em substituição da que se achava em exercício.
Por esse tempo, já o diminuto grupo primitivo achava-se notavelmente aumentado de crescido número
de cidadãos resolutos, que se dirigiram ao palácio do governo, arrombaram as respectivas portas, penetraram no interior do edifício e numa das suas
salas encontraram reunida a Junta, que declararam deposta em nome do povo e da tropa.
Não se conformando os da Junta com a intimação, foram presos pelos revoltosos, com sentinelas à
vista. A força militar lusitana, logo que nos seus quartéis soube de tão grave atentado, saiu a campo com todos os seus regimentos e requisitou o
auxílio da tripulação dos navios mercantes fundeados no porto de S. Salvador.
Comandados pelo brigadeiro Ignácio Luís Pereira de Mello; mais numerosos, mais
aguerridos e mais disciplinados do que os grupos que Felisberto Caldeira e Gordilho capitaneavam, venceram em toda a linha, libertando os membros da
Junta, prendendo os principais chefes da malograda revolta, enchendo os cárceres bahienses e remetendo para Lisboa, como traidores da causa
constitucional, grande número de brasileiros [21].
Os decretos de recolonização. Efeitos que produziram
Achavam-se as coisas neste pé de intranqüilidade e indecisão geral quando chegaram ao Rio de
Janeiro os célebres decretos de 29 de setembro. As Cortes não previram, por certo, o efeito desastrado que essas medidas iriam produzir no seio da
população americana.
A turba-multa de funcionários que ficavam sem emprego, em virtude da extinção
dos tribunais brasileiros, aprovada por outro decreto ainda não promulgado todavia, revoltaram-se contra as Cortes que tão rude e inesperadamente os
lesavam em seus interesse materiais e passaram logo a engrossar o batalhão de patriotas que lutavam pela independência ou relativa organização
autonômica do nosso País; os mesmos realistas que, na volta do príncipe para a ex-metrópole, vislumbravam os perigos de uma separação de caráter
acentuadamente republicano, também atacavam a conduta provadamente inepta das Cortes; e o elemento nacionalista tratou logo de organizar e opor os
meios mais eficazes de resistência à partida de d. Pedro [22].
Clube da Resistência
É então que se reúnem, como já referimos, em casa de José Joaquim da Rocha, vários membros do
Clube da Resistência, quase todos pertencentes à Maçonaria, para resolver com urgência a respeito de tão importante matéria.
Entre outros, estiveram presentes à reunião José Joaquim da Rocha, dr. José
Mariano de Azeredo Coutinho, desembargador França Miranda, brigadeiro Luís Pereira da Nóbrega, António de Menezes Vasconcellos de Drummond e
Francisco Maria Gordilho de Barbuda [23].
Desses conspiradores, José Clemente Pereira, quando ministro da Guerra, em
discurso proferido a 14 de junho de 1841 na Câmara dos Deputados Gerais, afirma que os primeiros que se lembraram da ficada do príncipe no Brasil,
ou ao menos que fizeram sentir a necessidade dessa medida - foram José Mariano e Rocha
[24].
O depoimento é valioso, porque de um contemporâneo envolvido nos acontecimentos: no Rio de Janeiro
teriam sido realmente aqueles cidadãos entusiastas os promotores da idéia; mas isso não importa em reconhecer que à Província Fluminense e seus
filhos cabe a prioridade do Fico, segundo pretende provar José Clemente Pereira no aludido discurso que comentaremos oportunamente.
Diante de provas insofismáveis, de documentos claros e limpos, havemos de evidenciar daqui a pouco
que, muito antes da reunião do Clube da Resistência, e da atitude dos próceres nacionalistas do Rio de Janeiro, S. Paulo, pelo seu Governo
Provisório, ou antes por José Bonifácio, tinha-se lembrado de alvitrar a d. Pedro a conveniência de seu permanecimento no Brasil, o que veremos no
lugar oportuno.
Naquele momento, se houve intervenção da Maçonaria em favor do Fico, ficou ela
exclusivamente limitada ao trabalho secreto da Loja Comércio e Artes, única que se achava de novo em atividade, aliás recente, não estando instalado
ainda o Grande Oriente do Brasil, fato que somente sucedeu no ano seguinte.
Reunidos os membros do Clube da Resistência, resolveram preliminarmente enviar emissários de
confiança a S. Paulo e Minas e às câmaras municipais da Provícia do Rio, pedindo-lhes que dirigissem a d. Pedro, com urgência, representações em que
lhe suplicassem para não partir. Ao mesmo tempo, entenderam que era da maior necessidade e prudência avisá-lo do que se tramava, para terem a
certeza de sua aquiescência.
Para desempenhar essa melindrosa comissão foi designado o coronel Gordilho de Barbuda, amigo da
causa brasileira, apesar de português reinol, pois, nesta qualidade, não podia ser suspeitado pelos seus compatriotas de estar servindo de
intermediário entre o príncipe e os nacionalistas.
Gordilho conferenciou com d. Pedro, o qual lhe prometeu para mais tarde uma
resposta definitiva, que lhe foi levada, não se sabe por quem, à sua casa à Rua do Aterrado, na manhã de 11. No caso de lhe chegarem representações
ou deputações do Rio, Minas e S. Paulo, pedindo-lhe que não partisse - ficaria [25].
Imediatamente, os membros do Clube da Resistência reúnem-se no Convento de Santo António, e
resolvem que, além das representações provinciais projetadas, conviria que o povo do Rio de Janeiro dirigisse também um manifesto ao príncipe,
implorando-lhe a graça de não partir.
Frei Francisco de Santa Teresa de Jesus
Sampaio
Imagem publicada com o texto
Frei Francisco de Sampaio
Foi encarregado de redigir esse documento frei Francisco de Santa Teresa de
Jesus Sampaio, monge franciscano de grande reputação pelo seu saber, patriotismo e altas virtudes
[26].
José Clemente Pereira, no discurso parlamentar a que atrás aludimos, chama a si a iniciativa das
medidas preliminares tomadas pelo Clube da Resistência, principalmente a sondagem do espírito de d. Pedro quanto ao modo por que receberia as
manifestações projetadas - o que contraria as informações ministradas ao público por MELLO MORAES, na sua Hist. das Constituições e trabalhos
idênticos.
Conta-nos que, procurado por José Mariano, que o interpelou sobre o assunto, confessou-lhe que
julgava necessária a ficada do príncipe, mas que o Rio não devia fazer sua representação sozinho, porque não obrava com a força indispensável, e sim
pedir a cooperação das províncias mais próximas - S. Paulo e Minas -, com o que concordaram os principais organizadores do movimento.
Depois, tratou de saber ("como me convinha" - é a sua expressão textual) qual a
opinião do Regente, porém este mostrou-se-lhe impenetravelmente reservado a tal respeito. Mas José Clemente Pereira, que não queria tomar uma
atitude decisiva, antes de saber quais as disposições reais da vontade de d. Pedro, voltou novamente à carga, e na véspera do Natal confabulou com
ele na tribuna da Capela Real ("Capela Imperial" chama-lhe anacronicamente em seu referido discurso), expôs-lhe o estado do espírito público e as
providências que os fautores do movimento tinham já tomado perante as Juntas de Minas e S. Paulo; e então o príncipe respondeu-lhe que ficaria
[27].
Atitude de José Clemente Pereira
José Clemente não era de coração um dedicado partidário do Brasil. Português de nascimento,
educado e formado na antiga metrópole, alto funcionário dela, com aspirações a melhorar progressivamente de posto, não lhe sorria de forma alguma a
vitória das idéias brasileiras.
Inteligente, porém, compreendeu, pela observação atenta e cotidiana dos acontecimentos, que a
emancipação da ex-colônia era coisa que não podia tardar muito, sobretudo depois das impolíticas medidas votadas pelas Cortes e que tinham ofendido
descompassadamente a dignidade e o orgulho natural de nosso povo.
Convinha-lhe, portanto, seguir com os acontecimentos, em vez de criar-lhes óbices; mas, antes de
mais nada, convinha-lhe também, para evitar escusadas responsabilidades e possíveis aborrecimentos, saber o que é que d. Pedro pensava em relação o
movimento que se elaborava em torno de sua pessoa.
A companhia do príncipe herdeiro era realmente uma boa companhia - principalmente no lamentável
caso de um fracasso, que provocaria certamente represálias punitivas por parte do governo português.
E não confiou nas informações dos conjurados, na fidedignidade da resposta dada a 11 de dezembro
por d. Pedro a Gordilho de Barbuda; quis ouvir direta e pessoalmente o príncipe, e como este, por discrição e cautela, nada lhe respondesse quanto à
matéria da interpelação, insistiu até o ponto de importuná-lo de novo na festividade religiosa de que acima falamos.
Só depois de ter a certeza de que - se viessem as representações de S. Paulo e
Minas - d. Pedro ficaria, é que deliberou compartilhar ativamente da conjuração. Uma vez que a tendência era mesmo livrar o Brasil da tutela de
Portugal, que ao menos ficassem os brasileiros sob a tutela dos portugueses. Foi somente com este fim que ele aderiu ao partido dos patriotas:
assegurar nos destinos da nova pátria a preponderância política de seus antigos dominadores
[28].
Aliás, as suas gratas relações com o general Avilez, comandante das forças
portuguesas, que fora quem muito se empenhara pela sua remoção da Praia Grande para o Rio, eram de molde a torná-lo suspeito ao príncipe e aos
elementos nacionalistas [29].
MELLO MORAES [30]
conta-nos que era mesmo seu desejo que o Regente regressasse para Portugal, porque ele, na sua qualidade de juiz de fora, faria naturalmente parte
da Junta Governativa mandada eleger pelas Cortes.
Vendo, todavia, que eram baldadas suas inúteis esperanças, achou melhor
passar-se para o lado daqueles cujas probabilidades de vitória lhe pareciam maiores. "Ora
português com a confiança da Divisão Auxiliadora, ora nacionalista, com um dos maiores graus maçônicos na Loja União e Tranqüilidade
- escreve dele um malogrado escritor patrício de relevante cultura [31]
- soube iludir as duas parcialidades até o aniquilamento de uma delas".
Um dos grandes fautores da Independência escrevia a respeito dele, quarenta anos
depois: "As suas idéias convergiam para uma forma de governo na qual fosse ele o mais influente. Assim passava dos princípios republicanos para os
absolutistas, e vice-versa. Em maio implorava ao príncipe regente que aceitasse o título de Protetor e Defensor Perpétuo, e em outubro, na Fala da
Aclamação, pretendia impor condições onerosas ao imperador" [32].
Atividade política dos fluminenses. Emissários para S. Paulo e Minas
No pé em que se achavam as coisas, chamou José Joaquim da Rocha ao capitão Pedro
Dias de Macedo Paes Leme, depois marquês de Quixeramobim, o qual se achava então na sua propriedade agrícola, a poucas léguas do Rio, para que, como
um dos fundadores do clube da Resistência [33],
fosse tomar conhecimento do quanto se passava e prestar à Pátria o seu inestimável concurso. Posto ao corrente do que se havia deliberado em sua
ausência, ofereceu-se Paes Leme para vir a S. Paulo entender-se com o Governo Provisório, no tocante à matéria da representação, julgada
imprescindível, gesto que foi aplaudido e aceito.
Trazendo cartas de Rocha para José Bonifácio e Martim Francisco, partiu o
emissário dos conspiradores, a cavalo, do Rio até Sepetiba [34],
donde se embarcou em uma canoa com destino a Santos, chegando à capital de S. Paulo na noite de 23 de dezembro.
Para Minas tinha ido no dia 20 o capitão Paulo Barbosa da
Silva [35].
Pedro Dias Paes Leme, na mesma noite em que chegou à capital paulista, procurou entender-se com José Bonifácio, apesar da chuva torrencial que caía
[36].
O vice-presidente da Junta, segundo narram todos os historiadores e cronistas, estava de cama,
atacado de erisipela, numa chácara nos arredores de S. Paulo, mas não nos dizem que chácara era essa e onde ficava localizada. Pois era a antiga
fazenda de Sant'Anna, outrora pertencente aos jesuítas, na qual funcionou muitos anos depois o extinto Seminário de Educandos, servindo com o correr
dos tempos para o aquartelamento da Força de Linha estacionada em S. Paulo.
Hoje, em grande parte retalhada e vendida, é um dos bairros mais florescentes desta Capital. No
que resta desse extenso imóvel suburbano, inclusive a casa de moradia, foi construído o atual Quartel da Força Federal.
José Bonifácio e Martim Francisco aí residiam efetivamente
[37], de
maneira que o primeiro não se encontrava nela eventualmente, por motivo de moléstia, como se depreende do tom em que falam a respeito os diferentes
investigadores do passado.
Surpreendido com a inesperada visita de Pedro Dias a horas avançadas, por uma
noite tão descaroável e agreste, recebeu e leu com avidez as cartas que lhe eram endereçadas, manifestou grande agitação, e logo ao amanhecer de 24,
segundo conta MELLO MORAES [38],
que os demais historiógrafos acompanham, transportou-se para a Cidade, convocou extraordinariamente a Junta, à qual expôs o que se passava,
propondo-lhe que se escrevesse imediatamente ao príncipe para sustar seu regresso, até que uma deputação, enviada por S. Paulo, chegasse à sua
presença a fim de dar-lhe as razões por que entendia que Sua Alteza devia ficar no Brasil. O presidente Oeynhausen divergiu da proposição, mas ao se
ver isolado no seio da Junta, e depois de ter ouvido as graves e enérgicas ponderações do vice-presidente, assinou a carta que este aí mesmo ditou e
foi aprovada.
A verdade quanto à representação da Junta de S. Paulo
Parece-nos, entretanto, que os fatos não se passaram exatamente como têm sido narrados até hoje,
conclusão a que chegamos depois de um exame atento, demorado e cuidadoso dos documentos existentes.
Os decretos recebidos pelo príncipe foram dados à publicidade na Gazeta
Extraordinária de 11 de dezembro [39],
isto é, 12 dias antes da partida do emissário fluminense com destino a esta Capital. Para que o governo provisório, as outras autoridades e o povo
tivessem conhecimento deles, não se fazia mister que viesse nenhum portador especial a S. Paulo com semelhante fim.
O simples recebimento da folha oficial era suficiente para isso, e tanto assim
que a Câmara Municipal, em vereança de 19 de dezembro - três dias antes da partida de Pedro Dias e 4 antes de sua chegada - aprovou uma
proposição do vereador Capitão António Cardoso Nogueira para que "à vista dos males que
ameaçam esta província e todas as demais do Reino do Brasil, pela pretensão das Cortes e conhecido desejo de arrancar o príncipe real da Corte do
Rio de Janeiro e pela forma dos governos provinciais por ela decretados, medidas inteiramente contrárias ao bem e felicidade desta província,
e de todo este reino, e decididamente inconstitucionais e por isso atentatórias dos direitos dos povos, se represente contra elas e se
peça ao governo faça subir sua dita representação ao augusto Congresso Nacional por intermédio dos deputados desta província; e que outrossim se
oficie a todas as demais câmaras desta província, comunicando-lhes o passo que esta Câmara vai dar sobre semelhante matéria, e convidando-as
para que concorram a um fim tão louvável"
[40].
A proposta foi aprovada em todos os seus termos. Eis aí: antes de partir do Rio o emissário
especial, trazendo as cartas de José Joaquim da Rocha pra José Bonifácio e Martim Francisco, e quando José Clemente Pereira ainda não tinha sequer
falado ao príncipe, a Municipalidade de S. Paulo, levada tão somente dos ditames de seu patriotismo, representava unanimemente em prol da
permanência de d. Pedro.
E como soubera ela do decreto que ordenava o regresso do
príncipe a Lisboa: Pela sua mesma publicação na Gazeta Extraordinária, do dia 11, a qual já era conhecida em S. Paulo no dia 19.
Efetivamente, o Governo Provisório, na sessão extraordinária realizada dois dias depois da da Câmara Municipal e dois dias antes da chegada de Pedro
Dias a S. Paulo, resolveu unanimemente o seguinte: "Com a chegada da Gazeta
Extraordinária do Rio de Janeiro, e nela o decreto das Cortes de 1º de outubro deste ano
[41], que manda a retirar à Sua Alteza Real o
Sereníssimo Senhor Príncipe Regente daquela Corte para o fazer viajar incógnito por determinadas Cortes da Europa e outrossim o decreto da mesma
data relativo à nova forma dos governos provisórios para as províncias do Reino do Brasil, o governo acordou unanimemente que se escreva a Sua
Alteza Real, e se lhe rogue suspenda a execução de tais decretos, enquanto não forem chegados à Corte do Rio de Janeiro seus deputados, que
sobre estes dois objetos lhe vão representar por parte dele Governo. E sendo convocada a Câmara desta Cidade, e ouvida sobre este mesmo objeto,
respondeu que em sessão de 19, ela já tinha tomado o mesmo acordo que agora toma o Governo; e que nomeara para levarem suas representações a Sua
Alteza Real os dois senhores deputados nomeados pelo Governo, além de um terceiro, que ajunta a estes. Acordou-se mais que se oficie ao Governo
de Minas Gerais para que de mãos dadas com este Governo represente à Sua Alteza Real sobre esta matéria"
[42].
Na própria carta, ofício ou representação que dirigiu a d. Pedro, datada de 24
de dezembro, o governo explica o modo por que soubera da promulgação dos referidos decretos, como se vê do trecho que segue: "Tínhamos
já escrito a Vossa Alteza Real, antes que pelo último correio recebêssemos a Gazeta Extraordinária do Rio de Janeiro, de 11 do corrente;
e, apenas fixamos nossa atenção sobre o primeiro decreto das Cortes... ferveu em nossos corações uma nobre indignação,
etc." [43].
Esse trecho confirma, pois, o que transcrevemos da ata da sessão efetuada a 21, ratificando
peremptoriamente que o Governo de S. Paulo agiu relativamente ao grave assunto diante apenas dos decretos estampados na gazeta oficial, não
esperando nem precisando que do Rio viessem o portador e as cartas enviadas por José Joaquim da Rocha; e, sobretudo, muito antes que José Clemente
Pereira, o pseudo patriarca do Fico, tivesse tido a oportunidade de perscrutar jeitosamente quais eram as verdadeiras disposições do príncipe
regente para pautar por elas sua própria conduta...
A verdade é que da ata de 21 de dezembro, cujo excerto principal acima transcrevemos, não consta
absolutamente a vinda de nenhum próprio do Rio de Janeiro, nem se fala de cartas que ele tivesse trazido, exorativas do patriotismo e do destemor
dos filhos de S. Paulo. Tudo prova, portanto, que quando Paes Leme cá chegou, a 23, já S. Paulo, à vista dos decretos publicados pela Gazeta
Extraordinária, tinha resolvido o que devia fazer, sem que para tal preciso fosse qualquer apelo ou insinuação dos devotados mas inexperientes
nacionalistas da capital do Brasil.
Na sessão ordinária do dia 22, à qual José Bonifácio não compareceu, nomeou o
governo uma deputação composta de Martim Francisco, secretário do Interior e Fazenda; e coronel António Leite Pereira da Gama Lobo, representante
das Armas no seio do mesmo governo, para ir à presença de Sua Alteza Real dar-lhe a conhecer as disposições e votos dos paulistas em relação ao
objeto dos famosos decretos expedidos pelas Cortes [44].
A 23 houve nova sessão extraordinária, em que se tratou especialmente de impedir a retirada do
presidente Oeynhausen, que queria partir para o Rio, pretextando, de novo, motivo de doença. Note-se que nem ele, nem José Bonifácio, compareceram à
dita reunião. É que estaria vivo ainda o choque violento que ambos tiveram, quando se tratou de aprovar a redação do ofício dirigido ao príncipe a
assiná-lo - choque a que se referem os diferentes historiadores.
Já vinham de trás, ao que parece, as divergências de Oeynhausen com os membros mais influentes do
Governo Provisório. Ainda havia pouco era ele o onipotente capitão-general da província, atuando sobre a administração pública com seu poder
arbitrário e sem contraste; sentia-se agora deslocado como simples membro e presidente da Junta, na qual seus pareceres e seu voto dependiam sempre
do voto da maioria; e, dado o culminante prestígio de José Bonifácio entre seus colegas e sobre a população de S. Paulo, quer da capital, como das
outras comarcas e municípios, compreende-se facilmente o quanto não sofreria seu natural orgulho, vendo aceitos e aprovados sempre as indicações,
idéias e alvitres lembrados, propostos e fundamentados pelo vice-presidente.
Outros motivos de ressentimento teria ele em relação aos Andradas, por causa de certos atos de
energia de Martim Francisco, tendentes a moralizar a administração da Fazenda, e que envolveram amigos e correligionários de Oeynhausen, habituados,
como funcionários ou contratantes de serviços públicos, a não ser fiscalizados no desempenho de suas funções ou no cumprimento de seus contratos -
matéria esta de que trataremos circunstanciadamente quando nos ocuparmos da bernarda de Francisco Ignácio.
O certo é que, a seu pedido, e por aviso de 22 de setembro
[45],
foi-lhe concedida uma licença para ir ao Rio tratar de sua saúde. Na sessão de 22 de outubro pôs o governo o Cumpra-se na portaria, a qual,
entretanto, só começaria a produzir seus efeitos depois que o príncipe regente respondesse à representação que lhe ia ser enviada pelo mesmo
governo, patenteando a inconveniência da retirada do seu presidente para o Rio naquele momento.
Efetivamente, subiu a representação a Sua Alteza, em 31 de outubro, e nela, entre outras coisas,
se dizia: "O fundamento real em que se estriba a referida licença é principalmente uma
moléstia, talvez endêmica no Brasil, adquirida ou agravada na Província de Mato Grosso, porém nunca funesta por suas conseqüências; para minorar os
seus sintomas, bastam o belo céu e clima desta província, certa frugalidade e parcimônia devida, e alguns específicos que a experiência tem
descoberto".
Deste tópico se depreende claro que o motivo alegado era apenas um pretexto para
melhorar de uma enfermidade comum, bem conhecida em S. Paulo, e sem graves conseqüências, não precisava Oeynhausen abalar-se até a Corte para
consultar professores. "Sob este ponto de vista, é, pois, desnecessária a licença"
- acrescenta imperiosamente a Junta em seu ofício. E mais adiante "...a sua retirada nas
atuais circunstâncias é extemporânea e impolítica, porquanto aos olhos de todo este povo ou pode parecer filha da má-fé e pouco gosto com que ocupa
e desempenha as obrigações de seu cargo - o que de certo não é verdade - e seria manifesta injustiça ao caráter honrado, leal e generoso de seu
presidente... ou pode parecer fruto das dissensões entre o governo e seu presidente, dissensões que nunca existiram e cuja suspeita é de sua honra e
primeira obrigação desvanecer e destruir"
[46].
Dos termos desse documento conclui-se, apesar de sua hábil redação, que
Oeynhausen não desempenhava a gosto as funções de seu cargo e que dissensões existiam entre ele e o governo, muito embora o redator do ofício se
tenha esforçado por demonstrar o contrário. O príncipe regente, em resposta de 15 de novembro, firmada por Francisco José Vieira, achou plausíveis
as razões apresentadas pela Junta paulista, e aquiesceu a elas, enquanto a saúde do presidente o permitisse
[47].
Em dezembro, sobrevindo ente este e o vice-presidente o atrito a que se referem os historiadores,
proveniente da assinatura da representação que devia ser dirigida a d. Pedro, pedindo-lhe para não desamparar a sorte e o governo do Brasil - voltou
à tona a questão da licença. Oeynhausen insistiu junto aos colegas para que começasse ela a produzir desde então os seus efeitos legais; e chegou
mesmo, em caso contrário, a solicitar exoneração do governo.
Em sessão extraordinária de 23 - dois dias após a resolução tomada de se representar ao príncipe
para não partir - o governo, "depois de madura deliberação" e à vista das judiciosas ponderações apresentadas por Martim Francisco, indeferiu a
pretensão de seu presidente, rogando-lhe que "continue a exercer o seu cargo tão dignamente
como o tem exercido, por assim o pedir a honra do mesmo excelentíssimo senhor presidente, a honra e dignidade do governo, e sobretudo a manutenção
do sossego público pelo qual são responsáveis o governo in solidum e cada um dos seus membros de per si".
Quanto à demissão, resolveu-se que "só
lhe pode ser dada por Sua Majestade ou pelo Sereníssimo Senhor Príncipe Regente, na forma da lei"
[48].
Tanto Oeynhausen como José Bonifácio, conforme notamos, não estiveram presentes à sessão, que foi presidida por Martim Francisco, substituto legal.
Aplacada a irritação dos ânimos, foi a representação assinada no dia seguinte; e
só a 29 se realizou outra sessão à qual compareceram os dois antagonistas, finalmente reconciliados
[49].
Nela se deliberou sobre a substituição de Martim Francisco nas funções de
secretário das Pastas do Interior e da Fazenda, enquanto permanecesse em comissão no Rio, ficando assentado que a primeira passasse ao secretário da
Marinha, tendo por ajudante o coronel Daniel Pedro Müller, com audiência de José Bonifácio nos casos de maior importância; e que a segunda fosse
confiada ao mesmo vice-presidente do governo, com jurisdição fiscal na Junta da Fazenda
[50].
Estas resoluções demonstram claramente a preponderância que os Andradas exerciam na administração
paulista, preponderância que, despertando uma indigna emulação por parte de certos colegas seus, deu em resultado as desagradáveis agitações
revolucionárias que pouco depois perturbaram profundamente a paz pública na província.
A 31 de dezembro, em sessão extraordinariamente convocada
[51],
Martim Franciso leu a fala que devia ser feita a Sua Alteza, e que convém não confundir com a carta que se escreveu a 24 a d. Pedro, de conformidade
com o vencido na sessão de 21. A carta - a que os historiadores também dão o nome de ofício ou representação - é um documento diverso da fala ou
discurso, aprovado em 31, e lido por José Bonifácio perante o príncipe a 26 de janeiro de 1822.
Finalmente, na sessão extraordinária de 3 de
janeiro [52],
Martim Francisco, por motivos ponderosos que expôs ao governo, foi substituído por José Bonifácio na deputação, de que também eram membros, por
parte da Câmara, o marechal José Arouche de Toledo Rendon [53]
e por parte do bispo diocesano, do cabido da Sé e do clero do bispado, o padre Alexandre Gomes de Azevedo, vigário colado da Freguesia de Mboy
[54].
Claro é, do que acabamos de expor, que José Bonifácio não esperou do Rio escusadas sugestões
quanto ao papel que aos paulistas cabia desempenhar, nas emergências criadas pela atitude das Cortes em relação ao Brasil. As notícias da Europa
chegavam àquela capital primeiro que a S. Paulo; e por isso não poderiam os paulistas, antes dos fluminenses, cogitar da adoção de medidas adequadas
para que d. Pedro não partisse. Logo, porém, que as referidas notícias vieram ao seu conhecimento, eles procederam exatamente como os patriotas do
Rio, sem terem tido com estes nenhum entendimento prévio. É lógico, pois, que houve, no momento, simultaneidade de idéias e de ação, não
podendo, portanto, os detraidores de José Bonifácio imputar a seus rancorosos adversários políticos a prioridade do movimento do Fico.
Aliás, já o dissemos, e repetimo-lo agora, que provaríamos no lugar oportuno, em face de
documentos decisivos e irrefutáveis, que a José Bonifácio cabe a glória de ter sido o primitivo autor dessa arrojada iniciativa, muito antes que os
próceres nacionalistas do Rio de Janeiro se tivessem lembrado dela.
Pedro Dias, quando chegou a S. Paulo, já encontrou tudo feito e os paulistas a postos para a
cruzada que se organizava. Esta circunstância, que parece ter passado despercebida a tantos eruditos investigadores e comentadores da história da
independência, explica, entretanto, ao que pensamos, certas incongruências e anacronismos que a cada momento se nos deparam em relação a incidentes
havidos quando se tratou de redigir o ofício ou representação para d. Pedro.
Os autores são acordes em constatar que José Bonifácio estava doente numa chácara fora da cidade,
na noite em que o procurou o esforçado mensageiro dos patriotas fluminenses, a 23 de dezembro. Na realidade, ele não compareceu à sessão ordinária
da Junta, a 17, mas esteve presente à sessão extraordinária de 21, convocada para se resolver sobre a necessidade de escrever-se ao príncipe,
solicitando-lhe que ficasse. Depois, não foi à sessão ordinária de 22, nem à extraordinária de 23, só aparecendo na de 29, o que indica que
efetivamente, ou por moléstia, ou por causa da disputa que com o chefe do governo tivera, ou por ambos os motivos ao mesmo tempo, deixou-se ficar em
casa até que a cólera de seu colega se aplacasse e a sua impolítica resistência desaparecesse.
Recebendo, porém, a inesperada visita noturna de Pedro Dias, e tomando conhecimento da
correspondência que ele lhe trazia, encheu-se de indescritível entusiasmo, e não de indignação, como rezam as crônicas, visto que a concordância dos
propósitos fluminenses com as deliberações dos paulistas só podiam despertar-lhe a mais vívida satisfação.
No dia seguinte, pela manhã, teria decido à Cidade, levando consigo a representação já redigida,
para ser devidamente assinada por todos os membros do governo presentes na capital. É exato que AZEVEDO MARQUES (Apontamentos Históricos, 2º
vol., pág. 274, col. 2ª) informa que os membros do governo se reuniram, para o efeito da representação, em casa de José Bonifácio, pelas 11 horas da
noite de 24 de dezembro, o que é perfeitamente aceitável, em consideração ao estado enfermiço de seu colega e ao mau tempo então reinante nesta
capital.
Paes Leme teria, portanto, chegado na noite de 24, e não na de 23. Informado de que José Bonifácio
se achava doente e em subúrbio afastado, levou ao presidente e outros membros da Junta as comunicações que trouxera do Rio. Estes, que já haviam
resolvido a respeito da matéria, foram, em companhia do diligente emissário, até a chácara de Sant'Anna, conferenciar com o vice-presidente e seu
irmão.
Em qualquer dessas hipóteses Oeynhausen, depois das honrosas manifestações de confiança que lhe
haviam patenteado na sessão de 23 os seus colegas, por indicação de Martim Francisco, já se achava naturalmente mais calmo e disposto a aderir ao
pensamento unânime dos outros. Não seria, pois, difícil a José Bonifácio dissipar-lhe as restantes hesitações, diante do apelo urgente que aos
dirigentes de S. Paulo mandaram os patriotas do Rio.
O que é fora de dúvida é que, em contrário à afirmativa de todos os historiadores, não houve
sessão alguma, ordinária ou extraordinária, da Junta, no dia 24, para se tomar conhecimento da mensagem trazida por Pedro Dias; e que a 21 já se
havia deliberado representar ao príncipe para que ficasse.
É também indubitável para nós - repetimo-lo - que a representação não foi redigida em sessão plena
do governo, pois nem de sua redação, nem de sua assinatura pelos membros do mesmo governo se fala ou alude em nenhuma das atas que se lavraram a
respeito dessa importante matéria.
Resolvido em 21 escrever-se a d. Pedro, José Bonifácio recolheu-se à tranqüilidade campesina da
velha Fazenda de Sant'Anna; lá redigiu, assistido por Martim Francisco, a enérgica representação, que a História considera famosa e realmente o é; e
depois mandou submetê-la ao apoio e assinatura dos colegas, dando-se então a escusa de Oeynhausen em assiná-la e daí o atrito entre ambos.
Amaral Gurgel
Que o histórico documento foi elaborado no vetusto casarão colonial, é o que nos
informa, em termos positivos, o padre dr. Manuel Joaquim do Amaral Gurgel, um dos arautos e sustentáculos da causa da Independência em S. Paulo, e,
portanto, uma das testemunhas presenciais dos sucessos correlativos mais interessantes
[55].
Evocando essa emocionante recordação do passado paulista, chama ele a atenção do
presidente da província (a quem transmitia, no momento, as funções governamentais, na qualidade de vice-presidente em exercício), para aquele
próprio nacional, onde então funcionava o Seminário de Educandos [56]
e hoje se acha instalada, como dissemos atrás, a Tropa Federal da Guarnição de S. Paulo, para a qual aí se construiu modernamente vasto quartel.
O testemunho do conselheiro Amaral Gurgel é valioso e decisivo, e reputamo-lo
bem ajustado à verdade dos fatos ocorridos [57].
São estas as suas palavras textuais no relatório com que, a 8 de março de 1864 passou ao presidente dr. Francisco Ignácio Marcondes Homem de Mello
as rédeas da administração provincial: "Permita V. Exa. que chame sua ilustrada atenção sobre
o Seminário de Educandos de Sant'Anna, estabelecido em um lugar que se presta a dar todos os cômodos àquele seminário, e que se prende a uma
recordação histórica; pois que ali residindo os conselheiros José Bonifácio de Andrada e Silva e Martim Francisco Ribeiro de Andrada, foi redigida a
24 de dezembro de 1821 a famosa representação do Governo Provisório a S. A. R. o príncipe regente para que se dignasse ficar no Brasil;
representação que deu brados nas Cortes Constituintes da Nação Portuguesa".
Não podemos absolutamente acreditar que uma pessoa saindo do Rio a 22, ainda que pela madrugada,
se encontrasse na noite de 23 ou 24 nesta capital, após uma viagem de canoa desde Sepetiba até Santos; e desta vila, a cavalo, até S. Paulo, pelos
escarpados e péssimos caminhos da Serra de Paranapiacaba. Mesmo que viesse por terra, havia de levar no mínimo cinco dias para chegar ao seu
destino.
É para nós ponto indiscutível que o mensageiro carioca só apareceu na presença de José Bonifácio,
depois que a representação ao príncipe e o ofício para a Junta Mineira já tinham sido expedidos. Entretanto, mesmo que ele, com essa velocidade
fabulosa, chegasse de fato a S. Paulo no dia 24, apenas serviria de testemunha ocular à assinatura daqueles documentos, cuja expedição a seus
destinatários estava resolvida desde alguns dias antes de sua chegada - desde 21.
Hoje, por terra ou por mar, em trens rápidos e poderosos
transatlânticos movidos a vapor, faz-se tal viagem em nada menos de 12 horas bem puxadas; quantos longos dias não seriam necessários, pois, para
fazê-la então por péssimas estradas e mares caprichosos, sobre o lombo de esfalfados solipedes ou a bordo de vagarosas e incômodas canoas, tocadas a
remo ou impelidas por velas nem sempre bafejadas por ventos de feição?
[...]
NOTAS:
[1] VARNHAGEN - Obr. cit.,
pág. 158. Esta é na íntegra a carta de que falamos: "Meu amigo e do meu caro Brasil -
Constando-me que ao Congresso não foram apresentadas algumas das minhas cartas a meu pai, as quais lhe deviam fazer conhecer meus sentimentos, amor
do grande e fértil Brasil e zelo nacional, busco este meio remetendo-lh'as todas, para que me conheça e os meus pensares, e possa (se as não tiver
visto) pedi-las, para que se façam públicas. Eu o conheço como o mais digno deputado americano; conheça-me a mim como o maior brasileiro, e que pelo
Brasil dará a última gota de sangue. Resta-me dizer-lhe que, se lá não o apoiarem, em lugar de se cansar com debates, volte, que os brasileiros o
desejam cá para as suas Cortes Municipais. Tomo esta deliberação de me expressar assim, porque conheço que é um verdadeiro brasileiro, e, demais,
paulista, estimado de todos seguramente, e mui em particular deste seu amigo - Príncipe Regente".
[2] VARNHAGEN - Obr. cit.,
pág. 118.
[3] VARNHAGEN - Obr. cit.,
pág. 119.
[4] ROCHA POMBO - Obr. cit.,
vol. 7º, pág. 599, nota 1.
[5] VASCONCELLOS DE DRUMMOND
- Obr. cit., pág. 14.
[6] Idem, ibidem, pág. 15.
[7] VARNHAGEN - Obr. cit.,
pág. 119.
[8] VASCONCELLOS DE DRUMMOND
- Obr. cit., pág. 14.
[9] ROCHA POMBO - Obr. cit.,
vol. 7º, pág. 599 e nota 1.
[10] Obr. cit., págs. 603
e 607. Este abalizado historiador assevera que os membros do Clube da Resistência costumavam reunir-se na casa do capitão-mor José Joaquim da Rocha,
à Rua da Ajuda, 137, quando não tinham sessão no Grande Oriente Maçônico. E assim fizeram, logo que circulou em 10 de dezembro a notícia dos
célebres decretos de 29 de setembro, promulgados pelas Cortes. Ora, o Grande Oriente só se instalou, como o próprio ROCHA POMBO narra à pág. 602, e
é a verdade, em maio de 1822, depois que José Bonifácio já se achava residindo no Rio. Os membros do clube, portanto, como maçons que eram em sua
maior parte, só poderiam comparecer às reuniões da Loja Comércio e Artes, única que se achava então em atividade regular, mas nunca às do Grande
Oriente, que ainda não estava fundado.
Aquele clube passou depois a chamar-se Club da Independência, e entre os nove membros que
primitivamente o compunham, achavam-se José Joaquim da Rocha, José Mariano de Azeredo Coutinho, António de Menezes Vasconcellos de Drummond e seu
dedicado irmão Luís (VASCONCELLOS DE DRUMMOND - Obr. cit., pág. 16).
ROCHA POMBO (obr. cit., pág. 607, nota 1) acrescenta hipoteticamente a essa relação os nomes
seguintes: coronel Francisco Velloso Gordilho de Barbuda (português), Luís Pereira da Nóbrega e desembargador Francisco da França Miranda,
completando-a com os nomes do padre Januário da Cunha Barbosa, Paulo Barbosa da Silva e Joaquim José de Almeida, o que dá um a mais, pois o provecto
historiador omitiu o nome de Luís de Vasconcellos de Drummond, indicado categoricamente por António de Vasconcellos de Drummond (loc. cit.), e que
nós mantivemos em nossa lista.
MELLO MORAES, na História das Constituições (vol. 1º, pág. 95, col. 2ª) dá-nos a relação
desses nomes, faltando apenas um. Ei-la: José Joaquimda Rocha e seus dois filhos, Innocêncio da Rocha Maciel e Juvêncio Maciel da Rocha; Luís de
Menezes Vasconcellos de Drummond, José Mariano, Gordilho Barbuda, Paes Leme e António de Menezes Vasconcellos de Drummond (8). Aliás, estas
contínuas reuniões de maçons num clube não maçônico, e a própria existência deste clube, criado e mantido para a defesa da causa nacional, provam
bem que a Maçonaria até então não tinha tido nenhuma ingerência oficial eficaz no movimento.
[11] Damos na íntegra a
aludida proclamação: "PEDRO AOS FLUMINENSES - Que delírio é o vosso? Quais são os
vossos intentos: Quereis ser perjuros ao rei e à Constituição: Contais com a minha pessoa para fins que não sejam provenientes e nascidos do
juramento que eu, tropa e constitucionais, prestamos no memorável 26 de fevereiro? Decerto não quereis; estais iludidos, estais enganados, e, em uma
palavra, estais perdidos se intentardes uma outra ordem de coisas, se não seguirdes o caminho da honra e da glória, em que já tendes parte, e do
qual vos querem desviar cabeças esquentadas, que não têm um verdadeiro amor de El-Rei meu pai o sr. d. João VI, que tão sábia como prudentemente nos
rege, e regerá enquanto Deus lhe conservar tão necessária como preciosa vida; que não têm religião e que se cobrem com peles de cordeiros, sendo
entre a sociedade lobos devoradores e esfaimados.
"Eu nunca serei perjuro nem à religião, nem ao rei, nem à Constituição; sabei o que eu vos declaro
em nome da tropa e dos filhos legítimos da Constituição, que vivemos todos unidos; sabei mais que declaramos guerra desapiedada e crudelíssima a
todos os perturbadores do sossego público, a todos os anti-constitucionais desmascarados. Contai com o que eu vos digo, porque quem vo-lo diz é fiel
à Religião, ao rei e à Constituição, e que por todas estas três divinais coisas estou, sempre estive e estarei pronto a morrer, ainda que fosse só,
quanto mais tendo tropa e verdadeiros constitucionais, que me sustêm por amor que mutuamente repartimos, e por sustentarem juramento tão cordial e
voluntariamente dado. Sossego, fluminenses! - Príncipe Regente"
[12] HADDOCK LOBO FILHO -
O Fico - Conferência realizada no Automóvel Clube de S. Paulo, a 14 de janeiro de 1922 (no Estado de S. Paulo, de 31 do mesmo mês e
ano).
[13] Cartas de D. Pedro
a D. João (Edição da Rev. do Inst. Hist. do Ceará).
[14] Obr. cit., pág. 28.
[15] Obr. cit., vol. 7º,
págs. 601 a 609.
[16] HADDOCK LOBO FILHO -
Conferência citada.
[17] Idem, ibidem.
[18] ROCHA POMBO - Obr. e
vol. cits., pág. 605.
[19] Cartas de D. Pedro
a D. João (Edição da Rev. do Inst. Hist. do Ceará), pág. 134.
[20] Primo e não pai do
marechal Felisberto Caldeira Brant, segundo a retificação oferecida por VARNHAGEN (obr. cit., pág. 361, nota 6) a PEREIRA DA SILVA (Hist. da Fund.
do Imp. do Brasil, vol. 5º, pág. 229).
[21] ROCHA POMBO - Obr.
cit., vol. 7º, pág. 605, nota 2.
[22] ROCHA POMBO - Obr.
cit., vol. 7º, pág. 606.
[23] Idem, ibidem, pág.
607, nota 2.
[24] Palavras textuais de
José Clemente Pereira: "Devo declarar que os primeiros que trataram desta medida, ou ao menos
que a fizeram sentir e levar a efeito, foram o sr. José Mariano e o sr. José Joaquim da Rocha".
[25] ROCHA POMBO - Obr.
cit., págs. 607 e 609, vol. 7º.
[26] Chamou-se no século
Francisco José de Sampaio e era filho de Manuel José de Sampaio e dona Helena da Conceição Sampaio, tendo nascido na cidade do Rio de Janeiro em dia
ignorado do mês de agosto de 1778 (o dr. A. TAUNAY, nos seus Grandes Vultos da Independência Brasileira, pág. 73, diz que a mãe de fr.
Sampaio se chamava Elvira). inda na adolescência, tomado de grande melancolia após a morte de sua progenitora
(N.E.: na verdade, genitora, mãe, e não progenitora, avó, engano que o autor comete em toda a extensão de sua
obra), que amava com os maiores extremos de seu coração, resolveu separar-se do mundo e fazer-se frade.
Tomou o hábito, a 14 de outubro de 1793, no Convento da Ilha do Bom Jesus (o dr. TAUNAY, na obra e página citadas acima, narra que esse fato se deu
a 15 de outubro de 1774), e em seguida partiu para S. Paulo, a fazer seus estudos teológicos no Convento de S. Francisco, onde,
segundo um dos seus biógrafos modernos, ouviu as eruditas lições de frei Francisco de S. Carlos.
SACRAMENTO BLAKE manifesta dúvidas se o seu curso teológico foi feito no Convento da Ordem
Franciscana do Rio ou no desta Capital. Ordenado em 1801, recebeu o diploma de Lente de Teologia e Mestre de Eloqüência Sagrada.
D. João VI, depois de ouvi-lo num sermão verdadeiramente magistral, nomeou-o em agosto de 1808
para pregador da Capela Real. No mesmo ano foi provido no cargo de Examinador da Mesa da Consciência e Ordens; em 1813 no de Censor Episcopal e em
1824 no de deputado da Bula da Cruzada.
Membro da Loja Maçônica Comércio e Artes, da qual foi orador, no jornalismo político e no púlpito
foi um dos mais entusiásticos paladinos da causa da emancipação. Como amostra de sua eloqüência, damos aqui dois pequenos trechos de um sermão de
penitência, pregado na Quaresma, em circunstâncias imprevistas.
Jornalista político, pregoeiro audaz de idéias avançadas, contava naturalmente não pequeno número
de adversários e desafetos. Ia quase no fim o sermão, quando alguns moços, que se achavam próximos do púlpito, interromperam o arrebatado orador,
dirigindo-lhe facécias e insinuações caluniosas.
Estaca frei Sampaio na tribuna sagrada, percorre com o olhar inspirado a multidão que abarrotava o
templo, volta-se com arroubo para o Santuário e exclama, imprimindo à voz todas as modalidades sônicas e emotivas, adequadas à natureza do
impressionador incidente que causara estranha sensação no espírito do auditório, ali congregado para enlevar-se com a magia de sua palavra e a
ilustração de seus profundos conceitos:
"Mas, quem sou eu, Senhor Deus crucificado:
Quem sou eu para lançar os raios de vossa cólera sobre este povo, desviado do caminho de vossa lei e perdido nos abismos da culpa? Eu, vosso
ministro, humilde sacerdote da Lei Divina, cingido pelo burel e pelo cilício, e que, misérrimo pecador, agravo todos os dias vossas chagas
preciosas, ultrajo as vestes sagradas que me revestem, profano o Santuário, e sacrilegamente me esqueço do culto sacrossanto de vosso martírio,
morte e paixão? Ah! Senhor! Eu vos confesso minhas culpas, eu bato no peito arrependido, eu vos imploro misericórdia! Perdoai-me, Senhor pela vossa
cruz e pela vossa morte, ungi meus lábios para que, pelo poder da palavra divina, este povo seja conduzido do Averno, em que se acha, à Terra Santa
da Promissão, anunciada pelos profetas e celebrada pelos filhos de Israel!".
E, voltando-se rapidamente para o povo estupefato, assim perorou: "E
vós, indignos pecadores! Filhos do mal, que reincidis a todas as horas, a todos os instantes, na culpa e no pecado; que vindes afrontar, com vosso
impudor e cinismo, os altares do Cordeiro Imaculado; que ousais interromper a palavra sagrada de seus ministros, com vossos motejos e calúnias, sem
respeito nem para Deus, nem para vossas almas, nem para a Religião de vossos pais; vós, misérrimos frutos do pecado original! O que seria de vós,
se, neste mesmo instante, o ministro do Senhor, com o poder de sua graça e de sua justiça, vos estendesse seus braços e vos abatesse
instantaneamente nos horrores do sepulcro? Prosternai-vos, geração bastarda, raça de indomáveis pecadores! Batei com a fronte orgulhosa e terrena de
encontro ao pó de onde saístes, para onde haveis de voltar no vosso máximo dia; nada mais sois do que pó; juntai essas mãos, que todos os dias obram
iniqüidades contra o Senhor, e rogai comigo, cheios de arrependimento, de dor e de contrição: Senhor! Senhor! perdoai-nos pelas vossas dores, pela
vossa paixão e morte, pela vossa infinita misericórdia!".
Conta o dr. Paulo de Menezes que esta patética peroração foi proferida com tamanha imponência, e
que o gesto, o olhar e a expressão fisionômica do orador foram tão imperativos que todo o povo caiu de joelhos a um só tempo, num só baque, num só
ruído, num só movimento generalizado.
Faleceu frei Sampaio no Rio de Janeiro a 13 de setembro de 1830 (SACRAMENTO BLAKE - Obr. cit.,
vol. 3º, pág. 118; J. M. P. DE VASCONCELLOS - Selecta Brasiliense, vol. 2º, pág. 134; ARTHUR DE CERQUEIRA MENDES - Frei Sampaio, págs.
19 a 21). Neste último resumido opúsculo, o autor, tratando perfunctoriamente dos acontecimentos políticos da época, diz, com relação à atitude
agressiva das Cortes de Lisboa, que os deputados brasileiros foram insultados pela "plebe
aglomerada nas galerias ao ponto de precisarem alguns fugir depois de publicarem o manifesto de Falmouth, em que explicaram a causa de seu
procedimento". O fato passou-se de maneira exatamente oposta: depois de terem fugido de Lisboa
e de se acharem em Falmouth, na Inglaterra, é que os deputados brasileiros publicaram os seus conhecidos Manifestos (pois foram dois e não um),
dando conta, a seus concidadãos, dos poderosos motivos por que se viram forçados a abandonar as Cortes Portuguesas.
[27] LUIZ FRANCISCO DA
VEIGA - O Primeiro Reinado, págs. 29 e 30.
[28] VASCONCELLOS DE
DRUMMOND - Obr. cit., pág. 144.
[29] MELLO MORAES -
Hist. das Consts., vol. 1º, pág. 108, 2ª col.
[30] Obr. cit., vol. 1º,
pág. 95, 1ª col.
[31] GONZAGA DUQUE -
Revoluções Brasileiras, pág. 88.
[32] VASCONCELLOS DE
DRUMMOND - Obr. cit., pág. 141.
[33] O dr. A. D'ESCRAGNOLE
TAUNAY, na sua recente obra - Grandes Vultos da Independência Brasileira (pág. 67) diz que esse clube era secreto. Mas VASCONCELLOS DE
DRUMMOND (obr. cit., pág. 50), que foi um dos seus nove fundadores, declara que o Apostolado foi a única sociedade secreta a que pertenceu em
toda a sua vida.
[34] Esta informação,
quanto à data da partida, é de José Clemente Pereira, no discurso que citamos. Parece incrível que um indivíduo pudesse partir a 22 de Sepetiba,
fazer em canoa a viagem até Santos, subir a serra de Paranapiacaba e chegar a S. Paulo na noite do dia seguinte.
[35] A informação é ainda
de José Clemente Pereira, no aludido discurso de 1841.
[36] VARNHAGEN (obr. cit.,
pág. 127) acrescenta que com Pedro Dias viera a S. Paulo, como emissário, João Evangelista Sayão Lobato, pormenor que os outros historiadores não
inserem nem confirmam.
[37] Relatório do
vice-presidente em exercício, da Província de S. Paulo, padre dr. Manuel Joaquim do Amaral Gurgel, ano de 1864.
[38] Obr. cit., vol, cit.,
págs. 87, 2ª col. e 88, 1ª col.
[39] VARNHAGEN - Obr.
cit., pág. 126.
[40] Actas da Câmara
Municipal de S. Paulo, vol. XXII, págs. 539 e 540. Os grifos são nossos (N.E.:
isto é, os grifos são do autor Alberto Sousa).
[41] Os decretos de 29 de
setembro foram promulgados e publicados com data de 1º de outubro.
[42] Actas das Sessões
do Govêrno Provisório de S. Paulo, pág. 98.
[43] ASSIS CINTRA - D.
Pedro 1º e o Grito da Independência, pág. 52.
[44] Actas das Sessões
do Govêrno Provisório, pág. 99.
[45] Documentos
Interessantes, vol. XXXVI, pág. 148.
[46] Registro de
Correspondência do Govêrno Provisório (no Arquivo do Estado).
[47] Documentos
Interessantes, vol. XXXVI, pág. 148.
[48] Actas das Sessões
do Govêrno Provisório, págs. 100 e 101.
[49] Idem, págs. 102 e
103.A
[50] Idem, ibidem.
[51] Idem, pág. 104.
[52] Actas das Sessões
do Govêrno Provisório, pág. 105.
[53] Actas da Câmara
Municipal de S. Paulo, vol. XXII, pág. 541.
[54] ASSIS CINTRA - Obr.
cit. pág. 171.
[55] Relatório com
que o conselheiro padre doutor Manuel Joaquim do Amaral Gurgel, vice-presidente em exercício, passou a administração de S. Paulo ao presidente
doutor Francisco Ignácio Marcondes Homem de Mello, a 8 de março de 1864 (no Arquivo do Estado).
[56] Este Seminário,
fundado em 1825, e extinto anos depois, teve como seu primeiro diretor Joaquim Francisco do Livramento (AZEVEDO MARQUES - Apontamentos, vol.
2º, pág. 165, 2ª col.).
[57] Manuel Joaquim do
Amaral Gurgel nasceu em S. Paulo, a 8 de setembro de 1797, e logo depois de nascer foi confiado aos cuidados de três senhoras pobres, que muito se
esforçaram por lhe dar esmerada educação. Ordenado em 1817, com dispensa da Autoridade Eclesiástica, por não ter completado a idade legal,
bacharelou-se em Direito a 17 de outubro de 1832, tomando o grau de doutor, em setembro do ano seguinte. Foi Lente Substituto e após Catedrático do
2º ano da Faculdade de S. Paulo, jubilando-se em 24 de maio de 1858, depois de ter exercido desde 30 de março de 1848 a direção do mesmo
estabelecimento.
Em 1820, alistou-se entre os Constitucionalistas, e após o Grito do Ipiranga, fez parte, com o
posto de secretário, da Guarda Cívica denominada Sustentáculo da Independência, e que por essa época se fundara em S. Paulo.
Com o padre Diogo António Feijó, de quem era extremoso amigo, sustentou renhida campanha contra o
celibato clerical, travando a esse respeito memorável discussão com o arcebispo da Bahia, d. Romualdo António de Seixas.
Dedicou-se também ao jornalismo, tendo redigido o Observador, no período de 1840 a 1843.
Como deputado geral à 3ª e à 5ª legislaturas, tomou parte ativa na elaboração do Código Comercial vigente até hoje. Deputado provincial em mais de
uma legislatura. Conselheiro de Estado em 1853, faleceu Amaral Gurgel em S. Paulo, com grande fama de orador sacro e profano, aos 15 de novembro de
1864 (AZEVEDO MARQUES - Obr. cit., vol. 2º, págs. 62 e 63; J. J. RIBEIRO - Obr. cit., vol. 2º, págs. 450 a 451; SACR. BLAKE - Obr. cit., vol. 6º,
pág. 109). |