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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS - OS ANDRADAS - BIBLIOTECA
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A história do Patriarca da Independência e sua família

Esta é a transcrição da obra Os Andradas, publicada em 1922 por Alberto Sousa (Typographia Piratininga, São Paulo/SP) - acervo do historiador Waldir Rueda -, volume II, com ortografia atualizada (páginas 175 a 198): 
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PRIMEIRA PARTE - PRELÚDIOS DA INDEPENDÊNCIA

Capítulo III - O problema brasileiro e a atitude das Cortes de Lisboa

As tendências das Cortes

ssistamos agora noutro cenário mais amplo, na vetusta Lisboa regenerada pelo filtro mágico do liberalismo constitucionalista, ao desenrolar dos importantes acontecimentos que lá se passavam e que tão de perto diziam com o problema capital imposto à livre consciência dos patriotas brasileiros - a autonomia relativa, quando não a absoluta independência do nosso País, chegado à idade de se emancipar.

Veremos que os liberais portugueses, talvez sentindo o influxo tutelar da Inglaterra dominadora, tinham aprendido, com os estadistas dessa artificiosa potência, a cultuar entusiasticamente a liberdade dentro de suas fronteiras, mas a desprezá-la com insolente arrogância nos demais países do Universo.

Para os dirigentes britânicos, a liberdade é a deusa tutelar, cujos pés osculam com religioso acatamento; ela, porém, é a deusa privativa dos lares ingleses, dos súditos ingleses, das instituições inglesas dentro do torrão inglês. Fora daí, o airoso barrete frígio da divindade politéica transforma-se em pesado capacete militar; o seu cetro alegórico, em gládio conquistador, e os seus grilhões espedaçados, em novas gargalheiras para escravizar alheios povos.

Na Inglaterra a liberdade brilha em toda a intensidade de seu magnífico esplendor; mas não existe na Irlanda, nem no Industão, nem no Transvaal, nem no Canadá, nem na Austrália; e no Egito é uma burla tão revoltante como aparatosa. Com tais mestres experimentados e suas lições sapientíssimas, pretenderam ingenuamente os estadistas da representação lusitana abrigar o reino português sob o manto protetor da mais desafogada liberdade política e civil, conservando, porém, o vasto e opulento reino americano no regime da escravidão mais afrontosa, sem governo autônomo, sem finanças próprias, sem qualquer franquia de caráter comercial, sem tribunais superiores, sem nenhuma daquelas preciosas conquistas a que já se tinha habituado durante os treze anos de permanência da família real no Rio de Janeiro.

Ao princípio, agiram as Cortes com habilidade e prudência, porque não conheciam ainda o efeito produzido nas capitanias do Brasil pela revolução triunfante da metrópole. Logo, porém, que o Pará, a Bahia, o Rio, Pernambuco e outras províncias se pronunciaram abertamente pela causa portuguesa - pondo-se ao lado da revolução contra o rei, se este se não quisesse curvar às imposições daquela -, começaram a delinear e pôr em execução os planos tendentes a recolonizar a ex-colônia, incapazes de compreender, na inópia de seus conhecimentos em relação ao estado de maturescência da cultura brasileira, que tais planos jamais alcançariam o resultado que quimericamente imaginavam.

Planos de recolonização

Tinham elas promulgado o conhecido decreto de 18 de abril, reconhecendo a legalidade das Juntas Governamentais Provisórias que se constituíssem nas sedes das capitanias, à semelhança do que tinha ocorrido na do Pará e na da Bahia. Já a primeira, desde 5 do aludido mês, fora expressamente considerada pelo soberano congresso como província de Portugal e não mais como simples capitania do Brasil. Começava por essa forma, aparentemente generosa, a deslocar-se para Lisboa a obediência que as capitanias brasílicas deviam prestar à Regência do Rio de Janeiro.

Enquanto nada se sabia relativamente à atitude do rei em face da revolução, os constituintes abstiveram-se, com a maior sagacidade, de adotar quaisquer providências que, mesmo de leve, pudessem melindrar as suscetibilidades patrióticas dos brasileiros.

Logo, porém, que d. João aportou ao Tejo e que as Cortes o converteram em prisioneiro do Estado, sem iniciativa, sem liberdade e sem vontade, o procedimento delas para com o Brasil mudou de todo. Desde que tinham o rei em casa, sotoposto ao arbítrio de suas soberanas decisões, não havia mais por que recearem o povo americano, cuja recolonização deveria fazer-se quanto antes, a fim de se evitar que as suas veleidades autonomísticas tomassem perigosas proporções.

Nas primeiras sessões, os dirigentes da nova política portuguesa excediam em escrúpulos relativamente às condições e à sorte do Brasil: cumpria-lhes não o coagirem a aceitar o pacto fundamental sem que, por seus legítimos representantes, o aprovasse previamente. Não devia também o Congresso legislar intempestivamente para ele, sem que, igualmente, interviessem na elaboração das leis os respectivos deputados, com suas opiniões e com seus votos. Breve todas essas atenções iriam desaparecer.

Em várias sessões do mês de julho discutiu-se a respeito da conveniência ou não de se mandarem para o Rio novas tropas em substituição da Divisão Auxiliadora, cujos soldados, tendo terminado seu tempo de alistamento, se impacientavam por voltar à pátria de origem. No projeto de lei relativo à reorganização dos governos ultramarinos havia um artigo - o último - dispondo sobre a matéria.

A medida proposta, ao que informam historiadores de peso, fora sugerida por d. João VI, pouco depois do seu regresso. Manuel Fernandes Thomás, que era o mais acatado dos chefes regeneradores, pronunciou-se contra ela, no que foi acompanhado por numerosos corifeus do liberalismo, sustentando que tão grave decisão não podia ser tomada sem ouvir-se a Junta Fluminense; e o deputado Mangiocchi, professor da Universidade de Coimbra, o apoiara, acrescentando que, na ausência dos representantes brasileiros, nenhuma providência deveria ser adotada em relação ao seu país.

Os deputados pernambucanos. Muniz Tavares. Araújo Lima. O bispo Azeredo Coutinho

Essas vozes prudentes não foram, porém, escutadas pela maioria, que aprovou, sob a orientação de Borges Carneiro, por 40 votos contra 37, a remessa de 1.200 praças para renderem a Divisão estacionada no Rio. Isso ocorria a 25 de agosto [1]. Daí a 4 dias, a 29 [2], tomavam posse os deputados pernambucanos que, apesar de eleitos depois dos fluminenses, foram os primeiros deputados americanos que compareceram às Cortes.

Eram eles: efetivos - Domingos Malaquias de Aguiar Pires Ferreira [3], Felix José Tavares de Lyra, padre Francisco Muniz Tavares [4], Ignácio Pinto de Almeida e Castro, João Ferreira da Silva, Manuel Zeferino dos Santos e Pedro de Araújo Lima [5]; e substitutos - António de Pádua Vieira Cavalcanti e d. Francisco Xavier de Lóssio e Seiblitz.

Pela Comarca do Sertão, da mesma província, foram eleitos e tomaram posse como efetivos Seraphim de Sousa Pereira e Theodoro Cordeiro, e como substituto, Domingos da Conceição.

As Juntas Provisórias. Inovação perigosa

É agora que se vão acentuar com maior energia as hostilidades do Congresso, apenas iniciadas, contra as justas pretensões do Reino do Brasil, formuladas pelos seus representantes congressionais, ainda timidamente por enquanto. A 30 de agosto, no dia seguinte, pois, ao empossamento dos deputados pernambucanos, tratou-se de organizar o governo da capitania que eles representavam e a base fundamental dessa organização definitiva era a separação entre a administração civil e a autoridade militar.

Aquela, abrangendo todas as atribuições de caráter civil, econômico ou meramente policial, caberia a uma Junta composta de sete membros nomeados pelos eleitores de paróquias, e com poderes bastantes para prover a todos os cargos públicos, cujos serventuários responderiam por seus atos perante ela, excetuando-se os empregados da Fazenda, que prestariam suas contas ao Governo Central estabelecido em Lisboa, embora a referida Junta pudesse suspendê-los e processá-los perante a Relação do Distrito, quando cometessem abusos no exercício de suas funções. Os vencimentos anuais de cada membro da Junta seriam de 1 conto de réis, sendo-lhe vedado ocupar qualquer outro cargo oficial retribuído. A autoridade militar seria confiada a um oficial superior do Exército, denominado governador comandante das Armas, nomeado pelo Poder Executivo do Reino, a quem ficavam subordinados; e venceriam, além do soldo da patente, a gratificação anual de 2:400$000.

Este plano era exatamente o contrário do sistema que até então tinha vigorado no Pará e na Bahia, onde a força armada estava à disposição das Juntas locais, tal e qual o governo revolucionário tinha estabelecido em Lisboa, após a vitória do Constitucionalismo. A sua adoção importaria, de um lado, no enfraquecimento da autoridade das Juntas que, sem dispor de força material, não poderiam executar a maior parte de suas deliberações; e de outro lado, no predomínio de uma seção da Monarquia sobre a outra, o que era a destruição do regime de igualdade perante a lei, fundado pela Revolução.

No Brasil, semelhante resolução, quando conhecida, produziu a mais deplorável impressão e o maior descontentamento. Todavia, os deputados pernambucanos consentiram sem protesto na sua aprovação legislativa. Parece que assim procederam para que pudessem com mais liberdade propugnar, na sessão do dia imediato, pela aprovação da proposta de Manuel Zeferino dos Santos, estatuindo que os oficiais encarcerados ou desterrados como participantes da revolução de 1817, e ora absolvidos pela Relação da Bahia, fossem reintegrados nos respectivos postos e pagos dos seus soldos desde a data em que a sentença os excluíra das fileiras do Exército.

Tratando-se de militares que tinham tomado parte ativa num movimento político declaradamente separatista, os recolonizadores das Cortes receberam com mal dissimulada suspicácia a proposição de Zeferino dos Santos que, aliás, a defendeu com grande cópia de vitoriosos argumentos; e devido à lógica de sua defesa foi aceita em parte, mesmo pelos espíritos mais prevenidos contra ela. Deliberou-se que os soldos seriam pagos integralmente, mas a reintegração pedida ficava dependente de ulteriores informações da Junta de Pernambuco.

Esta medida conciliatória foi alvitrada por Araújo Lima, que tinha certeza de que na eleição da nova Junta, criada pelo projeto aprovado na sessão antecedente, os elementos liberais exerceriam discricionária preponderância, obtendo maioria favorável à reintegração proposta.

Por este ou por aquele motivo, ou porque entendessem de transigir com as Cortes a fim de favorecer os aludidos oficiais, ou porque, isolados no seio da assembléia, sem o apoio moral e o concurso numeral das outras deputações brasílicas, se sentissem fracos para a luta que se travava - o que é certo é que até então os pernambucanos tinham-se portado com demasiada cordura no desempenho de seu mandato [6].

A bancada fluminense

A 10 do seguinte mês tomou assento a bancada fluminense, cuja composição já demos no capítulo anterior. Deixou apenas de comparecer d. Francisco de Lemos, bispo de Coimbra, quase octogenário, e que esperava restabelecer-se prontamente de achaques que supunha passageiros e próprios de sua provecta idade, para prestar juramento e entrar em exercício. Mas, a 13 de outubro, tendo reconhecido a impossibilidade física em que se achava de dar a seu mandato o conveniente desempenho, renunciou-o, entrando em seu lugar o deputado substituto Francisco Villela Barbosa, ulteriormente marquês de Paranaguá.

A 12 faleceu repentinamente o bispo Azeredo Coutinho [7], que foi substituído, a 17, pelo suplente dr. Custódio Gonçalves Ledo, médico então residente no Porto, e irmão de Joaquim Gonçalves Ledo [8]. Com estas duas modificações, começou a agir a deputação do Rio, segunda que chegava às Cortes.

A primeira questão em que tiveram de intervir foi a prisão do conde dos Arcos - questão que suscitou os mais veementes debates no seio do congresso. O governo de Lisboa, grato, pelos motivos expostos anteriormente, à Junta da Bahia, entendeu que devia, mais uma vez, dar arras de seu reconhecimento à fidelidade daquela corporação e, apoiando sua conduta em referência ao ex-vice-rei do Brasil, mandou detê-lo na Torre de Belém, até que viessem as devassas que se mandaram tirar. Como estas nunca chegassem, e não se formasse, portanto, culpa ao preso, requereu ele seu imediato livramento, de acordo com um dos dispositivos das Bases Constitucionais.

Trava-se debate no plenário da Constituinte. Uns, tendo à frente os principais vultos da regeneração, como Fernandes Thomás, o padre Castello Branco e José Joaquim Ferreira de Moura, opõem-se ao livramento requerido; outros são-lhe favoráveis por motivos que compridamente expõem e justificam.

A bancada fluminense e a pernambucana pronunciaram-se inexplicavelmente em favor do conde, que a maioria dos portugueses acusavam de traidor à causa nacional. A primeira já não se lembraria mais do sangue brasileiro, derramado na Praça do Comércio, por conselho daquele titular ao príncipe inexperiente e confiante? E a outra não teria mais presente na esquecediça memória os mártires de 1817, imolados barbaramente ao cortesanismo do então governador da Bahia, que ordenava aos soldados e ao povo para atirarem contra quem quer que fosse suspeito de revolucionário, como se atirassem a lobos?

A atitude das duas bancadas, que representavam de perto os povos oprimidos e sacrificados em seus anseios de liberdade pelo despotismo do conde dos Arcos, é um enigma que não encontrou ainda nenhum hábil historiador que o decifrasse. Generosidade dos vencedores em relação ao algoz ora encarcerado e vencido? Talvez, porquanto os pernambucanos, embora tivessem menos razões de odiar a Luís do Rego do que ao conde, continuavam a guerrear incansavelmente àquele, ao passo que contra este não formulavam acusações perante as Cortes.

E por quê semelhante diversidade de conduta? Porque um já estava fora de combate, destituído de todas as suas funções, despojado de todas as suas prerrogativas, e não podia mais perturbar a marcha das idéias triunfantes e nem perseguir seus denodados partidários; enquanto que o outro continuava à testa de seu cargo, honrado com a confiança do governo português, e permanecia como uma agouro funesto a ameaçar a liberdade tão cara aos patriotas pernambucanos.

Pensamos, por isso, que a deputação fluminense, optando declaradamente pela soltura, e a de Pernambuco, mantendo-se em completo silêncio durante as agitações do caloroso debate, o que equivalia a uma tácita concordância com os outros colegas brasileiros - assim agiram por um espontâneo sentimento de generosidade, tão próprio da índole amorável e do bondoso coração de nossos patrícios e sempre demonstrado inequivocamente em todas as fases de nossa história política.

Afinal, na sessão de 17 de setembro, o congresso manteve a prisão do conde, e mandou que se tomasse o depoimento de pessoas recentemente chegadas do Rio, sobre o motivo da acusação. Só mais tarde é que foi solto, por decreto real.

Do projeto de lei reorganizando a administração ultramarina fora aprovado, como dissemos atrás, à revelia dos representantes brasileiros que ainda não tinham chegado, justamente o último artigo, o que dispunha acerca da remessa de tropas para substituírem a Divisão Auxiliadora destacada no Rio. Para se deliberar e aprovar essa medida, argumentou-se com a sua patente relevância e urgência. O restante do projeto ficou parado, mesmo depois da posse dos pernambucanos e fluminenses, à espera de que chegassem os demais membros da representação brasileira, de acordo, aliás, com o que prescreviam as Bases Constitucionais vigentes.

Mas reinava completa anarquia na administração das províncias. Numas, os capitães-mores continuavam à frente dos públicos negócios, em desacordo com a vontade popular que eles menosprezavam; noutras, as próprias Juntas, eleitas em caráter provisório, estavam em conflito com as populações desgostosas.

Reorganização das províncias brasileiras

Fazia-se mister uma reorganização geral imediata, para restabelecer a ordem e a confiança profundamente abaladas. Muniz Tavares pugnou, portanto, que o projeto fosse dado à discussão, antes mesmo que a deputação brasileira ficasse completa; e a Junta do Pará, em ofício lido na sessão de 10 de setembro, manifestou a mesma opinião [9].

As Cortes atenderam prontamente ao que os próprios interessados lhes pediam. Não lhes caberia responsabilidade perante as demais bancadas americanas pela discussão, votação e aprovação do projeto, que estivera guardado para a ocasião oportuna e que voltava a figurar na ordem do dia para satisfazer a vontade dos que tinham nele maior interesse do que os portugueses.

A base da organização consistia essencialmente na criação de uma Junta Civil de sete membros nas capitanias administradas por capitães-mores; e nas capitanias regidas meramente por governadores, a Junta compor-se-ia de apenas cinco membros.

Quanto ao mais, a organização era exatamente igual à que já fora dada, em caráter provisório, em 29 de agosto, a Pernambuco, segundo narramos no princípio deste capítulo, e consistia principalmente na completa separação entre o poder militar e o poder civil, nomeado o detentor daquele pelo Poder Executivo do Reino, a quem ficava direta e exclusivamente subordinado; e eleitos os membros deste pelos eleitores paroquiais.

Martins Bastos, Pires Ferreira e Araújo Lima [10], que se não tinham insurgido contar semelhante dispositivo quando se tratou da organização do governo pernambucano, combateram agora a instituição da autoridade militar autônoma, tal como o projeto a concebia, e que colocava as Juntas Civis em posição subalterna diante do Governo Português e das Cortes Soberanas.

É verdade que essa organização era também provisória, pois vigoraria até que, promulgado o Pacto Fundamental, se desse então às capitanias seu definitivo regime de governação, mas já se percebia nela, através das discussões travadas a respeito, uma tendência visível para ficar perpetuada de futuro na legislação orgânica de caráter permanente.

Hippólyto José da Costa Pereira

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Fraqueza e falta de unidade das bancadas brasileiras

Apesar da intervenção daqueles três mandatários brasileiros, os seus colegas das duas bancadas presentes não os secundaram no ataque, aliás pouco vigoroso/; e o projeto, mesmo sem ter sofrido todas as discussões regimentais, foi aprovado e convertido em lei. A autoridade militar nas províncias de primeira ordem seria exercida por um general com o título de Governador das Armas, ganhando um vencimento anual de 2:400$000; e nas outras, por um coronel, intitulado Comandante Militar do Distrito, e vencendo 600$000 anualmente.

Estava finalmente tomado o pulso dos débeis delegados da opinião brasileira, até então presentes aos trabalhos da Constituinte, que ia agora desenvolver seu plano de recolonização com mais destemor e mais desembaraço. Enfraquecida a administração civil das capitanias pela passagem de suas atribuições militares para uma autoridades adstrita ao governo de Lisboa, cumpria entretanto às Cortes desfechar um golpe de morte na organização judiciária do reino ultramarino, a fim de jungi-lo mais fortemente à direção do reino português.

Desse pensamento reacionário nasceu a proposta, suprimindo os tribunais superiores aqui existentes e fundados por d. João VI. Levantou-se para impugná-la com ardor o representante fluminense Martins Bastos, cujo discurso calou profundamente no ânimo dos congressistas; e, apesar de serem autores e defensores da humilhante proposta regeneradores da polpa e prestígio de Fernandes Thomás, Borges Carneiro e Ferreira de Moura, que compunham a Comissão de Constituição, foi o assunto adiado para que se ouvissem a respeito os representantes americanos ausentes.

A 1º de outubro promulgou-se o decreto de 29 de setembro, pelo qual ficavam organizadas as capitanias nos moldes governamentais provisórios que já expusemos. Apesar de conterem as disposições desse decreto os germes da reescravização política, administrativa e militar do Brasil à sua antiga metrópole, os deputados brasileiros, salvo a restrição oposta à criação dos Governadores de Armas com dependência direta de Lisboa, aprovaram-no, como notamos atrás; e até, como observa um historiador criterioso que a cada momento estamos citando, o próprio Hyppólito da Costa, o insigne jornalista do Correio Brasiliense [11], aprovou-a também.

No dia seguinte ao da aprovação legislativa do referido projeto, que tirava ao príncipe regente toda a jurisdição que lhe conferira o rei sobre o Brasil, as Cortes, por unanimidade verificada duas vezes, decretaram a volta de d. Pedro para Portugal, por terem cessado suas atribuições com a criação das Juntas eletivas. Os deputados brasileiros não só não protestaram contra essa iníqua medida, como até lhe deram serenamente seu voto.

Entretanto, convertido em lei esse projeto e promulgado no mesmo dia que o anterior, ambos iriam produzir no Brasil resultados que os fluminenses e pernambucanos do Congresso não esperavam, porque concorreram para se intensificar o movimento separatista que poucos vultos de peso queriam, sendo a maioria dos espíritos calmos e sensatos partidária da autonomia ampla dentro da união.

Ainda esse ato legislativo logrou o aplauso de Hyppólito da Costa no seu periódico, porque a d. Pedro lhe parecia faltarem as mais elementares qualidades para exercer o cargo em que fora investido; mas entendia o arguto jornalista que devia existir no Brasil um poder executivo ligando as províncias entre si e, por seu intermédio, religando-as a Portugal.

É verdade que o decreto chamando a Lisboa o príncipe era, na aparência, a mera consumação oficial de um fato já existente e nada mais; pois o próprio príncipe confessara ao pai, na carta de 17 de julho de 1821, que estava reduzido, de regente do reino, a simples capitão-general de uma só província - o Rio.

Efetivamente, todas as Juntas Provinciais menoscabavam de sua autoridade cada vez mais precária e timbravam em manifestar sua completa obediência incondicional às Cortes. No Rio mesmo hesitava-se entre a sujeição a estas, ou a submissão àquele, e somente a presença pessoal de d. Pedro impedia um pronunciamento radical dos elementos mais agitados, graças à autoridade de que se achava ele investido não só pela tradição dinástica, senão também pelas instruções que lhe deixara o rei.

Entretanto, não faltavam, como vimos, os movimentos populares com o fim de ser imposto um justo limite aos seus caprichos demasiadamente pessoais ou aos seus possíveis excessos de poder governamental. Os espíritos adiantados e o próprio instinto do povo inculto viam que as Cortes, com suas normas liberais bem definidas na Constituição, eram preferíveis à regência de um príncipe, nato e criado no absolutismo, e em cujo caráter imperioso não podiam depositar inteira confiança.

Foi a Junta de S. Paulo a primeira a reconhecer oficialmente a autoridade de d. Pedro, pela carta de 30 de junho de 1821, que lhe foi pessoalmente entregue por uma deputação especial a 23 de julho - seis dias depois de ter ele escrito ao soberano a citada epístola-desabafo a que nos referimos, queixando-se de que era apenas o simples governador de uma só província, o que tudo narraremos no lugar oportuno, com os necessários pormenores.

Teríamos só por isso de atribuir aos paulistas, sem favor algum, a prioridade do movimento que produziu o Sete de Setembro, e, portanto, a prioridade de José Bonifácio, que foi o inspirador principal da atitude da Junta, de que era vice-presidente. Outros documentos falarão bem alto, relativamente à incontestável prioridade paulistana no movimento coordenador das forças políticas em torno da figura central do príncipe regente.

Com a posse de Villela Barbosa, a 16 de outubro, como substituto de d. Francisco de Lemos na bancada fluminense, melhorou a situação dos constituintes brasileiros, pois o seu verbo eloqüente e a coragem de suas atitudes influíram poderosamente para que as Cortes não tomassem de ora em diante deliberações precipitadas. A sua estréia verificou-se quando se debatia o caso dos pernambucanos, novamente inculpados de independencistas por Luís do Rego, que os remetera presos para Lisboa.

Graças à palavra de Villela Barbosa, foram eles recolhidos com o maior conforto possível ao Castelo de S. João e mandou o Executivo, pelo órgão do ministro da Justiça, que a Relação reunisse extraordinariamente para julgá-los sem demora e que se instaurasse inquérito a respeito da administração de déspota que governava Pernambuco. Infelizmente, a sua retardia presença já não podia evitar as medidas reacionárias adotadas até então.

Não obstante as resoluções tomadas em relação a Pernambuco, o congresso entendeu que devia mandar para lá um contingente militar, providência que os antecedentes separatistas e as vozes que a cada momento lhe chegavam das altas autoridades do Recife pareciam justificar amplamente. Na sessão de 18 de outubro foi apresentado um projeto em tal sentido, e contra o qual embalde clamaram Muniz Tavares, com grande abundância de argumentos sólidos, a que os oradores da Regeneração opuseram meros sofismas; e Villela Barbosa, que tornou patentes os intuitos hostis com que o novo Portugal correspondia à confiança com que os brasileiros tinham entusiasticamente abraçado a causa liberal.

O projeto que mandava ficarem em Pernambuco 400 soldados, dos 1.200 de que se compunha a expedição destinada para o Rio, foi apresentado contra os votos somente da bancada pernambucana e do deputado fluminense Villela Barbosa, cujos colegas de representação não acompanharam sua conduta, o que prova que a desorientação reinante entre os brasileiros foi a causa principal de levarem as Cortes a efeito, desde o começo, os seus planos de reconquista do Brasil.

Deputação maranhense

Com a chegada da deputação maranhense, que tomou pose na sessão de 6 de novembro, composta do desembargador da Relação da Província, Joaquim António Vieira Belfort e José João Beckman e Caldas [12], coincidiram os debates relativos à constituição de uma comissão permanente incumbida de zelar pela observância das leis, durante o período de encerramento das Cortes.

Dessa comissão deveriam fazer parte três deputados europeus e três ultramarinos, sob a presidência de um sétimo representante, tirada a sorte entre dois nomes com assento nas Cortes - um de cada seção da monarquia. Levantou-se forte oposição dos Regeneradores contra a igualdade de representação proposta n projeto, cabendo ainda a Villela Barbosa a tarefa de combater com grande superioridade os seus impugnadores. O projeto passou, afinal, na sessão de 13, por 69 votos contra 26, estando entre estes, por motivos que se não conseguiu esclarecer até agora, os deputados fluminenses Gonçalves Ledo e Lemos Brandão.

Deputados por Santa Catarina, Bahia e Alagoas

A 19 compareceu o deputado por Santa Catarina, padre Lourenço Rodrigues de Andrade, e a 15 de dezembro seguinte foi a representação americana poderosamente reforçada com a deputação das Alagoas e da Bahia.

Cypriano José Barata de Almeida

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Cypriano Barata. Visconde da Pedra Branca

Compunha-se a primeira dos deputados efetivos Francisco de Assis Barbosa, Francisco Manuel Martins Ramos e Manuel Marques Grangeiro; e da segunda faziam parte Alexandre Gomes Ferrão, dr. Cypriano José Barata de Almeida [13], Domingos Borges de Barros [14], Francisco Agostinho Gomes [15], José Lino Coutinho [16], Luís Paulino de Oliveira Pinto da França [17], padre Marcos António de Sousa [18] e Pedro Rodrigues Bandeira, todos efetivos.

Dos baianos, as principais figuras eram Cypriano Barata, Lino Coutinho e Agostinho Gomes. O primeiro, de pequena estatura e compleição franzina [19], impunha-se pela fogosidade de seus arroubos tribunícios; o segundo empolgava pela eloqüência primorosa, pelo gesto adequado e pelo trato ameno, insinuante e simpático [20]; o último, porém, dominava inteiramente a bancada por sua austeridade moral e pela vastidão de seu preparo [21].

Estréia de Barata. Divergências e falta de coesão entre os brasileiros

Barata estreou-se no mesmo dia da posse para propor, em termos veementes, categóricos e resolutos, que se adiasse a discussão de toda a matéria constitucional até a chegada dos restantes deputados brasileiros, perante os quais se renovaria a discussão dos negócios já votados na ausência deles - de acordo com o insofismável dispositivo das Bases em seu artigo 21.

A sua atitude não foi apoiada pelos demais colegas da representação americana, receosos, ao que supõe um historiador competente e juiz imparcial, de que, indispondo-se contra a maioria portuguesa, nada conseguiriam para sua pátria.

Além disso, as divergências de ordem puramente localista, as hostilidades de algumas províncias do Norte contra o Rio, por causa da supremacia que este conquistara sobre todas em virtude de ter ficado aí estabelecida a sede do governo geral, enfraqueciam, conforme já fizemos ver, a coesão, a harmonia, a unidade de atos e de propósitos, tão necessária naquele momento em que a liberdade brasileira estava em jogo e contra ela conspiravam abertamente os partidários da recolonização com assento nas Cortes.

A circunstância, também, de estarem compostas, as nossas bancadas, de bom número de brasileiros longamente fixados em Portugal, contribuiu para que os deputados nessas condições, amando a terra onde viviam folgadamente havia tantos anos, não raro se colocassem ao lado dos que nos combatiam sem cessar.

Barata viu erguer-se, em oposição à sua justa proposta, um colega de sua própria bancada - Pinto da França -, e acabou retirando-a do debate, a pedido de Fernandes Thomás, que havia formulado, em sessão anterior, o estranho conceito resumido nesta breve frase de seu discurso de 20 de setembro: "Aqui não somos representantes das províncias, senão da Nação inteira; eu sou tanto representante do Rio de Janeiro como os do Brasil são de Portugal e de suas províncias" - conceito que se firmou vitorioso durante o curso dos debates sobre o Pacto Fundamental.

Para quê, nesse caso, tinham declarado as Bases Constitucionais que os artigos aprovados na ausência dos representantes brasileiros só os obrigariam depois que eles expressamente os aprovassem de sua livre vontade? Para quê também solicitaram do Brasil, com insistência, que mandasse às Cortes os deputados de suas províncias, o que foi feito com os maiores descômodos e dificuldades? Se os portugueses de além-mar eram tão legítimos representantes nossos como os que elegemos aqui - então não havia necessidade alguma de mandarmos estes para lá, em atenção aos instantes apelos que da metrópole nos vinham oficialmente.

E assim foram sucessivamente aprovadas quantas medidas os reacionários propuseram para reduzir o Brasil à sua antiga posição colonial. Foram extintos os tribunais superiores criados aqui por d. João VI, e houve até um deputado fluminense, havido como assaz competente e bastante enérgico, que defendeu a sangue-frio esse tremendo golpe vibrado contra a autonomia de nossa organização judiciária.

Fagundes Varella, a quem coube tal inconsciente papel, sofreu tamanha crítica de seus compatriotas, quando aqui chegou a notícia de sua inexplicável atitude, que nunca mais se animou a assomar à tribuna até o encerramento dos trabalhos legislativos, mas os portugueses o recompensaram de tão grande dissabor investindo-o na presidência do congresso em fevereiro de 1822 [22].

Com a supressão dos tribunais, tinham os brasileiros de recorrer, demorada e custosamente, à superior instância estabelecida na capital da antiga metrópole. Aliás, o cego ciúme, a que há pouco aludimos, de algumas províncias relativamente à hegemonia fluminense, concorreu poderosamente para esse desfecho fatal. Não podendo conseguir que as causas fossem revistas pelas Relações Provinciais, convieram em que passasse para a Casa da Suplicação de Lisboa o respectivo julgamento delas.

A desorientação das nossas bancadas assumiu em certa ocasião proporções inauditas, que uma triste emulação acoroçoava. A comissão de Constituição mantinha o Supremo Conselho de Guerra, como tribunal indispensável. Os fluminenses e baianos opuseram-se com a maior insensatez a essa conservação, contra a qual até Lino Coutinho discorre, preocupado mais em subalternizar o Rio do que em servir à Pátria comum.

Dessas disputas e rivalidades, que muito nos comprometeram nas Cortes e das quais se aproveitaram astuciosamente os paladinos da recolonização, ressalta bem acentuadamente a franca tendência de certas províncias para se desagregarem do conjunto brasileiro. Cada uma delas propendia para considerar-se independente das outras, apesar da origem comum, das lutas comuns, da língua comum, dos laços morais e tradições comuns.

O trabalho mais forte de José Bonifácio foi justamente no sentido de obstar essa perigosa tendência, o que conseguiu finalmente com a adesão de d. Pedro à causa do novo império. O que, porém, foi uma necessidade imperiosa e benéfica naquele momento, depois, com o lento decorrer das eras, tornou-se um obstáculo à expansão de cada província, que o excesso de centralização monárquica levava outra vez ao ideal separatista.

Este novo perigo foi sabiamente conjurado pelos egrégios fundadores da federação republicana, que facilitará o engrandecimento econômico e político de cada Estado autonômico, se as veleidades reacionárias de alguns publícolas retrógrados não ousarem atentar contra a autonomia estatuída insofismavelmente em nossa Carta Fundamental.

José Lino Coutinho

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Medidas reacionárias. Supressão dos tribunais

O caso é que todos os tribunais superiores, inclusive o Conselho de Guerra, foram suprimidos pelo decreto de 11 de janeiro dd 1822 - um dos atos que mais fomentaram a propaganda pela independência absoluta, que até então apenas timidamente se iniciava no periodismo, na Maçonaria, no púlpito e na praça púbica [23].

Entra depois em discussão, e provoca longos, brilhantes e porfiados debates, o artigo referente à reforma judiciária, instituindo o júri para todas as questões pendentes, quer criminais como cíveis, e a efetiva responsabilidade dos juízes togados, por erros na aplicação do Direito ou infração das regras processológicas em vigor. A instituição do júri para todos os casos passou, após esgotante discussão, tendo votado contra ela apenas dois deputados brasileiros - Pinto da França e Belfort Vieira, respectivamente representantes da Bahia e do Maranhão.

Araújo Lima não esteve presente à sessão,q ue se realizou a 9 de janeiro - no dia mesmo em que, enquanto as Cortes se esmeravam em cercear ao Brasil todas as liberdades e garantias já conquistadas pelo valor de seus filhos e importância de seus territórios, as mais importantes províncias do Sul, reagindo contra as medidas adotadas em Portugal para reescravizar a sua opulenta ex-colônia, pediam ao príncipe regente que ficasse entre nós, no caráter de Defensor Perpétuo destes Povos, e obtinha favorável acolhimento à sua petição...

A responsabilidade dos juízes togados provocou discussão mais tormentosa e mais prolixas, porque, pelo projeto, as queixas das partes lesadas no Brasil tinham  que ser levadas remotamente a Lisboa para serem devidamente processadas.

"A denúncia, afirmava Barata, rompendo o debate em nome dos brasileiros, sai do ultramar para Portugal, volta ao ponto de partida para as necessárias informações, as quais serão protraídas indefinidamente, em virtude dos embaraços opostos pelo querelado, e torna a Portugal para o exame perante o Conselho de Estado. Acrescente-se a isto a raridade dos correios e o tempo da viagem e não haverá exagero em supor que mediará entre a queixa e a suspensão mais de um ano. Não faltará ao magistrado, portanto, ocasião para tropelias, frustra-se o intento do projeto, que é aliviar prontamente os povos do mau juiz  e priva-se a América do direito inestimável fruído pelos portugueses da Europa" [24].

Deputados de S. Paulo

A discussão prosseguiu no dia seguinte, mas foi suspensa quando falava Villela Barbosa em resposta ao deputado português Trigoso, para se dar juramento e posse a três membros da deputação paulista, então chegados, António Carlos [25], Nicolau Vergueiro e padre Diogo Feijó.

Com a entrada desses representantes ilustres, vai modificar-se radicalmente a atitude hesitante, a dubiedade e a desorientação mantidas pela maioria dos deputados brasileiros, em face de projetos que destruíam completamente as relativas liberdades que custosamente gozávamos e nos iam pouco a pouco repondo nas condições em que nos encontrávamos quando aqui chegou d. João.

Além do caráter combativista, denodado, extremamente resoluto dos três primeiros paulistas que compareceram às Cortes e de quase todos que depois chegaram, contribuía para realçar-lhes o mérito e o prestígio, perante seus colegas de aquém e de além-mar, o fato de serem portadores de instruções escritas do governo de sua província (que ouvira para esse fim as câmaras municipais), para por elas se conduzirem nas sessões do Congresso de Lisboa.

A índole organizadora dos paulistas e a emérita capacidade política de José Bonifácio já demonstravam, naquele documento, que nenhum outro povo e nenhum outro estadista do Brasil estavam melhor preparados do que eles para dirigirem e levarem a bom termo a grave agitação que entre nós se elaborava lentamente e que teria seu glorioso e pacífico remate nos gloriosos campos do Ipiranga.

Mas, ao tratarmos da entrada dos paulistas nas Cortes Constituintes, e da brilhante e digna posição que nele prontamente assumiram em todas as discussões que interessavam à América Brasílica, devemos interromper a exposição geral que íamos fazendo quanto à política portuguesa em relação à nossa Pátria, para nos ocuparmos, especial e detidamente, dos acontecimentos havidos na província de S. Paulo, desde a partida de d. João VI para Portugal.

Vai-se ver que é S. Paulo quem, perante o povo brasileiro, perante o príncipe d. Pedro, e perante as Cortes Portuguesas, dá um impulso orgânico às aspirações ainda dispersas dos naturais do País, fala com segurança, ponderação e clareza do problema que nos preocupa, e imprime, aos oscilantes anelos dos patriotas sem diretriz firmada, uma orientação positiva e capaz de congregar todas as almas, todas as energias e todos os esforços em torno de uma só vontade, de uma só pessoa, de uma só cabeça, porque, sem um centro coordenador estável, as mais prestimosas atividades e iniciativas se perderiam anarquicamente no vago, na incerteza, na irresolução dos muitos alvitres, dos variados projetos, dos planos multíplices, das opiniões discordantes e até das vozes desautorizadas...


NOTAS:

[1] GOMES DE CARVALHO - Os Deputados do Brasil nas Côrtes de 1821, pág. 111.

[2] Idem, ibidem, pág. 112

[3] Foi secretário de Cabugá na malograda missão dos revolucionários de 1817 junto ao governo dos Estados Unidos.

[4] Muniz Tavares - É o conhecido revolucionário pernambucano de 1817 e o mais ilustre dos historiadores do heróico movimento. Filho de João Muniz Tavares e dona Rita Soares de Mendonça, nasceu no Recife a 16 de fevereiro de 1793 e faleceu a 23 de outubro de 1876. Proclamada a Independência, foi deputado à Assembléia Constituinte, e à Assembléia Legislativa Geral na Legislatura de 1845 a 1847, e secretário de nossa legação em Roma, de 1826 a 1832. Doutorou-se em Teologia pela Universidade de Paris e foi nomeado monsenhor honorário da capela imperial e conselheiro de Estado. O Instituto Histórico de Pernambuco deve-lhe a sua fundação (SACRAMENTO BLAKE - Obr. cit., vol. 3º. pág. 59).

[5] Araújo Lima - Filho de Manuel de Araújo Lima e dona Anna Teixeira Cavalcanti, nasceu em Pernambuco a 22 de dezembro de 1793 e faleceu no Rio de Janeiro, a 7 de junho de 1870 (SACRAMENTO BLAKE - Obr. cit., vol. 7º, pág. 16). Doutorando-se em Direito pela Universidade de Coimbra, "preparava-se para tomar posse da Ouvidoria de Paracatu, em Minas Gerais, quando os sucessos de Portugal o induziram a protrair a viagem para tão remoto lugar" - informa-nos o sr. GOMES DE CARVALHO (Obr. cit., pág. 106). SACRAMENTO BLAKE dá-no-lo como doutor em Cânones e diz-nos que exerceu a magistratura em seu país, quando voltou da universidade. Senador a 5 de setembro de 1837, escolhido por Feijó, então Regente, e logo nomeado para a pasta do Império, foi elevado à Regência a 19 daquele mês, permanecendo no cargo até a proclamação da maioridade de d. Pedro 2º.

[6] GOMES DE CARVALHO - Obr. cit., págs. 103 a 118.

[7] GOMES DE CARVALHO - (Obr. cit., pág. cit) dá, por engano, o seu falecimento a 12. Também a Comissão do Inst. Hist. Brasileiro, incumbida de publicar a obra póstuma de VARNHAGEN - História da Independência, troca-lhe os primeiros nomes na relação apensa à nota III do Capít. II, pág. 523, chamando-lhe Joaquim José, em vez de José Joaquim. Clérigo secular, formado em Cânones, nasceu em Campos dos Goitacazes, a 8 de setembro de 1743. Apresentado a 21 de novembro de 1794, no reinado de dona Maria Primeira, e confirmado pelo papa Pio VI, foi sagrado bispo de Olinda de Pernambuco, a 25 de janeiro de 1795, de cujo cargo tomou posse a 25 de dezembro de 1796, regendo a diocese até 5 de julho de 1802. Fundou o Seminário Episcopal de Nossa Senhora da Graça de Olinda. Espírito ilustradíssimo e coração virtuoso e liberal, foi, entretanto, defensor acérrimo da escravidão africana, combatendo a sua projetada extinção num folheto intitulado Analyse sôbre a justiça do resgate dos escravos da Costa d'Africa, que alcançou três edições, uma das quais em francês. Era de opinião que o tráfico negro beneficiava o africano em vez de fazer-lhe mal. Publicou mais vários estudos econômicos, morais, religiosos e políticos (dr. M. L. MACHADO, nota III, à 2ª ed. da Hist. da Rev. de Pernambuco, de MUNIZ TAVARES, pág. 252; SACRAMENTO BLAKE - Obr. cit., vol. IV, págs. 475 a 480; dr. MANUEL DE ALVARENGA - Obr. cit., pág. 131).

[8] VASCONCELLOS DE DRUMMOND, nas suas já referidas Annotações (separata do vol. XIII dos Annaes da Bibliotheca Nacional, págs. 70 e 71), diz, por evidente lapso de memória, que Azeredo Coutinho foi substituído por Villela Barbosa, quando a verdade é que este substituiu a d. Francisco de Lemos, segundo se lê em nosso texto. O trecho de Drummond, em que se vê esse engano, é reproduzido, sem corrigenda alguma, nas Notas que a Comissão do Inst. Hist. Bras. apensou à Historia da Independência, de VARNHAGEN.

[9] GOMES DE CARVALHO - Obr. cit., págs. 118 a 120.

[10] GOMES DE CARVALHO - Obr. cit., pág. 123.

[11] Publicado em Londres, de 1808 a 1829.

[12] O último fora como substituto do efetivo Raymundo de Brito Magalhães e Cunha. GOMES DE CARVALHO (obr. cit., pág. 147) troca-lhe o segundo nome - Joaquim em vez de João. MELLO MORAES (obr. cit., vol. 1º, pág. 76, col. 1ª) dá apenas Beckman como representante do Maranhão, olvidando o nome de seu companheiro de bancada.

[13] Filho de João Alves Barata de Almeida, nasceu na Cidade do Salvador a 26 de setembro de 1762 e faleceu na do Natal (Rio Grande do Norte) a 1º de junho de 1838. Era cirurgião e bacharel em Filosofia e Matemática pela Universidade de Coimbra. Fundou o primeiro jornal realmente republicano que saiu no Brasil - A Sentinela da Liberdade na Guarita de Pernambuco - 1823 (SACR. BLAKE - Obr. cit., vol. 2º pág. 150; JOSÉ ÁLVARES DO AMARAL - Resumo Chronológico e Noticioso da Província da Bahia, pág. 311).

[14] Mais tarde visconde da Pedra Branca. Era filho do capitão-mor Francisco Borges de Barros e dona Luísa Borges, tendo nascido em São Salvador (N.E.: nome antigo da capital da Bahia, atual Salvador) a 10 de outubro de 1780 e falecido a 20 de março de 1855 na mesma cidade. Cultivou com êxito as belas letras, distinguindo-se principalmente na poesia. É dele o seguinte improviso sobre as desgraças que já naquele tempo afligiam nossa Pátria:

São desgraças do Brasil

Um patriotismo fofo,

Leis em parola, preguiça

Ferrugem, formiga e mofo.

Quando já valetudinário e detido por incurável paralisia que o levou à morte, apresentou-lhe gentil senhorita um álbum, pedindo-lhe sua valiosa contribuição. Nele escreveu o poema a seguinte quadrinha:

Brasília, toma o teu álbum,

Não bulas comigo, não;

Se as pernas andar não podem,

Inda pula o coração!

Doutor em Direito pela Universidade de Coimbra, durante sua residência na metrópole manteve com Bocage e Nicolau Tolentino excelentes relações de amizade pessoal. Ocupou vários cargos públicos de representação popular ou oficial, e foi quem negociou o casamento da princesa dona Amélia com d. Pedro 1º. Eleito contra sua vontade senador por sua província natal, tomou posse para agradecer a seus conterrâneos os votos que lhe deram, e ao imperador a sua escolha - e nunca mais compareceu na Câmara Vitalícia (MELLO MORAES - Obr. cit., vol. 1º, pág. 163, col. 2ª; SACRAMENTO BLAKE - Obr. cit., vol. 2º, pág. 196; B. DO RIO BRANCO - Ephemérides Brasileiras, pág. 204; J. M. P. DE VASCONCELLOS - Selecta Brasiliense, vol. 2º, pág. 112; e GOMES DE CARVALHO - Obr. cit., pág. 153).

[15] Agostinho Gomes - De origem fidalga, filho de Agostinho Gomes e dona Isabel Maria Maciel Teixeira, nasceu na Bahia a 4 de julho de 1769 e aí faleceu a 19 de fevereiro de 1842. Seguiu os estudos eclesiásticos, interrompendo-os depois de receber ordens de diácono. Concorreu para a fundação da Biblioteca Pública da Bahia, à qual doou sua importante livraria particular. Deixou o padre Agostinho Gomes sólida reputação de erudito (RIO BRANCO - Obr. cit., pág. 120 e SACR. BLAKE - Obr. cit. vol. 2º, pág. 383).

[16] Lino Coutinho - Nasceu na capital da Bahia a 31 de março de 1784 e aí faleceu a 21 de julho de 1836 (segundo SACRAMENTO BLAKE - Obr. cit., vol. 5º, pág. 7 e AFF. D'ESCRAGNOLE TAUNAY - Obr. cit., pág. 131) ou a 25 do dito mês (conforme assinala o B. DO RIO BRANCO - Obr. cit., pág. 358). Formado em Medicina pela Universidade de Coimbra, escreveu diversas obas sobre essa especialidade, além de alguns trabalhos filosóficos, literários e também poéticos.

[17] Pinto da França - Nascido na capital da Bahia a 30 de junho de 1770, faleceu a 24 de janeiro de 1824, a bordo de um navio que no Rio de Janeiro o levava para Lisboa. Era marechal-de-campo, mas inclinado às letras, tendo deixado reputação de bom poeta (SACR. BLAKE - Obr. cit., vol. 5º, pág. 446; P. DE VASCONCELLOS - Obr. cit., vol. 2º, pág. 224; PEREIRA DA SILVA - Varões Illustres do Brasil, vol. 2º, pág. 349).

[18] Padre Marcos - Segundo SACRAMENTO BLAKE (obr. cit., 6º vol., pág. 221 e o BARÃO DO RIO BRANCO (obr. cit., pág. 81) nasceu a 10 de fevereiro de 1771 na cidade do Salvador; mas JOSÉ ÁLVARES DO AMARAL (obr. cit., Revista do Inst. Geog. e Histórico da Bahia, vol. 47, pág. 126) registra a data de seu nascimento em 9 do dito mês. Presbítero secular, foi vigário da Vitória, em sua província natal. Apresentado bispo da Diocese do Maranhão, por decreto de 13 de novembro de 1826, foi confirmado pelo papa Leão XII, a 26 de julho de 1827, sagrado a 28 de outubro do mesmo ano, na capela imperial, pelo bispo do Rio de Janeiro, d. José Caetano da Silva Coutinho, tomou posse por procuração a 19 de março de 1828 e fez sua entrada solene no Maranhão a 11 de março de 1830. Foi o primeiro bispo brasileiro nomeado depois da Independência, pelo desligamento da Diocese do Maranhão do Patriarcado de Lisboa. Fundou o Seminário Diocesano Maranhense, cuja instalação se deu a 17 de abril de 1838 (dr. MANUEL DE ALVARENGA - O Episcopado Brasileiro, pág. 118).

[19] JOSÉ ÁLVARES DO AMARAL - Obr. cit., pág. 312.

[20] GOMES DE CARVALHO - Obr. cit., pág. 153.

[21] Idem, ibidem, pág. 154.

[22] GOMES DE CARVALHO - Obr. cit., pág. 172.

[23] O decreto em questão foi publicado com data de 13, esclarece RIO BRANCO em nota retificativa a VARNHAGEN, que lhe dá a data de 12 (Hist. da Indep., pág. 95 e nota 1).

[24] GOMES DE CARVALHO - Obr. cit., pág. 183.

[25] GOMES DE CARVALHO (Obr. cit., pág. 188) diz, por equívoco, que António Carlos era o mais moço dos três Andradas.

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