PRIMEIRA PARTE - PRELÚDIOS DA INDEPENDÊNCIA
Capítulo III - O problema brasileiro e a atitude das Cortes de Lisboa
As tendências das Cortes
ssistamos
agora noutro cenário mais amplo, na vetusta Lisboa regenerada pelo filtro mágico do liberalismo constitucionalista, ao desenrolar dos importantes
acontecimentos que lá se passavam e que tão de perto diziam com o problema capital imposto à livre consciência dos patriotas brasileiros - a
autonomia relativa, quando não a absoluta independência do nosso País, chegado à idade de se emancipar.
Veremos que os liberais portugueses, talvez sentindo o influxo tutelar da Inglaterra dominadora,
tinham aprendido, com os estadistas dessa artificiosa potência, a cultuar entusiasticamente a liberdade dentro de suas fronteiras, mas a desprezá-la
com insolente arrogância nos demais países do Universo.
Para os dirigentes britânicos, a liberdade é a deusa tutelar, cujos pés osculam com religioso
acatamento; ela, porém, é a deusa privativa dos lares ingleses, dos súditos ingleses, das instituições inglesas dentro do torrão inglês. Fora daí, o
airoso barrete frígio da divindade politéica transforma-se em pesado capacete militar; o seu cetro alegórico, em gládio conquistador, e os seus
grilhões espedaçados, em novas gargalheiras para escravizar alheios povos.
Na Inglaterra a liberdade brilha em toda a intensidade de seu magnífico esplendor; mas não existe
na Irlanda, nem no Industão, nem no Transvaal, nem no Canadá, nem na Austrália; e no Egito é uma burla tão revoltante como aparatosa. Com tais
mestres experimentados e suas lições sapientíssimas, pretenderam ingenuamente os estadistas da representação lusitana abrigar o reino português sob
o manto protetor da mais desafogada liberdade política e civil, conservando, porém, o vasto e opulento reino americano no regime da escravidão mais
afrontosa, sem governo autônomo, sem finanças próprias, sem qualquer franquia de caráter comercial, sem tribunais superiores, sem nenhuma daquelas
preciosas conquistas a que já se tinha habituado durante os treze anos de permanência da família real no Rio de Janeiro.
Ao princípio, agiram as Cortes com habilidade e prudência, porque não conheciam ainda o efeito
produzido nas capitanias do Brasil pela revolução triunfante da metrópole. Logo, porém, que o Pará, a Bahia, o Rio, Pernambuco e outras províncias
se pronunciaram abertamente pela causa portuguesa - pondo-se ao lado da revolução contra o rei, se este se não quisesse curvar às imposições daquela
-, começaram a delinear e pôr em execução os planos tendentes a recolonizar a ex-colônia, incapazes de compreender, na inópia de seus conhecimentos
em relação ao estado de maturescência da cultura brasileira, que tais planos jamais alcançariam o resultado que quimericamente imaginavam.
Planos de recolonização
Tinham elas promulgado o conhecido decreto de 18 de abril, reconhecendo a legalidade das Juntas
Governamentais Provisórias que se constituíssem nas sedes das capitanias, à semelhança do que tinha ocorrido na do Pará e na da Bahia. Já a
primeira, desde 5 do aludido mês, fora expressamente considerada pelo soberano congresso como província de Portugal e não mais como simples
capitania do Brasil. Começava por essa forma, aparentemente generosa, a deslocar-se para Lisboa a obediência que as capitanias brasílicas deviam
prestar à Regência do Rio de Janeiro.
Enquanto nada se sabia relativamente à atitude do rei em face da revolução, os constituintes
abstiveram-se, com a maior sagacidade, de adotar quaisquer providências que, mesmo de leve, pudessem melindrar as suscetibilidades patrióticas dos
brasileiros.
Logo, porém, que d. João aportou ao Tejo e que as Cortes o converteram em prisioneiro do Estado,
sem iniciativa, sem liberdade e sem vontade, o procedimento delas para com o Brasil mudou de todo. Desde que tinham o rei em casa, sotoposto ao
arbítrio de suas soberanas decisões, não havia mais por que recearem o povo americano, cuja recolonização deveria fazer-se quanto antes, a fim de se
evitar que as suas veleidades autonomísticas tomassem perigosas proporções.
Nas primeiras sessões, os dirigentes da nova política portuguesa excediam em escrúpulos
relativamente às condições e à sorte do Brasil: cumpria-lhes não o coagirem a aceitar o pacto fundamental sem que, por seus legítimos
representantes, o aprovasse previamente. Não devia também o Congresso legislar intempestivamente para ele, sem que, igualmente, interviessem na
elaboração das leis os respectivos deputados, com suas opiniões e com seus votos. Breve todas essas atenções iriam desaparecer.
Em várias sessões do mês de julho discutiu-se a respeito da conveniência ou não de se mandarem
para o Rio novas tropas em substituição da Divisão Auxiliadora, cujos soldados, tendo terminado seu tempo de alistamento, se impacientavam por
voltar à pátria de origem. No projeto de lei relativo à reorganização dos governos ultramarinos havia um artigo - o último - dispondo sobre a
matéria.
A medida proposta, ao que informam historiadores de peso, fora sugerida por d. João VI, pouco
depois do seu regresso. Manuel Fernandes Thomás, que era o mais acatado dos chefes regeneradores, pronunciou-se contra ela, no que foi acompanhado
por numerosos corifeus do liberalismo, sustentando que tão grave decisão não podia ser tomada sem ouvir-se a Junta Fluminense; e o deputado
Mangiocchi, professor da Universidade de Coimbra, o apoiara, acrescentando que, na ausência dos representantes brasileiros, nenhuma providência
deveria ser adotada em relação ao seu país.
Os deputados pernambucanos. Muniz Tavares. Araújo Lima. O bispo
Azeredo Coutinho
Essas vozes prudentes não foram, porém, escutadas pela maioria,
que aprovou, sob a orientação de Borges Carneiro, por 40 votos contra 37, a remessa de 1.200 praças para renderem a Divisão estacionada no Rio. Isso
ocorria a 25 de agosto [1].
Daí a 4 dias, a 29 [2],
tomavam posse os deputados pernambucanos que, apesar de eleitos depois dos fluminenses, foram os primeiros deputados americanos que compareceram às
Cortes.
Eram eles: efetivos - Domingos Malaquias de
Aguiar Pires Ferreira [3],
Felix José Tavares de Lyra, padre Francisco Muniz Tavares [4],
Ignácio Pinto de Almeida e Castro, João Ferreira da Silva, Manuel Zeferino dos Santos e Pedro de Araújo Lima
[5]; e
substitutos - António de Pádua Vieira Cavalcanti e d. Francisco Xavier de Lóssio e Seiblitz.
Pela Comarca do Sertão, da mesma província, foram eleitos e tomaram posse como efetivos Seraphim
de Sousa Pereira e Theodoro Cordeiro, e como substituto, Domingos da Conceição.
As Juntas Provisórias. Inovação perigosa
É agora que se vão acentuar com maior energia as hostilidades do Congresso, apenas iniciadas,
contra as justas pretensões do Reino do Brasil, formuladas pelos seus representantes congressionais, ainda timidamente por enquanto. A 30 de agosto,
no dia seguinte, pois, ao empossamento dos deputados pernambucanos, tratou-se de organizar o governo da capitania que eles representavam e a base
fundamental dessa organização definitiva era a separação entre a administração civil e a autoridade militar.
Aquela, abrangendo todas as atribuições de caráter civil, econômico ou meramente policial, caberia
a uma Junta composta de sete membros nomeados pelos eleitores de paróquias, e com poderes bastantes para prover a todos os cargos públicos, cujos
serventuários responderiam por seus atos perante ela, excetuando-se os empregados da Fazenda, que prestariam suas contas ao Governo Central
estabelecido em Lisboa, embora a referida Junta pudesse suspendê-los e processá-los perante a Relação do Distrito, quando cometessem abusos no
exercício de suas funções. Os vencimentos anuais de cada membro da Junta seriam de 1 conto de réis, sendo-lhe vedado ocupar qualquer outro cargo
oficial retribuído. A autoridade militar seria confiada a um oficial superior do Exército, denominado governador comandante das Armas, nomeado pelo
Poder Executivo do Reino, a quem ficavam subordinados; e venceriam, além do soldo da patente, a gratificação anual de 2:400$000.
Este plano era exatamente o contrário do sistema que até então tinha vigorado no Pará e na Bahia,
onde a força armada estava à disposição das Juntas locais, tal e qual o governo revolucionário tinha estabelecido em Lisboa, após a vitória do
Constitucionalismo. A sua adoção importaria, de um lado, no enfraquecimento da autoridade das Juntas que, sem dispor de força material, não poderiam
executar a maior parte de suas deliberações; e de outro lado, no predomínio de uma seção da Monarquia sobre a outra, o que era a destruição do
regime de igualdade perante a lei, fundado pela Revolução.
No Brasil, semelhante resolução, quando conhecida, produziu a mais deplorável impressão e o maior
descontentamento. Todavia, os deputados pernambucanos consentiram sem protesto na sua aprovação legislativa. Parece que assim procederam para que
pudessem com mais liberdade propugnar, na sessão do dia imediato, pela aprovação da proposta de Manuel Zeferino dos Santos, estatuindo que os
oficiais encarcerados ou desterrados como participantes da revolução de 1817, e ora absolvidos pela Relação da Bahia, fossem reintegrados nos
respectivos postos e pagos dos seus soldos desde a data em que a sentença os excluíra das fileiras do Exército.
Tratando-se de militares que tinham tomado parte ativa num movimento político declaradamente
separatista, os recolonizadores das Cortes receberam com mal dissimulada suspicácia a proposição de Zeferino dos Santos que, aliás, a defendeu com
grande cópia de vitoriosos argumentos; e devido à lógica de sua defesa foi aceita em parte, mesmo pelos espíritos mais prevenidos contra ela.
Deliberou-se que os soldos seriam pagos integralmente, mas a reintegração pedida ficava dependente de ulteriores informações da Junta de Pernambuco.
Esta medida conciliatória foi alvitrada por Araújo Lima, que tinha certeza de que na eleição da
nova Junta, criada pelo projeto aprovado na sessão antecedente, os elementos liberais exerceriam discricionária preponderância, obtendo maioria
favorável à reintegração proposta.
Por este ou por aquele motivo, ou porque entendessem de transigir com as Cortes a
fim de favorecer os aludidos oficiais, ou porque, isolados no seio da assembléia, sem o apoio moral e o concurso numeral das outras deputações
brasílicas, se sentissem fracos para a luta que se travava - o que é certo é que até então os pernambucanos tinham-se portado com demasiada cordura
no desempenho de seu mandato [6].
A bancada fluminense
A 10 do seguinte mês tomou assento a bancada fluminense, cuja composição já demos no capítulo
anterior. Deixou apenas de comparecer d. Francisco de Lemos, bispo de Coimbra, quase octogenário, e que esperava restabelecer-se prontamente de
achaques que supunha passageiros e próprios de sua provecta idade, para prestar juramento e entrar em exercício. Mas, a 13 de outubro, tendo
reconhecido a impossibilidade física em que se achava de dar a seu mandato o conveniente desempenho, renunciou-o, entrando em seu lugar o deputado
substituto Francisco Villela Barbosa, ulteriormente marquês de Paranaguá.
A 12 faleceu repentinamente o bispo Azeredo Coutinho
[7], que
foi substituído, a 17, pelo suplente dr. Custódio Gonçalves Ledo, médico então residente no Porto, e irmão de Joaquim Gonçalves Ledo
[8]. Com
estas duas modificações, começou a agir a deputação do Rio, segunda que chegava às Cortes.
A primeira questão em que tiveram de intervir foi a prisão do conde dos Arcos - questão que
suscitou os mais veementes debates no seio do congresso. O governo de Lisboa, grato, pelos motivos expostos anteriormente, à Junta da Bahia,
entendeu que devia, mais uma vez, dar arras de seu reconhecimento à fidelidade daquela corporação e, apoiando sua conduta em referência ao
ex-vice-rei do Brasil, mandou detê-lo na Torre de Belém, até que viessem as devassas que se mandaram tirar. Como estas nunca chegassem, e não se
formasse, portanto, culpa ao preso, requereu ele seu imediato livramento, de acordo com um dos dispositivos das Bases Constitucionais.
Trava-se debate no plenário da Constituinte. Uns, tendo à frente os principais vultos da
regeneração, como Fernandes Thomás, o padre Castello Branco e José Joaquim Ferreira de Moura, opõem-se ao livramento requerido; outros são-lhe
favoráveis por motivos que compridamente expõem e justificam.
A bancada fluminense e a pernambucana pronunciaram-se inexplicavelmente em favor do conde, que a
maioria dos portugueses acusavam de traidor à causa nacional. A primeira já não se lembraria mais do sangue brasileiro, derramado na Praça do
Comércio, por conselho daquele titular ao príncipe inexperiente e confiante? E a outra não teria mais presente na esquecediça memória os mártires de
1817, imolados barbaramente ao cortesanismo do então governador da Bahia, que ordenava aos soldados e ao povo para atirarem contra quem quer que
fosse suspeito de revolucionário, como se atirassem a lobos?
A atitude das duas bancadas, que representavam de perto os povos oprimidos e sacrificados em seus
anseios de liberdade pelo despotismo do conde dos Arcos, é um enigma que não encontrou ainda nenhum hábil historiador que o decifrasse. Generosidade
dos vencedores em relação ao algoz ora encarcerado e vencido? Talvez, porquanto os pernambucanos, embora tivessem menos razões de odiar a Luís do
Rego do que ao conde, continuavam a guerrear incansavelmente àquele, ao passo que contra este não formulavam acusações perante as Cortes.
E por quê semelhante diversidade de conduta? Porque um já estava fora de combate, destituído de
todas as suas funções, despojado de todas as suas prerrogativas, e não podia mais perturbar a marcha das idéias triunfantes e nem perseguir seus
denodados partidários; enquanto que o outro continuava à testa de seu cargo, honrado com a confiança do governo português, e permanecia como uma
agouro funesto a ameaçar a liberdade tão cara aos patriotas pernambucanos.
Pensamos, por isso, que a deputação fluminense, optando declaradamente pela soltura, e a de
Pernambuco, mantendo-se em completo silêncio durante as agitações do caloroso debate, o que equivalia a uma tácita concordância com os outros
colegas brasileiros - assim agiram por um espontâneo sentimento de generosidade, tão próprio da índole amorável e do bondoso coração de nossos
patrícios e sempre demonstrado inequivocamente em todas as fases de nossa história política.
Afinal, na sessão de 17 de setembro, o congresso manteve a prisão do conde, e mandou que se
tomasse o depoimento de pessoas recentemente chegadas do Rio, sobre o motivo da acusação. Só mais tarde é que foi solto, por decreto real.
Do projeto de lei reorganizando a administração ultramarina fora aprovado, como dissemos atrás, à
revelia dos representantes brasileiros que ainda não tinham chegado, justamente o último artigo, o que dispunha acerca da remessa de tropas para
substituírem a Divisão Auxiliadora destacada no Rio. Para se deliberar e aprovar essa medida, argumentou-se com a sua patente relevância e urgência.
O restante do projeto ficou parado, mesmo depois da posse dos pernambucanos e fluminenses, à espera de que chegassem os demais membros da
representação brasileira, de acordo, aliás, com o que prescreviam as Bases Constitucionais vigentes.
Mas reinava completa anarquia na administração das províncias. Numas, os capitães-mores
continuavam à frente dos públicos negócios, em desacordo com a vontade popular que eles menosprezavam; noutras, as próprias Juntas, eleitas em
caráter provisório, estavam em conflito com as populações desgostosas.
Reorganização das províncias brasileiras
Fazia-se mister uma reorganização geral imediata, para restabelecer a ordem e a
confiança profundamente abaladas. Muniz Tavares pugnou, portanto, que o projeto fosse dado à discussão, antes mesmo que a deputação brasileira
ficasse completa; e a Junta do Pará, em ofício lido na sessão de 10 de setembro, manifestou a mesma opinião
[9].
As Cortes atenderam prontamente ao que os próprios interessados lhes pediam. Não lhes caberia
responsabilidade perante as demais bancadas americanas pela discussão, votação e aprovação do projeto, que estivera guardado para a ocasião oportuna
e que voltava a figurar na ordem do dia para satisfazer a vontade dos que tinham nele maior interesse do que os portugueses.
A base da organização consistia essencialmente na criação de uma Junta Civil de sete membros nas
capitanias administradas por capitães-mores; e nas capitanias regidas meramente por governadores, a Junta compor-se-ia de apenas cinco membros.
Quanto ao mais, a organização era exatamente igual à que já fora dada, em caráter provisório, em
29 de agosto, a Pernambuco, segundo narramos no princípio deste capítulo, e consistia principalmente na completa separação entre o poder militar e o
poder civil, nomeado o detentor daquele pelo Poder Executivo do Reino, a quem ficava direta e exclusivamente subordinado; e eleitos os membros deste
pelos eleitores paroquiais.
Martins Bastos, Pires Ferreira e Araújo Lima
[10], que
se não tinham insurgido contar semelhante dispositivo quando se tratou da organização do governo pernambucano, combateram agora a instituição da
autoridade militar autônoma, tal como o projeto a concebia, e que colocava as Juntas Civis em posição subalterna diante do Governo Português e das
Cortes Soberanas.
É verdade que essa organização era também provisória, pois vigoraria até que, promulgado o Pacto
Fundamental, se desse então às capitanias seu definitivo regime de governação, mas já se percebia nela, através das discussões travadas a respeito,
uma tendência visível para ficar perpetuada de futuro na legislação orgânica de caráter permanente.
Hippólyto José da Costa Pereira
Imagem publicada com o texto
Fraqueza e falta de unidade das bancadas brasileiras
Apesar da intervenção daqueles três mandatários brasileiros, os seus colegas das duas bancadas
presentes não os secundaram no ataque, aliás pouco vigoroso/; e o projeto, mesmo sem ter sofrido todas as discussões regimentais, foi aprovado e
convertido em lei. A autoridade militar nas províncias de primeira ordem seria exercida por um general com o título de Governador das Armas,
ganhando um vencimento anual de 2:400$000; e nas outras, por um coronel, intitulado Comandante Militar do Distrito, e vencendo 600$000 anualmente.
Estava finalmente tomado o pulso dos débeis delegados da opinião brasileira, até então presentes
aos trabalhos da Constituinte, que ia agora desenvolver seu plano de recolonização com mais destemor e mais desembaraço. Enfraquecida a
administração civil das capitanias pela passagem de suas atribuições militares para uma autoridades adstrita ao governo de Lisboa, cumpria
entretanto às Cortes desfechar um golpe de morte na organização judiciária do reino ultramarino, a fim de jungi-lo mais fortemente à direção do
reino português.
Desse pensamento reacionário nasceu a proposta, suprimindo os tribunais superiores aqui existentes
e fundados por d. João VI. Levantou-se para impugná-la com ardor o representante fluminense Martins Bastos, cujo discurso calou profundamente no
ânimo dos congressistas; e, apesar de serem autores e defensores da humilhante proposta regeneradores da polpa e prestígio de Fernandes Thomás,
Borges Carneiro e Ferreira de Moura, que compunham a Comissão de Constituição, foi o assunto adiado para que se ouvissem a respeito os
representantes americanos ausentes.
A 1º de outubro promulgou-se o decreto de 29 de setembro, pelo qual ficavam
organizadas as capitanias nos moldes governamentais provisórios que já expusemos. Apesar de conterem as disposições desse decreto os germes da
reescravização política, administrativa e militar do Brasil à sua antiga metrópole, os deputados brasileiros, salvo a restrição oposta à criação dos
Governadores de Armas com dependência direta de Lisboa, aprovaram-no, como notamos atrás; e até, como observa um historiador criterioso que a cada
momento estamos citando, o próprio Hyppólito da Costa, o insigne jornalista do Correio Brasiliense
[11],
aprovou-a também.
No dia seguinte ao da aprovação legislativa do referido projeto, que tirava ao príncipe regente
toda a jurisdição que lhe conferira o rei sobre o Brasil, as Cortes, por unanimidade verificada duas vezes, decretaram a volta de d. Pedro para
Portugal, por terem cessado suas atribuições com a criação das Juntas eletivas. Os deputados brasileiros não só não protestaram contra essa iníqua
medida, como até lhe deram serenamente seu voto.
Entretanto, convertido em lei esse projeto e promulgado no mesmo dia que o anterior, ambos iriam
produzir no Brasil resultados que os fluminenses e pernambucanos do Congresso não esperavam, porque concorreram para se intensificar o movimento
separatista que poucos vultos de peso queriam, sendo a maioria dos espíritos calmos e sensatos partidária da autonomia ampla dentro da união.
Ainda esse ato legislativo logrou o aplauso de Hyppólito da Costa no seu periódico, porque a d.
Pedro lhe parecia faltarem as mais elementares qualidades para exercer o cargo em que fora investido; mas entendia o arguto jornalista que devia
existir no Brasil um poder executivo ligando as províncias entre si e, por seu intermédio, religando-as a Portugal.
É verdade que o decreto chamando a Lisboa o príncipe era, na aparência, a mera consumação oficial
de um fato já existente e nada mais; pois o próprio príncipe confessara ao pai, na carta de 17 de julho de 1821, que estava reduzido, de regente do
reino, a simples capitão-general de uma só província - o Rio.
Efetivamente, todas as Juntas Provinciais menoscabavam de sua autoridade cada vez mais precária e
timbravam em manifestar sua completa obediência incondicional às Cortes. No Rio mesmo hesitava-se entre a sujeição a estas, ou a submissão àquele, e
somente a presença pessoal de d. Pedro impedia um pronunciamento radical dos elementos mais agitados, graças à autoridade de que se achava ele
investido não só pela tradição dinástica, senão também pelas instruções que lhe deixara o rei.
Entretanto, não faltavam, como vimos, os movimentos populares com o fim de ser imposto um justo
limite aos seus caprichos demasiadamente pessoais ou aos seus possíveis excessos de poder governamental. Os espíritos adiantados e o próprio
instinto do povo inculto viam que as Cortes, com suas normas liberais bem definidas na Constituição, eram preferíveis à regência de um príncipe,
nato e criado no absolutismo, e em cujo caráter imperioso não podiam depositar inteira confiança.
Foi a Junta de S. Paulo a primeira a reconhecer oficialmente a autoridade de d. Pedro, pela carta
de 30 de junho de 1821, que lhe foi pessoalmente entregue por uma deputação especial a 23 de julho - seis dias depois de ter ele escrito ao soberano
a citada epístola-desabafo a que nos referimos, queixando-se de que era apenas o simples governador de uma só província, o que tudo narraremos no
lugar oportuno, com os necessários pormenores.
Teríamos só por isso de atribuir aos paulistas, sem favor algum, a prioridade do movimento que
produziu o Sete de Setembro, e, portanto, a prioridade de José Bonifácio, que foi o inspirador principal da atitude da Junta, de que era
vice-presidente. Outros documentos falarão bem alto, relativamente à incontestável prioridade paulistana no movimento coordenador das forças
políticas em torno da figura central do príncipe regente.
Com a posse de Villela Barbosa, a 16 de outubro, como substituto de d. Francisco de Lemos na
bancada fluminense, melhorou a situação dos constituintes brasileiros, pois o seu verbo eloqüente e a coragem de suas atitudes influíram
poderosamente para que as Cortes não tomassem de ora em diante deliberações precipitadas. A sua estréia verificou-se quando se debatia o caso dos
pernambucanos, novamente inculpados de independencistas por Luís do Rego, que os remetera presos para Lisboa.
Graças à palavra de Villela Barbosa, foram eles recolhidos com o maior conforto possível ao
Castelo de S. João e mandou o Executivo, pelo órgão do ministro da Justiça, que a Relação reunisse extraordinariamente para julgá-los sem demora e
que se instaurasse inquérito a respeito da administração de déspota que governava Pernambuco. Infelizmente, a sua retardia presença já não podia
evitar as medidas reacionárias adotadas até então.
Não obstante as resoluções tomadas em relação a Pernambuco, o congresso entendeu que devia mandar
para lá um contingente militar, providência que os antecedentes separatistas e as vozes que a cada momento lhe chegavam das altas autoridades do
Recife pareciam justificar amplamente. Na sessão de 18 de outubro foi apresentado um projeto em tal sentido, e contra o qual embalde clamaram Muniz
Tavares, com grande abundância de argumentos sólidos, a que os oradores da Regeneração opuseram meros sofismas; e Villela Barbosa, que tornou
patentes os intuitos hostis com que o novo Portugal correspondia à confiança com que os brasileiros tinham entusiasticamente abraçado a causa
liberal.
O projeto que mandava ficarem em Pernambuco 400 soldados, dos 1.200 de que se compunha a expedição
destinada para o Rio, foi apresentado contra os votos somente da bancada pernambucana e do deputado fluminense Villela Barbosa, cujos colegas de
representação não acompanharam sua conduta, o que prova que a desorientação reinante entre os brasileiros foi a causa principal de levarem as Cortes
a efeito, desde o começo, os seus planos de reconquista do Brasil.
Deputação maranhense
Com a chegada da deputação maranhense, que tomou pose na sessão de 6 de
novembro, composta do desembargador da Relação da Província, Joaquim António Vieira Belfort e José João Beckman e Caldas
[12],
coincidiram os debates relativos à constituição de uma comissão permanente incumbida de zelar pela observância das leis, durante o período de
encerramento das Cortes.
Dessa comissão deveriam fazer parte três deputados europeus e três ultramarinos, sob a presidência
de um sétimo representante, tirada a sorte entre dois nomes com assento nas Cortes - um de cada seção da monarquia. Levantou-se forte oposição dos
Regeneradores contra a igualdade de representação proposta n projeto, cabendo ainda a Villela Barbosa a tarefa de combater com grande superioridade
os seus impugnadores. O projeto passou, afinal, na sessão de 13, por 69 votos contra 26, estando entre estes, por motivos que se não conseguiu
esclarecer até agora, os deputados fluminenses Gonçalves Ledo e Lemos Brandão.
Deputados por Santa Catarina, Bahia e Alagoas
A 19 compareceu o deputado por Santa Catarina, padre Lourenço Rodrigues de Andrade, e a 15 de
dezembro seguinte foi a representação americana poderosamente reforçada com a deputação das Alagoas e da Bahia.
Cypriano José Barata de Almeida
Imagem publicada com o texto
Cypriano Barata. Visconde da Pedra Branca
Compunha-se a primeira dos deputados efetivos Francisco de Assis Barbosa, Francisco Manuel Martins Ramos e Manuel Marques
Grangeiro; e da segunda faziam parte Alexandre Gomes Ferrão, dr. Cypriano José Barata de Almeida
[13], Domingos Borges de Barros
[14],
Francisco Agostinho Gomes [15],
José Lino Coutinho [16],
Luís Paulino de Oliveira Pinto da França [17],
padre Marcos António de Sousa [18]
e Pedro Rodrigues Bandeira, todos efetivos.
Dos baianos, as principais figuras eram
Cypriano Barata, Lino Coutinho e Agostinho Gomes. O primeiro, de pequena estatura e compleição franzina
[19], impunha-se pela fogosidade de seus
arroubos tribunícios; o segundo empolgava pela eloqüência primorosa, pelo gesto adequado e pelo trato ameno, insinuante e simpático
[20]; o
último, porém, dominava inteiramente a bancada por sua austeridade moral e pela vastidão de seu preparo
[21].
Estréia de Barata. Divergências e falta de coesão entre os brasileiros
Barata estreou-se no mesmo dia da posse para propor, em termos veementes, categóricos e resolutos,
que se adiasse a discussão de toda a matéria constitucional até a chegada dos restantes deputados brasileiros, perante os quais se renovaria a
discussão dos negócios já votados na ausência deles - de acordo com o insofismável dispositivo das Bases em seu artigo 21.
A sua atitude não foi apoiada pelos demais colegas da representação americana, receosos, ao que
supõe um historiador competente e juiz imparcial, de que, indispondo-se contra a maioria portuguesa, nada conseguiriam para sua pátria.
Além disso, as divergências de ordem puramente localista, as hostilidades de algumas províncias do
Norte contra o Rio, por causa da supremacia que este conquistara sobre todas em virtude de ter ficado aí estabelecida a sede do governo geral,
enfraqueciam, conforme já fizemos ver, a coesão, a harmonia, a unidade de atos e de propósitos, tão necessária naquele momento em que a liberdade
brasileira estava em jogo e contra ela conspiravam abertamente os partidários da recolonização com assento nas Cortes.
A circunstância, também, de estarem compostas, as nossas bancadas, de bom número de brasileiros
longamente fixados em Portugal, contribuiu para que os deputados nessas condições, amando a terra onde viviam folgadamente havia tantos anos, não
raro se colocassem ao lado dos que nos combatiam sem cessar.
Barata viu erguer-se, em oposição à sua justa proposta, um colega de sua própria bancada - Pinto
da França -, e acabou retirando-a do debate, a pedido de Fernandes Thomás, que havia formulado, em sessão anterior, o estranho conceito resumido
nesta breve frase de seu discurso de 20 de setembro: "Aqui não somos representantes das províncias, senão da Nação inteira; eu sou tanto
representante do Rio de Janeiro como os do Brasil são de Portugal e de suas províncias" - conceito que se firmou vitorioso durante o curso dos
debates sobre o Pacto Fundamental.
Para quê, nesse caso, tinham declarado as Bases Constitucionais que os artigos aprovados na
ausência dos representantes brasileiros só os obrigariam depois que eles expressamente os aprovassem de sua livre vontade? Para quê também
solicitaram do Brasil, com insistência, que mandasse às Cortes os deputados de suas províncias, o que foi feito com os maiores descômodos e
dificuldades? Se os portugueses de além-mar eram tão legítimos representantes nossos como os que elegemos aqui - então não havia necessidade alguma
de mandarmos estes para lá, em atenção aos instantes apelos que da metrópole nos vinham oficialmente.
E assim foram sucessivamente aprovadas quantas medidas os reacionários propuseram para reduzir o
Brasil à sua antiga posição colonial. Foram extintos os tribunais superiores criados aqui por d. João VI, e houve até um deputado fluminense, havido
como assaz competente e bastante enérgico, que defendeu a sangue-frio esse tremendo golpe vibrado contra a autonomia de nossa organização
judiciária.
Fagundes Varella, a quem coube tal inconsciente papel, sofreu tamanha crítica de
seus compatriotas, quando aqui chegou a notícia de sua inexplicável atitude, que nunca mais se animou a assomar à tribuna até o encerramento dos
trabalhos legislativos, mas os portugueses o recompensaram de tão grande dissabor investindo-o na presidência do congresso em fevereiro de 1822
[22].
Com a supressão dos tribunais, tinham os brasileiros de recorrer, demorada e custosamente, à
superior instância estabelecida na capital da antiga metrópole. Aliás, o cego ciúme, a que há pouco aludimos, de algumas províncias relativamente à
hegemonia fluminense, concorreu poderosamente para esse desfecho fatal. Não podendo conseguir que as causas fossem revistas pelas Relações
Provinciais, convieram em que passasse para a Casa da Suplicação de Lisboa o respectivo julgamento delas.
A desorientação das nossas bancadas assumiu em certa ocasião proporções inauditas, que uma triste
emulação acoroçoava. A comissão de Constituição mantinha o Supremo Conselho de Guerra, como tribunal indispensável. Os fluminenses e baianos
opuseram-se com a maior insensatez a essa conservação, contra a qual até Lino Coutinho discorre, preocupado mais em subalternizar o Rio do que em
servir à Pátria comum.
Dessas disputas e rivalidades, que muito nos comprometeram nas Cortes e das quais se aproveitaram
astuciosamente os paladinos da recolonização, ressalta bem acentuadamente a franca tendência de certas províncias para se desagregarem do conjunto
brasileiro. Cada uma delas propendia para considerar-se independente das outras, apesar da origem comum, das lutas comuns, da língua comum, dos
laços morais e tradições comuns.
O trabalho mais forte de José Bonifácio foi justamente no sentido de obstar essa perigosa
tendência, o que conseguiu finalmente com a adesão de d. Pedro à causa do novo império. O que, porém, foi uma necessidade imperiosa e benéfica
naquele momento, depois, com o lento decorrer das eras, tornou-se um obstáculo à expansão de cada província, que o excesso de centralização
monárquica levava outra vez ao ideal separatista.
Este novo perigo foi sabiamente conjurado pelos egrégios fundadores da federação republicana, que
facilitará o engrandecimento econômico e político de cada Estado autonômico, se as veleidades reacionárias de alguns publícolas retrógrados não
ousarem atentar contra a autonomia estatuída insofismavelmente em nossa Carta Fundamental.
José Lino Coutinho
Imagem publicada com o texto
Medidas reacionárias. Supressão dos tribunais
O caso é que todos os tribunais superiores, inclusive o Conselho de Guerra,
foram suprimidos pelo decreto de 11 de janeiro dd 1822 - um dos atos que mais fomentaram a propaganda pela independência absoluta, que até então
apenas timidamente se iniciava no periodismo, na Maçonaria, no púlpito e na praça púbica
[23].
Entra depois em discussão, e provoca longos, brilhantes e porfiados debates, o artigo referente à
reforma judiciária, instituindo o júri para todas as questões pendentes, quer criminais como cíveis, e a efetiva responsabilidade dos juízes
togados, por erros na aplicação do Direito ou infração das regras processológicas em vigor. A instituição do júri para todos os casos passou, após
esgotante discussão, tendo votado contra ela apenas dois deputados brasileiros - Pinto da França e Belfort Vieira, respectivamente representantes da
Bahia e do Maranhão.
Araújo Lima não esteve presente à sessão,q ue se realizou a 9 de janeiro - no dia mesmo em que,
enquanto as Cortes se esmeravam em cercear ao Brasil todas as liberdades e garantias já conquistadas pelo valor de seus filhos e importância de seus
territórios, as mais importantes províncias do Sul, reagindo contra as medidas adotadas em Portugal para reescravizar a sua opulenta ex-colônia,
pediam ao príncipe regente que ficasse entre nós, no caráter de Defensor Perpétuo destes Povos, e obtinha favorável acolhimento à sua petição...
A responsabilidade dos juízes togados provocou discussão mais tormentosa e mais prolixas, porque,
pelo projeto, as queixas das partes lesadas no Brasil tinham que ser levadas remotamente a Lisboa para serem devidamente processadas.
"A denúncia, afirmava Barata, rompendo o debate em nome dos brasileiros, sai do
ultramar para Portugal, volta ao ponto de partida para as necessárias informações, as quais serão protraídas indefinidamente, em virtude dos
embaraços opostos pelo querelado, e torna a Portugal para o exame perante o Conselho de Estado. Acrescente-se a isto a raridade dos correios e o
tempo da viagem e não haverá exagero em supor que mediará entre a queixa e a suspensão mais de um ano. Não faltará ao magistrado, portanto, ocasião
para tropelias, frustra-se o intento do projeto, que é aliviar prontamente os povos do mau juiz e priva-se a América do direito inestimável
fruído pelos portugueses da Europa" [24].
Deputados de S. Paulo
A discussão prosseguiu no dia seguinte, mas foi suspensa quando falava Villela
Barbosa em resposta ao deputado português Trigoso, para se dar juramento e posse a três membros da deputação paulista, então chegados, António
Carlos [25],
Nicolau Vergueiro e padre Diogo Feijó.
Com a entrada desses representantes ilustres, vai modificar-se radicalmente a atitude hesitante, a
dubiedade e a desorientação mantidas pela maioria dos deputados brasileiros, em face de projetos que destruíam completamente as relativas liberdades
que custosamente gozávamos e nos iam pouco a pouco repondo nas condições em que nos encontrávamos quando aqui chegou d. João.
Além do caráter combativista, denodado, extremamente resoluto dos três primeiros paulistas que
compareceram às Cortes e de quase todos que depois chegaram, contribuía para realçar-lhes o mérito e o prestígio, perante seus colegas de aquém e de
além-mar, o fato de serem portadores de instruções escritas do governo de sua província (que ouvira para esse fim as câmaras municipais), para por
elas se conduzirem nas sessões do Congresso de Lisboa.
A índole organizadora dos paulistas e a emérita capacidade política de José Bonifácio já
demonstravam, naquele documento, que nenhum outro povo e nenhum outro estadista do Brasil estavam melhor preparados do que eles para dirigirem e
levarem a bom termo a grave agitação que entre nós se elaborava lentamente e que teria seu glorioso e pacífico remate nos gloriosos campos do
Ipiranga.
Mas, ao tratarmos da entrada dos paulistas nas Cortes Constituintes, e da brilhante e digna
posição que nele prontamente assumiram em todas as discussões que interessavam à América Brasílica, devemos interromper a exposição geral que íamos
fazendo quanto à política portuguesa em relação à nossa Pátria, para nos ocuparmos, especial e detidamente, dos acontecimentos havidos na província
de S. Paulo, desde a partida de d. João VI para Portugal.
Vai-se ver que é S. Paulo quem, perante o povo brasileiro,
perante o príncipe d. Pedro, e perante as Cortes Portuguesas, dá um impulso orgânico às aspirações ainda dispersas dos naturais do País, fala com
segurança, ponderação e clareza do problema que nos preocupa, e imprime, aos oscilantes anelos dos patriotas sem diretriz firmada, uma orientação
positiva e capaz de congregar todas as almas, todas as energias e todos os esforços em torno de uma só vontade, de uma só pessoa, de uma só cabeça,
porque, sem um centro coordenador estável, as mais prestimosas atividades e iniciativas se perderiam anarquicamente no vago, na incerteza, na
irresolução dos muitos alvitres, dos variados projetos, dos planos multíplices, das opiniões discordantes e até das vozes desautorizadas...
NOTAS:
[1] GOMES DE CARVALHO -
Os Deputados do Brasil nas Côrtes de 1821, pág. 111.
[2] Idem, ibidem, pág. 112
[3] Foi
secretário de Cabugá na malograda missão dos revolucionários de 1817 junto ao governo dos Estados Unidos.
[4] Muniz Tavares - É
o conhecido revolucionário pernambucano de 1817 e o mais ilustre dos historiadores do heróico movimento. Filho de João Muniz Tavares e dona Rita
Soares de Mendonça, nasceu no Recife a 16 de fevereiro de 1793 e faleceu a 23 de outubro de 1876. Proclamada a Independência, foi deputado à
Assembléia Constituinte, e à Assembléia Legislativa Geral na Legislatura de 1845 a 1847, e secretário de nossa legação em Roma, de 1826 a 1832.
Doutorou-se em Teologia pela Universidade de Paris e foi nomeado monsenhor honorário da capela imperial e conselheiro de Estado. O Instituto
Histórico de Pernambuco deve-lhe a sua fundação (SACRAMENTO BLAKE - Obr. cit., vol. 3º. pág. 59).
[5] Araújo Lima -
Filho de Manuel de Araújo Lima e dona Anna Teixeira Cavalcanti, nasceu em Pernambuco a 22 de dezembro de 1793 e faleceu no Rio de Janeiro, a 7 de
junho de 1870 (SACRAMENTO BLAKE - Obr. cit., vol. 7º, pág. 16). Doutorando-se em Direito pela Universidade de Coimbra, "preparava-se para tomar
posse da Ouvidoria de Paracatu, em Minas Gerais, quando os sucessos de Portugal o induziram a protrair a viagem para tão remoto lugar" - informa-nos
o sr. GOMES DE CARVALHO (Obr. cit., pág. 106). SACRAMENTO BLAKE dá-no-lo como doutor em Cânones e diz-nos que exerceu a magistratura em seu país,
quando voltou da universidade. Senador a 5 de setembro de 1837, escolhido por Feijó, então Regente, e logo nomeado para a pasta do Império, foi
elevado à Regência a 19 daquele mês, permanecendo no cargo até a proclamação da maioridade de d. Pedro 2º.
[6] GOMES DE CARVALHO - Obr.
cit., págs. 103 a 118.
[7] GOMES DE CARVALHO - (Obr.
cit., pág. cit) dá, por engano, o seu falecimento a 12. Também a Comissão do Inst. Hist. Brasileiro, incumbida de publicar a obra póstuma de
VARNHAGEN - História da Independência, troca-lhe os primeiros nomes na relação apensa à nota III do Capít. II, pág. 523, chamando-lhe
Joaquim José, em vez de José Joaquim. Clérigo secular, formado em Cânones, nasceu em Campos dos Goitacazes, a 8 de setembro de 1743.
Apresentado a 21 de novembro de 1794, no reinado de dona Maria Primeira, e confirmado pelo papa Pio VI, foi sagrado bispo de Olinda de Pernambuco, a
25 de janeiro de 1795, de cujo cargo tomou posse a 25 de dezembro de 1796, regendo a diocese até 5 de julho de 1802. Fundou o Seminário Episcopal de
Nossa Senhora da Graça de Olinda. Espírito ilustradíssimo e coração virtuoso e liberal, foi, entretanto, defensor acérrimo da escravidão africana,
combatendo a sua projetada extinção num folheto intitulado Analyse sôbre a justiça do resgate dos escravos da Costa d'Africa, que alcançou
três edições, uma das quais em francês. Era de opinião que o tráfico negro beneficiava o africano em vez de fazer-lhe mal. Publicou mais vários
estudos econômicos, morais, religiosos e políticos (dr. M. L. MACHADO, nota III, à 2ª ed. da Hist. da Rev. de Pernambuco, de MUNIZ TAVARES,
pág. 252; SACRAMENTO BLAKE - Obr. cit., vol. IV, págs. 475 a 480; dr. MANUEL DE ALVARENGA - Obr. cit., pág. 131).
[8] VASCONCELLOS DE
DRUMMOND, nas suas já referidas Annotações (separata do vol. XIII dos Annaes da Bibliotheca Nacional, págs. 70 e 71), diz, por
evidente lapso de memória, que Azeredo Coutinho foi substituído por Villela Barbosa, quando a verdade é que este substituiu a d. Francisco de Lemos,
segundo se lê em nosso texto. O trecho de Drummond, em que se vê esse engano, é reproduzido, sem corrigenda alguma, nas Notas que a Comissão do
Inst. Hist. Bras. apensou à Historia da Independência, de VARNHAGEN.
[9] GOMES DE CARVALHO - Obr.
cit., págs. 118 a 120.
[10] GOMES DE CARVALHO -
Obr. cit., pág. 123.
[11] Publicado em Londres,
de 1808 a 1829.
[12] O último fora como
substituto do efetivo Raymundo de Brito Magalhães e Cunha. GOMES DE CARVALHO (obr. cit., pág. 147) troca-lhe o segundo nome - Joaquim em vez
de João. MELLO MORAES (obr. cit., vol. 1º, pág. 76, col. 1ª) dá apenas Beckman como representante do Maranhão, olvidando o nome de seu
companheiro de bancada.
[13] Filho de João Alves
Barata de Almeida, nasceu na Cidade do Salvador a 26 de setembro de 1762 e faleceu na do Natal (Rio Grande do Norte) a 1º de junho de 1838. Era
cirurgião e bacharel em Filosofia e Matemática pela Universidade de Coimbra. Fundou o primeiro jornal realmente republicano que saiu no Brasil -
A Sentinela da Liberdade na Guarita de Pernambuco - 1823 (SACR. BLAKE - Obr. cit., vol. 2º pág. 150; JOSÉ ÁLVARES DO AMARAL - Resumo
Chronológico e Noticioso da Província da Bahia, pág. 311).
[14] Mais tarde visconde
da Pedra Branca. Era filho do capitão-mor Francisco Borges de Barros e dona Luísa
Borges, tendo nascido em São Salvador (N.E.: nome antigo da capital da Bahia, atual Salvador)
a 10 de outubro de 1780 e falecido a 20 de março de 1855 na mesma cidade. Cultivou com êxito as belas letras, distinguindo-se principalmente na
poesia. É dele o seguinte improviso sobre as desgraças que já naquele tempo afligiam nossa Pátria:
São desgraças do Brasil
Um patriotismo fofo,
Leis em parola, preguiça
Ferrugem, formiga e mofo.
Quando já valetudinário e detido por incurável paralisia que o levou à morte, apresentou-lhe
gentil senhorita um álbum, pedindo-lhe sua valiosa contribuição. Nele escreveu o poema a seguinte quadrinha:
Brasília, toma o teu álbum,
Não bulas comigo, não;
Se as pernas andar não podem,
Inda pula o coração!
Doutor em Direito pela Universidade de Coimbra, durante sua residência na metrópole manteve com
Bocage e Nicolau Tolentino excelentes relações de amizade pessoal. Ocupou vários cargos públicos de representação popular ou oficial, e foi quem
negociou o casamento da princesa dona Amélia com d. Pedro 1º. Eleito contra sua vontade senador por sua província natal, tomou posse para agradecer
a seus conterrâneos os votos que lhe deram, e ao imperador a sua escolha - e nunca mais compareceu na Câmara Vitalícia (MELLO MORAES - Obr. cit.,
vol. 1º, pág. 163, col. 2ª; SACRAMENTO BLAKE - Obr. cit., vol. 2º, pág. 196; B. DO RIO BRANCO - Ephemérides Brasileiras, pág. 204; J. M. P.
DE VASCONCELLOS - Selecta Brasiliense, vol. 2º, pág. 112; e GOMES DE CARVALHO - Obr. cit., pág. 153).
[15] Agostinho Gomes
- De origem fidalga, filho de Agostinho Gomes e dona Isabel Maria Maciel Teixeira, nasceu na Bahia a 4 de julho de 1769 e aí faleceu a 19 de
fevereiro de 1842. Seguiu os estudos eclesiásticos, interrompendo-os depois de receber ordens de diácono. Concorreu para a fundação da Biblioteca
Pública da Bahia, à qual doou sua importante livraria particular. Deixou o padre Agostinho Gomes sólida reputação de erudito (RIO BRANCO - Obr.
cit., pág. 120 e SACR. BLAKE - Obr. cit. vol. 2º, pág. 383).
[16] Lino Coutinho
- Nasceu na capital da Bahia a 31 de março de 1784 e aí faleceu a 21 de julho de 1836 (segundo SACRAMENTO BLAKE - Obr. cit., vol. 5º,
pág. 7 e AFF. D'ESCRAGNOLE TAUNAY - Obr. cit., pág. 131) ou a 25 do dito mês (conforme assinala o B.
DO RIO BRANCO - Obr. cit., pág. 358). Formado em Medicina pela Universidade de Coimbra, escreveu diversas obas sobre essa especialidade, além de
alguns trabalhos filosóficos, literários e também poéticos.
[17] Pinto da França
- Nascido na capital da Bahia a 30 de junho de 1770, faleceu a 24 de janeiro de 1824, a bordo de um navio que no Rio de Janeiro o levava para
Lisboa. Era marechal-de-campo, mas inclinado às letras, tendo deixado reputação de bom poeta (SACR. BLAKE - Obr. cit., vol. 5º, pág. 446; P. DE
VASCONCELLOS - Obr. cit., vol. 2º, pág. 224; PEREIRA DA SILVA - Varões Illustres do Brasil, vol. 2º, pág. 349).
[18] Padre Marcos -
Segundo SACRAMENTO BLAKE (obr. cit., 6º vol., pág. 221 e o BARÃO DO RIO BRANCO (obr. cit., pág. 81) nasceu a 10 de fevereiro de 1771 na cidade do
Salvador; mas JOSÉ ÁLVARES DO AMARAL (obr. cit., Revista do Inst. Geog. e Histórico da Bahia, vol. 47, pág. 126) registra a data de seu
nascimento em 9 do dito mês. Presbítero secular, foi vigário da Vitória, em sua província natal. Apresentado bispo da Diocese do Maranhão, por
decreto de 13 de novembro de 1826, foi confirmado pelo papa Leão XII, a 26 de julho de 1827, sagrado a 28 de outubro do mesmo ano, na capela
imperial, pelo bispo do Rio de Janeiro, d. José Caetano da Silva Coutinho, tomou posse por procuração a 19 de março de 1828 e fez sua entrada solene
no Maranhão a 11 de março de 1830. Foi o primeiro bispo brasileiro nomeado depois da Independência, pelo desligamento da Diocese do Maranhão do
Patriarcado de Lisboa. Fundou o Seminário Diocesano Maranhense, cuja instalação se deu a 17 de abril de 1838 (dr. MANUEL DE ALVARENGA - O
Episcopado Brasileiro, pág. 118).
[19] JOSÉ ÁLVARES DO
AMARAL - Obr. cit., pág. 312.
[20] GOMES DE CARVALHO -
Obr. cit., pág. 153.
[21] Idem, ibidem, pág.
154.
[22] GOMES DE CARVALHO -
Obr. cit., pág. 172.
[23] O decreto em questão
foi publicado com data de 13, esclarece RIO BRANCO em nota retificativa a VARNHAGEN, que lhe dá a data de 12 (Hist. da Indep., pág. 95 e nota
1).
[24] GOMES DE CARVALHO -
Obr. cit., pág. 183.
[25] GOMES DE CARVALHO (Obr.
cit., pág. 188) diz, por equívoco, que António Carlos era o mais moço dos três Andradas. |