Na Chácara Thaumaturgo, muito sossego, capricho e plantas raras
Duas chácaras, o que restou de tanto verde
Quem poderia imaginar? Até o começo da década de 1940 havia
no Boqueirão uma área de 22 mil metros quadrados de jardins e pomares, tão bem cuidada e interessante a ponto de se constituir numa das principais
atrações turísticas de Santos.
Tudo começou em 1895, quando Júlio Conceição adquiriu a chácara que ia desde a Avenida Vicente de Carvalho até a
Rua Embaixador Pedro de Toledo, e da Avenida Conselheiro Nébias até o prédio da Pensão Glória, hoje edifício do mesmo nome. Interessado por
plantas como ele só, acabou reunindo um acervo dos mais variados.
Pessoas mais idosas, como Joaquim Ribeiro de Morais, não se esquecem: na entrada pela Avenida Conselheiro Nébias
dois leões em tijolo e cimento guardavam um portão bonito, de ferro, e ajudavam a enfeitar a avenida de palmeiras imperiais bem à frente.
Palmeiras enormes, que por si só representavam um atrativo.
Qualquer um se impressionava com a beleza do Pavilhão Mira-Flores, onde estavam expostas flores e plantas. As
árvores frutíferas variavam desde o bacapari até o sapoti e estavam agrupadas em três pomares. Isso sem falar nos 90 mil pés de orquídeas.
Como se não bastasse, no chamado Parque Indígena podiam ser vistos cerca de dois mil pombos. E que espetáculo
bonito essas árvores proporcionavam, quando se juntavam, às 10 e às 15 horas, para comer num grande gramado!
Mas quem queria conhecer pássaros dos mais diferentes tipos podia visitar a Vila dos
Pássaros, que ficava na Avenida Conselheiro Nébias, 649 (N. E.: o endereço correto da Vila dos Pássaros era Avenida
Conselheiro Nébias, 650, com fundos pela Rua Armando Salles de Oliveira), vizinha à atual Casa de Saúde de Santos.
Seu idealizador foi Raul Jordão Magalhães, que conseguiu reunir as mais variadas espécies nacionais e estrangeiras. Havia desde pássaros
africanos, até gaviões, urubu-rei e tucanos. E quantos não ficaram de boca aberta diante dos três corrupiões que assobiavam boa parte do Hino
Nacional!
De tantas áreas verdes que o Boqueirão tinha, restaram apenas duas chácaras: A Thaumaturgo, no número 674 da
Avenida Conselheiro Nébias, e a Brasil, no 631 da mesma avenida. Olímpia Vergara Thaumaturgo não esconde o orgulho quando mostra a variedade de
plantas e flores que ela e o marido, Emmanuel Thaumaturgo, falecido recentemente, reuniram. Ele gostava de viajar pelo mundo afora, recolhendo
espécies, e não é à toa que a chácara ostenta inúmeras medalhas e troféus ganhos em concursos. No livro de visitas, estão expressas palavras de
admiração de pessoas dos mais diferentes países, como França, Austrália, Alemanha e Itália.
A Chácara Brasil também se conserva como um reduto bonito e tranqüilo, onde no final da tarde se ouve o canto de
sabiás, rolinhas e bem-te-vis. Tudo como se não fossem passados 50 anos de sua criação.
No Instituto Histórico e Geográfico, dificuldades devido à falta de verba
Uma feira hippie e a luta pelo folclore
Aos sábados, quando não chove, a pérgula do Boqueirão ganha
uma movimentação diferente, a partir das 14 horas. Ali se realiza a pitoresca Feira Hippie, onde se comercializam os mais variados tipos de
trabalhos artesanais.
Tem de tudo um pouco: estátuas esculpidas em madeira, sapatos em couro ou camurça, quadros, bolsas, cintos,
camisetas, bijuterias em cobre e mesmo o familiar crochê. Quem confecciona as peças em crochê geralmente são senhoras respeitáveis, que lembram
tias e avós, e nada têm a ver com os jovens cabeludos e de aspecto displicente e rebeldes que se acomodam por perto.
Sejam ou não hippies os expositores, a verdade é que a feira de arte enfeita as tardes do sábado do
bairro e proporciona um passeio interessante e descontraído.
Mas quem quiser ver autênticos exemplares de arte popular, deve visitar a Casa do Folclore, criada e mantida
pelo professor Albino Luís Caldas, um homem que pode-se dizer, sem nenhum exagero, vive para divulgar o folclore brasileiro.
A casa é a única iniciativa particular em todo o Brasil que se dedica à divulgação do folclore brasileiro, de
forma inteiramente gratuita, mantendo uma biblioteca especializada e um acervo que inclui a arte popular dos mais diferentes pontos do País.
Para o professor Albino, o folclore é um dos maiores fatores de integração nacional. Apesar disso, já tentou
fazer um levantamento completo do folclore de Santos por meio da Prefeitura, mas não conseguiu. As autoridades não se interessam por seu trabalho.
Mesmo assim ele não desanima e segue lutando com o apoio da esposa, Aida Luís Caldas. Tudo pelo amor ao
folclore, amor às coisas nossas, brasileiras. |