MARAPÉ RESISTE AO TEMPO E AOS PROBLEMAS - A partir de hoje, A Tribuna publicará sempre às
segundas-feiras reportagens sobre os bairros de Santos. Nesta edição, serão abordadas as principais características do Marapé, que tem o ritmo do
samba entre suas marcas registradas
Imagem: reprodução parcial da primeira página de A
Tribuna de 14/12/2009
TRANQÜILIDADE
Dores, delícias e tradições
Bairro resiste ao tempo e aos problemas, sem perder o ritmo do samba, outra
marca registrada
Renato Santana
Da Redação
O Marapé resiste. No samba, no passado, nas
histórias e, sobretudo, no amor dos moradores pelo bairro. E é esse amor que move as reivindicações por melhorias, além das constantes afirmações
de que é o melhor lugar da Baixada Santista para morar. Não só de Santos. Entre ruas esburacadas e caminhões por todos os lados, persistem as
características de sossego, vizinhança unida e boêmia. Na Cidade, características cada vez mais aniquiladas pela verticalização imobiliária.
Isso não
significa que os quase 22 mil moradores do Marapé vivam no atraso. O bairro conta com cinco escolas, dois centros médicos, supermercados, uma das
grandes transportadoras do País, o maior cemitério vertical do mundo, comércio intenso, um futuro condomínio com parque aquático e índice de
inclusão de baixo para médio - dos melhores na Cidade.
Sem contar que o samba da velha e nova guarda é tocado em vários bares do bairro, mas
principalmente no Ouro Verde e na escola União Imperial ou na popular Sedinha - localizadas na Rua 9 de Julho, que deverá ser nomeada Rua do
Samba. Em Santos não há outra concentração do gênero.
Entre o morro e as vias basicamente residenciais, o Marapé ainda guarda características de uma
cidade tranqüila, com quase 22 mil moradores que não abrem mão de morar lá
Foto: Irandy Ribas, publicada com a
matéria
Da mesma forma, não é raro encontrar moradores com mais de 30 anos no bairro. Caso de Antônio
Pedro Leite, que há 40 reside na Rua Dom Duarte Leopoldo e Silva. Chegou a morar dois verões em Mongaguá. Não agüentou ficar longe do Marapé.
"Criei meus filhos aqui, agora os netos e espero pelos bisnetos", brinca. Tem lembranças de um passado de gangues e mortes, mas afirma que hoje em
dia a tranqüilidade impera.
Democraticamente, as ruas são divididas entre a tradicional procissão de São Judas Tadeu e os
blocos carnavalescos. No bairro, é bem forte, numa breve caminhada, o contato com tudo aquilo que está acabando nas relações sociais. Molecada
andando descalça, batendo bola, gente sentada nas caçadas e muito batuque.
Entretanto, ainda não é um paraíso. Os moradores dizem o porquê.
UM BAR NA RUA DE GENTE BAMBA - Maria Aparecida Meli, a Cida, é dona de um dos bares mais
tradicionais do Marapé, o Bar da Cida. Localizado entre as ruas Saturnino de Brito e 9 de Julho, concentra a nova safra do samba santista. Ao
lado, no Ouro Verde, está a velha guarda. Há 38 anos no bairro, Cida lembra de uma época onde os chalés eram as moradias dos habitantes. Os mesmos
que pegavam o bonde 37 e pulavam Carnaval no Dengosas do Marapé. "Sou muito coruja com o bairro. Acho que ele só melhorou com o passar dos anos,
mesmo faltando um banco e outras melhorias. A vizinhança continua maravilhosa", aponta. Aos 73 anos, é levada em casa pelos fregueses e ressalta o
clima festivo e familiar das noites de sábado na 9 de Julho: começa no seu bar e no Ouro Verde para terminar na Sedinha
Foto: Irandy Ribas, publicada com a
matéria
MARAPÉ PARA SEMPRE - "A comunidade é tudo. O Marapé representa tudo". As palavras são de Heldir
Lopes Penha (foto), presidente da escola de samba União Imperial. Fundada em 1976 pela amizade entre pessoas do bairro e da Vila Mathias, boa
parte dos integrantes da União mora no Marapé. Para Heldir, a música dominou o bairro conforme o passar do tempo e hoje é uma conquista muitos
bares do bairro terem rodas de samba. "O Marapé é privilegiado. Aqui se respira melhor, tem o samba, a Igreja São Judas Tadeu e o Padre
Chiquinho", resume.
O Esporte Clube Santista do Marapé é
um outro exemplo de como o bairro mantém firme suas tradições. Fundado em 1964 por moradores e situado à Rua Joaquim Távora, 491, promovia
campeonatos de futebol e torneios de bocha. "É uma família o Marapé", define o presidente do clube, Antônio Carlos Dileu. Família essa que se
reúne periodicamente no Ouro Verde ou na própria sede do clube para campeonatos de malha e torneios de carteado. O tempo passou e para ele muita
coisa melhorou. "Vai continuar a mesma coisa porque permanecemos unidos".
Foto: Fernanda Luz, em 15/10/2009,
publicada com a matéria
Sobram pedras e buracos nas ruas
O Morro do Marapé, segundo seus moradores, está em estado de abandono. Fato que a reportagem de
A Tribuna constatou ao ver pedras soltas nas encostas, ruas esburacadas e muros de contenção se descolando do calçamento, encimando
residências e pondo em risco a vida de moradores. Falta de corrimão em algumas escadarias de acesso e lixo, terra e pedra acumulados nas valas são
outros transtornos. O morro, como todos os outros da Cidade, possui elevado índice de exclusão social.
A limpeza no sopé do morro, no final da Rua Napoleão Laureano, falha principalmente na poda da
vegetação, que cresce sobre um muro de arrimo, construído pelo morador Angelo Loureiro, há 50 anos no bairro.
"Moro no morro e pago R$ 600,00 de IPTU. É obrigação da Prefeitura nos atender", reclama José
Bento, com 70 anos e residente no morro desde que nasceu.
Junto com o presidente da Sociedade de Proprietários e Moradores Unidos do Morro do Marapé,
mostrou uma pedra que rolou, estourou parte do arrimo e estatelou-se no primeiro degrau da escadaria, no sopé. "Podia ter pego em alguém. Sempre
ficam crianças brincando aqui. Há tempos que pedimos a presença da defesa civil aqui para mapear essas pedras", afirmou o residente da entidade,
Cassimiro Ramos, há 18 anos no bairro.
Bento mostrou uma pedra na Rua 4 - sem nenhuma placa informando que ali era de fato a 4.
Sustentada por pedras menores, mais da metade de sua massa pendia no ar. O morador relatou que há várias outras.
O deficiente visual Devanir Batista dos Santos, há 42 anos serpenteando
pelas ruas do morro, diz que o fato de conhecer bem o local o livra de muitas quedas. Mas lembra que os idosos acabam sofrendo.
Principais problemas
ESTACIONAMENTO de caminhões e carretas no bairro atrapalha o trânsito e causa rachaduras nas
casas
Foto: Alberto Marques Ribas, publicada
com a matéria
NO MORRO, pedras soltas colocam em risco a vida da população. Recentemente uma delas rolou e
destruiu um pedaço do muro de arrimo, localizado em uma das subidas do morro
Foto: Irandy Ribas, publicada com a
matéria
OS CANAIS que percorrem o Marapé estão com as paredes internas desabando. Ruas e calçadas
apresentam buracos, além da sujeira em muitos pontos do bairro. Moradores pedem atenção
Foto: Irandy Ribas, publicada com a
matéria
Moradores reclamam de descaso
Fundado em 13 de junho de 1953, o nome do bairro possui origem indígena e significa Caminhos
para o Mar. Tais caminhos no Marapé apresentam-se esburacados, tomados por remendos obsoletos e pedrinhas soltas. O presidente da Sociedade de
Melhoramentos do Marapé, Dalve Manoel Negrão dos Santos, disse que uma lista com reivindicações foi entregue à Prefeitura em 2007 e pouco foi
feito.
No documento consta, além de asfaltamento nas vias, mais equipamentos de lazer para os idosos e
jovens (são 5.030 crianças e adolescentes e pouco mais de 3 mil idosos habitantes do bairro), reforma do Canal 1 e da Moura Ribeiro, além da via
que se estende até o sopé do morro, pela Rua Dom Duarte Leopoldo Silva e está com as paredes internas cedendo.
"A Defesa Civil nos procurou para traçar o plano de contingência no morro", lembra Dalve. O
presidente da Sociedade também reclama do lixo espalhado em alguns pontos do bairro, lembrando que os moradores possuem sua parcela de
responsabilidade, e do número abusivo de caminhões e carretas estacionadas pelo bairro.
É muito comum, por todo o bairro, se deparar com os enormes e pesados veículos em ruas pacatas,
nas portas das residências e muitas vezes pondo em risco a vida dos jovens - na medida em que eles não possuem espaço público esportivo.
Carrocerias apartadas de seus veículos também são comuns.
"Isso acaba com o asfalto, cria rachaduras nas casas dos moradores. O maior absurdo! Já
comunicamos a Prefeitura e até agora nada. É preciso disciplinar isso", indigna-se Dalve. |