Monumento funerário de José Bonifácio
Imagem: captura de tela, TV Mar, em 16/6/2003, 13h54
O Panteão dos Andradas: da idéia à realização
As comemorações do centésimo primeiro aniversário da
Independência, em Santos, revestiram-se do maior esplendor. A Câmara Municipal organizara um programa que foi cumprido rigorosamente. Assim, às 10
horas receberam imponentes homenagens os três irmãos Andradas, na praça da Independência. Houve às 13 horas recepção na Câmara, em homenagem à data
comemorativa da nossa emancipação política. E às 14 horas, procederam à inauguração do Panteão dos Andradas.
No porto, alguns navios de guerra, com o couraçado Minas Gerais à frente, e
depois o cruzador auxiliar José Bonifácio e outros vasos de guerra, sacudiram ao vento os seus embandeiramentos de gala.
Durante a inauguração do Panteão, vários hidroaviões da nossa Marinha de Guerra
executaram inúmeras evoluções sobre a Praça Barão do Rio Branco, onde o povo se aglomerava, inquieto e jubiloso.
As bandas escolares, num fragor de trombones, clarinetas e saxofones, tocaram
partituras de Alberto Nepomuceno e Carlos Gomes.
Notava-se, também, ali, formado em continência, um garboso contingente de marinheiros.
Precisamente à hora marcada, com a chegada das autoridades, as vibrações de entusiasmo
atingiram o mais alto grau.
Venhamos agora aos pormenores:
De quem seria a idéia desse Panteão dos Andradas? - À luz dos fatos e documentos não
será difícil responder a essa indagação. Basta, para isso, transportarmo-nos ao século passado (N.E.: século XIX),
quando o assunto principiou a ser ventilado. Os primeiros documentos falam em túmulo, mausoléu e monumento a José Bonifácio, o Patriarca. Fazem,
enfim, menção especial ao nome de José Bonifácio. A idéia, originariamente, não foi, portanto, de Panteão.
Cabe a um sacerdote, que por aqui andara na última década do século passado
(N.E.: século XIX), a honra de haver iniciado o empreendimento de consagrar-se um Panteão aos
Andradas. Queremos referir-nos ao cônego dr. Eduardo Duarte Silva, então visitador apostólico da Ordem Carmelitana Fluminense. Propôs ele, no ano de
1889, em carta dirigida à Municipalidade de Santos, que se erigisse "um Panteão onde fossem sepultados os restos mortais da família Andrada".
Como um dos fundamentos da sua sugestão, apontava "o grande amor que devotava à pátria
o notável estadista José Bonifácio, que certa ocasião manifestara o desejo de que seu corpo repousasse na terra onde nascera".
O cônego dr. Eduardo Duarte Silva, que tomara a iniciativa de tão grata e entusiástica
homenagem à família Andrada, era um sacerdote ilustre dado a estudos históricos e etnológicos. Em 1895-1896, era bispo de Uberaba, no Estado de
Minas. Uma das suas cartas pastorais está publicada no volume 121, pág. 293 e seguintes, da Revista do Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro. O eminente prelado não precisava dar-nos mais arras do seu valor. Por isso mesmo, conta o rumor antigo (expressão dos
Lusíadas, c.7, est. 19) que a tal respeito fora apresentado um projeto de lei à nossa Municipalidade.
O vereador João Carvalhal Filho, que falou, em nome da Câmara Municipal, na
inauguração do Panteão dos Andradas, não se referiu a qualquer projeto de lei. Eis aqui como se enunciou ele acerca do assunto:
"Diversas tentativas se fizeram, por isso, em prol de um local para a guarda condigna
dos sagrados despojos dos grandes brasileiros. Entre elas, salientei aquela em que figuram, entre outros, os ilustres brasileiros drs. Domingos
Jaguaribe, Martim Francisco, Júlio Conceição e outros, e posteriormente o comendador João Manuel Alfaia Rodrigues".
Esses pacientes esforços não passaram, infelizmente, de algumas tentativas baldadas.
Nossos edis, entretanto, não desertaram a honra do empreendimento. Retomaram o assunto, cerca de trinta anos depois, com obtenção de resultado mais
positivo. São, ainda, do brilhante orador, estas palavras de admirável transparência:
"Afinal, em dezembro de 1920, cogitando a Câmara Municipal desta cidade, da forma por
que deveria comemorar o primeiro centenário da nossa emancipação política, por indicação do distinto vereador sr. Arnaldo Ferreira de Aguiar, atual
vice-prefeito municipal, com o unânime e entusiástico assentimento de toda a Câmara, ficou resolvida a construção deste Panteão.
"E a promessa de ontem é a esplêndida realidade, que hoje festejamos, cheios de justo
desvanecimento e do nobre orgulho de quem paga uma dívida de honra".
Com efeito, em 7 de setembro de 1923 era inaugurado o Panteão dos Andradas, à Praça
Barão do Rio Branco, nº 16. Deu-se, nesse dia, a inauguração da luz elétrica da Bocaina; e realizaram-se outras solenidades que deixamos de
pormenorizar, para fugir à prolixidade.
Não poucas pessoas concorreram para a execução da nobre empresa do Panteão. Cumpre-nos
mencionar, pelo menos, algumas delas. São as seguintes:
Os preclaros
estadistas drs. Epitácio Pessoa e Washington Luiz, na época presidente, respectivamente, da República e do Estado. Concorreram eles para a
realização da idéia, com a maior parte dos recursos.
Arnaldo
Ferreira de Aguiar, o autor do projeto. Para a sua concretização empenhou ele todo o seu prestígio de vereador e vice-prefeito municipal.
O coronel
Joaquim Montenegro, prefeito municipal, e o dr. Benedito de Moura Ribeiro, presidente da Câmara, trabalharam perante os poderes públicos federais e
estaduais, para a obtenção dos recursos indispensáveis à execução da notável obra.
Os deputados
César Lacerda Vergueiro e A.S. Azevedo Júnior deram à idéia todo o valioso apoio da sua reconhecida influência.
O dr. Roberto
Simonsen, ilustre engenheiro santista e diretor-presidente da Companhia Construtora de Santos, "projetou e executou o monumento com o carinho e com
o ardor da sua alma de moço patriota".
Finalmente os
reverendíssimos padres carmelitas doadores do terreno onde se ergue ora o Panteão. A este propósito diligenciamos examinar a competente escritura a
fim de ilustrar a matéria. Procuramos o tabelião do 5º Ofício da Comarca - Edmundo Mendonça Neto - e ele, com a mesma generosa fidalguia do saudoso
avô, facultou-nos o exame da escritura, que se encontra no livro nº 16, fls. 128, lavrada naquele cartório em 25 de julho de 1922, figurando como
outorgante a Província Carmelitana Fluminense, e como outorgante a Câmara Municipal de Santos. O Instrumento é de doação e auxílio. Apenas
extrataremos dele alguns trechos.
Inicialmente, o Panteão ia ficar encravado no prédio da Província Carmelitana
Fluminense (Convento do Carmo), pois, assim reza a escritura: "Um terreno (faixa) com a área de 154,10 m², encravado no Convento do Carmo, com
entrada pela porta principal, que abre para a Praça Barão do Rio Branco, área essa que está figurada na planta a que devem obedecer as obras de
construção do Panteão".
Não ficou sendo esse, entretanto, o local exato do Panteão. Documentos posteriores,
como consta da mesma escritura, mudaram a posição do imóvel doado. Merecem transcrição as palavras do contrato. Aqui vão elas: "...preferindo a
outorgada conservar os despojos memoráveis no mesmo lugar sagrado, que tão carinhosamente e há tanto tempo guarda o corpo do Patriarca, haviam
ajustado ela, outorgante, e a outorgada, que dito Panteão fosse construído ao lado da Igreja do Carmo, ajuste esse que se tornou efetivo num termo
de acordo assinado no competente livro da Prefeitura Municipal, aos 20 de agosto de 1921, confirmado e alterado, posteriormente, por
correspondência, e ora expressamente cumprido e retificado, com pequenas alterações".
Segundo essa passagem e os documentos nela citados, o Panteão dos Andradas não foi
construído em terreno encravado, mas, sim, no local da antiga portaria do convento em comunicação para a via pública.
Conforme resolução tomada pela Câmara Municipal, em 26 de junho de 1922, entregou ela
à doadora do terreno, pelas despesas que teria de fazer com a modificação do seu prédio, a quantia de 100:000$000 (cem contos de réis).
Em remate:
Depois da oração do dr. Carvalhal Filho, que mereceu da assistência os mais fervorosos
aplausos, o coronel Joaquim Montenegro dava o Panteão dos Andradas por inaugurado e entregue à Cidade.
O Panteão dos Andradas é uma admirável obra de arte, tanto pela sobriedade das suas
linhas arquitetônicas como pelo bom acabamento da sua construção. É um eloqüente atestado da competência do ilustre engenheiro que a projetou e
executou. Essa linda jóia esmalta e condecora o amor da Cidade aos seus grandes filhos. |