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HISTÓRIAS E LENDAS DE SANTOS
Histórias do Largo da Banca

O Largo da Banca, muito popular, situava-se no Cais entre a atual Praça Azevedo Júnior e o começo da Rua Riachuelo ou pouco mais adiante. Em menores dimensões, o lugar foi mais tarde Largo 14 de Julho e Largo 11 de Junho. Ganhou tal denominação porque na área se estabelecia a banca do peixe, onde a população se abastecia de pescado. Possuía também um dos chafarizes mais procurados da Cidade: o Chafariz da Banca.

Transcrito da Cartilha da História de Santos, 1980, de Olao Rodrigues, Prodesan Gráfica, Santos/SP, página 52:

A Banca, em foto de 1865, atual Praça Azevedo Júnior
A Banca, em foto de 1865: no canto direito aparece o Hotel Palm. O prédio novo, que avança no mar, é o da Recebedoria de Rendas (antes denominado prédio do Consulado) e ao fundo vê-se a Igreja do Carmo. Em primeiro plano, um trapiche para o acesso às embarcações

Carlos Vitorino, em seu livro Reminiscências, foi testemunha da intensa movimentação do logradouro pelo menos em 1875-1880. Com trapiches muito conhecidos nas imediações, o popular Largo da Banca efervescia de atividade dia e noite. E, como tudo, era rudimentar!

O transporte de sal dos navios para os armazéns era feito por meio de caçambas puxadas por um só animal. A sacaria de algodão e aniagem equilibrava-se na cabeça de corpulentos crioulos estivadores, enquanto a madeira, ainda bruta, em vigas descomunais, saía dos patachos procedentes do Sul para ser aparelhada na serraria de Jacob Emmerich, dos primeiros industriais em Santos.

Congestionamento - Carga dificultosa, a das caldeiras vindas de portos estrangeiros. De bordo para a carroça baixa e especial, o pesado volume demandava esforços hercúleos. E quando já na carroça, após intensa energia, o veículo empacava. Caíra num buraco. Verdadeira tormenta. Pobres animais! Levavam bordoadas em todas as partes do corpo. Muita gente ao redor para assistir ao espetáculo já rotineiro naquela Santos de 1875.

Alguns circunstantes, resolutos, de boa índole e melhor ânimo, faziam força para safar a roda da cova, mas qual! O buraco era fundo. (...) Quando afinal a carroça ficava livre do barranco, os animais, trôpegos, puxando a enorme caldeira se punham em marcha, muitas outras carroças também ficavam livres e continuavam a caminhada que o acidente as paralisara, por congestionamento do espaço.

Pinga e tudo o mais - Mas a Banca tinha muitos outros aspectos negativos. Brigas lá se sucediam de meia em meia hora, em que também se envolviam marinheiros embriagados. Não faltavam botecos. Muito menos pinga! Predominava na Banca o Hotel Madrid, que recebia mulheres de vida airada e lá faziam a vida. (...) Ponto de gente arruaceira e valentona.

Anos antes do funcionamento do Mercado Provisório no Largo dos Gusmões, em 1880, a Banca transformava-se em tumultuada e babilônica feira-livre. Assim foi com a banca de peixe. Assim se verificou com um punhado de negociantes de meia-tigela que, não alugando dependências, montavam barracas ao ar livre, nas calçadas ou em qualquer canto do logradouro, com toldo suportado por quatro paus velhos, e ei-los em pleno exercício de comércio, sem licença de ninguém, no arrepio das posturas municipais, a concorrer com negociantes legalmente estabelecidos.

30 Quilos e Maria Mixola - Do mesmo modo sucedeu certa ocasião com um espanhol rústico, Domingos de Tal, que montou barraco sumário com toldo apodrecido e, indiferente à regularidade de tradicionais quitandeiros, instalados em casas apropriadas e devidamente licenciados, comprava verduras, legumes e frutas, a dinheiro contado, das embarcações que ancoravam no cais ali defronte e, sem qualquer cerimônia, apregoava os produtos, que, para ele, pesava cada peça 30 quilos. E daí seu apelido de 30 Quilos. O espanhol fez diabruras na Banca, de que se tornou senhor.

Como sua figura grotesca pouco ajudasse, valeu-se de outra, também burlesca, a Maria Mixola, tipo de mulher decidida mas escandalosa, com ela juntando trapos. Enquanto 30 Quilos cuidava das couves, alfaces, pimentões e bananas, Maria Mixola fazia das suas, costumando, por exemplo, atrair a cobiça de homens; não raro atirava-se à noitinha às águas sujas do Estuário quase desnuda ou pelo menos com o busto inteiramente despido, oferecendo espetáculo de concupiscência a muita gente.

Política - E nos dias de eleições? Os ajuntamentos, os comentários, os palpites, as discussões e os desentendimentos não raro se verificavam na Banca, onde se reuniam os lavradores provindos de sítios das cercanias e desembarcados no ancoradouro fronteiro, enjambrados, com o indefectível cigarro de palha, consignados ao partido político dominante. Eram votos certos, de cabresto, em troca de terno de brim amarelo, chapéu de três bicos, e botina amarela bico 44, tudo posto à sua disposição, por meio de vales no Palais Royal, nas proximidades.

Duas as facções, as dos liberais e dos conservadores. Conhecido o resultado do pleito, à noitinha, o partido ganhador - quase sempre os liberais - organizava passeata festiva com a banda musical de Luís Arlindo da Trindade.

Nem sempre as eleições decorriam em clima de tranqüilidade. Numa delas o pau roncou exatamente na única seção eleitoral. Sabem aonde? Na antiga Matriz, na Praça da República. Foi chinfrim pra valer. Socos, pontapés, urnas, cadeiras, mesas e outros móveis virados e mais ainda. O Cônego Scipião Junqueira, Vigário de Santos, foi enérgico. Proibiu que as eleições se efetuassem em templos, que não eram lugar de depravações públicas.

A Banca, para onde convergiam os bambas doutro século, foi um dos quadros mais populares e originais da rude paisagem santista doutros tempos.

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